ABRE-TE!

(Mc 7, 34)

 

“Depois, levantando os olhos para o céu, gemeu, e disse Effatha, que quer dizer ‘Abre-te!”

 

 

Saindo de novo do território de Tiro, seguiu em direção do mar da Galiléia, passando por Sidônia e atravessando a região da Decápole (Mc 7, 31). Trouxeram-lhe um surdo que gaguejava, e rogaram que impusesse as mãos sobre ele (Mc 7, 32). Levando-o a sós para longe da multidão, colocou os dedos nas orelhas dele e, com saliva, tocou-lhe a língua (Mc 7, 33). Depois, levantando os olhos para o céu, gemeu, e disse Effatha, que quer dizer “Abre-te!” (Mc 7, 34). Imediatamente abriram-se-lhe os ouvidos e a língua se lhe desprendeu, e falava corretamente (Mc 7, 34).

 

Diante daquele homem surdo e mudo, Nosso Senhor olhou para o céu e GEMEU:  “Isto demonstra que todos os membros de seu sagrado corpo são santos e divinos, como a saliva com que deu flexibilidade à língua do mudo. Porque é certo que a saliva é inútil; porém, tudo era divino no Senhor. E elevando os olhos ao céu, gemeu” (Teofilacto), e: “Elevou os olhos ao céu, para ensinar-nos que é dali que o mudo deve esperar a voz, o surdo a audição e todos os enfermos a saúde. E gemeu... para nos fazer ver que é com gemidos que devemos invocar sua divina piedade por nossos erros ou os do próximo” (São Beda, sobre Marcos, 2, 31), e também:  “Gemeu, tomando sobre Ele a nossa causa e compadecido de nossa natureza, vendo a miséria em que havia caído o gênero humano” (Pseudo-Crisóstomo, vict. Ant. e cat. in Marcum).

O Pe. João Colombo comenta: “O Mestre divino, com o seu olhar que abraça o universo e vadeia os séculos, naquele pobre desgraçado divisava tantos surdos e mudos espirituais, mas dignos de compaixão e mais desventurados do que aquele pobrezinho”.

 

I. Existem católicos SURDOS à PALAVRA de Deus: Muitos são aqueles que vão à igreja e saem dela revoltados e com piadinhas, dizendo que o sacerdote falou demais. Outros saem no meio do sermão ou da homilia, porque não gostaram das verdades que saíram dos lábios do sacerdote. Milhares escancaram os ouvidos para as conversas vazias nas portas dos botecos, mas são SURDOS à Palavra de Deus.

Aos católicos que saíam da igreja após o Evangelho, dizia Santo Hilário: “Podeis sair da igreja, mas do inferno não podereis sair!”

 

II. Existem católicos SURDOS às BOAS INSPIRAÇÕES: Talvez, há tempo, Nosso Senhor está convidando certos corações petrificados, e eles não voltam para Ele, preferem seguir pelo caminho das trevas... Talvez, há tempo, o Senhor está chamando certas almas para uma vida mais santa, e as mesmas permanecem sobre o muro.

 

Será que os INDIFERENTES se SALVARÃO?

Uma noite, com um grande saco ao ombro veio o diabo à terra para levar consigo tudo o que Deus não quer no céu. Ao caminhar, tropeçou num bêbado e lançou-o no saco, dizendo: “Os bêbados são meus, Deus não os quer. Ao inferno com eles!” Seguiu andando, e encontrou um ladrão: “Para o saco, para o saco! – disse com uma grande gargalhada. – De ladrões está cheio o inferno!” Continuou andando, e encontrou um escandaloso. “Oh! Oh! Este é pior que o demônio. Os escandalosos são sujeitos infernais. Se algum dia eu tiver de vir ao mundo disfarçado, será de escandaloso. Para o saco com ele!” E assim foi colocando no saco a todos que tinham a alma negra, manchada com pecados de maledicência, orgulho, inveja, luxúria, e não sei quanta coisa mais. Até um hipócrita foi colocado no saco carregado pelo diabo. “Oh! – disse – destes entram milhões no inferno! Até já perdi a conta. É pena que nenhum deles consiga entrar no céu... pois eu é que tenho de aguentar a todos”.

