FUGI DO MEIO DA BABILÔNIA

(Jr 51, 6)

 

"Fugi do meio da Babilônia e salve cada um a sua vida".

 

Um jovem elegantíssimo entrou numa igreja para, a meio joelho, receber a bênção.

Começava então uma Missa: ele parou de olhar as belas pinturas, para se aproximar do altar onde começava o Sacrifício divino. O sacerdote celebrava a Missa de uma maneira bela, alta e clara; a sua voz, sem ser declamatória, encerrava uma misteriosa palpitação que repousava o coração e o inclinava a meditar.

O jovem, em pé, escutava. Estava no Evangelho, que, aquela vez, era de São Mateus, capítulo VI.

O sacerdote persignou com a cruz o missal e depois a si, e leu: "Ninguém pode servir a dois senhores. Ou tem de amar o primeiro e odiar o segundo, ou seguir o segundo e abandonar o primeiro. É impossível servir a Deus e ao mundo juntamente".

A estas palavras, teríeis visto aquele coração pulsar forte e mudar-se todo, como sucede a uma planta com a haste meio arrancada e deixada em terra, à qual em breve murcham os frutos e se descoram as folhas, e morre nela a primavera verde que ela antes ostentava.

Assim sucedeu com aquele jovem, que se arrancou da servidão do mundo, seu senhor até então; recusou toda vaidade de aparecer; renunciou a paixão dos bens e dos amores.

Saiu da igreja e tomou o caminho do deserto. E quando estava longe do mundo, cheio de pecados, assaltando-o o temor de uma vida de privações, pois não tinha nem casa, nem pão, nem veste, nem alma viva em torno, lembrou-se das outras palavras do mesmo Evangelho: "Não vos aflijais pelo pão e pela veste. Olhai as aves do céu! Considerai os lírios do campo! Vós não sois mais do que os lírios, mais do que as aves? Empenhai-vos na salvação da sua alma, e tudo o mais vos virá por si. Deus, que é pai, sabe bem aquilo de que precisais" (Mt 6, 28-32).

Confortou-se o jovem a este pensamento, e ficou no deserto para se fazer santo: Santo Antão do deserto, vencedor do mundo.

A dois senhores ninguém pode servir: ou Deus ou as riquezas, ou Cristo ou o mundo: "Ninguém pode servir a dois senhores: com efeito, ou odiará um e amará o outro, ou se apegará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao Dinheiro" (Lc 16, 13).

Não se pode continuar nesta alternativa de confissão e de pecados, frequentar com a mesma indiferença a igreja e os divertimentos escandalosos; visitar os mortos no cemitério e perder a Missa nos dias de festa; erguer um altarzinho a Nossa Senhora e comer carne nos dias proibidos; fazer novenas e seguir uma moda imoral.

Ou Cristo ou o mundo.

Certamente, nem todos podem fugir para um deserto; não é necessário. O próprio Jesus disse: "Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno"(Jo 17, 15).

Portanto, fugir do mundo quer dizer fugir do mal que há no mundo.

 

Católico, FUJA do MUNDO e de suas ARMADILHAS.

Se você quer salvar a sua alma imortal FUJA dessa BABILÔNIA, isto é, do MUNDO inimigo de Deus e da Santidade.

O que você pode encontrar de bom nas bebedeiras, barulhos, noitadas, imoralidades, vaidades oferecidos pelo MUNDO? Nada! Somente angústia e vazio.

Lembre-se de que os amantes do mundo tornam-se inimigos de Deus e não possuem o Seu amor: "Adúlteros, não sabeis que a amizade com o mundo é inimizade com Deus? Assim, todo aquele que quer ser amigo do mundo torna-se inimigo de Deus" (Tg 4, 4), e: "Não ameis o mundo nem o que há no mundo. Se alguém ama o mundo, não está nele o amor do Pai" (1 Jo 2, 15).

O mundo é terrível inimigo, por isso, é preciso FUGIR dele: "As alegrias do mundo tendem para a eterna tristeza" (Santo Ambrósio), e: "O mundo apresenta duplo exército contra os soldados de Cristo. Afaga para seduzir, apavora para quebrar"  (Santo Agostinho).

