Instituto Missionário dos Filhos e Filhas da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e das Dores de Maria Santíssima

 

 

Segunda palestra

 

 

Cura da filha de uma mulher cananéia

(Mt 15, 21-28)

 

Em Mt 15, 21-28 diz: “Jesus, partindo dali, retirou-se para a região de Tiro e de Sidônia. E eis que uma mulher cananéia, daquela região, veio gritando: 'Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim: a minha filha está horrivelmente endemoninhada'. Ele, porém, nada lhe respondeu. Então os seus discípulos se chegaram a ele e pediram-lhe: 'Despede-a, porque vem gritando atrás de nós'. Jesus respondeu: 'Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel'.  Mas ela, aproximando-se, prostrou-se diante dele e pôs-se a rogar: 'Senhor, socorre-me!'  Ele tornou a responder: 'Não fica bem tirar o pão dos filhos e atirá-lo aos cachorrinhos'.  Ela insistiu: 'Isso é verdade, Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos!'  Diante disso, Jesus lhe disse: 'Mulher, grande é a tua fé! Seja feito como queres!' E a partir daquele momento sua filha ficou curada”.

 

Em Mt 15, 21 diz: “Jesus, partindo dali, retirou-se para a região de Tiro e de Sidônia”.

 

Tiro (hebr. çôr, relativo a açur, “a rocha”). Cidade da Fenícia, a atual Sur, a cerca de 80 km ao sul de Beirute. A antiga Tiro consistia de duas cidades, a cidade insular e a do continente. Parece quase certo que Tiro existia pelos anos 2100 a. C.

Sidônia (hebr. çîdon significado incerto). Cidade da Fenícia, localizada na moderna Saida, a cerca de 52 km ao sul de Beirute e a 46 km ao norte de Tiro. A cidade moderna cobre as ruínas da antiga Sidônia. Sidônia já existia na primeira parte do II milênio a.C. Sidônia era um império comercial com uma cidade de mercados e colônias no continente da Ásia. 

Fenícia (gr. phoenike, “carmesim”, “purpúrea”). Nome geográfico; a faixa costeira da Síria e do Líbano modernos, de Jebel Akra, o antigo monte Casio, ao monte Carmelo, com o comprimento de cerca de 400 km. A antiga Fenícia incluía apenas a faixa costeira e a encosta oeste das montanhas e não se estendia para o interior. A região é bem regada de água; tem apenas cinco meses de seca durante o ano e possui numerosos rios alimentados pela neve das montanhas.

Os fenícios eram um povo semita, idênticos aos cananeus e parentes dos israelitas.

São Jerônimo escreve: “O Salvador, depois de abandonar os fariseus e os caluniadores, passou para o território de Tiro e Sidônia para curar os seus habitantes, e por isso diz: 'E saindo Jesus dali, foi para Tiro e Sidônia”, e: “Tiro e Sidônia eram cidades habitadas pelos gentios. Porque Tiro era a metrópole dos cananeus e Sidônia, o limite” (Remígio), e também: “É digna de atenção a conduta do Senhor, o qual afastou os judeus da observância sobre os alimentos e abriu a porta aos gentios. Assim também Pedro recebeu, numa visão, a ordem de abolir essa lei, e imediatamente foi enviado a Cornélio (At 10, 5). Porém, se alguém pergunta: como é que depois de haver dito o Senhor a seus discípulos que não fossem pelos caminhos dos gentios, agora Ele mesmo vai por esse caminho? Responderemos em primeiro lugar, que o Senhor não estava sujeito ao preceito que deu aos discípulos, e, além disso, porque não foi ali para pregar e por isso disse São Marcos (Mc 7, 24) que se ocultou a si mesmo” (São João Crisóstomo), e ainda: “Foi ali para curar os habitantes de Tiro e de Sidônia, ou seja, para livrar do demônio a filha dessa mulher e condenar, por sua fé, a perversidade dos escribas e dos fariseus. Dessa mulher disse o evangelista: 'Está aqui uma mulher cananéia, que havia saído daqueles limites” (Remígio).

