O MAIS BELO (Sl 44, 3)
“És o mais belo dos filhos dos homens”.
I PONTO
JESUS CRISTO... FEIO?
Hoje, infelizmente, muitos atacam a Jesus Cristo também na sua fisionomia. Em São Lucas 1, 34-35 diz: “Maria, porém, disse ao Anjo: ‘Como é que vai ser isso, se eu não conheço homem algum?’ O anjo lhe respondeu: O ESPÍRITO SANTO virá sobre ti e o poder do Altíssimo vai te cobrir com a sua sombra; por isso o Santo que nascer será chamado Filho de Deus”. Deus Pai é o Criador, Deus Filho é o Redentor, Deus Espírito Santo é o Santificador. E, não obstante, o que UM faz, TODOS o fazem; onde UM está, estão os TRÊS. O Pai, o Filho e o Espírito Santo são igualmente eternos, porque possuem a mesma natureza divina... Deus Filho e Deus Espírito Santo não estão subordinados ao Pai de modo algum; nenhuma das Pessoas é mais poderosa, mais sábia e maior que as demais. As três têm igual perfeição infinita, igualmente baseada na única natureza divina que as três possuem. Sendo o Espírito Santo o amor infinito, apropriamos-lhe as obras de amor, especialmente a santificação das almas, que resulta da habitação do Amor de Deus em nossa alma. E foi o ESPÍRITO SANTO, DEUS, PERFEIÇÃO INFINITA, terceira Pessoa da Santíssima Trindade que ENGENDROU no SEIO de Maria Santíssima o CORPO e a ALMA de uma criança, a quem DEUS FILHO se uniu no mesmo instante. Será que o Espírito Santo, Deus Perfeito e Eterno, iria ENGENDRAR uma CRIANÇA FEIA no SEIO da Virgem Maria? Não dá para imaginar um DEUS, CRIADOR... BELEZA INFINITA, FEIO! Santo Agostinho escreve: “É belo enquanto Deus, o Verbo junto de Deus; belo no seio virginal, onde não perdeu a divindade, mas assumiu a humanidade; belo o Verbo, ao nascer como criança; pois, mesmo enquanto criança, ao sugar o leite materno, ao ser carregado nos braços, os céus se manifestaram, os anjos cantaram louvores, a estrela guiou os magos, e foi adorado no presépio, qual alimento dos mansos (cf. Lc 2, 8-14; Mt 2, 1). É, portanto, belo no céu, belo na terra; belo no seio, belo nos braços dos pais; belo nos milagres, belo entre os flagelos; belo quando convida à vida, belo quando não teme a morte; belo ao entregar-se a alma, belo ao retomá-la; belo no madeiro da cruz, belo no sepulcro, belo no céu”. Clemente de Alexandria escreve: “Para nós que desejamos a verdadeira beleza, só o Salvador é belo”. Se a BELEZA da Mãe de Jesus Cristo, a Virgem Maria, deixou São Dionísio Areopagita EXTASIADO, ENCANTADO e maravilhosamente ASSOMBRADO; por que o seu FILHO tem que ser FEIO? São Dionísio Areopagita conta que, tendo ouvido falar de Maria Santíssima, fez uma viagem longa para vê-la. Apenas admitido à sua presença, ficou tão assombrado pelo brilho sobre-humano, tão transbordado de consolação celeste, que lhe parecia já ter entrado na posse da glória. Tão cheio de gozo inefável ficou o Santo depois de visão tão encantadora, que depois, agradecendo a seu mestre São Paulo, escreveu: “Confesso na verdade, que não pensava que fora de Deus fosse possível beleza tão sublime e celestial, como a que contemplei. Eu vi Maria Santíssima! Pude ver e rever com meus próprios olhos a Mãe de Jesus Cristo! Confesso mais uma vez que, quando João me levou à presença deífica da Virgem altíssima, fiquei deslumbrado por um esplendor tão grande, que me desfaleceu o coração e faltou a respiração, oprimido como estava pela glória de tamanha majestade. Afigurou-me que a glória dos Bem-aventurados não podia ser superior àquela que tive a grande ventura de contemplar”.
