Instituto Missionário dos Filhos e Filhas da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e das Dores de Maria Santíssima

 

19 de Fevereiro

 

São Flaviano

 

Flaviano, sucessor de São Proclo, ocupou a sede patriarcal de Constantinopla durante os três anos de 446-449. Seu governo coincidiu com uma época agitadíssima da Igreja oriental. Heresias, graves dissensões e lutas intestinas perturbavam a paz e tornavam quase insuportáveis a permanência na capital do império grego. Flaviano, envolvido fatalmente nas agitações político-religiosas daquele tempo, com a solidez de suas virtudes, com a firmeza de seu caráter conservando-se sempre superior e absoluto senhor da situação, apresenta a figura dum grande Patriarca, digno da admiração de todos os tempos. A modéstia, unida à firmeza, a paciência imperturbável nas situações mais críticas, fizeram com que não se esquecesse nunca de sua alta posição e das obrigações a ela ligadas.

Logo após a sua eleição para Patriarca se deu um fato, presságio de lutas vindouras. Segundo o costume daquele tempo, o Patriarca eleito enviara ao Imperador os tais chamados eulógias, isto é, pão bento, símbolo da paz e concórdia. A oferta de Flaviano foi devolvida, com a retificação que só seriam aceitos vasos de ouro. O Patriarca respondeu: “Ouro e prata não me pertencem”.

Quando a heresia monofisítica do arquimandrita Eutiches começou a ganhar terreno em Constantinopla, Flaviano se lhe opôs, com toda a energia e franqueza apostólica. Principiou com esta campanha a subida para o Calvário do intemerato antístite. Eusébio de Doriléia, com um solene protesto contra a nova doutrina, dera sinal de alarme. Flaviano convocou um Concílio local em Constantinopla (448); que examinou a doutrina eutichiana e a condenou. Contra o autor foi lançada a excomunhão. Tendo na questão o apoio incondicional do grande Papa Leão I, Flaviano não mais hesitou em entrar em luta aberta contra os poderosos amigos de Eutíchio. Os que como tais se revelaram, eram o eunuco Crisáfio, favorito e tesoureiro do imperador Teodósio II e Dióscuro, Bispo de Alexandria; dois formidáveis adversários, cuja política outra mira não visava, a não ser deposição e expulsão do Patriarca. Para alcançar este fim, todos os meios, por mais indignos que fossem, lhes eram aceitáveis. Vendo que o Patriarca não cedia, nem ameaças com o desagrado do Imperador lhe faziam modificar a atitude, trataram de alcançar de Teodósio a autorização para convocar um concílio, com o intuito de, como diziam, restabelecer a paz religiosa. O Concílio chamado de latrocínio de Éfeso, realizou-se (449), sob a presidência de Dióscuro. Compareceram 135 bispos. De um sínodo, onde só inimigos tinham apresentação, que justiça Flaviano podia esperar? De fato o sínodo de Éfeso foi à expressão da paixão, do ódio, do despotismo sem freio contra o bispo católico.

A primeira humilhação foi a absolvição solene de Eutíquio e a reabilitação de sua doutrina condenada. Seguiu-se a vergonha de Bispos subalternos declaram depostos e superior, e pronunciarem contra ele a sentença da excomunhão. De nada valeu  a apelação de alguns bispos, que de joelhos suplicaram a Dióscuro que não cometesse tamanha injustiça e retirasse a sentença pronunciada contra Flaviano. A injustiça aí não parou. De choque  apareceu um bando de gente armada, entre outros, monges fanatizados chefiados pelo afamado Barsumas, que com paus e facas se atiram aos Bispos católicos, exigindo-lhes debaixo de terríveis ameaças, a assinatura do documento da deposição e condenação de Flaviano. Sem exemplo na história eclesiástica foi o tratamento bárbaro que Flaviano mesmo sofreu, no meio dos inimigos. O próprio Dióscuro (segundo outros Barsumas) pisou-o com os pés e as feridas que recebeu dos outros fanáticos foram tão graves, que morreu três dias depois.

