Instituto Missionário dos Filhos e Filhas da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e das Dores de Maria Santíssima

 

 

TERCEIRA PALESTRA

 

INFERNO

 

I. O inferno existe

 

O Inferno é um lugar de tormentos, onde sofrerão eternos suplícios os que morrem em pecado mortal: “Para que um pecado seja mortal requerem-se três condições ao mesmo tempo: ‘É pecado mortal todo pecado que tem como objeto uma matéria grave, e que é cometido com plena consciência e deliberadamente” (Catecismo da Igreja Católica, 1857).

1. A majestade infinita de Deus e a gravidade dos mandamentos divinos, exigem a existência de um lugar em que, depois da morte, sofram castigo todos os que se rebelaram contra Deus: “Se aqui na terra há prisões onde os criminosos vão pagar os crimes contra as leis civis, depois da morte irão encontrar também, os violadores dos divinos preceitos, a prisão tenebrosa dos mais inefáveis suplícios” (Pe. Alexandrino Monteiro).

2. A própria razão humana leva-nos a admitir esta verdade. Ao verem a maldade espantosa que campeia no mundo, mesmo os incrédulos se vão convencendo que deve existir o inferno, isto é, um lugar de castigo para a maldade. Ao ler os horrores de que são capazes os homens, os assassinatos horríveis cometidos sem pestanejar, os roubos, as imoralidades, o desprezo da justiça e da honra... quem não desesperaria e não se sentiria vacilar na fé se não existisse o inferno, em que estes horrores hão de receber justo castigo?

3. São João Batista afirmou que há inferno: “O machado já está posto à raiz das árvores e toda árvore que não produzir bom fruto será cortada e lançada ao fogo” (Mt 3, 10). Ensinou também: “A pá está na sua mão: vai limpar sua eira e recolher seu trigo no celeiro: mas, quanto à palha, vai queimá-la num fogo inextinguível” (Mt 3, 12).

4. Setenta vezes fala a Sagrada Escritura do Inferno; destas, vinte e cinco nos Evangelhos.

Em Mt 25, 30 diz: “Quanto ao servo inútil, lançai-o fora nas trevas. Ali haverá choro e ranger de dentes!”, e: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno...” (Mt 25, 41), e também: “E irão estes para o castigo eterno...” (Mt 25, 46).

5. A Igreja Católica Apostólica Romana sempre ensinou a existência do Inferno e a condenação de quem morre em pecado mortal: “As almas daqueles que saem do mundo em pecado mortal atual, imediatamente depois da sua morte descem ao Inferno, onde são atormentadas com penas infernais” (Bento XII, Constituição “Benedictus Deus”, Dz. 531), e: “Há de julgar os vivos e os mortos, cada um segundo os seus méritos: os que corresponderem ao Amor e à Misericórdia de Deus, indo para a vida eterna; os que os recusaram até o fim, indo para o fogo que não se extinguirá jamais” (Paulo VI), e também: “A Igreja, mantendo-se fiel ao Novo Testamento e à Tradição, crê no castigo eterno que espera o pecador, o qual será privado da visão de Deus, e na repercussão desta pena em todo o seu ser” (Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé).

 

II. Como começou o inferno?

 

O Pe. Leo J. Trese escreve: “Deus fez os anjos com livre arbítrio para que fossem capazes de fazer o seu ato de amor a Deus, de escolher Deus. Só depois é que o veriam face a face; só então poderiam entrar nessa união eterna com Deus a que chamamos ‘céu’. Deus não nos deu a conhecer a espécie de prova a que submeteu os anjos. Muitos teólogos pensam que Ele deu aos anjos uma visão prévia de Jesus Cristo, o Redentor da raça humana, e lhes mandou que o adorassem...: Jesus Cristo em todas as suas humilhações, uma criança no estábulo, um criminoso na cruz. Segundo esta teoria, alguns anjos se teriam rebelado ante a perspectiva de terem que adorar Deus encarnado. Conscientes da sua própria magnificência espiritual, da sua beleza e dignidade, não quiseram fazer o ato de submissão que a adoração a Jesus Cristo lhe pedia. Sob a chefia de um dos anjos mais dotados, Lúcifer, ‘Portador da luz’, o pecado de orgulho afastou de Deus muitos anjos, e o terrível grito ‘não servirei’, percorreu os céus. E assim começou o inferno. Porque o inferno é, essencialmente, a separação de Deus de um espírito”.

