VI DEPOIS OUTRO ANJO (Ap 10, 1-7)
“1 Vi depois outro Anjo poderoso descendo do céu: trajava-se com uma nuvem e sobre sua cabeça estava o arco-íris; seu rosto era como o sol, as pernas pareciam colunas de fogo, 2 e na mão segurava um livrinho aberto. Pousou o pé direito sobre o mar, o esquerdo sobre a terra, 3 e emitiu um forte grito, como um leão quando ruge. Ao gritar, os sete trovões ribombaram suas vozes. 4 Quando os sete trovões ribombaram, eu estava para escrever, mas ouvi do céu uma voz que me dizia: ‘Guarda em segredo o que os sete trovões falaram, e não o escrevas’. 5 Nisto, o Anjo que eu vira de pé sobre o mar e a terra levantou a mão direita para o céu 6 e jurou por aquele que vive pelos séculos dos séculos — que criou o céu e tudo o que nele existe, a terra e tudo o que nela existe, o mar e tudo o que nele existe —: ‘Já não haverá mais tempo! 7 Pelo contrário, nos dias em que se ouvir o sétimo Anjo, quando ele tocar a trombeta, então o mistério de Deus estará consumado, conforme ele anunciou aos seus servos, os profetas’”.
Em Ap 10, 1 diz: “Vi depois outro Anjo poderoso descendo do céu: trajava-se com uma nuvem e sobre sua cabeça estava o arco-íris; seu rosto era como o sol, as pernas pareciam colunas de fogo”.
Depois dos acontecimentos que se seguem ao toque da sexta trombeta (Ap 9, 13-21), e antes que soe a sétima (Ap 11, 15), encontramos esta nova visão – introduzida como um parêntesis – na qual o autor aparece situado de novo na terra (Ap 10, 4), tal como quando escreve as sete cartas (Ap 1, 4- 3, 22). As visões anteriores, descritas a partir do capítulo 4, e as posteriores (capítulo 12) apresentam-se como se o vidente estivesse no Céu. Isso mostra que agora se trata dum inciso, como que se prepara o leitor para conhecer o toque da sétima trombeta, a definitiva. Nesta visão intercalada São João reitera a sua condição de profeta, mediante a ação simbólica de comer um pequeno livro (Ap 10, 8-11), e recorda o testemunho dos antigos profetas, representados pelas duas testemunhas (Ap 11, 1-13). Ainda que não se diga o nome do Anjo, pode-se pensar em Gabriel porque se lhe chama poderoso (em hebraico geber), e Gabriel (em hebraico gabri’el) significa força de Deus, ou varão de Deus (Dn 8, 15), ou Deus se manifesta forte. Em qualquer dos casos, Gabriel é o nome que se dá ao Anjo encarregado de explicar as profecias messiânicas a Daniel, e de comunicar as notícias da parte de Deus a Zacarias (Lc 1, 19) e à Santíssima Virgem (Lc 1,26). Realizou uma função paralela ao Anjo que aparece em Ap 8, 3-5, que costuma identificar-se com São Miguel. Os traços impressionantes com que é descrito acentuam a sua natureza celestial e o seu poder. O Pontifício Instituto Bíblico de Roma explica: Analogamente ao que se viu (Ap 7, 1-2) na série dos sete selos (Ap 6, 1-8), o toque da última trombeta, que dará o sinal para a última e decisiva luta, é precedido de um interlúdio, ou tempo de espera. Aqui, porém, em duas fases ou atos: preparação do vidente para o encargo de escrever essas cenas proféticas (capítulo 10) e a pregação de duas testemunhas fiéis de Jesus Cristo (capítulo 11). O Pe. Geraldo Morujão ensina: No capítulo 10, é introduzida uma seção com outra visão, que é como um parêntese