O triunfo dos inimigos teve pouca duração. Dois anos depois se realizou o Concílio ecumênico de Calcedônia, que restabeleceu a honra do grande Patriarca, dando-lhe o título de Mártir glorioso, que morreu em testemunho da fé verdadeira. O Papa Hilário, que, como comissário apostólico, tinha presenciado as cenas horríveis do sínodo de Éfeso, construiu uma Igreja em honra do Bispo mártir. Nela se vê um quadro artístico que representa o martírio de São Flaviano.

Nota: A Igreja ensina que há em Jesus Cristo duas naturezas, a divina e a humana. A pessoa, porém, é uma só, a de Nosso Senhor Jesus Cristo, Homem-Deus. A heresia de Nestório, condenada pela Igreja, vê em Jesus Cristo, duas pessoas, uma divina e uma humana, uma bem diferente da outra. Eutyches ensinou, contrariamente a fé católica, e ao Nestorianismo que em Jesus Cristo há só uma natureza. Que estas heresias, todas orientais, pudessem causar tanta desordem e serem definidas com tanta paixão, tem em parte sua explicação no caráter dos orientais, que pedem mais para especulação teórica que os ocidentais. Quase sempre havia naquelas questões fortes elementos políticos e pessoais, que faziam com que degenerassem em espetáculos, como os que observamos na vida de São João Crisóstomo e São Flaviano.

 

REFLEXÕES

 

Admirável foi a resistência que são Flaviano opôs à heresia de Eutíquio. Pondo de lado o respeito humano, desprezando a grande influência do terrível heresiarca, Flaviano preferiu morrer a negar a fé. “Ó Timóteo! Guarda o depósito, evitando as profanas novidades de palavras e as contradições duma ciência de falso nome, da qual fazendo alguma profissão, decaíram da Fé”. Estas palavras do grande apóstolo dos gentios a seu discípulo Timóteo, Flaviano observou-as escrupulosamente, como se lhe fossem dirigidas. O mesmo devemos nós fazer: guardar a doutrina que nos foi transmitidas, e não uma que outros, depois inventaram. Da doutrina que nos veio, não nos é tirar um jota, nem lhe acrescentar uma virgula. “Deus – diz São Paulo – tendo falado muitas vezes e de muitos modos, noutro tempo, a nossos pais pelos profetas: Ultimamente nestes dias, nos falou pelo filho”. (Hb 1,2). A palavra do filho está documentada e depositada na Igreja, que cuidadosamente a conversa nos livros bíblicos e na tradição. Da Igreja é que todos os fiéis recebem a doutrina pura e imaculada. Para que ninguém possa ter queixas, como se a Igreja lhe quisesse impor causas impossíveis e “reduzir-lhe a cativeiro e entendimento para que obedeça a Cristo’. (2 Cor 10, 5). Deus prometeu  sua Igreja a assistência do Espírito Santo, para que lhe servisse de luz nas trevas e de orientação nas dúvidas. Cristo não fundou a Igreja sobre areia mas deu-lhe sólido fundamento, capaz de opor firme resistência às tempestades. “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. (Mt 16,18) Pedro é o fundamento. Pedro conserva a fé. Onde está Pedro está a verdade. Quem se associa a Pedro, está com a verdade. Cristo não podia deixar sua Igreja e sua doutrina ao vai- vem das opiniões humanas, que não tem fixidez alguma, e são como a areia do mar. O futuro da Igreja não podia ser confiado a homens sujeitos a paixões, erros, preconceitos e ignorância. Como poderia o espírito humano estudar e compreender coisas que lhe estão muito além do alcance? A fé, a doutrina estão garantidas em toda a sua integridade pela infalibilidade da Igreja. Conservemos fielmente o sagrado depósito da fé, como a Igreja infalível de São Pedro nô-lo apresenta.