PARÁBOLA DO BOM SAMARITANO
(Lc
10, 25-37)
"25
E eis que um legista se levantou e disse para experimentá-lo: 'Mestre,
que farei para herdar a vida eterna?'
26
Ele disse: 'Que está escrito na Lei? Como lês?'
27
Ele, então, respondeu: 'Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu
coração, de toda a tua alma, com toda a tua força e de todo o teu
entendimento; e a teu próximo como a ti mesmo'.
28
Jesus disse: 'Respondeste corretamente; faze isso e viverás'.
29
Ele, porém, querendo se justificar, disse a Jesus: 'E quem é meu
próximo?' 30
Jesus retomou: 'Um homem descia de Jerusalém a Jericó, e caiu no meio
de assaltantes que, após havê-lo despojado e espancado, foram-se,
deixando-o semimorto.
31
Casualmente, descia por esse caminho um sacerdote; viu-o e passou
adiante. 32
Igualmente um levita, atravessando esse lugar, viu-o e prosseguiu.
33
Certo samaritano em viagem, porém, chegou junto dele, viu-o e moveu-se
de compaixão. 34
Aproximou-se, cuidou
de suas chagas, derramando óleo e vinho, depois colocou-o em seu
próprio animal, conduziu-o à hospedaria e dispensou-lhe cuidados.
35
No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os ao hospedeiro, dizendo:
'Cuida dele, e o que gastares a mais, em meu regresso te pagarei'.
36
Qual dos três, em tua opinião, foi o próximo do homem que caiu nas
mãos dos assaltantes?'
37
Ele respondeu: 'Aquele que usou de misericórdia para com ele'. Jesus
então lhe disse: 'Vai, e também tu, faze o mesmo".
Em Lc
10, 25-28 diz: "E eis
que um legista se levantou e disse para experimentá-lo: 'Mestre, que
farei para herdar a vida eterna?' Ele disse: 'Que está escrito na Lei?
Como lês?' Ele, então, respondeu: 'Amarás o Senhor teu Deus, de todo o
teu coração, de toda a tua alma, com toda a tua força e de todo o teu
entendimento; e a teu próximo como a ti mesmo'. Jesus disse:
'Respondeste corretamente; faze isso e viverás".
O Pe.
Francisco Fernández-Carvajal escreve:
"É muito provável que o Senhor tivesse proposto esta nova
parábola à saída de Jericó, no caminho que sobe para Jerusalém através
do deserto de Judá. Com muita frequência o Mestre utilizava as coisas
que via para dar ensinamentos mais profundos e misteriosos acerca do
Reino que estava preste a chegar: assim, utiliza a água do poço de
Jacó para se referir à graça, o pão para falar da Eucaristia, etc. O
caminho de Jericó para Jerusalém, onde se davam tantos assaltos de
ladrões aos peregrinos, era um bom cenário para a parábola que narrará
a seguir. Talvez estejam prestes a iniciar o caminho".
A
doutrinação começou com uma pergunta de um doutor da Lei, com a
intenção de experimentá-lo:
"Mestre, que farei para
herdar a vida eterna?"
Esse
doutor da Lei não estava preocupado em aprender, e sim, colocar o
Senhor à prova.
Hoje,
também, existem milhares de católicos que não se preocupam em obedecer
ao que a Santa Mãe Igreja ordena, e sim, passam horas e horas a
questionarem e a reprovarem o que a mesma ensina. Esses são grandes
inimigos da Igreja Católica.
Feliz
do católico que inclina a cabeça perante a Lei de Deus e que segue
fielmente a Santa Doutrina católica. O mesmo será luz por onde passar,
principalmente nos ambientes contrários aos ensinamentos da Igreja.
Edições Theologica comenta:
"O Senhor ensina que o
caminho para conseguir a vida eterna consiste no cumprimento da Lei de
Deus. Os Dez Mandamentos, que Deus entregou a Moisés no monte Sinai
(Ex 20, 1-17), são a expressão concreta e clara da Lei natural. Faz
parte da doutrina cristã a existência da Lei natural, que é a
participação da Lei eterna na criatura racional, e que foi impressa na
consciência de cada homem ao ser criado por Deus (cfr Libertas
praestantíssimum). É evidente, portanto, que a Lei natural, expressada
nos Dez Mandamentos, não pode mudar, nem passar de moda, já que não
depende da vontade do homem nem das circunstâncias mutáveis dos
tempos.
