O SEU TESTEMUNHO É VERDADEIRO
(Jo 21, 24-25)
“Este é o
discípulo que dá testemunho dessas coisas e foi quem as
escreveu; e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro. Há,
porém, muitas outras coisas que Jesus fez e que, se fossem
escritas uma por uma, creio que o mundo não poderia conter
os livros que se escreveriam”.
É frequente hoje,
ainda entre os católicos (Calmes, Belser,
Lagrange, Tillmann, Durand, Meinertz, Gut, Braun, Gaechter,
Sickenberger, Wikenhauser, Mollat, Schich e Martín
Nieto) dizer que estes versículos 24 e
25 não são de São João Evangelista,
mas de seus discípulos, em vida ou depois da
morte do Mestre. Todavia, os argumentos não são
decisivos.
Teodoro de
Mopsuestia
também pensa que estes dois versículos não são
de São João.
Por que São
João acrescentou esses dois versículos?
São João Crisóstomo
e Teofilacto pensam que a causa foi
justificar-se de haver publicado seu Evangelho, quando
outros já haviam escrito. Fez pelo seu
extraordinário amor a Cristo Jesus e para
responder à predileção que o Senhor lhe demonstrara.
São Cirilo de
Jerusalém
e Ruperto pensam que foi para conciliar
autoridade em sua obra. Não havia ele escrito coisas
falsas ou incertas... ou mal conhecidas, mas tudo
presenciado por ele mesmo.
“...
sabemos”.
Esse verbo é muito frequente em São João.
O plural
pode ser: a) Plural editorial, de escritor
majestático. b) Plural de grupo. Os discípulos
de São João somam ao seu testemunho. c)
Finalmente, plural impessoal, como se sabe,
como todo o mundo sabe. É a explicação de Vaganay, e
que também admite Dodd. Aqui entra São João
e entram todos os que conhecem a ele e ao cristianismo
(cf. Jo 9, 29.31; Rm 2, 2). Parece-nos mais provável que
se trata do plural majestático, próprio do
escritor, e não do plural numérico, como
prova o fato de alternar imediatamente depois com o
singular (creio v. 25).
“...
o mundo não poderia conter os
livros”.
Alguns autores
dizem que o mundo não poderia conter, isto é,
entender tantas coisas (afirmam
isso: Santo Agostinho, São Beda e Ruperto). E o mesmo
Teofilacto o aprova e o confirma com as palavras de
Jesus Cristo:
“Tenho ainda muito a vos dizer, mas não
podeis agora suportar”
(Jo 16, 12).
Outros autores
afirmam que não assimilariam, isto é,
não haveria memória que pudesse conter tantas e tão várias
coisas (Teodoro de Heraclea e Leôncio).
Teodoro de
Mopsuestia
diz:
“O mundo não poderia conter equivale a:
ninguém poderia adquirir tantos livros necessários”.
Essa interpretação se revela como falsa.
A verdadeira
é:
“Haveria que escrever muitos livros se todas as coisas que
Cristo realizou fossem relatadas uma por uma”.
O que São
João nos narrou sob a inspiração do Espírito Santo
tem uma finalidade: fortalecer a nossa fé em Jesus
Cristo mediante a consideração do que Ele fez e ensinou.
Nunca esgotaremos o rico e insondável conteúdo da figura de
Nosso Senhor, como também o não esgota o quarto Evangelho.
Paulo VI
escreve:
“Quando alguém começa a interessar-se por
Jesus Cristo já não O pode deixar. Sempre fica algo para
saber, algo para dizer; fica o mais importante. São João
Evangelista termina o seu Evangelho precisamente assim (Jo
21, 25). É tão grande a riqueza das coisas que se referem a
Cristo, tanta a profundidade que temos de explorar e
procurar compreender (...), tanta a luz, a força, a alegria,
o anelo que d’Ele brotam, tão reais são as experiências e a
vida que d’Ele nos vem, que parece inconveniente,
anti-científico, irreverente, dar por terminada a reflexão
que a sua vinda ao mundo, a sua presença na história e na
cultura, a hipótese, por não dizer a realidade da sua
relação vital com a nossa própria consciência, honestamente
exige de nós”.
