FICARAM INVEJOSOS

 (Gn 26, 14)

 

 

 "Ele tinha rebanhos de bois e ovelhas e numerosos servos. Por causa disso os filisteus ficaram invejosos".

 

 

 

Isaac semeou naquela terra e, naquele ano, colheu o cêntuplo. Deus o abençoou (Gn 26, 12) e o homem se enriqueceu, enriqueceu-se cada vez mais, até tornar-se extremamente rico (Gn 26, 13). "Ele tinha rebanhos de bois e ovelhas e numerosos servos. Por causa disso os filisteus ficaram invejosos" (Gn 26, 14). Todos os poços que os servos de seu pai haviam cavado - do tempo de seu pai Abraão, - os filisteus os haviam entulhado e coberto de terra (Gn 26, 15).

 

Isaac trabalhou honestamente e colheu muito. Deus o abençoou e ele tornou-se extremamente rico.

Está claro que Deus não condena a riqueza, se aquele que a possui, conseguiu honestamente: "Deus abençoou o trabalho de Isaac na terra de Canaã, concedendo-lhe abundantes colheitas e uma grande riqueza, como havia concedido também a Abraão (cfr. Gn 13, 2). As riquezas são, neste caso, fruto do trabalho do patriarca e, ao mesmo tempo, sinal da benção divina. A Sagrada Escritura não condena as riquezas em si mesmas, nem o possuí-las legitimamente; mas condena o apego às mesmas e o colocar nelas a confiança (cfr. Lc 12, 13-21)" (EUNSA).

Além de ótima colheita, Isaac tinha rebanhos de bois e ovelhas, e numerosos servos a seu serviço.

Diante do progresso de Isaac, os filisteus não se aguentaram, e, cheios de INVEJA começaram a PERSEGUI-LO: "Todos os poços que os servos de seu pai haviam cavado - do tempo de seu pai Abraão, - os filisteus os haviam entulhado e coberto de terra" (Gn 26, 15).

Sobre os filisteus escreve o Pe. Alberto Colunga: "A prosperidade da fazenda de Isaac suscitou a inveja das tribos e povoações vizinhas. Também por anacronismo se chama a estas povoações filisteus (v. 14)... esta anomalia histórica se deve a que o redator posterior translada à época patriarcal a situação histórica de seu tempo, em que os 'filisteus' eram os tradicionais inimigos de Israel. Assim, os inimigos dos interesses dos patriarcas são chamados também 'filisteus'; porém, na realidade, no tempo de Isaac ainda não estavam estes em Canaã. Para fazer a vida impossível ao patriarca, decidiram secar os poços".

Católico, Isaac estava apenas cuidando do seu dever, não estava ocioso nem pegando o bem alheio; os fariseus, com INVEJA do seu progresso, ENTULHOU e COBRIU seus POÇOS.

Hoje não é diferente. Muitas pessoas levantam cedo para trabalhar, lutam honestamente para conseguir construir uma casa, comprar um carro, estudar os filhos, fazer um curso para conseguir um bom emprego... e não FALTAM os "fariseus modernos", isto é, os INVEJOSOS, que, não com as mãos, mas sim, com a "PÁ" da LÍNGUA, usam todos os meios para COBRIR os "POÇOS" desses  trabalhadores, para que esses NÃO sejam BEM SUCEDIDOS: "Da inveja nascem o ódio, a maledicência, a calúnia, a alegria causada pela desgraça do próximo e o desprazer causado por sua prosperidade" (São Gregório Magno, Mor. 31, 45, 88: CCL 143b, 1610 (PL 76, 621), e: "A maledicência é filha da inveja; e a inveja, o refúgio dos infecundos" (São Josemaría Escrivá, Sulco, n° 912).  

Católico, o INVEJOSO não consegue ficar CALADO diante do progresso do próximo; ele usa a "PÁ" da LÍNGUA para tentar "tapar o poço", isto é, ATRAPALHAR a vida do invejado, para que esse NÃO TENHA "água", isto é, MEIOS, para conseguir o desejado: "A maior fé do invejoso é acreditar que o mal dos outros vai acontecer!" (Pe. Orlando Gambi).

Os filisteus não suportavam ver o progresso de Isaac e por isso o perseguia, tapando os poços.

Católico, tome cuidado com os invejosos; esses, como porcos furiosos, fuçarão a sua vida para destruí-la: "Os porcos fuçam as coisas. O Invejoso fuça as vidas!" (Idem.).

Os fariseus andavam amargurados, exatamente porque eram invejosos: "A inveja é triste. O invejoso é infeliz... A pessoa invejosa anda triste, vive amargurada. O seu coração é como um buraco negro, que engole e anula todas as alegrias que lhe batem à porta, todas as luzes de felicidade possível que o convidam a sorrir" (Pe. Francisco Faus).