Neste
passo, Jesus louva o resumo da Lei que faz o escriba judeu. A resposta
é tirada do Deuteronômio (6, 4ss.) e era uma oração que os judeus
repetiam com frequência. Esta mesma resposta dá o Senhor quando Lhe
perguntam qual é o mandamento principal da Lei, para terminar dizendo:
'Destes dois mandamentos depende toda a Lei e os Profetas' (Mt 22,
40), (cfr também Rm 13, 8-9; Gl 5, 14).
Há uma
hierarquia e uma ordem nestes dois mandamentos que constituem o duplo
preceito da caridade: antes de mais e sobretudo amar a Deus por Si
mesmo; em segundo lugar, e como consequência do anterior, amar o
próximo, porque essa é a vontade explícita de Deus (1 Jo 4, 21).
Neste
passo do Evangelho encerra-se também outro ensinamento fundamental: a
Lei de Deus não é algo negativo, 'não fazer', mas algo claramente
positivo, é amor; a santidade, a que todos os batizados estão
chamados, não consiste tanto em não pecar, mas em amar, em fazer
coisas positivas, em dar frutos de amor de Deus. Quando o Senhor nos
descreve o Juízo Final realça esse aspecto positivo da Lei de Deus (Mt
25, 31-46). O prêmio da vida eterna será concedido aos que fizeram o
bem",
e:
"Sem dúvida, a nossa única ocupação aqui na terra é a de amar a Deus:
ou seja, começar a praticar o que faremos durante toda a eternidade.
Por que temos de amar a Deus? Porque a nossa felicidade consiste, e
não pode consistir noutra coisa, no amor de Deus. De maneira que se
não amamos a Deus, seremos constantemente infelizes; e se queremos
desfrutar de alguma consolação e de alguma suavidade nas nossas penas,
somente o conseguiremos recorrendo ao amor de Deus. Se quereis
convencer-vos disso, ide buscar o homem mais feliz segundo o mundo; se
não ama a Deus, vereis como na realidade não deixa de ser um grande
desgraçado. E, pelo contrário, se vos encontrais com o homem mais
feliz aos olhos do mundo, vereis como, amando a Deus, é ditoso em
todos os conceitos. Meu Deus! Abri-nos os olhos da alma, e assim
buscaremos a nossa felicidade onde realmente podemos achá-la!"(São
João Maria Vianney, Sermões escolhidos, Décimo segundo Domingo depois
de Pentecostes).
Em Lc
10, 29 diz: "Ele,
porém, querendo se justificar, disse a Jesus: 'E quem é meu próximo?"
Cristo Jesus não lhe deu uma definição de quem seria o seu próximo,
mas contou-lhe uma parábola.
Nessa
parábola, Cristo Jesus explica concretamente quem é o próximo e de
como há que viver a caridade com ele, ainda que seja nosso inimigo.
Em Lc
10, 30 diz: "Jesus
retomou: 'Um homem descia de Jerusalém a Jericó, e caiu no meio de
assaltantes que, após havê-lo despojado e espancado, foram-se,
deixando-o semimorto".
Quem
é esse homem? Nosso Senhor não diz qual a sua nacionalidade nem da sua
condição pessoal.
Este
é o nosso próximo: um homem qualquer, que está perto de nós e que
necessita da nossa ajuda.
Ajudemos sempre ao nosso próximo, não importa quem seja, a nossa
caridade deve ser verdadeira:
"No caminho da vida
encontramos pessoas feridas, despojadas e meio mortas, da alma e do
corpo. A preocupação por ajudar outros tirará o homem de bem do seu
caminho rotineiro, do próprio egoísmo, e alargará o seu coração para
se preocupar do que tem necessidade de ajuda. No caminho diário é
possível encontrar pessoas doridas de compreensão e de carinho ou que
carecem dos meios materiais mais indispensáveis; feridas por ter
sofrido humilhações que vão contra a dignidade humana; despojadas,
talvez, dos direitos mais elementares..."
(Pe. Francisco
Fernández-Carvajal).
