26 de maio
São Filipe Néri
Poucos são os Santos da Igreja privilegiados como São Filipe Neri. Filho de pais nobres e piedosos, Filipe nasceu em 1515, na cidade de Florença. De boa índole, de modos afáveis e inclinação à oração mereceram ao menino de 5 anos o apelidado de “o bom Filipe”. Um incêndio destruiu grande parte da fortuna dos pais, e Filipe passou a morar com um primo que era negociante riquíssimo em São Germano. Este primo prometeu-lhe estabelecê-lo como herdeiro de todos os seus bens, se quisesse tomar-lhe a gerência dos negócios. O bom Filipe, porém, pouca inclinação sentia para ser santo, e apesar das repetidas insistências do primo, resolveu dedicar-se ao serviço de Deus. Fez os estudos de Filosofia e Teologia em Roma, e começou desde logo a observar a regra de vida austeríssima, que o acompanhou até o fim da vida. Alimentava-se de pão, água e legumes; para o sono reservava poucas horas, para a oração, porém, muitas. No grande desejo de dedicar-se à vida contemplativa, vendeu a biblioteca, deu os bens aos pobres e aprofundou o espírito na meditação da Sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo. Todo o tempo disponível passava-o nas igrejas ou de preferência nas catacumbas. A graça de Deus tocou-lhe o coração com tanta violência que, prostrado por terra, exclamou muitas vezes: “Basta, Senhor, basta! Suspendei a torrente de vossas consolações, porque não tenho força para receber tantas delícias. Ó meu Deus, tão amável, por que não me destes um coração capaz de amar-vos condignamente?” Foi nas catacumbas de São Sebastião, no ano de 1545, que recebeu o Espírito Santo, em forma de bola de fogo. Naquela ocasião sentia em si um ardor tão forte do amor de Deus que, devido às palpitações fortíssimas do coração, foram deslocadas a segunda e a quarta costelas. Como o amor de Deus, grande era-lhe também o amor do próximo. Filipe possuía o dom de atrair todos a si, circunstância para a qual concorriam muito sua afabilidade, cortesia e modéstia. Recorria a mil estratagemas, para ganhar os jovens nas ruas e nas oficinas de Roma. Era amigo de todos e, uma vez adquirida a confiança preparava-os para a recepção dos Sacramentos e encaminhava-os para o bem. As noites passava-as nos hospitais, tratando dos doentes como uma mãe. O monumento mais belo da sua caridade é a irmandade da Santíssima Trindade, cujo fim principal era receber os romeiros e tratar dos doentes. Primeiramente trabalhava só com 15 companheiros, que o ajudavam nesta nobre missão. No princípio de cada mês, convidava o povo para o exercício da adoração do Santíssimo Sacramento durante quarenta horas e nestas ocasiões, embora leigo, fazia admiráveis alocuções aos fiéis. A piedosa idéia achou eco entre a população, e abundantes corriam as esmolas para a nova instituição. Cardeais, Bispos, Reis e Príncipes, Ministros, Generais e Princesas, viam grande honra em poderem pertencer a esta Irmandade. Têm-se visto exemplos de Papas, ao lado de jovens cristãos e em companhia dos Filhos de São Filipe Neri, ajoelharam-se diante de pobres doentes, para lhes lavar e pensar as feridas. Milhares de peregrinos acharam hospedagem e tratamento gratuito por três dias, principalmente durante a Semana Santa e o Jubileu. O movimento dos romeiros no ano jubilar de 1650 foi extraordinário. A Irmandade hospedou naquele ano 334. 453 romeiros e mais 600 pessoas estavam diariamente a serviço da Irmandade, para atender às necessidades de tanta gente. Segundo o conselho do confessor, Filipe recebeu o santo Sacramento da Ordem, tendo já trinta e seis anos de idade. Tinha o desejo de trabalhar nas Índias, como missionário e morrer mártir pela religião de Cristo. Pela vontade de Deus, porém, sua Índia havia de ser Roma e lá ficou. Deixando-se guiar pela Providência Divina, tornou-se Apóstolo da capital da cristandade, sendo sua obra principal a fundação da Congregação do Oratório, isto é, Congregação da Oração para a qual chamou homens igualmente distintos pelo saber e pela piedade, como César Barônio, Antônio Maria Tarugi, Antônio Galônia e outros. Todas as noites faziam conferências espirituais, que tinham grande concorrência. Cardeais, Bispos, sacerdotes e leigos, confiavam-se à direção de quem veneravam como a um pai. Algumas vezes no ano, de preferência nos dias de carnaval, organizava grandes procissões, que visitavam as sete igrejas principais de Roma. Para afastar o povo dos teatros e divertimentos perigosos, realizava os oratórios espirituais, isto é, representações teatrais de cenas bíblicas. Grande amigo da mocidade, a esta proporcionava muitas diversões e passeios. Era edificante ver o ancião de 70 anos, levando centenas de moços a passeio e excursões: com eles brincava e se divertia. “Diverti-vos à vontade, contanto que não pequeis”, eram as palavras com que os animava. Grande parte do dia passava no confessionário, e só Deus sabe o número das almas que a seus pés acharam a paz, o perdão e a salvação. Todos nele depositavam uma confiança ilimitada. Ilimitada também eram a inveja e o ódio de Satanás e seus sequazes. Filipe e os confrades