A TOMOU PELA MÃO E A FEZ LEVANTAR-SE

(Mc 1, 29-39)

 

29 E logo ao sair da sinagoga, foi à casa de Simão e de André, com Tiago e João. 30 A sogra de Simão estava de cama com febre, e eles imediatamente o mencionaram a Jesus. 31 Aproximando-se, ele a tomou pela mão e a fez levantar-se. A febre a deixou e ela se pôs a servi-los. 32 Ao entardecer, quando o sol se pôs, trouxeram-lhe todos os que estavam enfermos e endemoninhados. 33 E a cidade inteira aglomerou-se à porta. 34 E ele curou muitos doentes de diversas enfermidades e expulsou muitos demônios. Não consentia, porém, que os demônios falassem, pois eles sabiam quem era ele. 35 De madrugada, estando ainda escuro, ele se levantou e retirou-se para um lugar deserto e ali orava. 36 Simão e os seus companheiros o procuravam ansiosos 37 e, quando o acharam, disseram-lhe: ‘Todos te procuram’. 38 Disse-lhes: ‘Vamos a outros lugares, às aldeias da vizinhança, a fim de pregar também ali, pois foi para isso que eu saí’. 39 E foi por toda a Galiléia, pregando em suas sinagogas e expulsando os demônios”.

 

 

Em Mc 1, 29-31 diz: “E logo ao sair da sinagoga, foi à casa de Simão e de André, com Tiago e João. A sogra de Simão estava de cama com febre, e eles imediatamente o mencionaram a Jesus. Aproximando-se, ele a tomou pela mão e a fez levantar-se. A febre a deixou e ela se pôs a servi-los”.

 

São Beda escreve: “Primeiramente devia fechar aquela boca da serpente para que não espalhasse mais veneno. Depois curou a mulher que foi seduzida antes, da febre da concupiscência carnal. Por isso disse: ‘E logo que saíram da sinagoga foram”, e: “Se retirou, perto do anoitecer do sábado, como era costume, para ir à casa de seus discípulos. Porém, a mulher que devia servir-lhes estava com febre. E segue: ‘Achava-se com febre a sogra de Simão” (Teofilacto), e também: “Como esperavam que houvessem de obter por Ele alguma utilidade, lhe rogaram os discípulos, sem esperar a noite, que curasse a sogra de Pedro” (São João Crisóstomo), e ainda “No Evangelho de São Lucas se lê que Lhe rogaram por ela (Lc 4, 38). Tão rápido cura Ele espontaneamente aos enfermos. Deste modo mostra que as paixões e os vícios se suavizam sempre com os rogos dos fiéis, e que às vezes dá a entender aos mesmos, o que não entendem absolutamente” (São Beda), e: “A frequência com que reparte seus dons de medicina e doutrina, principalmente aos sábados, ensina que Ele não está sob a lei, mas sobre ela, e que não escolheu o sábado judaico, mas o verdadeiro sábado” (Idem., Super Lucam, cap. 4).

 

Edições Theologica comenta sobre a cura da sogra de Pedro.

Depois da cura do corpo – ou da alma – vem o “levantar-se” imediato da situação anterior e servir Jesus Cristo. Nada de lamentações de perdas de tempo, mas disponibilidade imediata ao serviço do Senhor.

Na vida pública de Jesus aparecem vários episódios entranháveis e familiares que ajudam a compreender e a apreciar a estima do Senhor pela vida ordinária do lar.

Manifesta-se aqui a eficácia da oração pelos outros: “Mal rogavam ao Salvador, Ele imediatamente curava os doentes; dando a entender que também atende as súplicas dos fiéis contra as paixões dos pecados” (São Jerônimo, Expositio in Evangelium séc. Lucam, ad loc.).

Sobre esta cura instantânea e completa observa São João Crisóstomo: “Como a doença era curável deu a conhecer o Seu poder no modo de curar, fazendo o que a medicina não podia. Depois da cura da febre os enfermos necessitam de tempo para recuperar a sua antiga saúde, mas neste caso fez-se tudo no mesmo instante” (Hom. sobre São Mateus, 27).