Católico, não olhe com indiferença para o seu próximo, mas o ajude
naquilo que for preciso, principalmente na vida espiritual:
"A caridade de Cristo
estimula, incita-nos a correr e voar com as asas do santo zelo. Quem
ama a Deus de verdade, também ama o próximo; o verdadeiro zeloso é o
mesmo que ama, mas em grau maior, conforme o grau de amor; quanto arde
de amor, tanto mais é impelido pelo zelo"
(Das Obras de Santo Antônio Maria Claret),
e: "Haverá ocasiões em
que, antes de pregar a fé, será necessário aproximar-se do ferido que
está à beira do caminho, para curar-lhe as feridas. Certamente. Mas
sem nunca excluir a preocupação cristã de comunicar a fé, de educar
nela e de propagar o sentido cristão da vida"
(Cardeal M. Gonzáles
Martín, Libres em la caridad, pág. 58).
Em Lc
10, 31-32 diz:
"Casualmente, descia por esse caminho um sacerdote; viu-o e passou
adiante. Igualmente um levita, atravessando esse lugar, viu-o e
prosseguiu".
Passaram por esse lugar um sacerdote e um levita:
"Voltavam certamente a casa depois de ter terminado o seu
turno no Templo. Neles está concretizada a piedade cultual de então.
Não tinham tempo, não queriam complicar a sua viagem... Não fizeram um
novo dano ao homem ferido e abandonado, como acabar de lhe tirar o que
restava, insultá-lo, etc. Iam ao seu, e não quiseram complicações.
Deram mais importância aos seus assuntos, importantes ou não, do que
ao homem necessitado" (Pe. Francisco Fernández-Carvajal).
Muitos do clero se envolvem com assuntos terrenos, como por exemplo, a
política, e não se preocupam com os católicos que estão feridos
espiritualmente, isto é, vivendo em pecado mortal.
Esses, preocupados somente com os assuntos terrenos passam adiante,
deixando de lado os fiéis que necessitam de um consolo e ajuda
espiritual.
Os
mesmos se preocupam com o leite, lã e carne das ovelhas, mas não as
orientam no caminho da santidade:
"Vejamos, portanto, o que aos
pastores que se apascentam a si mesmos, não às ovelhas, diz a palavra
divina que não adula a ninguém: 'Eis que bebeis o leite e vos cobris
com a lã; matais as mais gordas e não apascentais minhas ovelhas. Não
fortalecestes a fraca; não curastes a doente; não pensastes a ferida,
não reconduzistes a desgarrada e não fostes em busca da que se
perdera; tratastes com dureza a forte"
(Do Sermão sobre os
pastores, de Santo Agostinho).
Muitos também são os leigos que poderiam, se não fosse o egoísmo que
carregam no coração, ajudarem aqueles que necessitam de uma ajuda,
seja material ou espiritual.
Os
mesmos reservam um bom tempo para os seus passeios e lazeres, mas não
encontram um tempo sequer, para ajudar os necessitados.
Católico, abra o seu coração e tire dele todo egoísmo e indiferença, e
ajude o próximo com generosidade:
"Não te digo: arruma-me a
vida e tira-me da miséria, entrega-me os teus bens (...). Só te
imploro pão e roupa, e um pouco de alívio para a minha fome. Estou
preso. Não te peço que me livres. Somente quero que, pelo teu próprio
bem, me visitas. Com isso ficarei satisfeito e por isso te
presentearei com o Céu. Eu te livrei de uma prisão mil vezes mais
dura. Mas contento-me com que venhas ver-me de vez em quando.
Poderia, é
verdade, dar-te a tua coroa sem nada disso, mas quero estar-te
agradecido e que venhas depois receber o teu prêmio confiadamente. Por
isso, Eu, que posso alimentar-me por mim mesmo, prefiro dar voltas ao
teu redor, pedindo, e estender a minha mão à tua porta. O meu amor
chegou a tanto, que quero que tu me alimentes. Por isso, prefiro, como
amigo, a tua mesa; disso me glorio e te mostro ao mundo como meu
benfeitor" (São João
Crisóstomo, Homilia 15 sobre a Epístola aos Romanos).
Em Lc
10, 33-35 diz: "Certo
samaritano em viagem, porém, chegou junto dele, viu-o e moveu-se de
compaixão.
Aproximou-se, cuidou de suas chagas, derramando óleo e vinho, depois
colocou-o em seu próprio animal, conduziu-o à hospedaria e
dispensou-lhe cuidados. No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os
ao hospedeiro, dizendo: 'Cuida dele, e o que gastares a mais, em meu
regresso te pagarei".