          

1. Necessária é a fuga do mundo.

 

É neste sentido que mostrarei como é necessária a fuga do mundo; necessária mesmo se custa penitência.

Por um entardecer, chegaram a Sodoma dois anjos. Ló, que estava sentado à porta da cidade, quando os viu pulou ao encontro deles e adorou-os, prostrado em terra. Por aquela noite os anjos pararam na sua casa.

Mas, quando alvoreceu, eles sacudiram Ló e lhe disseram: "Levanta-te, com tua mulher, com tuas duas filhas, e foge, se não queres perecer na ruína da cidade. Nós destruiremos este lugar; porque o clamor dos seus pecados subiu até Deus" (Gn 19, 15).

Ló demorava-se, mas os anjos o tomaram pela mão, dizendo: "Salva a tua vida e foge sem te voltares para trás" (Idem. 19, 17).

Apenas o sol se levantou sobre a terra e Ló já estava ao abrigo em Segor, Deus enviou do céu enxofre e fogo. Sodoma e Gomorra e toda a região em volta, até o verde da campina, desapareceu numa miseranda ruína.

A nós também, como um dia a Ló, o Senhor envia, senão dois anjos, ao menos a palavra do Evangelho, e clama-nos: "Salva a tua alma e foge do mundo sem olhares para trás com saudades dele!"

E verdadeiramente, o mundo é outra pentápole, cujos pecados levantam um clamor de vingança até Deus. Nunca, como talvez nos nossos dias, se haja transgredido o preceito festivo de participar da Santa Missa e de deixar os trabalhos servis; nunca como talvez agora, os pais tenham descurado a educação cristã de seus filhos, não se preocupado de os vestir modestamente, de fazê-los rezar, de mandá-los à igreja e de edificá-los com o bom exemplo. Nunca, como nestes anos, tem-se alastrado a corrupção, mesmo fora das grandes cidades, difundindo por toda parte livros e folhetos infames, modas impudicas e espetáculos obscenos.

Se não quisermos perecer no fogo que devorará o mundo no dia do seu castigo, fujamos: "Salva a tua alma e foge do mundo sem olhares para trás com saudades dele!"

Católico, se você quiser salvar a sua alma imortal, FUJA do MUNDO inimigo de Deus e das almas imortais; FUJA dessa BABILÔNIA: "Fugi do meio da Babilônia e salve cada um a sua vida".

Lembre-se de que o mundo passará: "Os mundanos só consideram feliz a quem goza dos bens deste mundo: honras, prazeres e riquezas. Mas a morte acaba com toda esta ventura terrestre. 'Que é vossa vida? É um vapor que aparece por um momento' (Tg 4,14). Os vapores que a terra exala, quando sobem ao ar, pelo efeito dos raios solares, oferecem, às vezes, aspecto vistoso: mas quanto tempo dura essa aparência brilhante? Ao sopro do menor vento, tudo desaparece. Aquele poderoso do mundo, hoje tão acatado, tão temido e quase adorado, amanhã, quando estiver morto, será desprezado, olvidado e amaldiçoado. A morte obriga a deixar tudo" (Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a morte, Consideração II, Ponto I).

 

Na fuga do mundo, confortar-nos-á os seguintes pensamentos:

1) O amor de Deus e o amor do mundo não podem coabitar num mesmo coração; não se pode com um olho olhar o azul do céu e, com o outro, olhar o lodo da terra. Ou o dever glorioso ou o prazer vergonhoso! Ou Cristo ou Satanás! São Paulo, São João, os Apóstolos e os seus sucessores sempre pregaram contra o mundo, contra os seus teatros, as suas danças, as suas festas; com grande firmeza repeliam todo neófito que não quisesse renunciar aos prazeres do mundo. Quanta fé, quanta força nós admiramos naqueles primeiros cristãos que rompiam absolutamente toda relação com os idólatras, desafiavam o ódio dos tiranos e a sanha dos algozes! Ó séculos dos mártires, quanto estais longe de nós!

2) Não basta fugir do mundo, mas cada um deve esforçar-se por colocar no amor de Deus e das coisas pudicas e santas aquela ânsia que antes tinha pelas coisas mundanas e pecaminosas: "Saneai o vosso coração, e aquele ímpeto que antes vos impelia para o mundo, transporte-vos agora para o Criador do mundo" (Santo Agostinho, In Ps., XXXIV).

