MÁ TRISTEZA (Eclo 30, 23)
“... a tristeza matou a muitos e nela não há utilidade alguma”.
O Espírito Santo assegura que a tristeza enerva o homem, arruína-lhe a saúde, envelhece-o antes do tempo e abrevia os seus dias (Eclo 30, 23-24; Pr 17, 22). Os estragos, porém, que causa à alma são ainda muito mais sérios. Cassiano escreve: “A tristeza engendra a cólera e a exacerbação contra o próximo; torna-os desconfiados, impacientes, intratáveis, e causa-nos muitas tentações e quedas; pois que o demônio gosta de nos tentar quando nos vê tristes e abatidos”, e: “O que mais Deus odeia depois do pecado é a tristeza, porque nos predispõe ao pecado” (Santo Agostinho), e também: “Como a doença se dá no corpo, assim a tristeza se dá no espírito” (Sêneca), e ainda: “Assim como a traça come a roupa, e o cupim rói a madeira, assim a tristeza faz mal ao coração” (São Bernardo de Claraval), e: “A má tristeza perturba a alma, inquieta-a, inspira temores desregrados, tira o gosto da oração, traz ao espírito uma sonolência de morte, impede-a de tirar proveito dos bons conselhos, de tomar resoluções e ter o ânimo e a força de fazer qualquer coisa. Numa palavra, ela produz nas almas as mesmas impressões que o frio excessivo nos corpos, que se tornam hirtos e incapazes de se mover” (São Francisco de Sales). Do outro lado, perdemos o gosto da oração e da leitura, mais preciosos para nos sustentar nas lutas. E quantas faltas cometemos então: impaciência, descontentamento, suspeita, palavras desairosas ou contrárias à caridade. Daí inquietações e remorsos que aumentam o nosso mal e nos lançam numa espécie de desespero. Bem verdade é o que diz o Espírito Santo, quando afirma que a tristeza leva ao coração todos os males. Por que às vezes nos entristecemos? Será que a nossa tristeza não procede da falta de coragem e resignação? Ora é o amor próprio ofendido por uma palavra, um gesto, um pouco caso; ora é a vaidade humilhada por um esquecimento, uma falta de atenção... ou então são as tentações, a falta de mortificação que nos leva ao descontentamento, entristece o nosso temperamento e nos reduz a um silêncio sombrio... São Francisco de Sales escreve: “O inimigo serve-se da tristeza para tentar os bons até em suas boas obras, como se esforça também por levar os maus a se alegrarem de suas más ações; e, como ele não pode nos seduzir ao mal senão fazendo-o parecer agradável, assim também não nos pode apartar do bem senão fazendo-o parecer incômodo. Pode dizer-se que, sendo ele mesmo acabrunhado duma tristeza desesperadora por toda a eternidade, quer que todos os homens sejam tristes como ele”. Para prevenirmos contra a tristeza, tomemos essas resoluções: 1.° De sofrer em paz o que nos contraria; 2.° De não nos ocupar demais da nossa tristeza voluntária; mas, distraindo-nos, oferecer-nos a Deus para suportar penas maiores, se for da sua vontade. Esses atos generosos, repetidos frequentemente, dissiparão aos poucos os nossos dissabores. O nosso Deus é o Deus da Verdadeira Alegria; não se pode trabalhar para a Sua glória com a tristeza aninhada no coração: “Eu irei ao altar de Deus, ao Deus que me alegra” (Sl 43, 4).