 

III. Penas do inferno

 

As penas do Inferno são:

 

1.º Pena de dano

 

A privação de todo o bem: de todo o repouso, alegria, amor e esperança; e em especial a privação de Deus. É a chamada “pena de dano”.

A privação da visão de Deus é chamada pena de dano, e é a mais terrível das penas do Inferno: “A privação e a perda da glória de Deus é a mais terrível pena do inferno” (São Francisco de Sales), e: “O maior suplício do inferno é a pena de dano” (Santo Afonso Maria de Ligório).

De fato, priva os condenados para sempre de Deus, o Bem infinito para o qual fomos criados; e, privando-os de Deus, priva-os de qualquer outro bem e felicidade.

O condenado já não pode mais amar a Deus; então o seu amor transforma-se em ódio contra Deus, contra si mesmo e contra todos.

Santo Afonso Maria de Ligório escreve: “O verdadeiro inferno é a pena de ter perdido a Deus!”, e: “Multipliquem-se os tormentos, contanto que não se prive de Deus” (São Bruno), e também: “Se os condenados gozassem da visão de Deus, não sentiriam tormento algum, e o próprio inferno se converteria em paraíso” (Santo Agostinho).

Os pecadores não fazem caso desta grande perda, porque vivem longos anos sem Deus, mergulhados em trevas. Na hora da morte, entretanto, reconhecerão a grandeza do bem que perderam: “A alma, ao partir deste mundo, reconhece que foi criada por Deus e irresistivelmente deseja unir-se e abraçar-se com o Bem Supremo; achando-se, porém, em estado de pecado, Deus a repele” (Santo Antonino), e: “A alma ao separar-se do corpo se sente naturalmente atraída para Deus. O pecado, porém, a afasta...” (Santo Afonso Maria de Ligório).

Todo o inferno, pois, se resume nas primeiras palavras da sentença: “Apartai-vos de mim, malditos...” (Mt 25, 41).

Apartai-vos, dirá o Senhor, não quero que torneis a ver-me a face: “Mesmo que se imaginassem mil infernos, nada se poderia conceber que equivalesse à pena de ser odiado por Cristo” (São João Crisóstomo).

O condenado odiará a Deus eternamente; e esse há de ser o seu maior tormento: conhecer que Deus é o Sumo Bem, digno de infinito amor, e ver-se forçado a aborrecê-Lo para sempre: “O condenado odiará e amaldiçoará a Deus e amaldiçoando-o, amaldiçoará também os benefícios que dele recebeu, a criação, a redenção, os sacramentos, especialmente os do batismo e da penitência, e, sobretudo, o Santíssimo sacramento do Altar. Aborrecerá todos os anjos e com ódio implacável o seu anjo da guarda, os seus santos padroeiros e a Virgem Santíssima. Malditas serão por ele as três Pessoas divinas, especialmente a Jesus Cristo, que morreu para salvar-nos, e as chagas, os trabalhos, o sangue, paixão e morte de Cristo Jesus” (Santo Afonso Maria de Ligório).

 

2.º Pena de sentido

 

O sofrimento de todo o mal e dor. A Sagrada Escritura chama-lhe “lugar de tormentos” e especialmente insiste no suplício do fogo. Denomina-se “pena de sentido”.

A pena de sentido consiste no fogo e outros tormentos que os condenados sofrerão. Chama-lhe a Sagrada Escritura fogo voraz e inextinguível; “fogo que nunca se apaga”, repete Cristo em (Mc 9, 48) “... onde o verme não morre e onde o fogo não se extingue”.