II PONTO
HOMENS BELOS NA BÍBLIA
1. José (do Egito): “Então entregou nas mãos de José tudo o que tinha e, com ele, não se preocupou com mais nada, a não ser com a comida que tomava. José era BELO de PORTE e tinha um ROSTO BONITO” (Gn 39, 6). 2. Saul: “Tinha ele um filho chamado Saul, um BELO jovem. Nenhum outro havia entre os filhos de Israel mais BELO do que ele” (1 Sm 9, 2). 3. Absalão: “Em todo o Israel, não havia ninguém que fosse tão BELO como Absalão, ao qual se podiam fazer muitos elogios: da planta dos pés ao alto da cabeça ele era sem defeito” (2 Sm 14, 25). 4. Davi: “Jessé mandou chamá-lo: era ruivo, de BELO SEMBLANTE e ADMIRÁVEL PRESENÇA” (1 Sm 16, 12). 5. Adonias: “Ele era também extraordinariamente BELO...” (1 Rs 1, 6). 6. Moisés: “Vendo que era BONITO...” (Ex 2, 2). 7. Daniel, Ananias, Misael e Azarias: “... nos quais não devia haver DEFEITO algum: deviam ter BOA APARÊNCIA” (Dn 1, 4). Por que muitos dizem que Jesus Cristo é FEIO? Por que o CRIADOR tem que ser FEIO, e a CRIATURA BONITA? “O mundo foi criado igualmente por todas as três Pessoas divinas, porque aquilo que uma Pessoa faz relativamente às criaturas, fazem-no com um só e o mesmo ato também as outras” (São Pio X).
III PONTO
CELSO DIZIA QUE JESUS CRISTO É FEIO E DEFORMADO
Celso (do século II), filósofo platônico, criticava terrivelmente a Jesus Cristo e os católicos. Escreveu uma obra intitulada ’alethès lógos: “A Verdadeira Palavra”, ou “O Verdadeiro Discurso”, contra os católicos. Orígenes (185 – 254) travou uma terrível batalha contra ele (Contra Celso). Esse filósofo apresentara Jesus Cristo como impostor vulgar e atribuía os aspectos extraordinários de sua vida a uma invenção poética de seus primeiros discípulos, assim como a rápida propagação do cristianismo à impressão que produziram os quadros aterradores do juízo final e do fogo do inferno na plebe. Celso fez de Jesus um homem feio ou até deformado, baseia-se unicamente na exegese de uma passagem de Isaías 53, 2: “... não tinha beleza nem esplendor que pudesse atrair o nosso olhar, nem formosura capaz de nos deleitar”. Grande ignorância! O Profeta Isaías, com efeito, anuncia que o Servo de Javé não teria “nem beleza nem esplendor”. Aplicava-se simplesmente à sua fisionomia normal o que o Profeta dizia do homem das dores arrastado pelas ruas de Jerusalém (na sua sangrenta e dolorosa Paixão). O que contribuiu não pouco para espalhar essa opinião foi, sem dúvida, a doutrina platônica que via no corpo uma coisa indigna do homem, o cárcere da alma. Se um corpo bem constituído era obra do demônio tentador, não se podia atribuir ao Salvador dos homens senão um exterior pouco atraente.