São Francisco de Assis quando abandonou a mundo e todos os bens que possuía por amor de Deus, embora se encontrasse quase desnudo, dizia cheio de alegria: “Meu Deus e meu tudo”, como se dissesse: Tenho Deus, tenho tudo! Mais tarde, notando que um dos seus frades andava tristonho, disse-lhe: “Que é que tens irmão, que estás triste? Cometeste algum pecado? Não sabes que só a culpa nos deve entristecer? Vai rezar: só aos pés de Jesus se deve gemer e pedir perdão; diante de mim e dos outros confrades não se deve fazer isso”. São Francisco Borja também depois de retirar-se da corte e dar-se inteiramente a Deus, sentia consolação e felicidade, que passava noites inteiras sem poder dormir. São Filipe Néri que também não conseguia conciliar o sono em vista do grande prazer que sentia no serviço de Nosso Senhor, dizia: “Por favor, meu Jesus, deixai-me dormir!” Santa Teresa de Jesus dizia: “Vale mais uma só gota dessa paz, que só Deus pode dar, do que todos os prazeres, riquezas e glórias do mundo”. Os santos foram os “cantores” da mais pura alegria; eles não permitiam que a tristeza aninhasse em seus corações: “Uma comunidade em que todos se propusessem viver desta forma, seria um paraíso antecipado. Fraquezas haverá sempre; mas estamos aqui para nos suportar e santificar. Não devemos sucumbir à tristeza; antes, depositemos tudo nas mãos de Deus para nossa mútua edificação e também para edificação dos outros. Afastemos a má tristeza e conservemos a boa. Um indivíduo tristonho, na comunidade, não realiza mais nada” (Bem-aventurado José Allamano).
Existem remédios para combater a má tristeza. Nada debela melhor essa doença do que as reflexões e santos afetos hauridos de uma oração fervorosa: “A oração é um remédio salutar contra a tristeza porque eleva o nosso espírito a Deus que é a nossa alegria e consolação. Emprega em tuas orações essas palavras e afetos que inspiram maior confiança em Deus e em seu amor: Ó Deus de misericórdia! Ó Deus infinitamente bom! Meu benigníssimo Salvador! Ó Deus de meu coração, minha alegria e minha esperança! Ó caro Esposo de minha alma! Ó Dileto de meu coração!” (São Francisco de Sales), e: “Alguém de vós está triste? Reze” (Tg 5, 13). Cassiano escreve: “Como Davi, tocando a harpa, afugentava o Demônio que atormentava Saul, assim o coração põe em fuga o Demônio da tristeza, elevando os pensamentos, dissipando as nuvens do espírito, dilatando e alegrando o coração”; e o Bem-aventurado Henrique Suso, sob o peso de horrível melancolia, ouviu uma voz que lhe dizia: “Levanta-te e medita a paixão de Jesus!” Ele o fez e ficou logo consolado. No diálogo respeitoso com Deus, fonte de todas as delícias, encontraremos a verdadeira alegria: “Alegrá-los-ei no exercício da oração” (Is 56, 7). Não é, pois, junto das criaturas, mas ao pé do crucifixo ou diante dos altares e dos tabernáculos que encontraremos o remédio para nossas aflições. Lá aprenderemos a considerar os acontecimentos como dirigidos pela sabedoria e bondade de Deus: “Se alguém está triste, faça uma visita a Jesus Sacramentado e ficará contente” (Bem-aventurado José Allamano). Santo Tomás de Aquino ensina que “o verdadeiro remédio para curar a tristeza é a paciência”. Se estivermos convencidos de que Deus quer unicamente o nosso bem; por que, pois, entristecer-nos e queixar-nos quando Ele nos proporciona esse bem por meio da provação? O enfermo queixa-se do médico e do remédio que lhe restituem a saúde? E nós, fracos na fé, por que ficamos abatidos quando o Senhor, para santificar-nos, permite que o nosso orgulho seja humilhado... o nosso modo de pensar, contrariado... a nossa vontade, contrariada... a nossa paciência, colocada a prova? Que procuramos na oração senão a força para morrermos a nós mesmos, aos nossos vícios, às nossas inclinações... para praticarmos as virtudes? Deve ser para nós motivo de alegria e não de tristeza encontrar ocasiões de sofrimentos, a fim de crescermos em santidade e em méritos. Devemos fazer nossa a máxima de São Francisco de Sales que dizia: “Jamais vãs tristezas e inquietações; fazer bem e fazê-lo com alegria, eis um duplo bem; entristecer-se com os defeitos próprios é acrescentar defeito a defeito”.
Pe. Divino Antônio Lopes FP. Anápolis, 05 de outubro de 2009
Bibliografia
Sagrada Escritura Cassiano, Institutiones, lib. IX, cap. XI Pe. Luis Bronchain, Meditações para todos os dias do ano São Francisco de Sales, Filotéia, Parte IV, cap. 12 Bem-aventurado José Allamano. A Vida Espiritual Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica
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