NÃO SE CURVAR DIANTE DOS PERSEGUIDORES

(Sl 26, 6)

 

“E agora minha fronte se levanta em meio aos inimigos”.

 

O Papa Leão XIII escreve: Recuar diante do inimigo ou calar-se, quando de toda parte se ergue tanto alarido contra a verdade, é próprio de homem medroso ou de quem vacila no fundamento de sua crença. Qualquer destas coisas é vergonhosa em si; é injuriosa a Deus; é incompatível com a salvação tanto dos indivíduos como da sociedade, e só é vantajosa aos inimigos da fé; porque nada tanto afoita a audácia dos maus como a pusilanimidade dos bons.

Não se pode deixar as trevas triunfarem nem o mal sufocar o bem; sejamos fortes e corajosos na luta contra as trevas e o mal... ajudemos a todos com o bom exemplo: “Também tu és chamado a salvar as almas. Salvá-las ao menos com o bom exemplo, se de outro modo não podes” (Pe. Alexandrino Monteiro).

Jamais recuar ou calar; o nosso testemunho tem que ser verdadeiro. Sejamos corajosos e pisemos diariamente o respeito humano, a covardia e o medo: “Sempre pensei que a falta de lealdade por respeitos humanos é desamor..., e ausência de personalidade” (São Josemaría Escrivá).

O que se pode esperar do católico que abaixa a cabeça diante dos inimigos? Que se intimida com os uivos dos lobos? Que deixa de progredir no caminho da santidade por causa das ameaças dos perseguidores? Nada! Simplesmente nada de bom!

Sejamos fortes e corajosos... mantenhamos nossa cabeça erguida diante dos vendavais das perseguições e críticas; somente assim venceremos os inimigos da luz e do bem: “As árvores que crescem em lugares sombreados e livres de ventos, enquanto externamente se desenvolvem com aspecto próspero, tornam-se fracas e moles, e facilmente qualquer coisa as fere; mas as árvores que vivem no cume dos montes mais altos, agitadas pelos muitos ventos e constantemente expostas à intempérie e a todas as inclemências, atingidas por fortíssimas tempestades e cobertas por frequentes neves, tornam-se mais robustas que o ferro” (São João Crisóstomo).

Aprendamos dos MÁRTIRES e dos SANTOS a darmos o verdadeiro testemunho... a permanecermos com a fronte levantada em meio aos inimigos e perseguidores.

 

I. O testemunho dos mártires

 

O sangue dos mártires é uma voz de verdade.

São Pedro e São Paulo tinham sido arrastados ao Sinédrio à presença de Anás e de Caifás, os dois que haviam condenado a Nosso Senhor Jesus Cristo. Perguntaram-lhes: “Em nome de quem ousais pregar e realizar prodígios? E Pedro respondeu: Chefes do povo, é em nome de Jesus Cristo Nosso Senhor, aquele que vós crucificastes e que Deus ressuscitou da morte. O Sinédrio disse: Guardai-vos bem de ainda falar d’Ele com qualquer pessoa”. Pedro e João exclamaram: “Não podemos calar aquilo que ouvimos e vimos” (At 4, 20).

E desde aquele dia, em Jerusalém, em Antioquia, em Roma... sem medo e sem trégua, a voz de Pedro anunciou o Evangelho; para fazerem calar tiveram de matá-lo na colina Vaticana, no ano 67.

São João Evangelista, o Apóstolo predileto, a quem fora confiado Nossa Senhora, foi mergulhado numa caldeira de óleo fervente. Salvo prodigiosamente, foi condenado ao exílio na ilha de Patmos.

E Tiago, parente de Jesus, foi lançado do pináculo do templo de Jerusalém, lapidado enquanto rezava pelos seus inimigos e finalmente liquidado.

E André, em Patras, na Grécia, foi posto na cruz: por três dias, daquele púlpito, testemunhava a divindade de Cristo à gente que, chorando, o escutava.

E, depois dos Apóstolos, são milhares de meninos e de meninas, de homens e de mulheres que, intrépidos, derramam o seu sangue. O diácono Lourenço, vendo o Papa Sisto II, a cujo serviço estava, arrastado ao martírio, inveja-lhe a sorte e suplica-lhe, chorando levá-lo consigo para morrer.