É
preciso não esquecer que os samaritanos eram tidos em Israel por
idólatras. Estava-lhes vedado o acesso ao Templo, e o seu testemunho
nas cortes de justiça carecia de valor. Não podiam contrair matrimônio
com uma mulher judia. Não se podia aceitar deles um pedaço de pão ou
um copo de água. Um dos insultos mais fortes contra um judeu, que foi
dirigido também contra o Senhor, era o de dizer-lhe: É um
samaritano.
O
denário, equivalente ao jornal diário de um operário ou de um
legionário. O seu valor aquisitivo superava as necessidades diárias de
uma família. O samaritano pagou uma quantidade razoável.
O Pe.
Francisco Fernández-Carvajal escreve:
"Jesus quis intensificar a parábola com a figura do
samaritano. Este, apesar do grande distanciamento que havia entre eles
e os judeus, imediatamente se deu conta da desgraça, e encheu-se de
compaixão. É necessário, em primeiro lugar, querer ver a desgraça
alheia, não ir tão depressa na vida que possa justificar-se com
facilidade o passar do outro lado diante da necessidade e do
sofrimento.
A
compaixão do samaritano não é mero sentimentalismo. Pelo contrário,
põe os meios para prestar uma ajuda concreta e prática. O que leva a
cabo este viajante não é, talvez, um ato heróico, mas sim, faz o
necessário. Antes de mais, aproximou-se; é o primeiro que se
deve fazer diante da desgraça ou da necessidade: aproximar-se, não
vê-la de longe. Logo, o samaritano teve as atenções que a situação
requeria: cuidou dele. O amor ao próximo é prático e
demonstra-se nas obras. Manifesta-se levando a cabo o que se deve
fazer em cada caso concreto.
O amor faz
o que a hora e o momento exigem. Nem sempre são atos heróicos,
difíceis; com frequência são coisas simples, pequenas muitas vezes. Os
afazeres deste bom samaritano passaram por uns momentos para segundo
plano, e as suas urgências também; empregou o seu tempo e o seu
dinheiro, sem regateios, em auxiliar quem dele necessitava".
Santo
Agostinho, seguindo outros Santos Padres (De verb. Dom. serm., 37),
"identifica o Senhor
com o bom samaritano, e o homem assaltado pelos ladrões com Adão,
origem e figura de toda a humanidade caída. Levado por essa compaixão
e misericórdia, desce à terra para curar as chagas do homem,
fazendo-as suas próprias (Is 53, 4; Mt 8, 17; 1 Pd 2, 24; 1 Jo 3, 5).
Assim, em mais de uma ocasião, vemos como Jesus Se compadece e Se
comove diante do sofrimento do homem (cfr Mt 9, 36; Mc 1, 41; Lc 7,
13). Com efeito, diz São João: 'Nisto se demonstrou o amor de Deus
para conosco, em que enviou o Seu Filho Unigênito ao mundo para que
por Ele tenhamos a vida. E nisto consiste o Seu amor, que não é porque
nós tenhamos amado a Deus, mas porque Ele nos amou primeiro a nós, e
enviou o Seu Filho para ser vítima de propiciação pelos nossos
pecados. Queridos, se Deus nos amou assim, também nós devemos amar-nos
uns aos outros' (1 Jo 4, 9-11)" (Edições
Theologica).
Em Lc
10, 36-37 diz: "Qual
dos três, em tua opinião, foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos
assaltantes?' Ele respondeu: 'Aquele que usou de misericórdia para com
ele'. Jesus então lhe disse: 'Vai, e também tu, faze o mesmo".
Cristo Jesus perguntou ao doutor da Lei:
"Qual dos três, em tua
opinião, foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?"
O Pe.
Francisco Fernández-Carvajal escreve:
"Na pergunta, Jesus inverteu
a ordem:... quem foi o próximo daquele? Quem se comportou como
próximo? O conceito de próximo é correlativo, exige dos termos. E
Jesus não quer responder quem é o meu próximo, mas quem se
comportou como próximo daquele necessitado".
Termina a parábola com uma palavra cordial dirigida ao doutor: Vai
e faz tu do mesmo modo. Sê próximo inteligente, ativo e compassivo
com todo o que necessite de ti.