As penas do Inferno serão iguais em duração para todos os condenados, pois são eternas; mas, quanto à intensidade, serão diferentes, de acordo com a gravidade dos pecados e com o abuso das graças recebidas.

O inferno é cárcere fechado por completo e escuro, onde nunca penetrará raio de sol nem qualquer outra luz: “Ele vai juntar-se à geração dos seus pais, que nunca mais verá a luz” (Sl 48, 20).

A vista padecerá o tormento das trevas: “Antes de partir, sem nunca mais voltar, para a terra de trevas e sombras” (Jó 10, 21).

Santo Afonso Maria de Ligório escreve: “Haverá no inferno apenas a claridade precisa para aumentar os tormentos. Uma claridade que permite ver a fealdade dos condenados e dos demônios, assim como o aspecto horrendo que estes tomarão para causarem mais horror”.

O olfato do condenado padecerá o seu tormento próprio: “O condenado deve ficar sempre entre milhões de condenados, vivos para a pena, mas cadáveres hediondos quanto à pestilência que exalam” (Idem.).

São Boaventura escreve: “Se o corpo de um condenado saísse do inferno, bastaria ele só para produzir uma infecção em consequência da qual morreriam todos os homens do mundo”.

O condenado sofrerá também pelos gritos de desespero de milhões de réprobos: “O ouvido será atormentado com os contínuos gritos aflitivos daqueles pobres desesperados, e pelo barulho horroroso que, sem cessar, os demônios provocam” (Santo Afonso Maria de Ligório), e: “... o ímpio escuta ruídos que o espantam” (Jó 15, 21).

O membro que o condenado mais usou para pecar será o mais atormentado. A fome o castigará... também a sede: “A gula será castigada com a fome devoradora. Entretanto, não haverá ali nem uma migalha de pão. O condenado sofrerá sede abrasadora que não se apagaria com toda a água do mar. Mas não se lhe dará uma só gota. Uma só gota d’água pedia o rico avarento, e não a obteve e nem a obterá jamais” (Santo Afonso Maria de Ligório).

As faculdades da alma terão também o seu castigo apropriado: “O tormento da memória será a viva recordação do tempo que, em vida, teve o condenado para salvar-se e que empregou em perder-se, e das graças que Deus lhe concedeu e que foram desprezadas. O entendimento sofrerá ao considerar o grande bem que perdeu perdendo a Deus e o céu, ponderando que essa perda é já irreparável. A vontade verá que se lhe nega tudo quanto deseja. O condenado nunca obterá nada do que quer, e sempre terá aquilo que mais o aborreça, isto é, males sem fim. Quererá livrar-se dos tormentos e desfrutar paz. Mas sempre será atormentado, jamais encontrará momento de repouso” (Idem.).

A pena do sentido que mais atormenta aos condenados é o fogo do inferno: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno preparado para o diabo e para os seus anjos” (Mt 25, 40).

Inferno: separação de Deus... lugar de maldição e fogo... fogo eterno... morada dos demônios.

Há diferença do fogo aqui da terra com o fogo do inferno:  “Comparando com o fogo do inferno, as chamas aqui da terra parecem fogo pintado” (Santo Agostinho), e: “... como se a nossa chama fosse de gelo” (São Vicente Ferrer), e também: “E a razão consiste em que o fogo terreal foi criado para utilidade nossa, ao passo que o do inferno foi criado expressamente para o castigo” (Santo Afonso Maria de Ligório), e ainda: “Muito diferentes são o fogo que se utiliza para o uso do homem e o que serve para a justiça de Deus” (Tertuliano), e: “O fogo do inferno é real, mas não se assemelha ao fogo que conhecemos, incapaz de exercer qualquer ação sobre um espírito, sobre a alma. Significa, pois, um queimor interior muito grande, semelhante ao sofrimento que experimentamos pelo remorso ou pelo desespero” (Monge Edouard Clerc).

