FUGA DAS OCASIÕES
(Eclo 3,
27)
"... o que
ama o perigo nele cairá".
Conta-se de certa espécie de ursos da Mauritânia, África, que vão à
caça de macacos. Estes animais, ao ver o inimigo, sobem para o alto
das árvores. O urso estende-se junto ao tronco, fingindo-se morto, e
quando os macacos, confiados, descem ao solo, levanta-se, apanha-os e
os devora.
Santo
Afonso Maria de Ligório escreve:
"Tal é a astúcia do demônio:
persuade que as tentações estão mortas e quando os homens condescendem
com as ocasiões perigosas, apresenta-lhes de súbito a tentação que os
faz sucumbir"
(Preparação para a Morte, Consideração XXXI, Ponto III).
Quem
brinca com fogo se queimará. Aquele que mexe na lama se sujará. O que
passa entre os espinhos será ferido. Também aquele que brinca com o
pecado, cairá:
"Procurar voluntariamente o pecado, não evitando as ocasiões que
constituem um grande perigo, é expor-se à queda certa, é um verdadeiro
suicídio espiritual" (Pe. João
Batista Lehmann), e:
"O combate, que
sustentamos com os nossos inimigos, é às vezes tão forte que o único
meio de sair vencedor é abandonar o campo e pôr-se em fuga"
(Pe. Alexandrino Monteiro, Raios de Luz, 41).
É
preciso fugir das ocasiões de pecado. O demônio nos odeia, por isso,
usará de todas as armas para nos derrubar, para que não cheguemos ao
lugar desejado na vida espiritual.
Seria
prestar serviço ao demônio, se abandonássemos a obra que a divina
Providência nos confiou, ou se desistíssemos de um trabalho em bom
andamento, começado com pureza e retidão de intenção, só porque nos
vemos cercados de tribulações e angústias do espírito:
"O demônio vê sempre de maus
olhos aqueles que aspiram à perfeição" (Santo
Ambrósio).
No
campo de batalha, o soltado que abandona a luta e foge é tido por
covarde e fraco, enquanto que no combate espiritual, na luta contra as
paixões e ocasiões de pecado, o fugir é sabedoria e valentia; o
abandonar o campo do combate não é perder, mas ganhar a vitória.
Aquele que ama o perigo, com certeza será derrotado, mesmo que demore,
um dia cairá. É preciso viver prudentemente e fugir das ocasiões.
O
célebre capitão Alexandre Magno (+ 323 a. C.), numa de suas guerras,
chegou a Górdio, cidade da Frigia, onde se encontrava, numa torre, o
assim chamado nó górdio. O famoso nó era muito complicado, e
jamais alguém o conseguira desatar. Alexandre, porém, desatou-o sem a
mínima dificuldade. De que modo? Com um simples golpe de espada partiu
o nó pelo meio. É assim que devemos fazer para livrar-nos das ocasiões
do pecado: cortar imediatamente e sem hesitação os vínculos
pecaminosos.
Quando se trata da ocasião do pecado, não vacilemos nem arranjemos
desculpas, mas fujamos rapidamente:
"As ocasiões de pecar são
muito mais numerosas para pessoas tementes a Deus, que para os
libertinos. Estes já são calejados de malícia, e não se impressionam
mais com certas conversas, leituras, divertimentos e espetáculos, que
perturbariam as almas simples e puras. Sejamos rigorosos contra nós
próprios, abstendo-nos de tudo que é mundano, se quisermos agradar a
Nosso Senhor e conservar ilibada a virtude. Com pouco se começa e
facilmente se passa a coisas graves, a ocasião remota se transforma em
próxima e a queda não tarda"
(Pe. João Batista
Lehmann).
Constrangido pelos exorcismos,
"confessou certa vez o
demônio que, entre todos os sermões, o que mais detesta é aquele em
que se exortam os fiéis a fugirem das más ocasiões. E com efeito, o
demônio se ri de todas as promessas e propósitos que formule o pecador
arrependido, se este não evitar tais ocasiões"
(Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a Morte, Consideração
XXXI, Ponto III).
Um
casal de namorados, mesmo comungando todos os dias, confessando
semanalmente e rezando o Santo Terço; não evitaria o pecado se
namorasse no escuro:
"Em matéria de prazeres sensuais, a ocasião é como uma venda
posta diante dos olhos e que não permite ver nem propósitos, nem
instruções, nem verdades eternas; numa palavra, cega o homem e o faz
esquecer-se de tudo. Tal foi a perdição de nossos primeiros pais: não
fugiram da ocasião"
(Idem).