 

O Pe. Francisco Faus cita três frutos da inveja.

 

1. A maledicência

 

A experiência nos mostra que muitos daqueles que não conseguem subir e brilhar, se dedicam a demolir prestígios alheios, a rebaixar famas e méritos, para assim se sentiram situados mais alto. O infecundo, aquele que não se esforçou nem teve méritos para conquistar os bens a que aspirava, sente a necessidade de destruir com a língua e - se pode - com os atos aqueles que o superam.

Fala mal, lança suspeitas, semeia insinuações, espalha acusações falsas, despreza ou ridiculariza - com os seus comentários - o que merece louvor. O invejoso focaliza sempre o lado negativo, a pequena sombra escura que há mesmo nas honestidades mais íntegras e nos prestígios mais sólidos; e com isso tenta - e às vezes consegue - abalar a boa fama que outros possuem merecidamente, para assim, sobre a tinta negra das suas maledicências, brilhar ele mais intensamente.

Com palavras fortes, mas justas, o Pe. Bernardes, há quase quatro séculos, escrevia a respeito desses pobres invejosos: "Os miseráveis em cujo coração se embrenha a serpente da inveja..., o bem alheio têm por mal próprio, e não podem conter-se que não falem mal da pessoa invejada, vomitando contra ela detrações e calúnias".

 

2. A competição vaidosa

 

Ao lado da maledicência, podemos apontar como fruto da inveja a má competição ou competição vaidosa. Dizemos má e vaidosa, porque há uma competitividade boa - no trabalho, no esporte, no comércio, na indústria, na arte, etc. -, que é uma força positiva de aprimoramento e de progresso material, cultural e espiritual; essa boa competitividade, lealmente praticada, não é outra coisa senão aquela virtude a que chamávamos antes emulação,

Ninguém ignora, porém, que há uma competitividade ruim, e é provável que - uns mais, outros menos - já tenhamos tido que padecê-la. É, por exemplo, a competitividade vaidosa da mulher que sempre está a comparar-se com a mulher de Fulano, com a esposa de Sicrano; e, se não pode comprar o mesmo tipo de roupa, de sapatos, de perfume, de carro que a outra tem, fica desvairada, deixa louco o marido com gastos e exigências desorbitadas, ou resolve amontoar mais dinheiro seu, dedicando sem necessidade horas e horas a um trabalho voltado para a satisfação da "vaidade comparada", com grave abandono do lar.

A mesma coisa poderia dizer-se de muitos filhos, dominados pela frivolidade e pela vanglória, que tornam impossível a vida dos pais, exigindo - com lágrimas, com ira, com gemidos de vítima ou comentários humilhantes - que lhes comprem o que outros colegas consumistas têm e os pais deles não podem comprar.

E no ambiente profissional? Não vamos ser radicais e dizer, como afirmava um meu amigo, que os ambientes de trabalho - oficina, escritório, departamento de faculdade ou de colégio, redação de jornal, etc, etc. - são ringues da inveja, onde se desenrola uma contínua luta de boxe, ou melhor, de artes marciais com a regra do vale-tudo. Mas é verdade que não raro grassam nesses ambientes, como erva daninha, as maquinações da inveja: além da maledicência, os mexericos, os conchavos, as rasteiras, a ocultação de informações ou de decisões, a manipulação de dados, os "esquecimentos" propositados ("esqueceu-se" de convocar, de avisar uma reunião, de comunicar a chegada do presidente, etc.), para, desse modo, ir deixando à margem as pessoas que, por inveja, se desejaria apagar.

Uma expressão corrosiva dessa inveja entre colegas são as seguintes frases de Gore Vidal, citadas em artigo de Sérgio Augusto: "Toda vez que um amigo meu faz sucesso, eu morro um pouco", e "Não basta ser bem-sucedido; os outros também precisam fracassar".

Contemplando essas invejas, o psicólogo Moacyr Castellani fazia um lúcido diagnóstico, que transcrevemos, e que convida a meditar:

"Em vez de competir como forma de desenvolvimento, as pessoas se tornam rivais. Em vez de realizarem o melhor de si, desejam ser as melhores. Em vez de superarem seus limites, enfatizam suas próprias qualidades. Não buscam um resultado em comum, tornam-se demasiadamente egoístas. Num ciclo infinito rumo ao sucesso e ao reconhecimento, fecham-se para os próprios princípios, isolam-se em um ambiente frio e hostil [...]. O verdadeiro compromisso é com a construção de uma vida coerente com aquilo que somos. A competição é interna. O desafio está na superação dos próprios limites".

 

3. O ódio à bondade

 

Após contemplarmos dois frutos da inveja - a maledicência e a competição vaidosa e ambiciosa -, chegamos ao terceiro, o mais perverso de todos: o ódio à bondade.