Esta parábola do Bom
Samaritano está em profunda harmonia com o comportamento do próprio
Cristo: "A parábola do Bom Samaritano pertence
também - e de modo orgânico - ao Evangelho do sofrimento. Nesta
parábola Cristo quis dar uma resposta à pergunta "quem é o meu
próximo?" De fato, dos três que passavam pela estrada de Jerusalém a
Jericó, à beira da qual jazia por terra, meio morto, um homem roubado
e ferido pelos ladrões, foi exatamente o Samaritano quem demonstrou
ser na verdade "próximo" daquele infeliz: "próximo"
significa também aquele que cumpriu o mandamento do amor ao próximo.
Outros dois homens seguiam o mesmo caminho; um era sacerdote e o outro
levita; mas ambos "o viram e passaram adiante". O Samaritano, ao
contrário, "tendo-o visto, encheu-se de compaixão. Aproximou-se,
pensou-lhe as feridas", e depois "levou-o para uma estalagem e
prestou-lhe assistência" . E, ao ir-se embora, confiou aos cuidados
do hospedeiro o homem que estava a sofrer, comprometendo-se a
pagar-lhe o que fosse preciso.
A parábola
do Bom Samaritano pertence ao Evangelho do sofrimento. Ela indica, de
fato, qual deva ser a relação de cada um de nós para com o próximo que
sofre. Não nos é permitido "passar adiante", com indiferença; mas
devemos "parar" junto dele. Bom Samaritano é todo o homem que se
detém junto ao sofrimento de um outro homem, seja qual for o
sofrimento. Parar, neste caso, não significa curiosidade, mas
disponibilidade. Esta é como que o abrir-se de uma disposição interior
do coração, que também tem a sua expressão emotiva. Bom Samaritano é
todo o homem sensível ao sofrimento de outrem, o homem que "se
comove" diante da desgraça do próximo. Se Cristo, conhecedor do
íntimo do homem, põe em realce esta comoção, quer dizer que ela é
importante para todo o nosso modo de comportar-nos diante do
sofrimento de outrem. É necessário, portanto, cultivar em si próprio
esta sensibilidade do coração, que se demonstra na compaixão
por quem sofre. Por vezes, esta compaixão acaba por ser a única
ou a principal expressão do nosso amor e da nossa solidariedade com o
homem que sofre.
O Bom
Samaritano da parábola de Cristo não se limita, todavia, à simples
comoção e compaixão. Estas, transformam-se para ele num estímulo para
as ações que tendem a prestar ajuda ao homem ferido. Bom Samaritano,
portanto, é, afinal, todo aquele que presta ajuda no sofrimento,
seja qual for a sua espécie; uma ajuda, quanto possível, eficaz.
Nela põe todo o seu coração, sem poupar nada, nem sequer os meios
materiais. Pode-se dizer mesmo que se dá a si próprio, o seu próprio
"eu", ao outro. Tocamos aqui um dos pontos-chave de toda a
antropologia cristã. O homem não pode encontrar a sua própria
plenitude a não ser no dom sincero de si mesmo . Bom Samaritano é o
homem capaz, exatamente, de um tal dom de si mesmo.
Seguindo a
parábola evangélica, poder-se-ia dizer que o sofrimento, presente no
nosso mundo humano sob tantas formas diversas, também aí está presente
para desencadear no homem o amor, precisamente esse dom desinteressado
do próprio "eu" em favor dos outros homens, dos homens que sofrem. O
mundo do sofrimento humano almeja sem cessar, por assim dizer, outro
mundo diverso: o mundo do amor humano; e aquele amor desinteressado
que vem do coração e transparece nas ações da pessoa que sofre; amor
que esta deve, aliás, em certo sentido ao sofrimento. O homem que é o
"próximo" não pode passar com indiferença diante do sofrimento de
outrem; e isso, por motivo da solidariedade humana fundamental e em
nome do amor ao próximo. Deve "parar", "deixar-se comover", como fez o
Samaritano da parábola evangélica. Esta parábola, em si mesma, exprime
uma verdade profundamente cristã e, ao mesmo tempo, muitíssimo
humana universalmente. Não é sem motivo que até na linguagem corrente
se designa obra de "bom samaritano" qualquer atividade em favor dos
homens que sofrem ou precisam de ajuda.