Um
pai de família, mesmo sendo católico praticante, não manteria a
fidelidade conjugar, se estivesse sempre a beijar e abraçar a
empregada: "Para
tornar a entrar numa alma donde foi expulso, o demônio somente aguarda
a ocasião oportuna"
(São Cipriano).
Uma
mulher casada, que está sempre assanhada e a olhar para os homens,
solteiros ou casados, com certeza trairá o marido:
"Quando a alma se deixa
seduzir pela ocasião do pecado, o inimigo se apoderará novamente dela
e a devorará irremediavelmente"
(Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a Morte, Consideração
XXXI, Ponto III).
Uma
faxineira que está sempre a experimentar as jóias da patroa, poderá,
com o passar do tempo, embolsar algumas delas.
A
criança que está sempre a apertar os doces e chocolates nas
prateleiras da padaria, com certeza, também cairá.
Católico, se quiser se salvar, isto é, entrar na vida eterna, fuja das
ocasiões do pecado:
"Quem quiser se salvar, precisa renunciar, não somente ao pecado, mas
também às ocasiões de pecado, isto é, deve afastar-se deste
companheiro, daquela casa, de certas relações de amizade..."
(Idem).
Um
dia, São Jerônimo, desapareceu das alegres reuniões romanas;
procuraram-no nas termas, no circo, nos divertimentos: em vão. Por
longos anos não se soube mais nada dele, tão alegre, tão inteligente.
Porém uma vez, Vigilâncio descobriu-o numa gruta na Palestina, perto
de Belém, depauperado pela penitência, de rosto em terra, rezando.
Chamou-o: "Jerônimo! Por que te enfunaste como um urso nesta gruta?
Que temes?"
O
santo ergue-se sobre os joelhos e, olhando-o, disse-lhe: "Vigilâncio;
sabes o que eu temo? Temo tantos perigos entre os quais tu vives, temo
as conversas ociosas, as brigas, a avareza sórdida, temo os olhos da
mulher mundana".
Depois tornou a apoiar a cabeça no solo daquela gruta onde, quatro
séculos antes, nascera Jesus, o Salvador.
"Isto
é um fugir de covarde - insistia Vigilâncio - e não um vencer de
glorioso. O bonito é saber resistir ao mal mesmo vivendo no meio
dele!"
"Basta, Vigilâncio. Se esta é a minha fraqueza, confesso que sou
fraco. Prefiro fugir para vencer, do que ficar para perder".
Católico, o único modo, pois, de vencer as ocasiões é fugir das
mesmas. Se um santo, já desfeito pelas penitências, assegura não saber
resistir no meio das ocasiões, como havemos nós de pretender não ver,
sem deixar aquela companhia, sem abandonar aquele encontro, aquelas
relações, sem queimar aquele livro?
"A nossa natureza é demasiada fraca, e por isto é mais fácil
ressuscitar um morto do que viver nas ocasiões sem pecar"
(São Bernardo de Claraval), e: "Quantas almas
infelizes, que praticavam a oração, que frequentavam a comunhão e que
se podiam chamar santas, deixaram-se prender nos tentáculos do
inferno, porque não evitaram as más ocasiões"
(Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a Morte, Consideração
XXXI, Ponto III).
A
crer nos poetas antigos, houve uma vez uma menina de nome Atalanta,
que era invencível na corrida. Muitíssimos haviam apostado com ela,
mas tinham sido vergonhosamente vencidos.
Ora,
veio Hipômenes, homem de coração astuto, e pediu para disputar o
páreo. Todos já se riam da sua derrota, quando ele começou a lançar
sobre o caminho maçãs de ouro. Maravilhada com o esplendor delas,
Atalanta parava para apanhá-las, para olhá-las; mas, enquanto isso, os
espectadores soltaram um altíssimo grito. Hipômenes a ultrapassara, e
naquele momento tocava a meta.
Ante
aqueles aplausos estremeceu a menina rapidíssima, e num segundo
compreendeu: caíram-lhe das mãos as maçãs de ouro. Porém em vão; ela
perdera para sempre.