Vão me desculpar se trago à tona o comentário sobre esse mau fruto, que fazia, com expressões um tanto chocantes, um jornalista velho, rude e curtido nas lides profissionais.

Dizia-me esse amigo: "O porco, para não se sentir humilhado, precisa de transformar o mundo num chiqueiro, porque, se 'provar' que todos são porcos..., então ser porco é o normal".

Com essas frases cruas, referia-se a um fenômeno atual e crescente: à campanha, atiçada, sobretudo, pela mídia - jornais, revistas, televisão, cinema, internet -, de exaltação de atitudes e comportamentos objetivamente imorais, depravados, perversos, que se teima em apresentar como normais, modernos, positivos e desejáveis: desde o marketing pornográfico e o lenocínio eletrônico, até a iniciação sexual prematuríssima de crianças e adolescentes em programas e consultórios da TV; e aborto por atacado, e infidelidade conjugal - basta passar ocasionalmente os olhos e os ouvidos por qualquer telenovela -, e "casamento" de homossexuais...; enfim, uma libertinagem sem nenhum freio de valores, já não apenas religiosos ou morais, mas de respeito mínimo à dignidade do ser humano.

E, paralelamente a essa campanha de exaltação insensata do perverso, do anormal e do podre, fazia notar o meu bom amigo que avançam os vagalhões de uma outra campanha, empenhada em conspurcar, seja como for, figuras íntegras do passado e do presente, que gozam de justa fama de honestos, de bons e até de santos.

Procurando derrubar esses referenciais de bondade, procurando provar que a pureza e a santidade não existem na vida real, os devassos, os malignos e os infames sentem-se melhor. Eles trazem espetado na alma o espinho da inveja, em forma de tristeza raivosa do bem alheio, da bondade dos outros, porque esta os acusa, os repreende silenciosamente. Para livrar-se desse mal-estar, decretam então que a bondade moral e a santidade não existem, e que se alguns parecem íntegros e santos, na realidade são uns hipócritas, e cá estão eles - os caluniadores - para prová-lo.

Um atrás do outro, vêm aparecendo livros, artigos, programas televisivos, entrevistas, ensaios "históricos", etc., cujo único objetivo é denegrir, "provando" mediante a manipulação de dados e de testemunhas - ou com a calúnia pura e simples - que quem parecia bom não o é, quem parecia puro é o mais sujo, e quem parecia santo é um falso.

 

Católico, não deixe de TRABALHAR e de PROGREDIR por causa dos ATAQUES dos INVEJOSOS; pelo contrário, TRABALHE com mais AFINCO: "A verdade é que todos eles queriam nos amedrontar, pensando: 'Suas mãos se cansarão do trabalho e jamais será terminado'. No entanto, dava-se o contrário: eu fortalecia minhas mãos!" (Ne 6, 9).

Isaac NÃO se ESMORECEU diante dos filisteus. Ele Mudou de lugar por várias vezes, e com paciência e toda garra, PERSEVEROU "FURIOSAMENTE" no seu trabalho: "Isaac partiu, pois, de lá e acampou no vale de Gerara, onde se estabeleceu. Isaac cavou de novo os poços que tinham cavado os servos de seu pai Abraão e que os filisteus tinham entulhado depois da morte de Abraão, e lhes deu os mesmos nomes que seu pai lhes dera. Os servos de Isaac cavaram no vale e encontraram lá um poço de águas vivas. Mas os pastores de Gerara entraram em disputa com os pastores de Isaac, dizendo: 'A água é nossa!' Isaac chamou a este poço de Esec, pois querelaram por causa dele. Cavaram outro poço e houve ainda uma disputa a seu respeito; ele o chamou de Sitna. Então partiu de lá e cavou outro poço; e como por esse não disputaram, chamou-o de Reobot e disse: 'Agora Deus nos deu o campo livre para que prosperemos na terra" (Gn 26,  17-22).

Católico, persevere com paciência, lute com firmeza, caminhe com passos rápidos... conte com a ajuda de Deus e reze pela conversão dos invejosos; mas, jamais FOGUE FORA o seu ideal: "Aquele que luta tem o que esperar. Onde há luta, há coroa" (Santo Ambrósio, Os Sacramentos, I, 2).

Depois de ter FURADO vários poços em outros lugares, Deus recompensou Isaac: "Agora Deus nos deu o campo livre para que prosperemos na terra" (Gn 26, 22). Ele colocou mãos à obra e não desanimou.

Católico, às vezes você sofre todo tipo de calúnias, xingos, desprezos, zombarias e até agressões; NÃO DESISTA da batalha e  Deus lhe dará a verdadeira paz nessa e na outra vida: "Bem-aventurado o homem que suporta com paciência a provação! Porque, uma vez provado, receberá a coroa da vida, que o Senhor prometeu aos que o amam" (Tg 1, 12).

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 10 de agosto de 2008

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Ficaram invejosos"

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