IV PONTO
TRAÇOS FISIONÔMICOS DE JESUS CRISTO
Como seria a sua aparência exterior? O modo de vestir certamente não o distinguia dos judeus e rabinos do seu tempo, pois fez-se semelhante aos homens e foi reconhecido exteriormente como homem. As suas roupas não chamavam a atenção, fazendo-o parecer um rijo (severo) asceta como o Precursor, João Batista, que andava vestido de pelo de camelo e trazia à cintura uma tira de couro. Como os seus conterrâneos, Jesus normalmente vestia uma túnica de lã, um cinco que servia também de bolsa de dinheiro, um manto e sandálias. O relato da sua Paixão informa-nos também que a túnica era inconsútil, tecida toda de uma só peça. De conformidade com as indicações da Lei, o manto estava adornado com quatro borlas feitas com um cordel espiralado de lã púrpura. Segundo os costumes do seu tempo, Jesus também cingiria a testa e os braços com tiras de pergaminho para a oração da manhã, pois não critica nos fariseus este costume em si mesmo, e sim a vaidade que põem em alargar as suas tiras de pergaminho e alongar as suas franjas. Um sudário branco, que cobria a cabeça e o pescoço, devia protegê-lo do sol nas suas longas caminhadas: Pedro havia de encontrá-lo depois, dobrado, no sepulcro. Ao mesmo tempo, Jesus desprezava toda a preocupação excessiva com a maneira de vestir. Evitava tudo o que fosse chocante ou estranho, até no aspecto corporal. Certamente usava barba comprida, como era usual entre os judeus, e o cabelo era cuidado e cortado atrás, ao contrário dos nazarenos, que o usavam comprido e desgrenhado. São Paulo atesta, aliás, que se considerava uma desonra o varão deixar crescer a cabeleira. Também não lhe eram estranhos – e os Evangelhos o testemunham expressamente – os cuidados normais com o corpo. Apesar de criticar o exagero nas lavagens rituais em uso entre o seu povo, o cuidado que põem os fariseus em limpar por fora a taça e o prato, que por dentro estão cheios de rapina e imundície, recomenda a higiene e um sadio cuidado com o corpo. Chega a indicar especialmente, até mesmo para os períodos de jejum e penitência, as lavagens e as unções: “Mas tu, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto. Antes da Ceia pascal, é Ele próprio quem lava os pés dos discípulos, e no banquete na casa do fariseu Simão, repreende-o com brandura por não lhe ter dado água para os pés nem ungido a sua cabeça com óleo. Também defende a pecadora que se aproximou d’Ele com um frasco de alabastro cheio de precioso unguento e lho derramou sobre a cabeça enquanto Ele estava recostado à mesa, diante dos discípulos que murmuram pusilanimemente. Seus preceitos sobre a conduta nos banquetes demonstram ainda que Jesus era delicado no trato e revelava fina educação. Seu aspecto físico devia ser extremamente agradável e atraente, mesmo fascinante. Infelizmente, não dispomos de nenhuma descrição explícita, como já constatava Santo Irineu no final do século II. No entanto, São Lucas, ao afirmar que Jesus crescia em graça diante de Deus e diante dos homens, parece indicar que aumentava não só a sua beleza espiritual, mas também a física. Talvez possa interpretar-se neste mesmo sentido aquela mensagem um pouco misteriosa a respeito da expressividade do olhar humano: A luz do teu corpo é o olho. Se, pois, o teu olho estiver são, todo o teu corpo estará iluminado. Sem dúvida, falava assim por experiência própria. A sua aparência humana devia irradiar, portanto, alguma coisa de brilhante ou luminoso, que atraía as pessoas, especialmente mulheres e crianças. Quando aquela mulher do povo prorrompe repentinamente em louvores – Bem-aventurado o ventre que te trouxe e os seios que te amamentaram – , a resposta de Jesus dá a entender que ela se referia não só ao espírito e à alma, mas principalmente ao seu aspecto físico; com efeito, Jesus corrige-a chamando-lhe a atenção para as realidades espirituais: Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática. Os depoimentos evangélicos conduzem-nos a uma opinião inteiramente oposta. A extraordinária impressão causada por Jesus sempre que se mostrava à multidão, e especialmente aos enfermos e aos pecadores e pecadoras, era devida incontestavelmente à força espiritual e religiosa que se desprendia da sua pessoa; mas certamente devia-se também, em parte, ao encanto do seu exterior fascinante, que atraía e prendia as massas. Seu olhar, sobretudo, devia impressioná-los, esse olhar que bastava para inflamar, sacudir e censurar. Não é destituído de interesse notar que São Marcos, quando relata qualquer palavra importante do Mestre, emprega esta expressão: E Ele olhou-os e disse... Nesses momentos, Jesus teria sem dúvida um olhar de expressão soberana e dominadora.