Os Santos Padres viram na febre desta mulher uma figura da concupiscência: “Na febre da sogra de Pedro (...) está representada a nossa carne afetada por diversas doenças e concupiscências; a nossa febre é a paixão, a nossa febre é a luxúria, a nossa febre é a ira, vícios que embora digam respeito ao corpo, perturbam a alma, a mente e o sentido” (Santo Ambrósio, Expositio Evangelii séc. Lucam, ad loc.).

Quanto as consequências práticas, diz-nos São Cirilo: “Recebamos nós Jesus, porque quando nos visita e O levamos na mente e no coração extingue em nós o ardor das maiores paixões, e manter-nos-á incólumes para que O sirvamos, isto é, para que façamos o que Lhe agrada” (Hom. 28 in Mattheum).

 

Dom Duarte Leopoldo comenta sobre Mc 1, 29-31.

O milagre desta cura foi tão completo como instantâneo. As paixões a que estamos sujeitos são comparadas com a febre desta mulher. Elas têm as intermitências da febre, esgotam-nos como ela, impedem-nos de trabalhar e de fazer o bem. É preciso deixar que Jesus nos estenda a sua mão. Avareza, ambição, cólera, luxúria, nenhuma febre resiste à sua graça. Uma vez curados, voltemos como a sogra de São Pedro às obrigações do nosso estado, pois a humildade é um grande remédio contra as recaídas.

 

Católico, em Mc 1, 30-31 diz: “A sogra de Simão estava de cama com febre, e eles imediatamente o mencionaram a Jesus. Aproximando-se, ele a tomou pela mão e a fez levantar-se. A febre a deixou e ela se pôs a servi-los”.

Com o coração cheio de caridade, imitemos o exemplo dos apóstolos.

Eles, ao ver que a sogra de São Pedro estava com febre, imediatamente mencionaram a Cristo Jesus.

Quando encontrarmos alguém precisando de uma ajuda, não passemos indiferente por esta pessoa, mas peçamos ao Senhor que a ajude.

Milhares vivem prostrados pela “febre” dos vícios; não deixemos que se percam eternamente, mas rezemos ao Senhor pedindo que os ajudem a recuperar a saúde espiritual.

Nosso Senhor “a tomou pela mão e a fez levantar-se”.  

Quando um pecador se aproxima da confissão, Cristo o toma pela mão e o levanta... a “febre” desaparece, porque agora a Graça Santificante está em sua alma imortal.

“A febre a deixou e ela se pôs a servi-los”.

Feliz da sogra de São Pedro que foi grata a Nosso Senhor; foi curada e não ficou no comodismo, mas pôs-se a servi-los.

Milhões de pessoas recebem graças de Cristo Jesus, mas ao invés de agradecê-Lo trabalhando para a Sua glória, se colocam a serviço do mundo e do demônio. Quanta ingratidão!

Católico, não vire as costas para Nosso Senhor, mas seja-Lhe grato: “Quem nos dá a caridade? Quem nos torna humildes e pacientes? Somente a gratidão. E porque reconhece a grande dívida que tem com Deus, a alma procura viver virtuosamente. Ela sabe que Deus não lhe pede outra coisa. Portanto, conservai na memória com grande empenho os inúmeros benefícios recebidos de Deus, para adquirirdes a virtude em perfeição” (Santa Catarina de Sena,  Carta 379, 2).

 

Em Mc 1, 32-34 diz: “Ao entardecer, quando o sol se pôs, trouxeram-lhe todos os que estavam enfermos e endemoninhados. E a cidade inteira aglomerou-se à porta. E ele curou muitos doentes de diversas enfermidades e expulsou muitos demônios. Não consentia, porém, que os demônios falassem, pois eles sabiam quem era ele”.