Depois, encontrou-se com um tal que não era bêbado, nem ladrão, nem escandaloso; mas, também, não era bom, porque Deus não o quis levar. “Quem és?” – Perguntou-lhe o diabo, abrindo o saco para colocá-lo dentro. “Eu – respondeu o tal – nunca fui amigo nem inimigo de ninguém; a todos e a tudo fui indiferente”. “Um indiferente!? diz o diabo; ora essa, não serviste para Deus, nem para mim me serves; não prestas nem para o inferno!”

 

III. Existem filhos católicos SURDOS, que desprezam as ordens dos pais: milhares de filhos desprezam abertamente e até com ameaças as palavras dos pais, mas estão prontos a ouvirem e seguirem as péssimas orientações dos vizinhos. Tapando os ouvidos para os pais, se fazem de surdos para Deus.

 

Esses MAUS filhos serão castigados.

A 19 de Outubro de 1914, próximo de Turim, um rapaz discutiu com sua mãe por questão de interesses, chegando a espancá-la brutalmente, quebrando-lhe o braço e causando-lhe ferimentos graves.

A mãe teve de ser hospitalizada e o filho foi preso. Quando o levaram à estação para conduzi-lo ao tribunal de Turim, o rapaz tentou atirar-se debaixo do trem que se aproximava. Caindo, porém, ao lado, o trem cortou-lhe somente as duas mãos com que maltratara a mãe e, assim, teve de apresentar-se no tribunal.

 

Deixemos a SURDEZ ESPIRITUAL e FALEMOS da MUDEZ ESPIRITUAL; ela é uma das DOENÇAS mais DIFUNDIDAS nestes nossos tempos. Poder-se-ia CONSIDERÁ-LA sob um TRÍPLICE ASPECTO.

 

1. Um mutismo da oração.

2. Um mutismo da confissão.

3. Um mutismo do respeito humano.

  

A- Um mutismo da oração.

 

No século VI, os Godos e os Gregos disputavam o domínio da Itália. Os exércitos estavam acampados nas faldas do Vesúvio, prontos para a batalha. Contra o velho e terrível Narsete, chefe dos Gregos, os Godos haviam escolhido um jovem audaz até à temeridade e valoroso até à morte. Contra ele os soldados imperiais, apenas iniciada a refrega, retesaram o arco e desfecharam as setas; mas Téia estava protegido por um alto escudo de pele. Chegaram os dardos sibilantes, fincavam-se no couro, e, fincados, tremiam em vão. Mas, pouco a pouco, o escudo ficava tão pesado de ferro, que era preciso trocá-lo. Num destes momentos Téia deixou o peito descoberto diante do inimigo: foi um instante, e bastou. Uma seta envenenada feriu-o no coração, e ele caiu.

Santo Ambrósio escreve: “A nossa vida, disse o Espírito Santo, é uma batalha. O demônio, que é mais forte e mais astuto do que nós, procura, com os dardos venenosos, fazer-nos cair em pecado. Para esta luta Deus nos armou de um escudo invencível: a oração” (De Obitu Valent.).

Ai de nós se mesmo só por um instante o depusermos: ao demônio bastaria esse instante para nos achar inermes e nos ferir: “Ainda outras diferenças entre as lutas desta terra e as das almas poderão ser mencionadas: o tempo do combate aqui é breve e, ainda assim, interrompido por armistícios. A noite, a fadiga, a fome e muitas outras circunstâncias são motivos para os soldados descansarem. Aí podem depor as armaduras, refazer as forças, refrigerar-se com comidas e bebidas e, por estes e outros meios, recuperar as forças perdidas. Na luta com aquele maligno, porém, nunca haverá pausa; nunca poderás despojar-te das armas, nunca poderás entregar-te ao descanso, caso quiseres ficar ileso” (São João Crisóstomo, O Sacerdócio, Livro sexto, 13).