Nosso Senhor dirigiu-se com os apóstolos em direção noroeste, atravessando a parte superior da Galiléia. Assim chegou ao Líbano, à região de Tiro e Sidônia, fora da autoridade de Herodes; pertencia à Fenícia, convertida em província romana e unida à Síria nos dias de Pompeu (64 a. C). Era uma região pagã e, segundo o historiador Flávio Josefo (Contra Apión, 1, 13), hostil aos judeus.

Edições Theologica comenta: “Tiro e Sidônia são duas cidades fenícias, na costa do Mediterrâneo, atualmente pertencentes ao Líbano. Nunca fizeram parte da Galiléia, mas encontram-se perto da fronteira noroeste desta região. Portanto, no tempo de Jesus estavam fora dos domínios de Herodes Antipas. Para ali se retira o Senhor para evitar a perseguição deste e dos judeus, e atender de modo mais intenso à formação dos seus Apóstolos. Na região de Tiro e Sidônia a maioria dos habitantes era pagã. São Mateus chama a esta mulher 'cananéia'. Segundo o Gênesis 10, 18-19, esta região foi uma das principais colônias dos Cananeus; São Marcos 7, 26, chama sírio-fenícia a esta mulher. Ambos os Evangelhos põem em realce a sua condição de pagã, com o que adquire maior relevo a sua fé no Senhor, como aconteceu também no caso do centurião, Mt 8, 5-13”.

Nosso Senhor se retira para a região de Tiro e Sidônia, para evitar a perseguição de Herodes e dos judeus.

Cabe a nós imitarmos o exemplo de Cristo Jesus. Não devemos perder tempo dando atenção aos nossos perseguidores; pelo contrário, desprezemos os seus ataques e continuemos a fazer o bem.

Às vezes é necessário até partirmos para regiões distantes, como aconteceu com Nosso Senhor; mas o importante é perseverarmos no bem.

 

Em Mt 15, 22 diz: “E eis que uma mulher cananéia, daquela região, veio gritando: 'Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim: a minha filha está horrivelmente endemoninhada”.

 

São João Crisóstomo escreve: “O evangelista a chama cananéia, a fim de fazer notar a influência que nela exercia a presença de Cristo. Os cananeus que haviam sido expulsos para que não corrompessem os judeus, se mostraram nesta ocasião mais sábios que os judeus, saindo fora de suas fronteiras e aproximando-se de Cristo. Mas esta mulher, logo que se aproximou de Cristo, não Lhe pediu mais que misericórdia. Por isso segue: 'E chamava dizendo-Lhe: Senhor, filho de Davi, tende piedade de mim”, e: “Grande fé se nota nestas palavras da cananéia: acreditava na divindade de Cristo quando O chama Senhor, e em sua humanidade quando Lhe diz filho de Davi. Ela não pede nada em nome de seus merecimentos, invoca só a misericórdia de Deus, dizendo: 'Tende piedade'. E não disse, tende piedade de minha filha, mas de mim, porque a dor da filha é a dor da mãe; e a fim de movê-Lo à compaixão, Lhe conta toda a sua dor. Por isso segue: 'Minha filha está horrivelmente atormentada pelo demônio'. Nestas palavras, ela descobre suas feridas ao médico e a grandeza e características de sua enfermidade. A grandeza, quando disse: 'É atormentada horrivelmente', e as características pelas palavras: 'pelo demônio” (Glosa).

A intenção do Senhor era de permanecer oculto naquela região, mas não foi possível: “Saindo dali, foi para o território de Tiro. Entrou numa casa e não queria que ninguém soubesse, mas não conseguiu permanecer oculto” (Mc 7, 24).

Uma mulher cananéia, pagã, “ouviu falar dele” (Mc 7, 25), e entrou na casa onde estava Cristo Jesus.

Aquela mulher não se intimidou diante das pessoas ali presentes, não deixou para depois nem pediu em voz baixa; mas prostrando-se aos pés de Nosso Senhor gritava: “Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim: a minha filha está horrivelmente endemoninhada”.

A oração dessa mulher é perfeita. Ela reconhece Jesus como Messias (Filho de Davi): “Perante a incredulidade dos judeus, expõe a sua necessidade com palavras claras e simples, insiste sem desanimar diante dos obstáculos e exprime humildemente a sua petição: Tem compaixão de mim” (Edições Theologica).