V PONTO
VIGOR FÍSICO DE JESUS CRISTO
À impressão produzida pelo encanto exterior da sua pessoa, somava-se a do seu vigor físico, de equilíbrio perfeito e fácil, de notável domínio sobre si mesmo. Segundo o testemunho concordante dos Evangelhos, Jesus deve ter sido um homem extremamente apto para o trabalho, resistente à fadiga e verdadeiramente saudável. É já um traço que o diferencia de outros fundadores célebres de religiões. Quando desfraldou o estandarte de profeta, Maomé era um doente, de hereditariedade carregada e sistema nervoso abalado. Buda estava aniquilado, com o corpo esgotado, quando deixou o mundo. Quanto a Jesus, em parte alguma encontramos a menor alusão a qualquer doença ou moléstia. Os únicos padecimentos que sofreu foram as privações e sacrifícios impostos pela sua vocação de Messias. Seu corpo parece singularmente resistente à fadiga. Uma prova é o seu hábito de iniciar o dia bem cedo: E pela manhã, muito cedo, levantou-se e foi a um lugar deserto para orar... Ao romper da aurora, chamou os seus discípulos e escolheu doze entre eles. A mesma impressão de saúde, frescor e vigor ressalta da alegria irradiante que Jesus encontra na natureza. Ama especialmente as colinas e o lago. Depois de um penoso dia de trabalho, sobe de bom grado a um monte ou faz-se conduzir, ao entardecer, sobre as águas espelhantes do lago de Genesaré, na calma e no silêncio da noite. Sabemos, aliás, que toda a sua vida pública foi um ir e vir errante pelas serras e pela planície da Galiléia, e, depois da Galiléia, pela Samaria e Judéia, e mesmo até a região de Tiro e Sidônia. Essas caminhadas, fazia-as com o equipamento mais elementar, como recomendava aos discípulos: Não leveis nada convosco para o caminho, nem bastão, nem bolsa, nem pão, nem dinheiro. Muitas vezes, com efeito, faziam-lhe companhia a fome e a sede. Também a sua última viagem, de Jericó a Jerusalém, constituiu uma demonstração de notável resistência física. Sob um sol abrasador, por estradas sem sombra, ou através de colinas rochosas e desertas, venceu numa caminhada de seis horas uma subida de mais de mil metros. É de admirar que, à chegada, ainda se achasse bem disposto. Na mesma noite, com efeito, tomou parte num banquete que Lázaro e suas irmãs lhe haviam preparado. A maior parte da sua vida pública, Jesus a passou, não na tranquilidade de uma casa amiga, mas ao ar livre, no meio da natureza, exposto a todas as intempéries. O lugar do seu nascimento e o da sua morte não se encontram entre os mais frequentados pelos homens. Entre esses dois extremos – o estábulo de Belém e a colina do Gólgota – desenrolou-se a sua vida, mais nômade e mais pobre do que a dos pássaros que tem o seu ninho ou a das raposas que tem a sua toca. Quando entrava numa casa, não era a sua própria, mas a de qualquer amigo, porque Ele não tinha onde repousar a cabeça. Parece não haver dúvida de que, a maior parte do tempo, passou as noites ao relento. É daí, sobretudo, que lhe terá vindo a familiaridade com os lírios do campo e as aves do céu. Não supõe tudo isto um corpo bem constituído, uma saúde robusta? Essa vida errante estava, além disso, cheia de ocupações cansativas. Várias vezes – nota São Marcos – Jesus e os discípulos não tinham tempo nem para comer. Até bem tarde da noite vinham chegando doentes, como também os adversários cheios de malícia, os saduceus e os fariseus. Era então o momento dos embates doutrinais, das longas e enervantes discussões, das lutas perigosas e das contínuas tensões. Seguiam-se, por fim, as extenuantes explicações aos discípulos, um pesado encargo que lhe era imposto pela pouca agilidade daquelas inteligências estreitas e pelas suas constantes preocupações mesquinhas. Um temperamento doentio ou simplesmente delicado não teria podido resistir. Nunca, nem mesmo nas situações mais enervantes e perigosas, Jesus perdeu a calma. Um dia, por exemplo, quando era mais forte a tempestade no lado de Genesaré, continuou a dormir tranquilamente até que os discípulos se decidiram a acordá-lo; e imediatamente, saindo do seu sono profundo, dominou a tormenta com a maior presença de espírito. O conjunto destes fatos mostra suficientemente que Jesus, longe de ter um temperamento fraco, nervoso e excitável, era, pelo contrário, plenamente senhor de si, de um equilíbrio perfeito e de uma saúde férrea.