Católico, é necessário REZAR SEMPRE e NUNCA DESISTIR, porque o demônio sempre nos TENTA e NUNCA se CANSA: “Em resumo, a oração é uma grande armadura, uma defesa, um porto, um tesouro. A oração é uma valiosa arma para vencer os assaltos dos demônios; é uma defesa, que nos conserva em todos os perigos; é um porto seguro contra toda tempestade; é um tesouro, que nos provê de todos os bens” (Idem.), e: “Assim como o demônio não descansa, armando-nos contínuas ciladas para nos devorar, como nos escreve São Pedro: ‘O demônio, adversário vosso, anda rodeando-vos, como um leão que ruge, buscando sua presa’ (1 Pd 5,8), do mesmo modo, nós, para sermos protegidos contra tal inimigo, nunca devemos depor as armas, mas devemos dizer com o real Profeta: ‘Perseguirei os meus inimigos e não voltarei atrás, enquanto não derrubá-los por terra’ (Sl 17, 4). Não cessarei de combater, até que veja meus inimigos destroçados” (Santo Afonso Maria de Ligório, A Oração, Capítulo IV, 39).

São Milhões os católicos que FECHAM a BOCA para Deus; mas estão prontos para conversarem sobre novelas, esporte, prazeres do mundo e pornografia: “Quantos católicos passam longos dias e semanas inteiras, mudos com Deus! Para eles o Senhor quase não existe: trabalham, suam, consomem-se, são oprimidos pela desventura, são atormentados pelas tentações, mas o auxílio de Deus nunca pedem. Coitados! Esses já não se lembram de que, se o Senhor não edificar a casa, inutilmente trabalham os que a constroem; se o Senhor não guardar a cidade, inutilmente vigiam as sentinelas” (Pe. João Colombo).

Felizes aqueles que fizeram da oração a respiração da sua alma! Felizes as mães que aprenderam a acudir aos seus afazeres recitando jaculatórias! Felizes os homens que, entre o barulho surdo das oficinas, murmuram breves orações! Era assim que São Paulo queria os cristãos: “Desejo que os homens rezem em todo lugar...” (1 Tm 2, 8).

 

B- Um mutismo da confissão.

 

Quando o Conde de Carmagnola foi derrotado pelos Milaneses o governo vêneto condenou-o à morte como traidor. E o terrível Conselho dos Dez ordenou que ele fosse arrastado, de mãos atadas por trás das costas, à praça de São Marcos, e justiçado entre duas colunas; mas antes deviam pôr-lhe na boca uma tranca de ferro.

Oh! Se o conde de Carmagnola naqueles últimos instantes pudesse falar! Teria dito palavras dilacerantes, teria invocado a piedade do povo para seus filhos inocentes; e todo o povo comovido ter-se-ia insurgido e tê-lo-ia salvo. Mas aquela inexorável tranca de ferro trancava-lhe a boca.

O Pe. João Colombo escreve: “Todo homem que comete pecado mortal é réu de traição, daquela traição que Judas cometeu no Horto das Oliveiras; e Deus o condena à morte eterna do inferno. Oh! Se o pecador não se obstinasse a fazer-se de mudo, mas falasse, mas confessasse ao sacerdote o seu pecado, a bondade de Deus cancelaria a sua condenação e lhe perdoaria! Oh! Se Judas não se houvesse fechado no seu mudo desespero, mas tivesse corrido, ao invés,  da árvore do suicídio, à árvore da cruz, e lá, chorando, tivesse aberto a boca para confessar o seu pecado, do alto Jesus moribundo teria dito também a ele aquela palavra de perdão que já dissera ao ladrão”.