Aprendamos da cananéia a rezar com fé, confiança, perseverança e humildade: “O Senhor atendeu a oração dos humildes” (Sl 101, 18), e: “Deus resiste aos soberbos e dá a graça aos humildes” (Tg 4, 6), e também: “Deus não houve as orações dos soberbos que confiam na própria força e por isso abandona-os às suas misérias” (Santo Afonso Maria de Ligório), e ainda: “Só nos vasos da confiança o Senhor coloca o azeite de sua misericórdia” (São Bernardo de Claraval), e: “Aproximemo-nos com confiança do trono da graça a fim de alcançarmos misericórdia e de acharmos graça para sermos socorridos oportunamente” (Hb 4, 16), e também: “É, pois, necessário que rezemos com humildade e confiança. Entretanto, isto só não basta para alcançarmos a perseverança final e, com ela, a salvação eterna. As graças particulares que pedimos a Deus, podemos obtê-las por meio de orações particulares. Mas, se não perseverarmos na oração, não conseguiremos a perseverança final, a qual compreende uma cadeia de graças e, por isso, supõe orações repetidas e continuadas até à morte” (Santo Afonso Maria de Ligório).

 

Em Mt 15, 23 diz: “Ele, porém, nada lhe respondeu. Então os seus discípulos se chegaram a ele e pediram-lhe: 'Despede-a, porque vem gritando atrás de nós”.

 

São Jerônimo escreve: “E não lhe responde, não por um ato de soberba semelhante à dos judeus, nem pelo orgulho próprio dos escribas, mas por não parecer que estavam em contradição sua conduta e essas palavras: 'Não andeis pelos caminhos dos gentios' (Mt 10, 5). Não queria dar motivo para que O caluniassem e reservava para o tempo de sua paixão e ressurreição a completa salvação dos gentios”, e: “Com essa demora e falta de resposta, o Senhor nos manifesta a paciência e a perseverança da mulher. Também foi uma das causas para não responder: Ele quis que os discípulos suplicassem por ela, a fim de fazer-nos ver a necessidade da súplica para conseguir algo dos santos. Por isso segue: 'E chegando os discípulos, lhe suplicavam” (Glosa), e também: “Os discípulos, que ainda não sabiam nesse tempo os mistérios de Deus, suplicavam pela mulher cananéia, ou movidos à compaixão ou porque desejavam livrar-se de sua insistência” (São Jerônimo), e ainda: “Parece existir uma espécie de contradição entre o que foi dito anteriormente e a narração de São Marcos, que disse que quando veio a mulher a suplicar por sua filha, se encontrava o Senhor numa casa. Pode crer-se que São Mateus não falou da casa e, contudo, contou o mesmo trecho. Porém, como ele refere que os discípulos disseram ao Senhor: 'Despede-a, porque vem gritando atrás de nós', parece indicar que a mulher dirigiu suas súplicas ao Senhor, quando Ele andava. Deve, pois, entender-se esta passagem neste sentido: A mulher entrou na casa onde estava o Senhor, posto que São Marcos disse que o Senhor estava em uma casa; porém, depois das palavras que refere São Mateus: 'E não a respondeu'. Durante esse tempo de silêncio (posto que nenhum evangelista disse se continuou o Senhor na casa) é de acreditar que o Senhor saiu daquela casa. Assim se enlaça tudo perfeitamente e desaparece toda diferença entre ambos evangelistas” (Santo Agostinho), e: “Eu presumo que se entristeceram os discípulos diante da desgraça da mulher, porém não se atreveram a dizer: Dá-lhe essa graça, coisa que nos sucede com frequência. Quando queremos persuadir a alguém, lhe dizemos muitas vezes o contrário do que queremos. Mas, Jesus respondeu: 'Não fui enviado senão às ovelhas de Israel” (São João Crisóstomo), e também: “Veja a sabedoria dessa mulher. Não pediu aos homens sedutores, nem buscou fórmulas vãs, mas, deixando todas as superstições diabólicas aproximou-se do Senhor. Não pediu a Tiago, nem suplicou a João, nem se aproximou de Pedro; mas, amparada na proteção da penitência, correu sozinha ao Senhor… Pede e manifesta com gritos sua dor ao Senhor que tanto ama aos homens; o Senhor não lhe responde e por isso segue: 'E Ele não lhe respondeu” (Orígenes).

