AS SETE PRAGAS DAS SETE TAÇAS

(Ap 15, 5-8)

 

5 Depois disto, vi abrir-se o templo da tenda do Testemunho que está no céu, 6 e dele saíram os sete Anjos com as sete pragas. Estavam vestidos de linho puro, resplandecente, e cingidos à altura do peito com cintos de ouro. 7 Um dos quatro Seres vivos entregou aos sete Anjos sete taças de ouro, cheias do furor do Deus que vive pelos séculos dos séculos. 8 O templo se encheu de fumaça por causa da glória de Deus e do seu poder, de modo que ninguém podia entrar no templo, até que estivessem consumadas as sete pragas dos sete Anjos”.

 

Depois do cântico de louvor, e como sua consequência, descreve-se a intervenção divina em termos semelhantes aos utilizados ao narrar o som da sétima trombeta (Ap 11, 19). Mostra-se assim a conexão entre ambas as passagens. A diferença está em que, em lugar da arca, agora aparece a tenda do testemunho. Ambas deviam permanecer ocultas até aos tempos messiânicos, segundo relata 2 Mc 2, 4-8; e, quando se descobrissem, voltaria a manifestar-se a glória de Deus, como na consagração do templo feita por Salomão. Naqueles momentos, por causa da nuvem – símbolo da glória divina – os sacerdotes não puderam continuar o seu culto (1 Rs 8, 10-11).

Com a aparição da tenda vai culminar também a realização dos projetos de Deus. O autor do Apocalipse apresenta-nos assim a iminência da parusia do Senhor, tal como se descreverá mais adiante.

As sete taças de ouro são os instrumentos para lançar as pragas sobre o mundo; por isso se diz que estão cheias do furor de Deus, isto é, estão repletas da justiça divina que se vai manifestar plenamente. Daí que as taças de ouro sejam ao mesmo tempo símbolo das orações dos Santos que motivam a intervenção divina e das suas consequências: vitória do bem e castigo dos poderes do mal. As taças simplificam propriamente as orações dos santos; o seu conteúdo não são as pragas, mas os efeitos da oração: a atuação de Deus que leva consigo a consolação – como um perfume – para os justos, e o castigo – o furor de Deus – para os que seguem a BESTA, os que operam a iniquidade.

O Pe. Geraldo Morujão escreve: É então que surge a visão do santuário com o tabernáculo do testemunho, numa alusão à tenda do encontro do Êxodo, escondida por Moisés no Monte Nebo (2 Mc 2, 5), que os judeus esperavam que aparecesse no fim dos tempos. Dali saem os sete anjos a quem são entregues as sete taças de ouro cheias da ira de Deus (Ap 15, 8). Já tinham aparecido taças de ouro cheias do perfume das orações dos santos (Ap 5, 8); aqui as taças de ouro aparecem cheias da ira de Deus, o que parece sugerir que a justa punição dos maus – a ira de Deus – está na sequência da oração dos fiéis.

O Pontifício Instituto Bíblico de Roma ensina: Começa-se a descrever aqui pormenorizadamente os flagelos, isto é, os golpes da ira divina desencadeados sobre os obstinados idólatras. São eles preparados diligentemente no céu, no conselho divino, simbolizado aqui pelo santuário celeste que foi mostrado a Moisés como modelo do tabernáculo que ele devia erigir para o culto na terra (Ex 25, 8-9). Os castigos de Deus são representados sob a figura das taças cheias da ira de Deus que serão derramadas sobre a terra.

O Pe. José Salguero comenta: Depois de contemplar os bem-aventurados entoando o cântico do Cordeiro, São João vê como se abre o templo celeste (versículo 5).  Uma cena semelhante se encontra em Ap 11, 19, onde também se deixa ver o templo de Deus e a arca do testamento. O santuário que contempla o vidente de Patmos no céu é também designado com o nome da tenda do testemunho. Esta expressão se refere ao tabernáculo do deserto, porque o primeiro templo que levantaram os israelitas, quando andavam errantes pelo deserto, foi uma tenda grande (Ex 26, 1-37). Também era chamado este santuário do deserto de a tenda da reunião, porque nele se reuniam Deus e Moisés para falar (Ex 33, 7; Dt 31, 14). No livro dos Números 9, 15 é designada como a tenda do testemunho, enquanto que nela se guardava a arca da aliança que continha as tábuas da Lei, as quais eram o testemunho e a prova do pacto entre Deus e Israel.

Nesta seção são descritas as últimas intervenções divinas contra os adoradores da BESTA. Toda a visão das sete pragas oferece um estreito paralelismo com os capítulos 8 e 9. Os sete anjos que vão executá-las já foram apresentados no versículo 1 do capítulo 15. Agora São João contempla-os saindo do templo celeste com as sete pragas (versículo 6). Provavelmente estes sete anjos são os mesmos que tocaram as sete trombetas (Ap 8, 2). Trazem as sete pragas, porque os castigos e a misericórdia procedem igualmente do santuário, como também do altar (Ap 8, 2-6). Tudo, até os mesmos castigos estão ordenados para o bem dos homens e da Igreja de Deus. Eles vão vestidos de linho puro, brilhante, e cingidos à altura do peito com cintos de ouro, como os sacerdotes (Ex 28, 40-43; Lv 16, 4; Ap 1, 13), porque a missão que levam é uma missão sagrada. Ao castigar oferecem como um sacrifício à justiça divina ofendida. A indumentária dos anjos recorda também a do ser misterioso de Ezequiel (Ez 9, 2-3), que sai do templo para castigar Jerusalém. É muito possível que o autor do Apocalipse se inspire na cena do profeta Ezequiel.