Esta
atividade adota, ao longo dos séculos, formas institucionais
organizadas e constitui um campo de trabalho nas respectivas
profissões. Quanto de "bom samaritano" têm as profissões do médico
ou a da enfermeira, ou outras similares! Em virtude do conteúdo
"evangélico" que nelas se encerra, somos inclinados a pensar, nestes
casos, mais em vocação do que em simples profissão. E as instituições
que, no decorrer das gerações, realizaram um serviço de "bom
samaritano", desenvolveram-se e especializaram-se ainda mais nos
nossos dias. Isto prova, sem sombra de dúvida, que o homem de hoje se
detém cada vez com maior atenção à perspicácia junto aos sofrimentos
do próximo, tenta compreendê-los e precavê-los, de modo cada vez mais
preciso, e conquista também, cada vez mais, capacidade e
especialização neste sector. Tendo presente tudo isto, podemos dizer
que a parábola do Samaritano do Evangelho se tornou uma das
componentes essenciais da cultura moral e da civilização
universalmente humana. E pensando em todas aquelas pessoas que,
com a sua ciência e capacidade, prestam múltiplos serviços ao próximo
que sofre, não podemos deixar de ter para com elas uma palavra de
reconhecimento e de gratidão.
Esta
palavra estende-se a todos aqueles que exercem o próprio serviço para
com o próximo que sofre, de maneira desinteressada, aplicando-se
voluntariamente em dar ajuda de "bom samaritan" e destinando a
essa causa todo o tempo e forças que lhes ficam do trabalho
profissional. Tal atividade espontânea como "bom samaritano", ou
caritativa, pode ser chamada atividade social; e pode também ser
definida como apostolado quando é empreendida por motivos
lidimamente evangélicos, sobretudo quando isso sucede em ligação com a
Igreja ou com uma outra Comunidade cristã. A atividade voluntária de
"bom samaritano" realiza-se nas instituições e meios apropriados, ou
então através de organizações criadas para determinado fim.
Estas formas de atuação têm grande importância, especialmente quando
se trata de assumir tarefas de maior vulto, que exijam cooperação e
uso de meios técnicos. Permanece não menos valiosa também a atividade
individual, especialmente a atividade daquelas pessoas que se sentem
mais aptas para cuidarem de certas espécies de sofrimento humano, a
que não se pode dar ajuda senão individual e pessoalmente. Depois há a
ajuda familiar, que compreende quer os atos de amor ao próximo
feitos em benefício dos membros da própria família, quer a ajuda
recíproca entre as famílias.
É difícil
apresentar um elenco de todos os gêneros e de todas as esferas da
atividade de "bom samaritano" que existem na Igreja e na sociedade.
Importa pelo menos reconhecer que são muito numerosos e, por isso,
exprimir alegria; com efeito, graças a eles, os valores morais
fundamentais, como o valor da solidariedade humana, o valor do
amor cristão ao próximo, compõem o quadro da vida social e das
relações inter-humanas e aí fazem frente às diversas formas do ódio,
da violência, da crueldade, do desprezo pelo homem, ou até da simples
"insensibilidade", ou seja, da indiferença para com o próximo e os
seus sofrimentos.
Neste
ponto é para salientar o grandíssimo significado das atitudes que
convém adotar na educação. A família, a escola e as outras
instituições educativas - ainda que seja somente por motivos
humanitários - devem trabalhar com perseverança no sentido de
despertar e apurar aquela sensibilidade para com o próximo e o seu
sofrimento, de que se tornou símbolo a figura do Samaritano do
Evangelho. A Igreja deve fazer o mesmo, como é óbvio; e, se for
possível, ajudar a aprofundar ainda mais tal sentido, com a
perscrutação das motivações que Cristo apresentou na sua parábola e em
todo o Evangelho. A eloquência da parábola do Bom Samaritano - como de
todo o Evangelho, de resto - está sobretudo nisto: o homem deve
sentir-se como que chamado, de maneira muito pessoal, a
testemunhar o amor no sofrimento. As instituições são muito
importantes e indispensáveis; no entanto, nenhuma instituição, só por
si, pode substituir o coração humano, a compaixão humana, o amor
humano, a iniciativa humana, quando se trata de ir ao encontro do
sofrimento de outrem. Isto é válido pelo que se refere aos sofrimentos
físicos; mas é mais válido ainda quando se trata dos múltiplos
sofrimentos morais e, sobretudo, quando é a alma que está a sofrer.