A cananéia gritava pedindo ajuda a Nosso Senhor; mas Ele que atendia e dialogava com todos, nesta ocasião nada respondeu: “Olhou para ela e não disse nada… Dá a impressão de não fazer o menor caso dela. Mas ela não desanimou. Pelo contrário, continuou a clamar e a pedir, inclusive quando saíram da casa onde se encontravam. Ela seguiu-os com os seus gritos e as suas vozes” (Pe. Francisco Fernández Carvajal).

O Senhor ia à frente e logo atrás caminhava a mulher, aos gritos, pedindo a sua ajuda.

Cristo Jesus ficara calado, mas ela não. Ela precisava que Ele a ajudasse, e não queria que o Senhor fosse sem dar-lhe a ajuda.

Sabemos que Cristo atende aos que Lhe pedem com fé, confiança, humildade e perseverança; por isso, não desistamos nunca, mas a exemplo da cananéia, peçamos a Nosso Senhor tudo aquilo de que necessitamos: “Somos pobres, mas, se pedirmos, já não somos mais pobres. Se nós somos pobres, Deus é rico. E Deus é imensamente liberal” (Santo Afonso Maria de Ligório), e: “Peçamos-lhe não coisas pequenas e vis, mas, sim, coisas grandes” (Santo Agostinho), e também: “O Senhor sente-se honrado com isso e fica tão consolado com as nossas orações, que até, de certo modo, nos agradece. Porque assim abrimos-lhe o caminho de seus benefícios; pois o seu desejo é fazer o bem a todos. E podemos estar certos de que, quando pedimos alguma graça, recebemos sempre mais do que pedimos” (Santa Maria Madalena de Pazzi).

A cananéia não parava de gritar e de insistir com o Senhor. Os discípulos, ouvindo tal gritaria, disse a Cristo Jesus: “Despede-a, porque vem gritando atrás de nós”.

Dom Duarte Leopoldo escreve: “É de estranhar, à primeira vista, que Jesus, habitualmente tão bom, tão compassivo, tenha assim repelido, com tanta dureza, a esta pobre mãe. Quem, porém, conhece o Coração do Divino Mestre, adivinha logo que se trata de um grande mistério a realizar-se, de uma lição proveitosa a receber. Os discípulos intercedem por esta mulher condoídos da sua aflição. Não prova isto que é legítima a intercessão dos Santos? Se o Divino Mestre não atendeu à súplica dos discípulos, não foi porque a condenasse, senão por outros motivos”.

Milhões são os católicos que sofrem precisando da ajuda de Nosso Senhor. Cabe aos sacerdotes, ministros de Deus, pedirem a Cristo Jesus que socorra essas pessoas necessitadas.

Se o sacerdote estiver envolvido com política e com outras coisas terrenas, com certeza o povo viverá na amargura.

 

Em Mt 15, 24 diz: “Jesus respondeu: 'Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”.

 

Estas palavras de Jesus não contradizem a universalidade da sua doutrina e da salvação. Ele veio trazer o seu Evangelho a todo o mundo, mas diretamente só pregaria principalmente aos judeus. Logo, os seus discípulos de todos os tempos, por mandato de Cristo, encarregar-se-iam de evangelizar o mundo inteiro. O próprio São Paulo, nas suas viagens missionárias, pregou primeiro aos judeus (At 13, 46). Além disso, isto não quer dizer que Jesus não atendesse os gentios. Nos próprios Evangelhos vemos que curou alguns deles, que fez grandes elogios do centurião de Cafarnaum, e que doutrinou os samaritanos, tidos pelos judeus como gentios.