 

Teofilacto escreve: “Como o povo considerava que a ninguém era permitido curar no sábado, esperavam o pôr-do-sol para levar a Jesus aos que haviam de curar. Assim disse: ‘Ao entardecer, quando o sol se pôs, trouxeram todos os que estavam enfermos’. E depois: ‘E curou a muitas pessoas de diversas enfermidades”, e: “Onde se diz muitas deve entender-se todas, segundo o costume da Escritura” (São João Crisóstomo), e também: “Ou disse muitas, porque tiveram alguns que não foram curados por causa da incredulidade. Porém, curou a todos aqueles que dentre os presentes tinham fé: ‘E expulsou a muitos demônios” (Teofilacto), e ainda: “Os demônios sabiam que Ele era o Cristo que havia sido prometido pela lei, pois viam n’Ele todos os sinais que haviam anunciado os profetas. Ainda assim, tanto eles como seus príncipes, desconheciam o mistério de sua divindade, já que se O houvessem conhecido, não teriam crucificado ao Senhor da majestade” (Santo Agostinho), e: “O diabo compreendeu (ou melhor, suspeitou) que era o Filho de Deus pelos sinais tão portentosos que realizava aquele homem, a quem havia visto no pesado jejum de quarenta dias” (São Beda), e também: “O Senhor não deixava os demônios falarem, porque assim nos ensinava a não crer neles, ainda que digam a verdade, pois  mistura a verdade com a mentira” (Teofilacto).

 

O Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena comenta sobre esse trecho da Palavra de Deus.

É nesse quadro que o Evangelho apresenta Jesus rodeado de multidão de sofredores: “… trouxeram-lhe todos os que estavam enfermos e endemoninhados. E a cidade inteira aglomerou-se à porta. E ele curou muitos doentes de diversas enfermidades e expulsou muitos demônios”. Está o Salvador trabalhando, está em ato de salvação. “Andava pregando nas sinagogas deles, por toda a Galiléia, e expulsava os demônios”. Para aliviar a humanidade do estado de sofrimento físico e moral em que se debate, Cristo recorre à pregação e às curas. Com a primeira, ilumina os espíritos, revela o amor de Deus, leva as almas à fé, e dá sentido à dor, mostra o caminho da salvação. Com os milagres, cura os corpos enfermos, expulsa os demônios. Quer Cristo salvar o homem total, alma e corpo. Assim cura a carne, para que seja meio e sinal da salvação espiritual. E quando não suprime o sofrimento, ensina a carregá-lo com esperança e amor, para que dê frutos de vida eterna.

 

Dom Duarte Leopoldo comenta Mc 1, 32-34.

Aos sábados, abstinham-se os judeus de todo trabalho. Mas, como ao pôr do sol começava o novo dia, aproveitavam-se da ocasião para trazer-lhe os seus doentes.

Compreende-se o entusiasmo de todo país à vista de tais milagres. Infelizmente, porém, os fatos confirmarão, mais tarde, que esse entusiasmo não produziu os frutos de conversão que era de esperar. Evitemos o abuso da graça... Jesus não quer ser honrado pelos espíritos impuros, para não parecer que estava de acordo com eles.

 

Edições Theologica comenta Mc 1, 34.

Os demônios possuem um saber sobre-humano, por isso reconhecem Jesus como o Messias (Mc 1, 24). Por meio dos endemoninhados, os demônios podiam dar a conhecer o caráter messiânico de Jesus. Mas o Senhor, com o Seu poder divino, manda-os guardar silêncio. Ordena a mesma coisa, noutras ocasiões, aos discípulos (Mc 8, 30; 9,9), e aos doentes, depois da sua cura, ordena que não propaguem a notícia (Mc 1, 44; 5,43; 7, 36; 8,26).