VI PONTO
JESUS CRISTO: DETERMINAÇÃO CLARA E FIRME
Os evangelistas no-lo informam de maneira muito clara. O que os impressionou antes de tudo, na natureza humana de Jesus, foi a extraordinária lucidez do seu pensamento, assim como a inquebrantável firmeza da sua vontade. Se se quisesse tentar o impossível e exprimir numa palavra a fisionomia humana de Jesus, seria necessário dizer que foi verdadeiramente um homem de caráter inflexível e totalmente voltado para o seu fim; um homem que discerniu nitidamente o seu dever na vontade de seu Pai, e o aceitou e cumpriu até o fim, até o derramamento do seu sangue. Seu modo de falar, as expressões que se repetem sem cessar: Eu vim… Eu não vim… traduzem bem esse “sim” e esse “não” claros e inabaláveis. Eu não vim trazer a paz, mas a espada; Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores; O Filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido; O Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em redenção por muitos; Eu não vim para suprimir a Lei e os profetas, mas para os cumprir; Eu vim trazer fogo à terra e que quero senão que arda? Jesus sabe o que quer, e sabe-o desde o começo. Na idade dos doze anos, quando seus pais o encontram no templo, exprime tão claramente quanto possível todo o programa da sua vida: Não sabíeis que devo ocupar-me nas coisas de meu Pai? Do ponto de vista da sua psicologia, as três tentações do deserto são uma resistência vitoriosa à possibilidade satânica que lhe era oferecida: fazer uso do seu poder messiânico para a glorificação pessoal, para um fim egoísta, em vez de empregá-lo para a glória de Deus. Podemos ver aí muito nitidamente a clareza com que Jesus, desde o início da sua vida pública, descortina a nova via que deve trilhar – a do dom de si, do sacrifício à vontade de seu Pai –, e a resolução com que envereda por ela. Daí em diante, não serão somente os seus inimigos que procurarão desviá-lo do seu fim. Em três passagens, pelo menos, podem encontrar-se vestígios de tentativas por parte dos que o cercam para que abandone o caminho do sacrifício, da paixão, que aceitara definitivamente. A primeira foi em Cafarnaum, onde os seus próprios parentes lhe opõem uma silenciosa resistência. Essas influências acentuam-se com o protesto tão claro de Pedro em Cesaréia de Filipe: Deus não permita, Senhor, que isto aconteça! E atingem o ápice quando Jesus fala de dar a sua carne a comer e o seu sangue a beber, momento em que boa parte dos seus discípulos se separam d’Ele para não mais voltar. Jesus não deixa por isso de continuar o seu caminho, decidido a avançar sozinho, abandonado de todos, se for preciso. Nem uma palavra de pesar destinada a apaziguar os discípulos. Acrescenta simplesmente a pergunta lacônica e cortante: E vós, também quereis ir-vos embora? É bem Jesus: o homem da vontade pronta, da ação decidida e confiante. Durante todo o seu ministério, jamais foi visto a calcular, hesitar e voltar atrás. Esta mesma vontade pronta, firme, inflexível, exige-a também dos seus discípulos: Ninguém que mete a sua mão no arado e olha para trás é apto para o reino de Deus... Quem quer edificar uma torre senta-se e faz o cálculo dos gastos que são necessários... Quem parte para uma expedição de guerra começa por contar as suas tropas. É bem a sua própria marca que imprime nos discípulos. A irreflexão e a precipitação, tanto como a hesitação ou os compromissos covardes, não são com Ele. Todo o seu ser, toda a sua vida se traduzem simplesmente num “sim” ou num “não”. Jesus é sempre Ele mesmo, está sempre pronto, porque nunca fala ou age senão com toda a sua consciência luminosa e com a sua vontade enérgica e total. Pode muito bem dizer, mas só Ele: Que o vosso falar seja sim, sim; não, não . Toda outra palavra procede do maligno. Todo o seu ser, toda a sua vida, é unidade, firmeza, claridade, pureza e verdade. Causou uma tal impressão de verdade, de lealdade, de força, que nem os seus próprios inimigos se lhe podiam esquivar: Mestre, nós sabemos que és veraz e não receias ninguém. Nessa unidade, nessa pureza e nessa claridade de todo o seu íntimo se encontra a explicação psicológica da sua luta mortal contra os fariseus, esses sepulcros caiados, contra todos os representantes do que há de falso, de inferior, de puramente exterior e imóvel na religião e na vida. Foi o que o levou diretamente à cruz. Do ponto de vista psicológico, o que fez o seu trágico destino foram a verdade e a lealdade de todo o seu ser, a fidelidade a si mesmo a serviço de seu Pai. Jesus é um caráter plenamente heróico, o heroísmo feito homem.