que leve o leitor a preparar-se para tudo aquilo que de grandioso irá suceder com o toque da última trombeta: o combate final que decidirá a vitória de Cristo sobre as terríveis forças do mal. A visão traz-nos outro anjo, distinto dos das trombetas, com tais características que alguns, como Santo Alberto Magno, chegaram a identificá-lo com o próprio Cristo glorioso: desce do céu numa nuvem (Ap 1, 15-16; Mt 17, 5; 24, 30; 26, 64), o seu rosto brilha como o sol (Mt 17, 2). O Pe. Miguel Nicolau escreve: São João Evangelista tem uma nova visão. Contempla um anjo que desce do céu. Pelas circunstâncias que em seguida se darão, alguns dizem que é Jesus Cristo. Não parece admitir-se este ponto de vista. A única razão aparentemente válida que alegam os partidários desta sentença, é que o anjo resplandece como o Filho do homem na aparição inicial das mensagens às sete igrejas. Porém, o resplandecer é comum ao sobrenatural glorioso. Em mudança, este anjo atua como os outros e recebe ordens de Deus, o qual nunca sucede em Jesus Cristo, e, além disso, neste breve capítulo por três vezes se ouve a voz divina, distinta da do anjo, que se há de identificar com a de Jesus Cristo. Disse o vidente, São João, que é outro anjo, para distingui-lo, sem dúvida, do que tocou a sexta trombeta. Ele é também atlético. A palavra grega reflete, sem dúvida, o original semítico gibbôr, que significa valente, herói, gigante, e costuma aplicar-se aos guerreiros, e aqui denota uma constituição de colosso robustíssimo. Ele está vestido de uma nuvem (Sl 104, 3), com a qual se indica talvez a brancura do seu vestido de linho; e leva em torno da cabeça o arco íris... o arco íris é mais sinal de glória espiritual que de paz (Gn 9, 13).O aspecto do anjo ou seu rosto brilhava como o sol, e suas pernas eram torneadas e fortes como colunas e brilhantes como o fogo. As características externas do anjo levam à esplendidez de seu ser e a sua missão concreta. Quem é esse anjo? É praticamente impossível esclarecer esta questão. Alguns dizem ser Gabriel. O Pe. José Salguero comenta: São João vê um Anjo que desce do céu. O aspecto do Anjo é imponente, poderoso, ele é todo majestoso. Para encobrir um pouco a sua majestade e glória, vem envolto numa nuvem que é o meio tradicional usado pelos seres celestes para suas viagens entre o céu e a terra. Levava sobre a cabeça o arco íris. O arco íris indica sua glória espiritual e sua procedência celestial; porém, ao mesmo tempo, é sinal de que o Anjo traz uma mensagem de paz e de misericórdia para os cristãos fiéis perseguidos. O rosto do Anjo resplandecia como o sol e seus pés eram como colunas de fogo. Este aspecto resplandecente e cheio de glória é uma nota característica das parições sobrenaturais de seres em forma humana (Ap 1, 15). Esta imagem do Anjo nos recorda um pouco a visão do Anjo do Ap 5, 2. Como este havia anunciado o começo das calamidades sobre o mundo pagão; assim o Anjo de Ap 10, 1 vem anunciar a consumação próxima dos juízos divinos. A intervenção deste Anjo poderoso significa a importância da missão que traz: a consumação está próxima (Ap 10, 6-7).
Em Ap 10, 2 diz: “... e na mão segurava um livrinho aberto. Pousou o pé direito sobre o mar, o esquerdo sobre a terra”.