Este proceder do Senhor pode explicar-se como pedagogia divina para ir ensinando que a ideia que do Messias tinham a maioria dos contemporâneos de Jesus era demasiado humana e politizada. Por isso quer primeiro despertar o interesse com os Seus milagres, e ir esclarecendo o sentido do Seu messianismo com as Suas palavras, para que os discípulos e todo o povo o possam compreender progressivamente.

Também devemos pensar, com alguns Santos Padres, que Jesus não quer aceitar em favor da verdade o testemunho daquele que é o pai da mentira. E por isso, apesar de O reconhecerem, não os deixa dizer Quem é.

 

Em Mc 1, 35-39 diz: “De madrugada, estando ainda escuro, ele se levantou e retirou-se para um lugar deserto e ali orava. Simão e os seus companheiros o procuravam ansiosos e, quando o acharam, disseram-lhe: ‘Todos te procuram’. Disse-lhes: ‘Vamos a outros lugares, às aldeias da vizinhança, a fim de pregar também ali, pois foi para isso que eu saí’. E foi por toda a Galiléia, pregando em suas sinagogas e expulsando os demônios”.

 

Teofilacto escreve: “O Senhor, depois de curar os enfermos se retirou para um lugar afastado: ‘Pela manhã, de madrugada, saiu para um lugar solitário’. Com o qual nos ensinou a não fazer nada por ostentação e a não tornar público o bem que fazemos. E continua: ‘E fazia assim oração”, e: “Porque, agindo deste modo nos oferece verdadeiramente como modelo, com o qual devemos configurar-nos por nossas boas obras” (São João Crisóstomo), e também: “Também nos mostra que é a Deus a quem devemos atribuir todo o bem que fazemos, e a quem devemos dizer: Todo o bem de que gozamos nos vem de Ti desde o Céu” (Teofilacto), e ainda: “Se dirige àqueles que mais necessitam, porque convém estender por todas as partes seus raios e não limitar sua doutrina em um só lugar. E prossegue: ‘Porque para isso Ele veio” (Idem), e: “No qual manifesta o mistério da encarnação e o senhorio de sua divindade, confirmando que veio ao mundo por sua vontade. E São Lucas disse: ‘Para isso fui enviado’, manifestando a boa vontade de Deus Pai sobre a disposição da encarnação do Filho. E pregava nas sinagogas e por toda a Galiléia” (São João Crisóstomo), e também: “Nesta pregação que teve lugar em toda a Galiléia, está contido também o sermão que pronunciou o Senhor no monte, como refere São Mateus. Nem deste, nem de algum modo semelhante faz menção São Marcos” (Santo Agostinho).

 

Dom Duarte Leopoldo comenta esse trecho da Palavra de Deus.

Jesus rezava sempre, passando muitas noites inteiras neste santo exercício, não obstante as fadigas do dia. Se Jesus, que era Deus, rezava com tanta frequência, como compreender um cristão que não reza?

 

Edições Theologica comenta Mc 1, 35-39.

São muitos os passos do Novo Testamento que referem à oração de Jesus. Os evangelistas assinalaram-no nos momentos mais importantes do ministério público do Senhor: Batismo (Lc 3,21), escolha dos Apóstolos (Lc 6, 12), primeira multiplicação dos pães (Mc 6, 46), Transfiguração (Lc 9, 29), no horto do Getsêmani antes da Paixão (Mt 26, 39), etc. Marcos, por seu lado, refere à oração de Jesus em três momentos solenes: no começo do Seu ministério público (1, 35), no meio (6, 46), e no fim, no Getsêmani (14, 32).