3) Não nos esqueçamos de que somos estrangeiros e peregrinos na terra: "Aviso-vos, ó irmãos, o tempo é breve: aqueles, pois, que são casados vivam mortificando-se como se o não fossem; os que choram, como se não chorassem; os que gozam, como se não gozassem; os que compram coisas, como se não possuíssem; os que se servem do mundo, como se não servissem: tudo passa e se desvanece como uma sombra" (1 Cor 7, 29-31).

 

2. Necessária é a fuga do mundo, mesmo se custa.

 

Juliano, o Apóstata, o imperador que voltou aos ídolos depois de reconhecer o verdadeiro Deus, aquele homem que acreditara sufocar no berço a nascente Igreja de Cristo, promulgara um odioso edito. Qualquer cristão que ocupasse um posto militar ou civil deveria logo renunciar ou à dignidade ou ao batismo.

Muitos foram os que antepuseram o ser simples soldados de Cristo a qualquer cargo de guerra ou de paz. Mas também houve alguns que renunciaram a Cristo por mamona.

O jovem Marino, cujo talento e audácia o tinham elevado a altos ofícios no império, e maiores ainda lhe deixavam esperar, estava fortemente perplexo.  Devia então renunciar à sua carreira esplêndida e invejada, e voltar a ser plebeu?

E especulava sobre a maneira de unir a espada ao Crucifixo, de conciliar Juliano com Cristo. Nesse ondular de pensamentos, Deus guiou-o à igreja, onde se achava o bispo Teotônio.

Viu-o o bispo, e, ao seu primeiro entrar, adivinhou a luta daquela alma agitada entre dois senhores.

Tomou-lhe as mãos nas suas mãos santas, e conduziu-o, passo a passo, até ao altar. Depois olhou-o nos olhos e lhe disse: "Meu senhor, aqui não há necessidade de consultar: o mundo e Cristo não podem estar juntos. Escolhei: a qual dos dois quereis servir?"

Ante as palavras do bispo, resolutas e precisas, Marino cessou de hesitar. Beijou os degraus do altar e disse: "Vá-se tudo: só Cristo é meu Senhor, e só a Ele servirei".

E perdeu a dignidade, encerrou a sua honrosa carreira, e confundiu-se entre a multidão dos pobres, mas a sua alma foi salva.

Não apenas Marino, porém muitas vezes também nós somos postos numa dolorosa alternativa: ou fazer como Cristo diz ou como o mundo diz. Agradar-nos-ia, mesmo, obedecer a Cristo; mas é preciso expor-se ao escárnio dos maus, a crítica dos indiferentes; é preciso desprender-se de certos hábitos maus; renunciar a certos ganhos ilícitos; confessar-se e comungar frequentemente.

Mesmo o negociante mais interessado, se é surpreendido pela procela em alto mar, prefere lançar as suas preciosas mercadorias à mercê da água, contanto que seja salva a sua vida.

Mesmo o homem mais sensual, quando é acometido por uma moléstia grave, não hesita em gastar grossas somas, em sujeitar-se a um regime desagradável, em sofrer até mesmo dolorosas operações, contanto que seja salva a sua vida.

Isso que o negociante e o mundo fazem pela vida do corpo, não sabemos fazê-lo pela vida da alma?

Que é que nos escandaliza?

Aqueles pensamentos? Serão enxotados com as jaculatórias. - Aquela pessoa? Fugiremos dela. - Aquele lugar? Não iremos mais a ele. - Aquele livro? Queima-lo-emos. - O amor do dinheiro? Faremos esmolas.

"É doloroso perder estas coisas!"

- Infinitamente mais doloroso é perder a alma para sempre.

 

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 03 de dezembro de 2008

 

 

Bibliografia

                   

Bíblia Sagrada

Pe. João Colombo, Pensamentos sobre os Evangelhos e sobre as Festas do Senhor e dos Santos

Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a morte

Santo Ambrósio, Do Tratado sobre a Epístola aos Filipenses - (PLS. 1: 617-618)

Santo Agostinho, (Sermo 276, 1-2: PL 38, 1256)

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Fugi do meio da Babilônia"

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