“Que grande loucura expor-se ao perigo de uma morte infeliz e
começar com ela uma eternidade desditosa, por causa dos breves
e miseráveis deleites desta vida tão curta! Oh, quanta
importância tem esse último instante, esse último suspiro,
esta última cena! É uma eternidade de gozos ou de tormentos.
Vale uma vida sempre feliz ou sempre desgraçada. Consideremos
que Jesus Cristo quis morrer vítima de tanta amargura e
ignomínia para nos obter morte venturosa. Com este objetivo
nos admoesta e ameaça, tudo para que procuremos concluir a
hora derradeira na graça e na amizade de Deus.
Até um pagão,
Antístenes, a quem perguntaram qual era a maior dita deste
mundo, respondeu que era uma boa morte. Que dirá, pois, um
cristão, a quem a luz da fé ensina que nesse momento se enceta
um dos dois caminhos, o do eterno sofrimento ou o da eterna
alegria? Se numa bolsa metessem dois bilhetes: um com a
palavra inferno, outro com a palavra glória, e tivesses que
tirar à sorte um deles para seguir imediatamente ao lugar
indicado, que precaução não tomarias para tirar o que desse
entrada para o céu? Os desgraçados, condenados a jogar a vida,
como haveriam de tremer ao estender a mão para lançar os dados
de cuja sorte dependesse a sua vida ou a sua morte? Com que
espanto te verás próximo desse momento solene em que poderás
dizer a ti mesmo: Deste momento depende minha vida ou minha
morte eterna! Decide-se agora se hei de ser eternamente feliz
ou desgraçado para sempre!... Refere São Bernardino de Sena
que certo príncipe, ao expirar, dizia atemorizado: Eu, que
tantas terras e palácios possuo neste mundo, não sei, se
morrer esta noite, que mansão irei habitar!
Se crês, meu
irmão, que hás de morrer, que existe eternidade, que se morre
só uma vez, e que, dado este passo em falso, o erro é
irreparável para sempre e sem esperança de remédio: por que
não te decides, desde o momento em que isto lês, a praticar
quanto puderes para te assegurar uma boa morte?... Era a
tremer que Santo André Avelino dizia: Quem sabe a sorte que me
estará reservada na outra vida: salvar-me-ei?... Tremia um São
Luís Beltrão de tal maneira que, em muitas noites, não lograva
conciliar o sono, acabrunhado pelo pensamento que lhe dizia:
Quem sabe se te condenarás? E tu, meu irmão, que de tantos
pecados és culpado, não tremes? Apressa-te em tomar o remédio
oportuno; decide entregar-te inteiramente a Deus, e começa,
desde já, uma vida que não te aflija, mas proporcione consolo
na hora da morte. Dedica-te à oração; freqüenta os
sacramentos, evita as ocasiões perigosas e, se tanto for
preciso, abandona o mundo para assegurar tua salvação,
persuadido de que, quando desta se trata, não há confiança que
baste”
(Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a Morte,
Consideração III, Ponto III). |