Santo
Estêvão, a quem a Sagrada Escritura chama um homem cheio de fé e do
Espírito Santo, foi o primeiro que teve a honra e a felicidade de
derramar o sangue e sacrificar a vida em testemunho da fé e da
doutrina de Jesus Cristo. Esta circunstância fez com que fosse
honrado com o título de Protomártir. Foi o primeiro entre os sete
homens eleitos pela Igreja de Jerusalém, aos quais os Apóstolos
impuseram as mãos. Não se sabe quem eram seus pais e onde nasceu.
Sabe-se apenas que era de descendência judaica e foi discípulo do
célebre Gamaliel. Além de ser profundo conhecedor dos livros
sagrados, distinguiu-se por uma piedade pouco vulgar e por um zelo
ardente pela santa fé. Feito diácono, cabia-lhe fazer a distribuição
das esmolas, como ajudar aos Apóstolos nas funções litúrgicas. Junto
com os Apóstolos, pregava a doutrina de Jesus Cristo em toda a
cidade de Jerusalém. Além disto fazia grandes milagres, como atesta
a Sagrada Escritura: “Estêvão, cheio de graça e fortaleza, fazia
grandes prodígios e milagres entre o povo” (At 6,8).
Muito bem sabiam os escribas e os fariseus que
Estêvão era profundamente conhecedor da lei mosaica. Por isso,
vendo-o tão empenhado em propagar a religião de Cristo, procuraram
envolvê-lo em disputas ardilosas, com o fim de desprestigiá-lo
perante o povo. Havia em Jerusalém diversas escolas, que ensinavam
aos judeus a lei antiga. De todas vinham representantes,
provocando-o para disputar com eles. Por mais sutis e maldosas que
lhes fossem as argumentações, não puderam resistir à sabedoria de
Estêvão e ao espírito que pela boca lhe falava. Vendo que, em
conseqüência dessas práticas, muita gente passava para a religião de
Cristo, recrudesceram-lhe os ataques e procuraram meios para
eliminá-lo. Alguns judeus se incumbiram de espalhar entre o povo que
Estevão se atrevera a blasfemar contra Deus e Moisés, dizendo-se
testemunhas disto. Assim e por outras calúnias contra o santo
diácono, contra este se conjuraram o povo, anciãos e escribas. Com
grande vozeria precipitaram-se sobre ele, levaram-no à presença do
Supremo Conselho, que já se achava reunido, estando presentes também
o Sumo Pontífice Caifás, e todos os sacerdotes e fariseus. Foram
apresentadas as falsas acusações, comprovadas por falsas
testemunhas. “Este homem, disseram, não cessa de proferir palavra
contra o lugar santo e contra a lei; porque nós o ouvimos dizer:
“Que esse Jesus Nazareno há de destruir este lugar e mudar as
tradições que Moisés nos ensinou”. Os olhos de todos estavam sobre
Estevão, para ver a impressão que lhe faziam estas acusações. Mas
enganaram-se os que esperavam descobrir em Estêvão alguma
perturbação ou medo. Nada disso se lhe via; pelo contrário, todos
lhe viram o rosto resplandecente, como o de um Anjo, o que aliás não
era de admirar, porque, com os Anjos, Estêvão partilhava a pureza da
alma e a fortaleza do espírito. Os perseguidores deviam ter ficado
impressionados. Mas a maldade não os deixava desviar-se do plano
sinistro. O Sumo Pontífice perguntou então: “São assim com efeito
essas coisas?” Estevão respondeu em longo e enérgico discurso, que
se lê no capítulo VII dos Atos dos Apóstolos. Neste discurso se
refere ao legislador da lei mosaica, elogia-o, e menciona a profecia
messiânica de Moisés. Em seguida verbera a contumácia dos judeus e
os acusa do crime de deicídio. “E vós — continua — homens de dura
cerviz e de corações e ouvidos incircuncisos, vós sempre resistis ao
Espírito Santo: assim como foram vossos pais, assim sois também vós.
A qual dos profetas não perseguiram vossos pais? Mataram aos que
anunciavam a vinda do Justo, que acabais de trair e do qual fostes
os homicidas, vós que recebestes a lei por ministério dos Anjos e
não a guardastes”. Palavras tão duras os incriminados não quiseram
ouvir. Tomados de raiva, rangiam os dentes contra o orador. Este, de
olhos elevados ao céu, continuou: “Eis que estou vendo os céus
abertos, e o Filho do homem sentado à direita de Deus”.
Então, eles levantando um grande clamor, taparam os
ouvidos, e unanimemente arremeteram com fúria contra ele. E
tirando-o para fora da cidade, apedrejaram-no. Os acusadores, que
segundo a lei mosaica deviam atirar as primeiras pedras, depuseram
as capas aos pés de um moço que se chamava Saulo, aquele mesmo que
mais tarde se converteu e por Deus foi chamado para ser o grande
Apóstolo dos gentios. Enquanto apedrejavam a Estevão, este orava e
dizia: “Senhor Jesus Cristo, recebei o meu espírito”. E, estando de
joelhos, clamou em alta voz, dizendo: “Senhor, não lhes imputeis
este pecado”. E tendo dito isto, adormeceu no Senhor” (At 7).
Alguns homens piedosos trataram de enterrar Estêvão e
fizeram grande pranto sobre ele. É opinião de muitos que dos
primeiros destes homens tenha sido o próprio Gamaliel, e que o
enterro de Estevão se teria realizado num sitio que Gamaliel
possuía, nas cercanias de Jerusalém.
Os Santos Padres tecem grandes elogios a Santo
Estêvão, põem-lhe em relevo a pureza, o zelo apostólico, a firmeza e
constância. Antes de tudo, porém, me enaltecem o amor ao próximo
verdadeiramente heróico, que o fez rezar pelos próprios assassinos.
A muitos destes a oração do santo mártir alcançou a
graça da conversão. Santo Agostinho não hesita em atribuir à oração
de Santo Estêvão a conversão de Saulo: “Se Santo Estêvão não tivesse
rezado, a Igreja não teria um São Paulo”.
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