Dom Duarte Leopoldo escreve: “Jesus não disse que o Messias só vinha salvar o povo judeu, mas que fora enviado, principalmente, à casa de Israel. Aos seus discípulos caberia, mais tarde, a missão de evangelizar os pagãos”, e: “Não disse isto porque não fora enviado às demais nações, mas para indicar que foi a Israel, aonde primeiramente havia sido enviado, e depois que este povo rejeitasse o Evangelho, o Evangelho passaria com justiça aos gentios” (São Jerônimo), e também: “Foi enviado particularmente ao povo de Israel, para que este recebesse sua doutrina até com sua presença visível” (Remígio), e ainda: “E disse com determinação: 'Às ovelhas perdidas de Israel', para que com estas palavras compreendamos o significado da ovelha perdida de que se fala em outra parábola (Lc 15)” (São Jerônimo).

 

Em Mt 15, 25-27 diz: “Mas ela, aproximando-se, prostrou-se diante dele e pôs-se a rogar: 'Senhor, socorre-me!' Ele tornou a responder: 'Não fica bem tirar o pão dos filhos e atirá-lo aos cachorrinhos'. Ela insistiu: 'Isso é verdade, Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos!”

 

Diante do silêncio de Nosso Senhor, a cananéia continuou a gritar. Agora diante das palavras de Cristo: “Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”, continua a insistir; não desanima nem se afasta, mas “… aproximando-se, prostrou-se diante dele e pôs-se a rogar: 'Senhor, socorre-me!”

São João Crisóstomo escreve: “Porém, vendo a mulher que nada podiam os apóstolos, perdeu a vergonha, feliz vergonha! Antes, não se atrevia a apresentar-se diante do Senhor. Por isso segue: '… vem gritando atrás de nós'. Mas quando parecia que se retiraria cheia de angústia, então se aproxima mais do Senhor. Por isso segue: 'Mas ela veio e O adorou”, e: “Note como esta mulher cananéia O chama com perseverança filho de Davi, em seguida Senhor e por último O adora” (São Jerônimo), e também: “E por isto não disse: Roga ou suplica a Deus, mas, ó Senhor, ajuda-me. E quanto mais aumentava a mulher suas súplicas, menos Ele as atendia. E não chama ovelhas aos judeus, mas filhos. Mas chama-a de cão. 'E Ele respondendo disse: não fica bem…” (São João Crisóstomo), e ainda: “Filhos, são os judeus gerados e alimentados no culto de um só Deus pela lei. Seu pão são o Evangelho, os milagres e tudo quanto pertence a nossa salvação. Não é, pois, conveniente que se tirem todas estas coisas dos filhos e se dêem aos gentios (que são os cachorros), enquanto são repudiados pelos judeus” (Glosa), e: “Os gentios são chamados cachorros por causa de sua idolatria, e os cachorros bebendo sangue e devorando os cadáveres se voltam raivosos” (Rábano), e também: “Olhe a sabedoria da mulher! Não se atreveu a contradizer, nem se entristeceu pelos louvores dos outros, nem se abateu pelas coisas sensíveis que a lançaram no rosto. Por isso segue: 'Mas ela disse: É verdade, Senhor; porém também os cachorros comem das migalhas que caem das mesas de seus senhores'. Cristo havia dito: 'Não fica bem…' e esta disse: 'Assim é, Senhor'. Cristo chama os judeus de filhos e ela os chama de senhores. Ele chama a mulher de cachorro e ela acrescentou a qualidade dos cachorros, como se dissera: se sou cachorro, não sou estranha; me chama de cachorro, alimenta-me o Senhor como a um cachorro. Eu não posso abandonar a mesa do meu Senhor” (São João Crisóstomo), e ainda: “São louvadas a fé, a humildade e a paciência admiráveis desta mulher. A fé, porque acreditava que o Senhor podia curar sua filha. A paciência, porque fora desprezada muitas vezes e outras tantas persevera em suas súplicas. A humildade, porque não só se compara aos cachorros, mas aos cachorrinhos. Disse que eu não mereço o pão dos filhos, nem posso tomar seus alimentos, nem sentar-me à mesa com o pai; porém, me contento com o que é dado aos cachorrinhos, a fim de chegar, mediante minha humildade, até a mesa onde se serve o pão inteiro” (São Jerônimo).