Santo Agostinho
comenta:
“Não vá supor-se que o fato de o mundo não
poder conter o que se escreveria, deve ser tomado no sentido
de espaço local. Se o mundo não podia contê-lo, como podia
escrever-se tudo isso? Deve interpretar-se da falta de
capacidade em entender tudo o que se escreveria. Observada a
fé das verdades, por vezes parece que a linguagem excede a
própria fé. Não se dá isto quando se explica racionalmente
qualquer ponto de doutrina que era obscuro ou duvidoso, mas
dá-se quando se aumenta ou explana o que é suficientemente
claro, sem contudo se sair dos limites da verdade explicada.
Assim as palavras excedem a substância da verdade, para se
manifestar a vontade do que fala e não engana, o qual
conhece até onde se deve acreditar, e pelo qual se
restringe ou aumenta o que vai além do objeto da fé. A este
modo de falar chamam os mestres tanto da literatura grega
como da literatura latina, uma hipérbole, que é uma palavra
grega. O que se encontra neste lugar a respeito deste modo
de se exprimir, também se encontra em outras passagens das
Sagradas Escrituras. Sirvam-nos de exemplo as seguintes:
‘Colocaram a sua boca no céu’. ‘Deus esmagará a extremidade
do cabelo dos que caminham através dos seus delitos’. E
muitas outras passagens poderiam citar-se das Escrituras
santas, onde se encontra este modo de falar. A este respeito
poderia eu fazer largos comentários, mas, como o Evangelista
termina o seu Evangelho, vejo-me obrigado a terminar a minha
instrução”.
Os demais
Evangelistas (Mateus, Marcos e Lucas) terminam
repentinamente seus relatos, sem acrescentar nenhuma
nota ou observação pessoal.
São João, como havia terminado seu Evangelho,
antes de acrescentar o capítulo 21, com uma alusão a
outras obras de Jesus Cristo não consignadas nele, assinala
ao próprio tempo o fim que se propôs ao escrevê-lo (cf.
Jo 20, 30-31), assim, agora, o conclui definitivamente
com estes dois versículos, em que dá
testemunho da veracidade do seu relato e pondera as muitas
coisas nele não escritas.
São João
escreveu seu Evangelho a pedido de seus amigos ou dos
bispos da Ásia, segundo testemunho de São
Clemente de Alexandria e São Jerônimo: por ele o
autor assegura com sua assinatura, por dizer assim, a
verdade do que narrou em seu livro e o fato de que ele mesmo
o escreveu:
“Este é o discípulo que dá testemunho dessas coisas e foi
quem as escreveu”.
Não escreveu somente no último capítulo, mas em todo o
Evangelho.
Como garantia de
que é verdade o que narrou, apela o autor para o seu próprio
testemunho e para o testemunho dos demais discípulos, que
eram testemunhas contemporâneas de Jesus Cristo, como o
Evangelista:
“... e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro”.
Quando São João
escreveu seu Evangelho, os outros três Evangelistas já
haviam escritos os seus... sem dúvida havia outros relatos
que não foram admitidos logo entre os Evangelhos canônicos.
São João deixa intacto tudo o que os demais
Evangelhos e o que de verdade pudessem conter outros
escritos sobre Jesus Cristo; porém, para que não se
julgue da pessoa e da obra de Jesus reduzindo-o à extensão
do seu livro, acrescenta:
“Há, porém, muitas outras coisas que Jesus fez”.
São João
Crisóstomo
e Teofilacto afirmam que São João não
escreveu essas palavras:
“Há, porém, muitas
outras coisas que Jesus fez”,
com a intenção de adular Jesus Cristo por ser seu amigo.
São Cirilo de
Jerusalém, Leôncio
e Teodoro de Heraclea dizem que foi uma desculpa dada
pelo Evangelista ao leitor que talvez o repreendesse,
por ter calado muitas coisas feitas pelo Salvador.
São João responde que a abundância das coisas
feitas pelo Senhor era tal, que nem caberia no mundo.
“Este é o
discípulo que dá testemunho dessas coisas”.
Quando dizemos uma coisa de cuja verdade estamos
profundamente convencidos, não intimidamos em confirmá-la
com a solene contribuição do nosso testemunho, disse São
João Crisóstomo. É o que aqui faz São João
Evangelista: contribui o título de sua dignidade:
“Este é o discípulo...”
Afirma que escreveu o seu Evangelho pessoalmente:
“... dá testemunho dessas coisas e foi quem as escreveu”.
E a assina com seu testemunho:
“... que dá testemunho”.