Se
Atalanta e Hipômenes existiram, pouco importa, mas creio na existência
da alma e no demônio:
"A nossa alma é como um menino que deve correr rapidamente para o
Paraíso. Mas o demônio, de coração velhaco e maligno, lança-lhe sobre
o caminho as maçãs de ouro das más ocasiões: é aquela companhia, é
aquele encontro, é aquela pessoa, é aquele brinquedo. Cristãos: não
pareis para recolher os enganosos frutos do nosso inimigo, do
contrário perdereis a corrida da vida.
Faz rir,
ou, melhor, faz chorar, a ingenuidade dessas almas que propõem não
mais ofender o Senhor, passar uma santa quaresma, e não querem
retirar-se no deserto.
Dizem
querer converter-se, e depois ainda se apegam a tudo aquilo que no
mundo se acha de mais adequado para pervertê-las.
Dizem não
querer ofender a Deus e, no entanto, dão-se à leitura de jornais, de
revistas e de livros suspeitos, ímpios e imorais.
Dizem não
querer ofender a Deus, e metem-se em conversações em que o pudor e a
caridade são ofendidos a todo momento.
Dizem não
querer ofender a Deus, e demoram-se em certas afeições que amolecem o
coração e o inclinam, pouco a pouco, para a culpa e para a desonra.
Dizem não
querer ofender a Deus, e acorrem a espetáculos, a círculos ou reuniões
onde acharão pessoas capazes de exercitarem sobre a sua alma
mortíferas impressões.
Dizem não
querer ofender a Deus, e depois, com a moda e com os arrebiques são
ávidas de ver e de fazer-se ver pelo mundo.
Não se
iludam elas: com estas disposições é impossível converter-se"
(Pe. João Colombo).
As
ocasiões de pecar são muitas, por isso, é preciso estar sempre atento
para não se escorregar.
Aquele que se coloca na ocasião de pecar está tentando a Deus, e por
isso, não tem o direito de esperar do Criador uma graça especial para
não cair no pecado, em cuja ocasião se colocou.
O Pe.
Alexandrino Monteiro escreve:
"As ocasiões de pecado são
empecilhos que não nos deixam caminhar livremente para o céu. São como
o visgo, que o menino arma ao passarinho para o agarrar. Vem a incauta
avezinha, pousa sobre ele, e quando vai levantar-se, não pode: tem as
asas presas!
Quem se
põe na ocasião fica preso nela, e já dificilmente pode voar para Deus,
como a pena caída no lodo não se levanta para o céu.
A ocasião
do pecado faz repetir as quedas nele, e estas enfraquecem tanto a
alma, que esta chega a perder as forças para se desatolar do vício"
( Raios de Luz, 41).
Conta
um poeta da antiga Roma, que um leão adoecera de uma tremenda
bronquite. De cauda pendente, de cabeça baixa, com o ardor da febre
nas vísceras, vem à boca da sua caverna e avista passar, na vereda em
baixo, a raposa. "Raposa, raposa! - chamava gemendo o rei do deserto.
- Estou doente de bronquite: ajude-me, do contrário morrerei sem
sequer um cuidado".
A
astuta raposa começou a pôr-se a uma distância tranquilizante;
perscrutou em volta, e observou a vereda que conduzia à gruta do
ilustre enfermo. Depois respondeu-lhe com um sorrisinho todo
malicioso: "Eh, meu caro! Vejo muitas pisadas de animais, e todas
voltadas para dentro da espelunca, e nenhuma para fora. Isto
absolutamente não me tranquiliza. Se estás doente, sinto muito:
adeus". E desapareceu, rindo-se, por entre as verduras.
Católico, as ocasiões de pecar assemelham-se a uma gruta, onde não
está um leão, e sim, o demônio. Mas os homens são menos astutos que a
raposa, por isso, São Cipriano lhes diz:
"Quem brinca com a ocasião
próxima do pecado, já não está seguro; é uma pérfida esperança essa
que nos atrai para o meio da trincheira inimiga. Meter-se entre as
chamas de um vasto incêndio e não se queimar, ou poder sair dele
quando se quiser, é uma empresa impossível. Seria preciso um milagre;
mas Deus não está obrigado a fazê-lo, e o homem que assim se expõe não
o merece, antes faz tudo para se afastar do Senhor e perecer"
(Lib. I, Ep. II).
Em vão São Bernardo de Claraval os adverte:
"Quem procura a ocasião já pecou".
Católico, tenha o cuidado da raposa, olhai a senda que conduz às
ocasiões: não lhe achareis nenhum vestígio de retorno. Todos perecem
nela.
Pe.
Divino Antônio Lopes FP.
Anápolis, 17 de junho de 2007
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