A parábola
do Bom Samaritano que, como foi dito, pertence sem dúvida ao Evangelho
do sofrimento, com ele tem caminhado ao longo da história da Igreja e
do Cristianismo e ao longo da história do homem e da humanidade. Ela
testemunha que a revelação, feita por Cristo, do sentido salvífico do
sofrimento, não o identifica, de forma alguma, com um comportamento
de passividade. Muito pelo contrário. O Evangelho é a negação da
passividade diante do sofrimento. O próprio Cristo, neste aspecto, é
sobretudo ativo. E assim, realiza o programa messiânico da sua missão
em conformidade com as palavras do Profeta: "O Espírito do Senhor está
sobre mim; porque me conferiu a unção e me enviou para anunciar aos
pobres a boa nova, para anunciar aos cativos a libertação e aos cegos
o dom da vista; para pôr em liberdade os oprimidos e promulgar um ano
de graça da parte do Senhor". Cristo realiza de modo superabundante
este programa messiânico da sua missão: passa "fazendo o bem";
e o bem resultante das suas obras assumiu grande realce sobretudo
diante do sofrimento humano. A parábola do Bom Samaritano está em
profunda harmonia com o comportamento do próprio Cristo.
Esta
parábola, por fim, quanto ao seu conteúdo, tem cabimento naquelas
inquietantes palavras do juízo final, que São Mateus recolheu no seu
Evangelho: "Vinde, benditos de meu Pai, entrai na posse do reino que
vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e
destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber; era peregrino e
destes-me hospedagem, andava nu e vestistes-me, estava doente e
visitastes-me, estava no cárcere e fostes ver-me". Aos justos que
perguntam quando fizeram precisamente a ele tudo isso, o Filho do
Homem responderá: "Em verdade vos digo que tudo o que
fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes".
Sentença contrária caberá àqueles que se houverem comportado
diversamente: "tudo o que não fizestes a um destes pequeninos a mim
deixastes de o fazer".
Poder-se-ia certamente ampliar a lista dos sofrimentos que encontraram
eco na sensibilidade humana, na compaixão e na ajuda, ou que não o
encontraram. A primeira e a segunda parte da declaração de Cristo
sobre o juízo final indicam, sem ambiguidade, quanto são essenciais
para todos os homens, na perspectiva da vida eterna, o "parar", como
fez o Bom Samaritano, junto do sofrimento do seu próximo, o ter
"compaixão" dele, e, por fim, ajudá-lo. No programa messiânico de
Cristo, que é ao mesmo tempo o programa do reino de Deus, o
sofrimento está presente no mundo para desencadear o amor, para fazer
nascer obras de amor para com o próximo, para transformar toda a
civilização humana na "civilização do amor". Com este amor é que o
significado salvífico do sofrimento se realiza totalmente e atinge a
sua dimensão definitiva. As palavras de Cristo sobre o juízo final
permitem compreender isto, com toda a simplicidade e clareza típicas
do Evangelho.
Estas
palavras sobre o amor, sobre os atos de caridade relacionados com o
sofrimento humano, permitem-nos descobrir, uma vez mais, por detrás de
todos os sofrimentos humanos, o próprio sofrimento redentor de
Cristo. O mesmo Cristo diz: "A mim o fizestes". É Ele próprio
quem, em cada um, experimenta o amor; é Ele próprio quem recebe ajuda,
quando ela é prestada a quem quer que sofra, sem exceção. Ele próprio
está presente em quem sofre, pois o seu sofrimento salvífico foi
aberto de uma vez para sempre a todo o sofrimento humano. E todos os
que sofrem foram chamados, de uma vez sempre, a tornarem-se
participantes "dos sofrimentos de Cristo". Assim como todos foram
chamados a "completar" com o próprio sofrimento "o que falta aos
sofrimentos de Cristo". Cristo ensinou o homem a fazer bem com o
sofrimento e, ao mesmo tempo, a fazer bem a quem sofre. Sob
este duplo aspecto, revelou cabalmente o
sentido do sofrimento"
(João Paulo II, Carta
Apostólica, Salvifici doloris, 28-30).
Pe.
Divino Antônio Lopes FP.
Anápolis, 10 de julho de 2007
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