Muitos são os católicos que se aproximam do confessionário com a “boca trancada”, isto é, decididos a mentirem no confessionário, a esconderem os seus pecados no tribunal do perdão... e assim, cometem sacrilégio e saem “carregados” de faltas:  “Ó homem, que a custo achais o caminho do confessionário uma vez por ano, e talvez nem isso; lembrai-vos de que é o demônio que, com suas mãos, vos mantém fechada a boca, porque não quer que torneis a ser bons! E, enquanto isso, a vida foge, e a morte se avizinha; mas, se não vos confessardes frequentemente e bem, em vida, não espereis fazer uma boa confissão no leito de morte. Naquele momento, o inimigo da vossa alma terá maior interesse de vos fechar a boca com a tranca férrea do silêncio. E vós caireis no fundo do inferno: então abrireis os lábios para maldizer a vossa estultice, mas inutilmente: será tarde demais” (Idem.).

 

Infeliz do católico que MENTE na confissão.

 

Cromázio, prefeito de Roma, estava doente de um mal estranho que nenhum médico sabia curar.

Disseram-lhe então que em Roma havia dois cristãos que realizavam curas milagrosas, e, quem sabe, talvez também curassem a ele. Cromázio mandou chamá-los: eram Sebastião e Policarpo.

“Cromázio, — disseram os dois santos ao prefeito pagão — se queres ficar bom, entrega-nos em mão todos os ídolos da tua casa, pois queremos destruí-los”.

“Se é necessário, — respondeu ele a contragosto — mostrar-vos-ei onde eles estão, e vós tomai-os, pois eu não o ouso”.

Sebastião e Policarpo pegaram todas as imagens dos falsos deuses e quebraram-nas; depois voltaram a ter com Cromázio. Porém, Cromázio não estava curado; antes, estava pior.

“Cromázio!” Disseram os santos, olhando-o fixamente na nuvem que havia no branco dos seus olhos, “Cromázio, tu mentistes: na tua casa ainda há ídolos”.

E o prefeito teve de confessá-lo: escondera alguns no seu quarto perto de si, porque lhe eram mais caros. Só quando se decidiu a entregar também esses, é que pôde ficar bom.

Assim é também na Confissão: aqueles que têm, escondido no mais fundo da sua alma, ainda mesmo um só pecado mortal, não serão perdoados nem mesmo os outros; antes, tornam-se culpados de um terrível sacrilégio.

São João Crisóstomo exclamava: “Ó homem, que é pior: fazer o mal ou dizê-lo? Se na presença de Deus não te envergonhaste de fazer o mal, por que tens vergonha de dizê-lo diante dos homens? Se não tiveste vergonha de te manchares, por que terás vergonha de te lavares?”

 

C- Mutismo do respeito humano.

 

Em Turim, no palácio do senhor Gaetano della Rovere, São Luís Gonzaga viu um velho que julgava alegrar um grupo de jovens com algumas palavras pouco polidas.  São Luís não pôde calar-se; e, ardendo no rosto, gritou: “Velho! Não tens vergonha de falar assim? As palavras más fazem apodrecer o coração”.

Milhares de católicos, por RESPEITO HUMANO, ficam calados diante de piadas imorais, canções indecentes... dizem que não é dever deles corrigir o próximo e que cada um cuide de sua vida. Pobres infelizes! Prestarão terríveis contas a Nosso Senhor no Dia do Juízo.

Muitas pessoas vivem nas trevas e percorrem o caminho do inferno, exatamente porque milhares de católicos PERMANECEM com a BOCA FECHADA.

Assim como Cristo Jesus disse àquele senhor: “Abre-te!” Digamos também aos católicos covardes e “bocas trancadas”: “Abre-te”.

Não calemos a boca, mas CORRIJAMOS aos que cometem erros: “Irmãos, caso alguém seja apanhado em falta, vós, os espirituais, corrigi esse tal com espírito de mansidão...” (Gl 6, 1), e: “Se o teu irmão pecar, vai, corrigi-o” (Mt 18, 15).

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 07 de setembro de 2008

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Abre-te!"

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