Instituto Missionário dos Filhos e Filhas da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e das Dores de Maria Santíssima

 

Carta 62

 

Anápolis, 23 de julho de 2013

 

Ao Revmo. Pe. Luís Lima de Sousa

 

Estimado sacerdote, com os olhos fixos no Coração Santíssimo de Jesus Cristo, nosso Salvador, falemos para agradar a Deus e não aos homens: “Dais-vos conta do perigo que pode ser calar-se. O ímpio morre, e morre com razão; morre no seu pecado e na sua impiedade: a sua própria negligência o mata. Pois poderia ter encontrado o pastor que vive e que diz: ‘Pela minha vida, diz o Senhor...’; como foi negligente, e o que recebeu o encargo de o admoestar também o não fez; um morre justamente e o outro, justamente também, é condenado” (Santo Agostinho, Sermão 46, 20).

 

Deus lhe pague pela palestra (Quem é Deus?) dada no Santo Retiro de junho, dia 29, na Casa de Retiro Madre Beatriz de Nossa Senhora das Dores (Cidade Missionária do Santíssimo Crucifixo)-Anápolis-GO, para 90 pessoas. Obrigado pela colaboração! Precisamos de sua ajuda para o Santo Retiro de agosto/setembro que será realizado aqui na nossa Cidade Missionária; além dos brasileiros, estamos esperando bolivianos, paraguaios e argentinos.

Prezado, é pela pregação que a fé se propaga, e é também pela pregação que o Senhor quer que ela se conserve: Crê-se porque se ouve, e ouve-se porque a palavra de Jesus Cristo é pregada. Mas não basta que o cristão saiba o que tem a fazer; é necessário que se lhe recorde de quando em quando a divina palavra, se lhe mostre a importância da sua salvação eterna e os meios a empregar para consegui-la. Por isso o Apóstolo fazia a Timóteo esta recomendação: Prega a palavra; insiste a tempo e contra tempo; repreende, suplica, faze arguições; não cesses de ensinar com muita paciência.

E foi o que o próprio Deus outrora mandou a Isaías e Jeremias: Clama, não cesses, faze soar a tua voz como uma trombeta, e lança em rosto ao meu povo os seus crimes. Eis que ponho as minhas palavras na tua boca. Hoje te constituo sobre as nações e sobre os reinos, para que arranques e destruas... edifiques e plantes. A mesma obrigação impôs o Senhor aos padres, por ser a pregação uma das suas principais funções: Ide, pois, ensinai todos os povos... a observar os mandamentos que vos dei. E se algum pecador vier a perder-se, por não ter tido ninguém que lhe anuncie a palavra de Deus, o Senhor pedirá contas da sua alma ao padre que lha podia anunciar: Quando eu digo ao ímpio: Tu morrerás; se tu não o advertires, ele morrerá na sua iniquidade, mas eu te pedirei contas do seu sangue.

Para salvar, porém, as almas, não basta pregar; é necessário pregar convenientemente. Ora, a PRIMEIRA condição para bem pregar é a ciência acompanhada do estudo; quem prega ao acaso e sem preparação, faz de ordinário às almas mais mal do que bem. A SEGUNDA condição é uma conduta exemplar. Despreza-se a palavra do pregador quando se lhe despreza a vida, diz São Gregório. Lemos na Obra imperfeita: Desmentis com as vossas obras o que afirmais com as vossas palavras. Como persuadir por palavras aos outros o que se lhes dissuade pelas ações? Tudo quanto o pregador possa então dizer, só servirá para o condenar. Como diz São Paulo, a si próprio se condena quem dá exemplo do mal que censura nos outros: Não tens desculpa, ó tu, que julgas os outros! Porque, ao julgá-los, a ti mesmo te condenas. Daí a bela resposta de São João de Ávila, a quem lhe perguntava qual a regra melhor a seguir para bem pregar: Amar muito a Jesus Cristo. Um facho apagado não pode incendiar, dizia também São Gregório. É necessário que o pregador primeiro se acenda do divino amor para poder depois afervorar os outros. Dizia São Francisco de Sales: Fala o coração ao coração. Queria significar que as palavras só por si ressoam aos ouvidos, mas não penetram no coração; só aquele que prega do coração, isto é, que sente o que diz, só esse pode falar ao coração dos outros e movê-los a amar a Deus. Eis por que um pregador deve amar muito a oração para dela tirar os sentimentos que deve comunicar aos outros, conforme as palavras do Redentor: O que vos digo ao ouvido, pregai-o em público. É a oração a ditosa fornalha em que os oradores se inflamam no amor divino: Na minha meditação se ateará o fogo. Ali se preparam os dardos de fogo que penetram os corações dos ouvintes.