tiveram que saborear muitas vezes o escárnio, a calúnia e perseguição. O ódio dos inimigos chegou a tal ponto, que levaram uma acusação falsa à autoridade eclesiástica, de que resultou para Filipe a suspensão de ordens. Privado da celebração Santa Missa, da pregação e da administração do Santíssimo Sacramento, o Santo não perdeu a calma e só dizia: “Como Deus é bom, que me humilha!” A suspensão foi retirada, e o inimigo principal do Santo, caindo em si, fez reparação pública e tornou-se-lhe discípulo. Pelo fim da vida já não lhe era possível dizer a Santa Missa em público, tanta era a comoção que lhe sobrevinha, na celebração dos santos mistérios. Estando no púlpito, as lágrimas lhe embargavam a voz quando falava do amor de Deus e da Paixão de Cristo. Quando celebrava a Missa, chagando à duas a três horas ficava arrebatado em êxtase enquanto o corpo se lhe elevava á altura de dois palmos. Não é para admirar que o Papa o consultasse nos negócios mais importantes e quisesse beijar-lhe as mãos e a batina. À sua prudência e clarividência deve a França a felicidade de ter permanecido país católico. Henrique IV, calvinista, tinha abjurado a heresia e entrado na Religião Católica. No ardor das guerras civis, tornou a voltar ao calvinismo, para depois outra vez se agregar à Igreja. O Papa Clemente VIII, com o apoio dos Cardeais, negou ao rei a absolvição e opôs-se-lhe à reconciliação. Filipe, prevendo a apostasia da França, no caso de o Papa persistir nessa resolução, fez jejuns e orações extraordinárias e pediu a Barônio, que era confessor do Papa, que o acompanhasse nestes exercícios, para alcançar a luz do Divino Espírito Santo. No terceiro dia de manhã, disse Filipe a Barônio: “Hoje o Papa te pedirá para ouvi-lo em confissão; depois da confissão, antes de lhe dares a absolvição, dizei-lhe: O Pai Filipe ordenou-me que negasse a Vossa Santidade a absolvição, e lhe declarasse que não continuarei a servir de confessor, se não conceder absolvição ao rei da França” Assim se fez. Clemente VIII, profundamente impressionado com esta declaração, pediu a absolvição com a promessa de por tudo em ordem. Henrique IV obteve a absolvição do Papa, e foi solenemente recebido no seio da Igreja. Fatigado e exausto de trabalhos e alquebrado pela idade, Filipe foi acometido de grave doença. Tendo-o examinado quatro médicos, saíram do quarto desanimados quando ouviram o doente exclamar: “Ó minha Senhora, ó dulcíssima e bendita Virgem!” Foram ver o que tinha acontecido e encontraram o Santo elevado sobre o leito e, braços em êxtase, exclamando: “Não sou digno, não sou digno de vós, ó dulcíssima Senhora, que venhais visitar-me!” Os médicos respeitosos aproximaram-se e perguntaram ao doente que sentia! Este, voltando a si, e tomando a posição costumeira no leito, perguntou: “Não a vistes, a Santíssima Virgem, que me livrou das minhas dores?” De fato se levantou completamente curado, e viveu mais um ano. Tendo predito a hora da morte, Filipe fechou os olhos para este mundo no dia 2 de maio de 1595. O túmulo tornou-se-lhe glorioso e poucos anos depois da morte, Filipe foi beatificado pelo Papa Paulo V, em 1622, e canonizado por Gregório XV.
REFLEXÕES
1 — A obediência é o caminho mais curto da perfeição. Quem deseja fazer progressos na vida espiritual, sujeite-se a direção judiciosa de um confessor prudente e virtuoso, ao qual, com toda a sinceridade, manifeste o estado de sua alma e não tome nenhuma resolução, sem antes lhe ouvir o conselho. 2 — Antes de tomar um confessor, convém lembrar-se do seguinte: Tendo-se feito a escolha, não se deve mudar de confessor, a não ser por motivos de força maior, e é preciso que se lhe de toda a confiança. Quando o demônio não consegue perder uma pessoa, envida todos os esforçar e o penitente, sabendo que assim, com muita probabilidade, alcançará o fim que visa. 3 — A Santíssima Virgem deve ter todo o nosso amor: “A devoção a Maria é de grande necessidade, por não haver meio mais seguro de obter as graças divinas, que pela intercessão da divina Mãe.” 4 — Principiantes na vida espiritual devem meditar muito os novíssimos. Quem não descer ao inferno enquanto viver, corre perigo de nele entrar quando morrer. 5 — O maior perigo que existe para a inocência, é não temer a si próprio. Tudo está perdido para quem não desconfia de si e não teme. 6 — Se alguém, que muitos anos viveu religiosamente, tiver a infelicidade de cometer um erro grave, não há meio mais seguro de levantar-se, que manifestá-lo a um amigo, que lhe mereça toda a confiança. Em atenção a esse ato de humildade, Deus o restabelecerá no estado antigo. 7 — São Filipe deu o seguinte conselho a uma pessoa que se queixava da sua cruz: “Meu filho, a grandeza do amor que se tem a Deus, é medida pela grandeza do desejo de sofrer muito por amor de Deus; que se impacienta com a cruz, achará uma outra mais pesada; convém fazer da necessidade uma virtude. Os sofrimentos deste mundo são a melhor escola do desprezo do mundo; quem não se matricular nesta escola, merece dó, porque é um infeliz.
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