Não foram raros os episódios como o da morte do pontífice Caio. Nas catacumbas, no dia de Páscoa, muitíssimos cristãos haviam-se reunido: o pontífice Caio estava no altar. Enquanto a hóstia se transubstanciava no Corpo de Cristo e o povo recolhido adorava, ouviram-se fortes gritos: “Morte aos cristãos!” Esses gritos partiam dos seguidores do Imperador Diocleciano que ali haviam penetrado para os trair. A multidão, sem se alterar, prosseguiu adorando Cristo Eucarístico. Desembainhando as espadas, os soldados feriram à direita e à esquerda. “Filhos caríssimos, - bradou o pontífice Caio, - Cristo morreu e ressurgiu por nós. Coragem: Ele quer coroar-vos”. E todos, a uma voz, gritaram: “Somos cristãos!”. A matança continuou, mas ninguém exalou uma queixa. As mães, estreitando ao seio os filhos, diziam: “Vamos para o Céu: eis que o Senhor chega para nos buscar”. O pontífice Caio disse por sua vez: “Eu também sou cristão!” E a sua cabeça decepada rolou sobre os degraus do altar.

Não se deve pensar que a época dos mártires esteja acabada desde aqueles primeiros séculos. Também nos nossos tempos temos tido gloriosos mártires. É de 1861 o martírio de Teófanes Vénard, missionário francês na Ásia (Tonquim); antes de morrer, quis escrever a cada um dos seus entes queridos uma carta de lembrança: “É meia-noite, em torno da minha cela só se vêem lanças e longas  espadas. Num ângulo da câmara, um grupo de soldados joga baralho, outro grupo joga dados. A dois metros de mim uma lâmpada projeta a sua luz trêmula na minha folha de papel chinês, e permite-me traçar-te estas linhas. De dia para dia espero a minha sentença. Talvez amanhã eu seja conduzido à morte. Morte feliz, não é verdade? Morte desejada, que conduz à vida...” Escreve ao seu irmão: “Meu caro Henrique, não consumas a tua vida nas vaidades do mundo... Resiste às inclinações da carne e sujeita-a ao espírito, fica alerta contra as insídias do demônio e as práticas do mundo, observa os preceitos da religião; isto é ser homem. Escrevo-lhe estas palavras num momento solene... dentro de algumas horas serei morto pela fé em Jesus Cristo... Adeus, irmão; vem comigo para o céu”.

A 2 de fevereiro de 1861 foi-lhe cortada a cabeça.

Ante estes fatos, torna-nos espontânea à mente a bela frase do grande pensador Pascal: “Eu creio em testemunhas que se deixam degolar”.

 

II. O testemunho dos santos

 

No meio da treva noturna, Deus acendeu as estrelas que brilham longínquas e suaves até o nascer do sol: o navegante batido pelas ondas e o peregrino perdido no emaranhado do bosque olham para elas e reencontram a trilha segura.

Como as estrelas, assim são os santos no meio das trevas do mundo: os santos são os pálidos reflexos da face esplendente de Deus. Os homens incertos entre as paixões e os erros volvem para eles o olhar, entrevêem a felicidade e a verdade, reencontram o caminho da vida cristã.

Quantos, pensando em São Francisco de Assis, o pobrezinho de Deus, não sentiram a força de desprender o coração da avareza! Outros, pelo exemplo de São Domingos de Gusmão, fugiram das heresias que estragam a fé; outros, ante a humildade de São Carlos Borromeu, compreenderam que as honras do mundo são névoa ao vento; outros inúmeros receberam de São Luís Gonzaga a força de domar a paixão impura e de resistir por toda a vida como lírios intactos e cândidos.

Em Sabedoria 18, 1 diz: “Para os teus santos havia plena luz”. Dos teus santos, ó Jesus Cristo, uma grande luz se difunde que rasga a nossa escuridão e ilumina o nosso caminho. Eles são as tuas testemunhas: quem se aproxima deles sente-se atraído por uma força misteriosa como aquela que saía outrora da tua veste; quem os escuta falar, no timbre da sua voz e no sentido da sua palavra apreende um eco da tua voz, ó Senhor, e da tua palavra viva que chega a nós dos séculos longínquos; quem os vê mortificar-se asperamente, fazer o bem generosamente, morrer jubilosamente, vê na face deles uma semelhança contigo.