Está claro que foi São João o autor desse
Evangelho. O que falamos de São João podemos
dizer dos outros Evangelistas: escreveram e deram
testemunho do que escreveram, cada qual em sua ordem. E
sendo verdadeiro o seu testemunho, devemos crer que Jesus
Cristo é o Filho de Deus.
“... e sabemos
que o seu testemunho é verdadeiro”.
Eu sei, disse São João Crisóstomo, porque esteve
presente em todas as coisas que fez Jesus Cristo... estava
perto de Jesus quando o crucificaram... a ele foi confiado
cuidar da Virgem Maria.
“Há, porém,
muitas outras coisas que Jesus fez”.
São João sabia muitas coisas sobre Jesus Cristo. Ele, o
Apóstolo, com o seu olhar de águia, estimulado pelo fogo do
seu amor ao Redentor, penetrava em cada uma das ações do
divino Mestre e nas palavras d’Ele... chegava a
“adentrar” no pensamento e no Coração divino. Além
da sua amizade com Jesus Cristo, teve a alegria de viver por
muitos anos com a Mãe de Deus. Tudo indica, ela contou-lhe
muitas coisas belas sobre Jesus Cristo.
FELIZ DO
CATÓLICO QUE GOSTA DA BOA LEITURA
O livro aparece
hoje por toda a parte, versa todos os assuntos, e reveste
todas as formas.
O livro atrai pela
novidade do título, pelo nome do autor e pelo luxo da
impressão.
Se é ilustrado,
tem mais atrativos; se é um romance, quem o não compra?
Porém, de muitos
livros de exterior garrido (elegante,
lindo) se pode dizer com muita verdade que –
nem tudo que brilha é ouro!
Alguns há que se
podem chamar sepulcros branqueados, pois, ostentando um
exterior brilhante, têm no interior oculta a podridão dos
erros mais grosseiros em matéria de honestidade e religião.
É pelo mau livro
que o demônio dá a beber a peçonha do pecado a muitas almas
inocentes.
É com a droga de
livros obscenos que o demônio faz o maior negócio do mundo.
As almas que ele cativa com a leitura de um romance
indecoroso, podem contar-se pelas letras que o compõem.
Ler um mau livro é
aconselhar-se com um inimigo. Ler um bom livro é ouvir um
bom conselheiro.
Um livro mau é um
falsário; um livro bom é um pregador que fala ao coração,
convence o entendimento e move a vontade.
O mau livro
entenebrece o espírito com os erros que encera. O bom livro
é um farol que mostra o caminho da virtude através do
espesso nevoeiro das aberrações de que o mundo anda envolto.
É o bom livro um
espelho onde cada um vê a sua própria imagem, ou ataviada
com virtudes, ou afeada com vícios.
É o bom livro um
velho experimentado que tem muito que narrar ao jovem que
entra no caminho da vida, no consórcio dos homens e na luta
com as paixões.
Ler um bom livro é
entrar num arsenal que fornece ao cristão as armas de que
precisa para se defender dos ataques contra a verdade
católica.
Se houvesse mais
leitores dos bons livros, como a religião seria mais
praticada, mais trilhado o caminho da virtude, mais imitado
Jesus Cristo e mais respeitado o nome de Deus! Como se
veriam os templos mais povoados e mais desertos os
cárceres! Como se melhoraria o estado
da sociedade e com ele as condições dos povos!
Mas, desgraçadamente, não é assim! Quem hoje
governa o mundo são os maus livros. São eles que fomentam as
revoluções e anarquizam os povos, corrompem os costumes
e desmoralizam as sociedades!
Que livros você
lê? Enfastia-te a leitura de obras religiosas? Muito.
Não admira! É que
você já tem o gosto corrompido com novelas que servem só
para excitar a fantasia e avivar as paixões.
O livro faz o
homem. A doutrina nele exposta infiltra-se por tal modo pelo
teu espírito que vens a ser aquilo que leste. Quem muito lê
história, será historiador; quem muito se dá a leitura dos
clássicos, será um deles; quem manuseia os poetas, vem-lhes
a herdar o estro; quem lê amiúde a vida dos Santos, não
tarda a imitar-lhes as virtudes.
Se Santo Inácio de
Loiola tivesse lido um livro de cavalarias quando o pediu,
teria saído um famoso cavaleiro; mas, porque lhe trouxeram
outro que encerrava a vida dos Santos, saiu um tão grande
Santo.