O pequeno livro aberto que o Anjo leva é diferente do livro fechado com sete selos da visão de Ap 5, 2. Agora é um livro semelhante ao rolo da visão descrita pelo profeta Ezequiel (Ez 2, 9-3,1), destinado a ser comido pelo vidente. O livro está aberto, o que quer dizer que pode conhecer-se o seu conteúdo. Com a imagem de comer o livro significa que a palavra que vai sair da boca do profeta provém em última análise de Deus. Reflete também a convicção com que Deus comunica a sua palavra, fala em forma de um escrito. Daí que esta imagem sirva ao mesmo tempo para fundamentar-se a fé na inspiração divina dos escritos sagrados – a Bíblia - e compreender o seu verdadeiro alcance: estes livros são sagrados porque são em si mesmos palavra de Deus que chega à Igreja em forma escrita através de autores inspirados, e a Igreja proclama-o assim ao lê-los publicamente. Não nos é dito qual é o conteúdo desse pequeno livro, sinal de que o único que pretende o autor com essa imagem é ressalvar a sua condição de profeta. Pelo contrário, sem dúvida quer-se assinalar que as suas profecias afetam toda a criação: a terra e o mar (Ap 10, 6). O Pe. Geraldo Morujão ensina: ... e tem um pé sobre a terra e outro sobre o mar em sinal de domínio absoluto da natureza, e uma voz potente como o rugido de um leão, à maneira de como é representada a voz de Deus (Sl 29, 3-9; Os 11, 10). O Pe. Miguel Nicolau escreve: O Anjo levava um pequeno livro, que no original grego se expressa com um diminutivo. O Anjo, mensageiro celeste, põe seu pé direito sobre o mar e seu esquerdo sobre a terra. Esta posição tem o significado, como aparecerá manifestamente quando dentro de pouco se fale de seu juramento. Tendo em conta que São João está em Patmos, é muito provável que ao pôr o Anjo seu pé direito sobre o mar e seu esquerdo na terra, ficasse projetado sobre o horizonte da Palestina, que era o lugar do sol nascente. O Pe. José Salguero comenta: O Anjo de aspecto majestoso tem em sua mão um livrinho aberto. Este livrinho está como em contraste com o livro selado do capítulo 5, a causa de sua pequenez e por estar aberto. No livrinho devia estar os destinos do Império Romano, considerado em suas relações com a Igreja e como protótipo das potências que hão de ser vencidas por Jesus Cristo.
Em Ap 10, 3-7 diz: “... e emitiu um forte grito, como um leão quando ruge. Ao gritar, os sete trovões ribombaram suas vozes. Quando os sete trovões ribombaram, eu estava para escrever, mas ouvi do céu uma voz que me dizia: ‘Guarda em segredo o que os sete trovões falaram, e não o escrevas’. Nisto, o Anjo que eu vira de pé sobre o mar e a terra levantou a mão direita para o céu e jurou por aquele que vive pelos séculos dos séculos — que criou o céu e tudo o que nele existe, a terra e tudo o que nela existe, o mar e tudo o que nele existe — : ‘Já não haverá mais tempo! Pelo contrário, nos dias em que se ouvir o sétimo Anjo, quando ele tocar a trombeta, então o mistério de Deus estará consumado, conforme ele anunciou aos seus servos, os profetas’”.
A voz do Anjo, como a voz de Deus no Antigo Testamento, é comparada ao rugido do leão (Os 11, 10; Am 1, 2) e ao estrondo do trovão que intimidam o homem. Segundo o texto, cada trovão encerra a sua própria mensagem, e o fato de serem sete significa que neles fica expressa a totalidade da revelação divina. Mas esta revelação ainda há de ficar em segredo e só se desvendará no fim os tempos. A imagem de selar o livro serve para expressar que essa revelação não se há de tornar pública, e que, portanto, é inútil querer averiguá-la. Pertence ao mistério que Deus não quis comunicar, como acontece com o tempo da Parusia do Senhor e do fim do mundo (Mt 24, 36). Com um gesto e uma fórmula solene de juramento, o Anjo assegura que vai chegar o estabelecimento definitivo do Reino de Deus, quando já não houver mais tempo para este mundo de agora. Mas não