O Pe. Francisco Fernández Carvajal comenta: “O Senhor não parece facilmente disposto a realizar milagres fora de Israel. Provavelmente encontrava-se de novo na casa, à mesa. A mulher seguiu-os todo o tempo. Diz então a esta pagã que não fica bem tomar o pão dos filhos e dá-lo aos cachorrinhos. Evidentemente, os filhos são os judeus e os cachorrinhos são os pagãos. E esta mulher, que foi proposta como exemplo para as almas que não se cansam de pedir, introduz-se com suma humildade e habilidade na semelhança que acaba de ouvir dos lábios do Mestre e conquista o seu coração: Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos. Ela considera-se um cachorrinho que se alimenta das migalhas que caem da mesa do seu senhor. Reconhece a superioridade do povo escolhido e a sua falta de méritos, mas confia na misericórdia de Cristo, para quem conceder esta graça é como permitir que um cachorrinho coma as migalhas da sua mesa. Com esta argumentação, não pode já Jesus continuar com a sua fingida dureza”.

 

Em Mt 15, 28 diz: “Diante disso, Jesus lhe disse: 'Mulher, grande é a tua fé! Seja feito como queres!' E a partir daquele momento sua filha ficou curada”.

 

São João Crisóstomo escreve: “Por esta razão, se prolongava o Senhor. Ele sabia que ela lhe falava dessa maneira e não queria que ficasse oculta tão grande virtude. Por isso segue: 'Então respondeu Jesus e lhe disse: 'Ó mulher, grande é sua fé: seja feito como queres!' Como se dissera: tua fé pode conseguir coisas maiores que estas, porém, seja feito como queres. Observe que esta mulher influiu não pouco na cura de sua filha, por isso não disse Cristo: Seja curada tua filha, mas: 'Tua fé é grande: seja feito como queres'. Desta maneira nos dá a entender a simplicidade de coração com que falava essa mulher, não para adular ao Senhor, mas para manifestar-lhe sua grande fé. Esta palavra de Cristo é parecida àquela outra: 'Faça o firmamento e ele foi feito' (Gn 1, 6). Por isso segue: 'E desde aquela hora foi curada sua filha'. Olha como alcança a mulher o que não obtiveram os apóstolos. Tão grande poder tem a insistência na oração! Deus prefere que lhe dirijamos a Ele nossas súplicas por nossos pecados, do que valermos das súplicas dos outros”, e: “Estas palavras nos dá um exemplo da necessidade que há de catequizar e batizar as crianças. Porque não disse a mulher: salva a minha filha, ou ajuda-a, mas sim, tem compaixão de mim e ajuda-me. Daqui vem o costume da Igreja de prometer aos fiéis a fé em Deus no lugar de seus filhos pequenos, por não ter estes a razão e a idade suficientes para fazer a Deus essa promessa; e assim, como pela fé dessa mulher foi curada sua filha, assim também, pela fé dos fiéis, se perdoam os pecados das crianças. Esta mulher significa, em sentido alegórico, a Igreja Santa, formada por todas as nações. A vinda do Senhor, depois de abandonar os escribas e os fariseus, ao território de Tiro e Sidônia, nos figura o abandono em que depois deixaria aos judeus e que se passaria aos gentios. E saiu esta mulher dos confins de sua terra, porque a Igreja Santa saiu dos erros e vícios antigos” (Remígio), e também: “Penso que a filha da cananéia representa as almas dos fiéis, que eram cruelmente maltratadas pelo demônio, quando não conheciam o seu Criador e adoravam as pedras” (São Jerônimo), e ainda: “O Senhor indica com a palavra 'filhos' aos patriarcas e profetas daquele tempo; com a palavra 'mesa', a Sagrada Escritura, e com 'migalhas', os preceitos leves ou os mistérios íntimos que dão o alimento à Igreja, e com 'casca', os preceitos carnais que observavam os judeus. Diz-se que é comida as migalhas que estão debaixo da mesa, porque a Igreja se submete com humildade ao cumprimento dos preceitos divinos” (Remígio), e: “Os cachorros pequenos não comem as cascas, mas as migalhas do pão das crianças, porque os que eram desprezados entre as nações, convertendo à fé, buscam, não a superfície literal da Escritura, mas o sentido espiritual, com o que pode adiantar em suas boas obras” (Rábano), e também: “Com razão se chama grande a essa fé, porque as nações, sem haver sido imbuídas na lei, nem haver sido instruídas pelos profetas, obedeceram prontamente às primeiras palavras que lhes dirigiam os apóstolos, por cuja obediência mereceram a salvação, e sem o Senhor, adia a salvação de suas almas e não atende às primeiras súplicas da Igreja; nunca essas almas devem desesperar-se ou deixar de suplicar, mas ao contrário, devem insistir em suas preces” (Idem.), e ainda: “O não vir o Senhor às casas do filho do centurião e da cananéia, significa que as nações onde Ele não fora, alcançaram a salvação por meio de sua palavra. A cura do filho do centurião e da filha da mulher cananéia, mediante as súplicas de seus pais, é figura da Igreja que é mãe de todos os membros que são seus filhos. Porque a chama mãe de todos os homens que a compõem e estes levam o nome de filhos” (Santo Agostinho), e: “Ou também, esta mulher, que saiu dos limites de seu território, é a primeira dos prosélitos. É dizer, saiu dentre as nações para ir ao meio do povo que lhe era estranho; suplica por sua filha (isto é, pela gente humilde das nações, submetidas à dominação do espírito imundo) e chama ao Senhor, filho de Davi, porque o conhecia pela lei” (Santo Hilário), e também: “Afinal, se alguém manchou a consciência pela imundície de algum vício, esse tem, indubitavelmente, a sua filha horrivelmente atormentada pelo demônio, e se alguém tem corrompido suas boas obras com o veneno do pecado, esse também tem sua filha agitada pelas fúrias do espírito impuro e necessita, por conseguinte, de recorrer com súplicas e lágrimas e pedir a intercessão e o auxílio dos santos” (Rábano).