Por isso – dize-me
que livro você lê, e eu te direi quem você é!
Os livros são como
remédios: os que a uns fazem bem, a outros podem fazer mal.
Um livro pode não
prejudicar um ancião, mas pode causar um grande mal a um
jovem. O livro que é bom para o mestre, pode vir a ser a
ruína do discípulo... o livro que um pai pode ler sem abalo
na fé ou na virtude, pode, nas mãos do filho, causar um
grande mal roubando-lhe a inocência.
Escolha bem! O
acertar na escolha é caso de vida ou morte. Se lançares a
mão ao livro proibido, suceder-te-á o mesmo que a nossa mãe
Eva ao tomar o ponto vedado. Perderás a vida da graça,
incorrendo, como ela, nos terríveis castigos do pecado.
Escolha livros que
te abasteçam a inteligência de salutares princípios e
conhecimentos úteis, inflamem a vontade em afetos nobres e
convide o seu coração para ações virtuosas.
Passa uma revista
aos livros da tua biblioteca. Talvez não tenhas nela o
livrinho precioso da Imitação de Cristo, nem algum
livro da vida dos Santos.
A Imitação de
Cristo é o livro da santidade, a escola da mais elevada
perfeição, um tesouro de consolações para as almas
atribuladas.
A Bíblia
Sagrada é o livro de Deus, a sua palavra escrita, enfim,
a história de suas maravilhas.
O Catecismo
é o livro do cristão, o seu Evangelho, a sua moral, o seu
mestre nas dúvidas sobre as verdades e deveres religiosos.
Por falta da sua leitura é que o nível da instrução
religiosa tem baixado tanto nestes desditosos tempos.
Não é nas fontes
viciadas da imprensa pornográfica que se bebe a sã doutrina
da moral católica, única norma que pode guiar o homem pelo
caminho do dever.
A Vida dos
Santos! Que romances, que poemas e narrativas tão
cheias de interesse aí se não encontram?
São páginas
douradas as dos gloriosos anais que relatam os heroísmos
desses valentes e denodados campeões da religião cristã,
desses jovens e moças que lutaram contra os leões,
triunfaram do paganismo entre das chamas e zombaram da
idolatria entre as contorções do ecúleo
(ponta aguçada).
Mas estes feitos
heróicos, estes atos de valor sobre-humano não se lêem em
tantos livros que há por aí... que nem iluminam o
entendimento no caminho do bem, nem inflamaram a vontade em
atos de virtude.
Leia bons livros.
Não te deixes iludir pelo muito que promete o título, nem
pelos ornatos do frontispício, nem pela fama do autor...
mas, examina se o livro que
pretendes ler traz a chancela da aprovação eclesiástica,
porque o que a Igreja aprova, podes ler sem dano; mas o que
ela proíbe, não lerás sem culpa!
Cuidado!
Existem muitas porcarias com aprovação eclesiástica.
O veneno, ainda
quanto doce, mata. Assim, o livro pode ser muito agradável à
fantasia, mas encerrar um veneno tão fino que,
imperceptivelmente, leve a morte à alma!
Oração
Cantai, ó
Verbo, os louvores do Pai e manifestai-me vosso Pai! Vossas
palavras salvar-me-ão e vosso canto ensinar-me-á. Até agora
andei errante à procura de Deus. Mas desde que me
iluminastes, Senhor, fizestes-me encontrar aquele que é meu
Deus e vosso Pai, e de vós o recebo. Torno-me herdeiro
convosco, desde que não vos envergonheis de vosso irmão.
Pe. Divino Antônio
Lopes FP (C)
Anápolis, 27 de
maio de 2014
Bibliografia
Sagrada Escritura
Pe. Manuel de Tuya,
Bíblia comentada
Pe. Juan de
Maldonado, Comentário do Evangelho de São João
Edições Theologica
São Clemente de
Alexandria, Protrepticus 11
Paulo VI,
Audiência geral, 20-11-1974
D. Isidro Gomá y
Tomás, O Evangelho explicado
Pe. Alexandrino
Monteiro, Raios de luz
Santo Agostinho,
Escritos
São João
Crisóstomo, Escritos
Ruperto, Escritos
São Cirilo de
Jerusalém, Escritos
Teofilacto,
Escritos
Leôncio, Escritos
Teodoro de
Heraclea, Escritos
Pe. Juan Leal, A
Sagrada Escritura (texto e
comentário)
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