A oração de Jesus é oração de louvor perfeito ao Pai, é oração de petição por Si mesmo e por nós, e é, finalmente, modelo para os Seus discípulos. É louvor e ação de graças perfeita porque Ele é o Filho amado de Deus em Quem o Pai Se compraz plenamente (Mc 1, 11). É oração de petição, pois pedir coisas a Deus é o primeiro movimento espontâneo da alma que reconhece Deus como Pai. A oração de Jesus, segundo vemos por numerosos passos evangélicos (Jo 17, 9 e ss.), era uma petição contínua ao Pai pela obra da Redenção, que Ele devia realizar por meio da dor e do sacrifício. O Senhor quer, além disso, ensinar-nos com o Seu exemplo qual deve ser a atitude do cristão: entabular habitualmente um diálogo filial com Deus, no meio e por ocasião das nossas atividades ordinárias — trabalho, vida familiar, relações sociais, apostolado —, com o fim de dar à nossa vida um significado e uma presença autenticamente cristãos, já que, como assinalará mais tarde Jesus, “sem Mim nada podeis fazer” (Jo 15, 5).

Jesus Cristo diz que a Sua missão é pregar e evangelizar. Para isto foi enviado. Os Apóstolos, por sua vez, foram escolhidos por Jesus para os enviar a pregar (Mc 3, 14; 16, 15). A pregação é o meio escolhido por Deus para levar a cabo a salvação: “Aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação” (1 Cor 1, 21). Por isso o mesmo São Paulo diz a Timóteo: “Prega a palavra, insiste oportuna e inoportunamente, repreende, censura e exorta com bondade e doutrina” (2 Tm 4, 1-2). A fé vem-nos pelo ouvido, dirá em Rm 10, 17 e, citando o profeta Isaías, exclama com entusiasmo: “Que formosos são os pés dos que anunciam boas novas!” (Rm 10, 15; Is 52, 7).

A Igreja põe em realce entre os ofícios principais de Bispos e de presbíteros o de pregar o Evangelho. São Pio X chegou a dizer que “o dever de pregar é o que mais grave e estritamente obriga o sacerdote” (Acerbo nimis).

O Povo de Deus é reunido antes de tudo pela palavra do Deus vivo (cfr 1 Pd 1, 23; At 6, 7; 12, 24), que é justíssimo esperar receber da boca dos sacerdotes (cfr Ml 2, 7; 1 Tm 4, 11-13; etc.). Com efeito, como ninguém se pode salvar se antes não tiver acreditado (cfr Mc 16,16), os presbíteros, como cooperadores dos Bispos, têm, como primeiro dever, anunciar a todos o Evangelho de Deus (cfr 2 Cor 11, 7), para que, realizando o mandato do Senhor: Ide por todo o mundo, pregai o Evangelho a todas as criaturas (Mc 16, 15), constituam e aumentem o Povo de Deus.

A pregação de Jesus não consiste apenas em palavras. É uma doutrina acompanhada com a autoridade e eficácia de uns fatos (Mc 1,27.39). Jesus faz e ensina (At 1, 1). Também a Igreja foi enviada a pregar a salvação, e a realizar a obra salvífica que proclama. Esta obra é posta em prática mediante os sacramentos e, especialmente, através da renovação do sacrifício do Calvário na Santa Missa.

Na Igreja de Deus, todos os fiéis têm de escutar devotadamente a pregação do Evangelho e todos têm de sentir, por sua vez, a responsabilidade de transmiti-lo com palavras e com fatos. Por seu lado, à Hierarquia da Igreja corresponde ensinar autenticamente - com a autoridade de Cristo – a doutrina evangélica.

 

O Pe. Francisco Fernández-Carvajal comenta Mc 1, 35-39.

Jesus levantou-se de madrugada, como em muitas outras ocasiões, e retirou-se para um lugar fora da cidade a fim de orar. Os Apóstolos encontraram-no ali e disseram-lhe: Todos andam à tua procura. E o Senhor respondeu-lhes: Vamos a outra parte, às aldeias próximas, para ali pregar, pois para isso vim.