O condenado estará dentro dessas chamas, envolvido por elas, como um pedaço de lenha numa fornalha. Terá um abismo de fogo debaixo de seus pés, imensas massas de fogo sobre sua cabeça e ao derredor de si... Estará submergido em fogo como o peixe em água. E essas chamas não cercarão apenas o condenado, mas penetrarão nele, em suas próprias entranhas para atormentá-las. Todo o corpo será pura chama; arderá o coração no peito; as vísceras, no ventre; o cérebro, na cabeça; nas veias, o sangue e a medula, nos ossos.

Cada condenado converter-se-á numa fornalha ardente: “Deles farás uma fornalha no dia da tua face: Deus os engolirá em sua ira, um fogo os devorará” (Sl 20, 10).

Santo Afonso Maria de Ligório diz que o condenado padecerá o tormento da imobilidade: “Da maneira como o condenado cair no inferno, assim há de permanecer imóvel, sem que lhe seja dado mudar de posição, nem mexer mão nem pé, enquanto Deus for Deus”.

 

IV. Eternidade do inferno

 

A eternidade das penas do Inferno é dogma de fé definido pela Igreja, e consta em muitos lugares da Sagrada Escritura: “Ide, malditos, para o fogo eterno” (Mt 25, 41), e: “E irão estes para o castigo eterno” (Mt 25, 46), e também: “O castigo deles será a ruína eterna, longe da face do Senhor e do esplendor de sua majestade” (1 Ts 1, 9).

A eternidade das penas não contradiz a misericórdia divina, porque, se esta é infinita, também é infinita a sua justiça: “Deus é clemente, mas também é justo” (Santo Afonso Maria de Ligório), e: “Não haverá também por que ter pena dos que se perdem, pois receberam nesta vida – na medida adequada para eles – graça suficiente para se salvarem: foram eles próprios que rejeitaram a misericórdia de Deus, que não lhes faltou. Todos os homens podem salvar-se, porque Cristo morreu por todos, e Deus não pratica nenhum tipo de segregação. Os que forem condenados, sê-lo-ão de acordo com toda a justiça: serão eles que o terão querido até o fim, porque não pode haver qualquer assomo de injustiça em Deus. É preciso ter isto sempre presente, sem tentar atenuar o rigor da justiça por uma falsa misericórdia: não haverá nenhuma ‘anistia final’, porque toda a ‘anistia’ já foi incansavelmente oferecida por Deus na vida terrena” (Monge Edouard Clerc).

Para evitar o Inferno devemos pensar com frequência na eternidade das suas penas, a fim de fomentarmos na nossa alma o temor de Deus e o cumprimento dos seus mandamentos.

Aquele que entrar uma vez no inferno jamais sairá de lá. Apenas um condenado cai naquele poço de tormentos, fecha-se sobre ele a entrada para nunca mais se abrir: “No inferno só há porta para entrar e não para sair” (Santo Eusébio).

O que é a eternidade? Nesse mundo paganizado em que vivemos quase ninguém sabe definir a eternidade.

O Pe. Alexandrino Monteiro a explica: “Imagina uma coluna de bronze que chegue da terra ao céu, e supõe que, de mil em mil anos, uma avezinha vem roçá-la de leve com o bico por ela abaixo: quando essa coluna estiver gasta, a eternidade ainda estará no seu princípio!”

O mesmo sacerdote também escreve: “Vai à praia do mar, toma um punhado de areia e vê se podes contar os grãos que tens abarcados na mão. Supõe agora que uma ave baixe do céu e leve de mil em mil anos um grão de areia no bico: quando a tiver transportado toda, a eternidade estará ainda no seu princípio!”

Esse sacerdote ainda escreve: “Já viste, de certo, o mar. Pensa agora que, de século em século, se evapora uma gota desse grande reservatório d’água. Pois bem: quando se começar a descobrir o fundo do oceano, a eternidade estará ainda no seu princípio!”

Santo Afonso Maria de Ligório escreve: “Infeliz Judas! Há mais de mil e novecentos anos que já está no inferno e, não, obstante, se diria que seu castigo apenas está no princípio!”

 

 

 

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