se indica nenhuma data do momento em que acontecerá: só se diz que será quando o Mistério de Deus, o seu desígnio de salvação, chegar à sua plenitude; quando for o tempo da colheita (Mt 13, 24-30), porque tanto o bem como o mal – o trigo e o joio – se terão manifestado plenamente (2 Ts 2, 6ss.). Na perspectiva do Apocalipse, o fim dos tempos é assinalado pelo toque da sétima trombeta, que se descreverá mais adiante (Ap 11, 15), e com o qual se cumprem os três ais que enumerou em Ap 8, 13 e 9, 13. Agora põe-se em relevo a certeza de que acontecerá, motivo de esperança para a Igreja, e apelo à conversão para todos os homens: Há, contudo, uma coisa, amados, que não deveis esquecer: é que para o Senhor um dia é como mil anos e mil anos como um dia. O Senhor não tarda a cumprir a sua promessa, como pensam alguns, entendendo que há demora; o que ele está é usando de paciência convosco, porque não quer que ninguém se perca, mas que todos venham a converter-se (2 Pd 3, 8-9). O Pontifício Instituto Bíblico de Roma explica: O trovão é a voz de Deus e o número sete indica a sua plenitude ou totalidade (Gn 2, 1-3). São João ouviu o que se dizia e queria escrevê-lo, o que lhe foi proibido fazer, talvez porque eram coisas inexprimíveis em linguagem humana (2 Cor 12, 4). Sela: conserva em segredo. O que São João deve escrever está contido num pequeno rolo, um livro de pequeno volume, de sorte que pode ser engolido pelo vidente. Não haverá mais tempo para a implantação do reino de Cristo, com o triunfo do monoteísmo judeu-cristão sobre a idolatria, de qualquer espécie ela seja. Isso é o que se dizia desde o início que deve acontecer em breve (Ap 1, 1). O Pe. Geraldo Morujão ensina: Nos sete trovões está simbolizado o mistério indescritível de tudo o que Deus tem nos seus planos, e daí a voz: Não escrevas. O Pe. Miguel Nicolau escreve: O Anjo expõe a sua mensagem com grandes gritos, como ruge o leão. São João amplia propriamente o verbo mugir, que não pode aplicar-se à maior das feras da palestina. São João quer indicar a intensidade, potência e majestade da voz do Anjo. O Anjo tem, todavia, duas coisas para fazer, pelas quais desceu do céu: certificar sobre os planos de Deus e dar o pequeno livro a São João. O Pe. José Salguero comenta: O mensageiro divino, o Anjo, depois de ter dado um grande grito, se dispõe a pronunciar um juramento para certificar a absoluta verdade do que vai dizer. O juramento estava permitido pela lei judaica e tinha grande força obrigatória. Também entre os cristãos é lícito, sempre que seja verdadeiro aquilo pelo qual se jura e haja motivo suficiente para jurar. O Anjo, em atitude de prestar solene juramento, jura levantando ao céu sua mão direita e tendo seus pés sobre a terra e o mar. Com esta atitude, o Anjo quer significar que toca as três partes do universo porque vai jurar por aquele que criou o céu, a terra e o mar (Ex 20, 11; Sl 146, 6). A ação de elevar a mão ao céu, como querendo colocar a Deus por testemunha, por quem se jura, é comum na Sagrada Escritura (Gn 14, 22; Dt 32, 40). Nesta atitude, o Anjo pronuncia a fórmula do juramento. O que o Anjo jura? Jura que não haverá mais tempo. A palavra tempo aqui significa espera. Por conseguinte, significa que já não passará mais tempo, já não haverá mais espera para o cumprimento dos juízos divinos que se realizarão ao toque da sétima trombeta. Uma vez que toque a sétima trombeta, se cumprirá o mistério de Deus. Este mistério de Deus é o estabelecimento definitivo do reino de Deus e de seu Cristo, que terá lugar com a destruição das nações pagãs.
Pe. Divino Antônio Lopes FP (C) Anápolis, 22 de maio de 2015
Bibliografia
Sagrada Escritura Edições Theologica Pe. Miguel Nicolau, A Sagrada Escritura Pontifício Instituto Bíblico de Roma Pe. Geraldo Morujão, Apocalipse Pe. José Salguero, Bíblia Comentada
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