Além disto, é preciso que na pregação se tenha em vista um fim reto: que se pregue, não sob o impulso de algum interesse temporal, mas para a glória de Deus; não para conseguir aplausos efêmeros, mas para salvar as almas. Neste intuito, procurará o pregador acomodar-se à capacidade dos ouvintes, como ordena o Concílio de Trento: Por si próprios, ou por outros pregadores idôneos, cuidarão os párocos de apascentar as almas que lhes estão confiadas, fazendo-lhes ouvir palavras salutares e amoldadas à sua capacidade... Que pena causa ver por vezes tanta pobre gente afluir a um sermão sem colher dele nenhum fruto! Saem da igreja, tristes e desanimados, por não terem compreendido o que lhes pregaram! São João de Ávila falando dos que pregam em estilo sublime e ininteligível para seus ouvintes, dizia com razão, que são traidores de Jesus Cristo esses que, enviados a procurar-lhe a glória, só se aplicam a pregar-se a si próprios. Com não menos razão que são traidores de Jesus Cristos esses que, enviados a procurar-lhe a glória, só se aplicam a pregarem-se a si próprios. Com não menos razão, o Pe. Gaspar Sanzio lhes chamam de maiores perseguidores atuais da Igreja, porque se tornam causa da perda de muitas almas, que uma pregação simples e verdadeiramente apostólica teria salvado. O Apóstolo, que pregava animado do verdadeiro espírito de Deus, escrevia aos Coríntios: Ao pregar-vos, não me tenho servido dos discursos persuasivos da sabedoria humana, mas antes dos efeitos sensíveis do espírito e da virtude de Deus. Ao ler as vidas dos santos que trabalharam na salvação das almas, encontro muitos que foram louvados por terem pregado duma maneira simples e popular; não tenho encontrado nenhum que o fosse por haver pregado em estilo elegante e florido.

A este propósito, convirá referir aqui resumidamente o que escreveu o sábio e célebre Luís Muratori no seu livro de ouro — Da Eloquência popular. Eis o que ele diz: Há duas espécies de eloquência: uma sublime, outra popular. Com a eloquência sublime, compõem-se discursos cheios de pensamentos profundos, de argumentos engenhosos, expressões brilhantes e períodos arredondados; com a eloquência popular, expõem-se simplesmente as verdades eternas, e ensinam-se coisas ao alcance de todos os ouvintes, em estilo simples e familiar, de tal modo que cada um possa compreender tudo quanto lhe é anunciado. Nos sermões, não se fala somente a pessoas instruídas, mas a ignorantes, que de ordinário compõem a maior parte dos ouvintes. Eis porque sempre convém pregar dum modo simples e popular, não só nas missões e exercícios espirituais, mas em todos os sermões feitos ao povo. Diante de Deus, tão preciosas são as almas dos sábios como as dos ignorantes, e o pregador é obrigado a procurar a vantagem duns e doutros, indistintamente, conforme a palavra do Apóstolo: Sou devedor aos sábios e aos ignorantes. Por outro lado, mesmo aos sábios, os sermões em estilo simples e familiar são mais proveitosos, que em estilo sublime e florido; porque, quando se assiste a esses discursos brilhantes e elevados, facilmente o espírito se detém a admirá-los ou a criticá-los. O Pe. Paulo Segneri, pregando duma maneira popular, arrebatava, diz Muratori, o coração dos próprios sábios. Outro tanto acontecia com os sermões de São João Francisco Regis.

Assim, quem quer pregar, não para ser louvado, mas para ganhar almas para Deus, não deve desejar que digam dele: Ó que belos pensamentos! Que pregador brilhante! Que grande talento! — Deve proceder de modo que todos os seus ouvintes se retirem cabisbaixos, a chorar os seus pecados, decididos a mudar de vida e a dar-se a Deus. Tal é o fim da verdadeira retórica: persuadir, tocar os ouvintes e movê-los à prática das exortações que se lhes dirigem (Cfr. Santo Afonso Maria de Ligório, A selva).

Estimado sacerdote, perseveremos no bem com FORÇA, CORAGEM e VALENTIA, porque o céu é a pátria dos BATALHADORES; não deixemos que os caluniadores e invejosos atrapalhem o nosso trabalho para a glória de Deus e pelo bem das almas: “Sem perseverança, impossível é chegar à santidade ou à salvação: não basta sermos virtuosos e generosos alguns dias ou alguns anos; necessário é sê-lo sempre, até o fim... Retirar-se do bem começado, do caminho da fé e do seguimento de Cristo, quer dizer pôr em perigo a própria salvação... Quem retrocede condena-se voluntariamente e jamais atingirá a meta: é um fraco, um vil, um desertor; enquanto deve o cristão ser forte, intrépido e perseverante... O cristão que ama a Deus com todo o coração é capaz de enfrentar por ele qualquer dificuldade, de abraçar e suportar qualquer sacrifício. Justamente por ser o Evangelho o código do amor, é também o código da fortaleza... A fé expulsa o medo. Que pode temer quem crê firmemente em Deus e está certo de seu onipotente auxílio? Jesus não esconde aos discípulos que encontrarão inimigos e serão perseguidos como o foi ele, e os exorta a se comportarem impávidos... Deve o cristão confessar sua fé também quando isto pudesse custar-lhe a vida. Por mais valor que tenha a vida terrena, infinitamente mais vale a eterna, que ninguém pode tirar. Quem dá testemunho de Cristo diante dos homens, pode estar seguro de que Cristo dará testemunho dele diante do Pai. A vida eterna será sua recompensa. Não hão de intimidar os discípulos de Cristo perante seus inimigos ou juízes... O cristão que se poupa, que calcula para dar a Deus o mínimo indispensável, de modo a não lhe ser traído, que vive procurando antes fugir da cruz que carregá-la, antes defender-se que renunciar-se, antes salvar a própria vida que sacrificá-la, não é discípulo de Cristo. Se não nos é dado testemunhar nosso amor e nossa fé com o martírio do sangue, devemos, todavia, testemunhá-los abraçando com generoso coração todos os deveres que o seguimento de Cristo impõe, sem recuar perante o sacrifício” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena).

Devemos tomar muito cuidado com os membros do clero: “O sacerdote deve temer mais os que lhe estão próximos, inclusive os colegas de cargo (São João Crisóstomo, O Sacerdócio, Livro Terceiro, 14).

Com gratidão,

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

 

 

Página Inicial | Escritos | Cartas | Cartas aos Sacerdotes