A filha ficou sã naquele instante. A sua perseverança e a sua humildade tinham vencido. A mãe encontrou pouco depois a filha em casa, deitada na cama, “sem a tensão que tinha sofrido até este momento. Esta teria uma vida pela frente para agradecer a sua mãe uma segunda existência, finalmente livre. E devemos supor que procuraria mais tarde Jesus e que se converteria depressa à fé cristã. Tinha os seus bons motivos” (Pe. Francisco Fernández Carvajal).

Segundo uma tradição que remonta ao século III, ambas eram conhecidas na comunidade cristã: a mulher chamar-se-ia Justa, e a sua filha, Berenice (testemunhos nas obras duvidosas de Clemente Romano, MG 2, 87 e 158).

Edições Theologica comenta: “O diálogo é de uma beleza incomparável. Com aparente dureza Jesus consegue assegurar a fé da cananéia, que chega a merecer um dos maiores elogios que saíram da boca de Jesus: 'é Grande a tua fé!”, e: “Que perseverança na oração e na humildade a desta mulher pagã! Enquanto Jesus parece repeli-la, a sua fé aumenta cada vez mais. Advertida de que se acha na mesma relação em que estão os cães para os filhos da casa, ela replica que não pede o pão dos filhos, mas somente as migalhas que se dão aos animais. Quando a dor nos oprime, quando a nossa alma está desolada e aflita, em completa escuridão, sob os golpes do infortúnio; quando já nos parece que Deus nos abandonou, surdo às nossas súplicas, é então que é preciso rezar, rezar ainda, e não deixar de rezar. Porque as orações que fazemos nesse estado de alma, são de eficácia soberana, desprendem um perfume de fé e de confiança que alegra o Coração de Jesus. Se perseverarmos na fé, na confiança e na oração, não sairemos da prova, sem ouvir estas doces palavras - Faça-se como queres” (Dom Duarte Leopoldo).

A filha dessa mulher estava endemoninhada, e a mesma se preocupou em pedir ao Senhor que libertasse a sua filha das garras de Satanás.

Hoje, são milhares de jovens que são escravas das drogas, bebidas e prostituição. Será que as mães católicas se preocupam em pedir a Nosso Senhor que liberte suas filhas de tamanha desgraça?

Muitas mães, infelizmente, além de não ajudarem as filhas, aconselham-nas a afundarem mais e mais nas trevas do pecado.

O que essas mães dirão a Deus na hora do julgamento? Onde essas víboras passarão a eternidade?

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

 

 

 

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