No momento de sair os sete anjos do templo celeste, um dos quatro viventes que sustentam o trono de Deus deu aos sete anjos as sete taças de ouro, cheias da cólera do Deus eterno (versículo 7). As taças são de ouro, como os copos do tabernáculo, porque na casa de Deus era indecoroso o uso de outra matéria. As taças contém a porção com o que já se havia ameaçado aos adoradores da BESTA (Ap 14, 10). Agora será cumprida a terrível ameaça. No profeta Ezequiel (Ez 10, 7) existe uma cena que tem certa semelhança com a nossa passagem. Um querubim toma o fogo de junto às rodas do trono de Deus e o dá ao que estava vestido de linho para que o lance sobre Jerusalém com a finalidade de anunciar sua próxima destruição. As taças que entrega um dos viventes estão cheias da cólera do Deus imortal, eterno e onipotente, que não deixará de realizar suas ameaças. Estas taças vem a ser como a contrapartida das taças de ouro cheias de perfumes que os viventes e os anciãos tinham em suas mãos (Ap 5, 8) quando adoravam ao Cordeiro. As taças são entregues aos anjos por um dos viventes.

A fumaça que encheu o templo celeste (versículo 8) é um traço próprio das teofanias (Ex 19, 18; 40, 34). Na inauguração do templo de Salomão, a fumaça ou a nuvem encheu a casa de Deus (1 Rs 8, 10-11). A nuvem era  o sinal da presença de Deus que tomava posse do seu templo. Também o profeta Isaías viu na visão inaugural a Deus rodeado de serafins que lhe aclamavam, e, ao mesmo tempo, o templo onde teve a visão se encheu de fumaça (Is 6, 4ss.). Deus quer fazer sentir a majestade de sua presença com esta imagem sensível. Além disso, deste modo o santuário se faz inacessível durante a promulgação dos castigos, para significar a execução inexorável dos decretos divinos, ou bem para indicar que os juízos de Deus são impenetráveis e incompreensíveis até que sejam realizados. Tudo isso é a preparação das pragas que os sete anjos vão derramar sobre a terra.

O Pe. Miguel Nicolau ensina: Depois de contemplar os vencedores da BESTA e de ouvir sua extensa sinfonia, São João tem uma nova visão, cujo tema havia anunciado antes (versículo 1). Abriu-se  o santuário da tenda do testemunho no céu.  Trata-se do templo celeste (Ap 11, 19), que era protótipo do terrestre (Hb 8, 5). Chama-se tenda porque o primeiro templo que teve o povo de Israel foi a imensa tenda de campanha, ao estilo beduíno, que acompanhava e presidia aos israelitas em seu caminho pelo deserto antes de entrar na terra prometida e depois da libertação no Egito. Foi construída minuciosamente segundo as instruções que deu Moisés (Ex 26). Mais tarde, quando estava já levantado o grande templo de Salomão, continuou chamando-se santuário, por anacronismo arcaizante, tenda ou tabernáculo de Deus (Sl 43, 3; 87, 2). Neste sentido se usa aqui a palavra. Chamava-se tenda do testemunho porque nela se guardava, entre os objetos de culto, a arca da aliança, que continha as tábuas da Lei, as quais eram testemunhos e provas do pacto ou aliança entre Deus e seu povo. O santuário é precisamente a tenda do testemunho, isto é, o templo celeste convertido no templo perpétuo na aliança decisiva do Novo Testamento.

Saem do interior do santuário celeste, de um lugar mais próximo do trono de Deus, os sete anjos, bem definidos pela presença do artigo, porque são já conhecidos. São João falou deles no versículo 1. É possível que sejam os mesmos anjos que estão diante do trono de Deus e tocaram as sete trombetas do castigo (Ap 8, 2). Estão vestidos de linho puro, com o qual se indica mais sua genuinidade e valor que sua carência de manchas, e, além disso, resplandecente, com o qual se assinala sua glória e dignidade. A esplendidez do cargo chega à dignidade do ser. Estão cingidos em torno do peito com cinturão de ouro (Ap 1, 13).

Um dos quatro viventes lhes havia dado sete taças de ouro. A taça tinha uma cavidade pouco profunda, sem asa e sem pé. Muito parecida com as vasilhas onde são coladas as frutas. O vivente, que talvez fosse semelhante a homem, que formava parte, segundo nosso modo de dizer, da guarda mais próxima à Divindade, iria recebendo de Deus sua vontade em cada taça, que entregaria sucessivamente a cada anjo. O conteúdo de cada uma das taças era diferente, segundo se verá pelos efeitos. Dizem que estão cheias do furor do Deus imortal por essência, portanto verdadeiro e único, porque desencadearam os castigos progressivos contra os inimigos da Igreja.

É sensível a presença de Deus no santuário por uma fumaça que se forma. Não se trata propriamente da fumaça que sai do incensário (Is 6, 4; Ex 19, 18), mas da nuvem que é sinal sensível da presença gloriosa do Deus onipotente (Ex 40, 34-35). Glória e potência são epítetos de dignidade e respeito que se aplicam a Deus. Ninguém podia entrar no santuário até que se terminassem as taças-pragas, seja porque a fumaça impedisse a entrada ao lugar santo, por reverência à presença divina; seja porque – como acredita alguns – ninguém com orações e súplicas conseguirá de Deus que as pragas não caiam sobre a terra. Tudo está preparado para a atuação dos sete anjos.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 10 de junho de 2015

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Edições Theologica

Pe. Geraldo Morujão, Apocalipse

Pontifício Instituto Bíblico de Roma

Pe. José Salguero, Bíblia Comentada

Pe. Miguel Nicolau, A Sagrada Escritura

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “As sete pragas das sete taças”

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