A missão de Cristo é evangelizar, levar a Boa Nova até o último recanto da terra, através dos Apóstolos e dos cristãos de todos os tempos. Esta é a missão da Igreja, que assim cumpre o que o Senhor lhe preceituou: “Ide e pregai a todos os povos…, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei” (Mt 28, 19-20). Os Atos dos Apóstolos narram muitos pormenores daquela primeira evangelização; no próprio dia de Pentecostes, São Pedro prega a divindade de Jesus Cristo, a sua Morte redentora e a sua Ressurreição gloriosa (At 2, 38). São Paulo, citando o profeta Isaías, exclama com entusiasmo: “Como são formosos os pés dos que anunciam a Boa Nova!” (Rm 10, 15).

Evangelizar não é glória para mim, escreve São Paulo, mas necessidade: “Ai de mim se não evangelizar!” (1 Cor 9, 16).

Com essas mesmas palavras de São Paulo, a Igreja tem recordado com frequência aos fiéis a chamada que o Senhor lhes dirige para levarem a doutrina de Cristo a todos os cantos do mundo, aproveitando qualquer ocasião.

São João Crisóstomo vai ao encontro das possíveis desculpas perante esta gratíssima obrigação: “Não há nada mais frio do que um cristão que não se preocupa pela salvação dos outros […]. Não digas: não posso ajudá-los, porque, se és cristão de verdade, é impossível que não o possas fazer. Não há maneira de negar as propriedades das coisas naturais; o mesmo acontece com isto que agora afirmamos, pois está na natureza do cristão agir dessa forma [...]. É mais fácil o sol deixar de iluminar ou de aquecer do que um cristão deixar de dar luz; mais fácil do que isso seria que a luz fosse trevas. Não digas que é impossível; impossível é o contrário [...]. Se orientarmos bem a nossa conduta, o resto sairá como consequência natural. Não se pode ocultar a luz dos cristãos, não se pode ocultar uma lâmpada que brilha tanto” (Homilia sobre os Atos dos Apóstolos, 20).

Perguntemo-nos se no nosso ambiente, no lugar onde vivemos e onde trabalhamos, somos verdadeiros transmissores da fé, se levamos os nossos amigos a uma maior frequência de sacramentos. Examinemos se encaramos a ação apostólica como algo urgente, como exigência da nossa vocação, se sentimos a mesma responsabilidade daqueles primeiros, pois a necessidade hoje não é menor... Ai de mim se não evangelizar!

A dedicação à tarefa apostólica nasce da convicção de se possuir a Verdade e o Amor, a verdade salvadora e o único amor que preenche as ânsias do coração.

Quando se perde essa certeza, não se encontra sentido na difusão da fé. Chega-se a pensar, por exemplo, mesmo em ambientes cristãos, que não se pode fazer nada para que os não-cristãos apoiem uma lei reta, de acordo com o querer divino. Deixa também de ter sentido levar a doutrina de Cristo a regiões onde ela ainda não chegou ou onde a fé não está profundamente arraigada; quando muito, a missão apostólica converte-se numa mera ação social em favor da promoção desses povos, esquecendo o maior tesouro que se lhes pode dar: a fé em Jesus Cristo, a vida da graça... A fé debilitou-se nesses cristãos e eles esqueceram que a verdade é única, que a verdade torna mais humanos os homens e os povos, que abre o caminho do Céu.

É importante que a fé leve a empreender ações sociais, mas omitir a essência da sua mensagem: “O mundo não pode conformar-se apenas com reformadores sociais. Precisa de santos. A santidade não é um privilégio de poucos; é um dom oferecido a todos... Duvidar disso significa não entender completamente as intenções de Cristo” (João Paulo II, Discurso aos educadores apostólicos, 12-09-1987).

A fé é a verdade, e ilumina a nossa inteligência, preserva-a de erros, cura as feridas e a inclinação para o mal que o pecado original semeou em nós. Provém daí a segurança do cristão, não só no que se refere estritamente à fé, mas a todas as questões que lhe são conexas: a origem do mundo e da vida, a dignidade intocável da pessoa humana, a importância da família... Isto nos leva — como ensina Paulo VI — a ter uma atitude dogmática, sim, que significa que não está fundamentada numa ciência própria, mas na Palavra de Deus [...]. Atitude que não nos ensoberbece, como possuidores afortunados e exclusivos da verdade, mas nos torna fortes e corajosos para defendê-la, amorosos para difundi-la. Santo Agostinho no-lo recorda: “Sem soberba, estai orgulhosos da verdade”.