VII PONTO
JESUS CRISTO: HEROÍSMO E AUTORIDADE
Esta disposição para o heroísmo, este dom absoluto da vida pela verdade reconhecida, exige-o também dos seus discípulos. O heroísmo é algo de natural n’Ele. Que falta a esse moço rico que cumpria todos os mandamentos, senão vender os seus bens e seguir Jesus? O verdadeiro discípulo deve “odiar” pai e mãe, mulher e filhos, irmãos e irmãs, e mesmo a própria vida – isto é, segundo o sentido aramaico, pospor tudo a Jesus – para poder acompanhá-lO. Semelhante vontade concentrada e visando um fim, semelhante iniciativa e energia fazem de Jesus um chefe nato. Chama Simão e André, e imediatamente estes abandonam as suas redes. Chama Tiago e João, e eles deixaram o pai na barca com os empregados. Expulsa do templo os vendedores, e ninguém ousa resistir-lhe. Tem um temperamento dominador, um porte régio. Os discípulos sentiam isso. Daí o seu respeitoso temor pelo Mestre, o vivo sentimento da distância que os separava d’Ele. Incessantemente os evangelistas fazem notar o espanto e mesmo o terror dos discípulos diante dos seus discursos e dos seus atos, seu receio em interrogá-lo. São Marcos começa a narração da última viagem de Jesus a Jerusalém com estas palavras significativas: Jesus caminhava à frente deles. Estavam todos perturbados e seguiam-no cheios de temor. Este temor apoderava-se das próprias massas e as cativava: E eles foram tomados de medo; tal era o primeiro sentimento que o aparecimento de Jesus fazia nascer. Não era como os chefes que tinham os escribas e os fariseus. Era Aquele que tem poder. Esta impressão de superioridade, de poder dominador que se desprendia da sua pessoa era tal que, para exprimi-la, o povo evocava os nomes das personalidades mais poderosas: será João Batista, ou Elias, ou Jeremias, ou algum dos Profetas? Jesus tinha consciência dessa diferença fundamental que o separava do povo e de todos. Jesus sabia muito bem que não era como os outros homens. Amava a solidão. Depois de se ter esgotado pregando à multidão e curando os doentes, recolhia-se e retirava-se a um lugar solitário ou a uma colina silenciosa. São Mateus assinala-o especialmente: Logo que deixou o povo, subiu a uma colina para orar na solidão… E ali permanecia sozinho.
Oração
Ó Jesus! Quando chegará o dia em que vos possa dizer: Deus meu, já não vos posso perder? Quando poderei vos contemplar face a face, certo de amar-vos com todas as minhas forças por toda a eternidade? Ah, Sumo Bem e meu único amor! Enquanto viver, estarei sempre em perigo de ofender-vos e perder vossa graça. Houve um tempo de desleixo em que não vos amei, em que desprezei vosso amor... Pesa-me dele com toda a minha alma, e espero que me tenhais perdoado, pois vos amo de todo o coração e desejo fazer quanto possa para amar-vos e vos ser agradável. Mas como ainda estou em perigo de negar-vos meu amor e de afastar-me de vós outra vez, rogo-vos, meu Jesus, minha vida e meu tesouro, que não o permitais… Se tão grande desgraça tiver de me suceder, fazei-me antes morrer neste momento, da morte mais dolorosa que escolhereis, que assim o desejo e vo-lo peço. Meu Pai, pelo amor de Jesus Cristo, não me deixeis cair em tão grande ruína! Castigai-me como vos aprouver. Mereço-o e o aceito, mas livrai-me do castigo de ver-me privado do vosso amor e da vossa graça. Meu Jesus, recomendai-me ao vosso Pai! Maria, minha Mãe, rogai por mim ao vosso divino Filho; alcançai-me a perseverança em sua amizade e a graça de amá-lo; e depois que faça de mim o que lhe aprouver.
Pe. Divino Antônio Lopes FP (C) Anápolis, 27 de maio de 2014
Bibliografia
Sagrada Escritura Patrologia, Berthold Altaner e Alfred Stuiber Pe. Leo J. Trese, A fé explicada Santo Agostinho, Enarrationes in psalmos São Pio X, Catecismo Maior Karl Adam, Jesus Cristo Clemente de Alexandria, Escritos Santo Afonso Maria de Ligório, Meditações
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