Quando um santo passa pela terra, são sempre numerosíssimos os que compreendem o testemunho que ele dá de Jesus Cristo, e por isso são muitíssimos os que o seguem. Quem pode dizer quantos frades, de pés descalços, têm seguido e seguirão as pegadas de São Francisco de Assis? Quem pode dizer quantos têm estudado e pregado para imitar São Domingos de Gusmão? Olhai os missionários que todo ano partem intrepidamente para regiões longínquas, encorajados pela proteção de São Francisco Xavier!

São muitos os jovens que todo ano, nas instituições salesianas, sentem a carícia de São João Bosco; são centenas de infelizes, recusados pela sociedade humana, que são acolhidos na “Pequena Casa da Divina Providência” em Turim – Itália, onde palpita o coração do Cottolengo; são milhares de pessoas, em todas as partes da terra, de todas as condições sociais, que na sua alma foram comovidas pelo testemunho de Santa Teresinha do Menino Jesus, Santa Gema Galgani, São Gabriel de Nossa Senhora das Dores e outros.

Verdade é que o mundo despreza os Santos, como também o morcego despreza a luz; é verdade que eles são julgados uns ignorantes, gente iludida e doente, que não compreendeu o prazer da vida. Em quem nós acreditaremos? No testemunho do mundo ou no testemunho dos santos?

 

III. O nosso testemunho

 

O primeiro testemunho que Jesus Cristo espera de cada um de nós é o do bom exemplo. “Tu vais à igreja e és pior do que os outros!” Este insulto que os inimigos dos católicos nos lançam frequentemente, às vezes tem um fundamento de realidade: as obras não correspondem à fé professada.

O grande Apóstolo São Paulo escreve: “Quanto a ti, sê para os fiéis um modelo na palavra... na caridade, na fé, na pureza” (1 Tm 4, 12).

Na palavra. As doutrinas da fé devem ser estudadas e professadas de fronte erguida. Ao invés disto, que fazeis vós, ó homens de pouca fé? O Evangelho diz, por exemplo, que é preciso fazer penitência, e nas vossas conversas não se fala de outra coisa senão de gozo e de prazeres. O Evangelho lança a maldição ao mundo e aos seus escândalos: ao contrário, sem tantas considerações vós dizeis que o mundo vos agrada. O Evangelho diz que não se julgue a ninguém, e, no entanto, não se passa dia sem murmurações e sem maledicências.

Na caridade. O Evangelho, em todo pobre que sofre, em toda boa obra mostra-nos Jesus Cristo que sofre e que pede; porém nós, ao contrário, apegamo-nos tanto ao dinheiro que a esmola nos mete medo.

Na . Vós todos credes que na Hóstia Santa está Deus, credes que Ele é Pão e Força da vossa alma; e então como sucede que não o recebeis? Que não o visitais?

Na pureza. Acreditais que o pecado é a lepra da alma e o trazeis convosco tranquilamente por semanas e meses. Credes que o vosso corpo é templo do Espírito Santo e, no entanto, não o respeitais.

Estes são falsos testemunhos que Jesus Cristo recusa e condena.

Católico, seja testemunha fiel de Nosso Senhor, não se curve diante dos ataques dos inimigos, mas lute corajosamente confiando em Deus: O cristão nasceu para a luta, e quanto mais encarniçada se apresenta, tanto mais segura há de ser a vitória com o auxílio de Deus (Papa Leão XIII).

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 03 de junho de 2011

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Leão XIII, Sapientiae Christianae, 18

Pe. João Colombo, Pensamentos sobre os Evangelhos e sobre as Festas do Senhor e dos Santos

Pe. Alexandrino Monteiro, Raios de Luz

São Josemaría Escrivá, Sulco, 370

São João Crisóstomo, Homilia sobre a glória da tribulação

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Não se curvar diante dos perseguidores”

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