É um dom imenso termos recebido a fé verdadeira, mas é ao mesmo tempo uma grande responsabilidade. A vibração apostólica de todo o cristão consciente do tesouro que recebeu não é fanatismo: é amor à verdade, manifestação de fé viva, coerência entre o pensamento e a vida. Proselitismo, no sentido nobre e verdadeiro do termo, não é de forma alguma atrair as almas com enganos ou violências, mas o esforço apostólico por dar a conhecer Cristo e a sua chamada a todos os homens, querer que as almas conheçam a riqueza que Deus revelou e se salvem, que recebam a vocação para uma entrega plena a Deus, se for essa a vontade divina. É uma tarefa das mais nobres que o Senhor nos confiou.

O empenho por difundir a fé, sempre com respeito e apreço pelas pessoas, não se concilia com a pusilanimidade de transmitir meias verdades por receio de que a plenitude da verdade e as exigências de uma autêntica vida cristã possam entrar em choque com o pensamento em voga e com o aburguesamento de muitos. A verdade não conhece meios termos e o amor sacrificado não admite descontos nem pode ser objeto de compromissos. Uma das condições de toda a ação apostólica é a fidelidade à doutrina, ainda que em alguns casos esta se mostre difícil de cumprir e chegue até a exigir um comportamento heróico ou, pelo menos, cheio de fortaleza.

Não se podem omitir temas tais como o da generosidade em ter uma família numerosa, o das exigências da justiça social, o da entrega plena a Deus quando Ele chama... Não se pode querer agradar a todos reduzindo de acordo com as conveniências humanas as exigências do Evangelho: Falamos — escrevia São Paulo —, não como quem procura agradar aos homens, mas somente a Deus.

Não é bom caminho pretender tornar fácil o Evangelho, silenciando ou rebaixando os mistérios que devem ser cridos e as normas de conduta que devem ser vividas. Ninguém pregou nem pregará o Evangelho com maior credibilidade, energia e atrativo que Jesus Cristo, e houve quem não o seguisse fielmente. Não podemos esquecer-nos de que pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os gentios, mas poder de Deus para os escolhidos, quer judeus, quer gregos.

E esse anúncio significa que devemos insistir com os nossos colegas e amigos, um por um, na necessidade de mudarem de vida, de fazerem penitência, de renunciarem a si próprios, de estarem desprendidos dos bens materiais, de serem castos, de buscarem com humildade o perdão divino, de corresponderem ao que Ele quer de nós desde a eternidade. O que não quer dizer, no entanto, que não devamos esforçar-nos por adaptar-nos sempre à capacidade e às circunstâncias daqueles que pretendemos levar ao Senhor, tal como Ele próprio fez ao longo do Evangelho, tornando-o acessível a todos.

A caridade de Cristo urge-nos! Este foi o motor da incansável atividade apostólica de São Paulo e este há de ser também o aguilhão que nos incite. O amor a Deus há de levar-nos a sentir a urgência da tarefa apostólica e a não desperdiçar nenhuma oportunidade de exercê-la; mas ainda, em muitas ocasiões, há de levar-nos a provocar essas oportunidades, que de outra forma nunca nos chegariam.

Todos andam à tua procura... O mundo tem fome e sede de Deus. Por isso, além da caridade, devemos cultivar a esperança; os nossos amigos e conhecidos, mesmo os mais afastados de Deus, também têm necessidade e desejos d’Ele, ainda que muitas vezes não o manifestem. E, sobretudo, o Senhor procura-os.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 04 de fevereiro de 2009

 

Vide também:

Todos te procuram

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "A tomou pela mão e a fez levantar-se"

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