QUERES ENTRAR NO CÉU?

(Mt 6, 33)

 

“Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas”.

 

Não se salva vivendo na “poltronice”, na boa vida e na ociosidade; para conquistar o céu é preciso trabalhar e lutar continuamente: “... o Reino dos Céus sofre violência, e os violentos arrebatam-no” (Mt 11, 12), e: “O Reino dos Céus não pertence aos que dormem e vivem dando-se todos os gostos, mas aos que lutam contra si mesmos” (Clemente Romano), e também: “Essa força não se manifesta na violência contra os outros; é fortaleza para combater as nossas debilidades e misérias, valentia para não mascarar as nossas infidelidades, audácia para confessar a fé, mesmo quando o ambiente é contrário” (São Josemaría Escrivá).

 

Para entrar no céu é preciso imitar a Cristo e lutar diariamente.

Perguntai a São Paulo o que deveis fazer para vos tornardes semelhantes a Jesus Cristo. São Paulo não vos enganará. Ele é o doutor que mais admiravelmente expõe as leis divinas de nossa perfeição na vida espiritual...

Santo Apóstolo, temos a fé de Pedro, o discípulo escolhido por Jesus  Cristo para seu vigário na terra... Basta-nos?

Não basta.

Temos a caridade para com Deus e o amor para com o próximo, que aprendemos do amigo predileto de Jesus... Basta?

Não.

Temos a fortaleza heróica demonstrada por São João Batista ante os inimigos... Basta?

Não.

Temos a confiança em Deus que distinguiu o patriarca São José, o qual mereceu ser tido por pai de Jesus Cristo... Basta?

Não basta, não... Escutai o que vos digo: Jesus Cristo é o modelo que deveis ter sempre diante dos olhos... é o retrato que haveis de reproduzir em vosso corpo e em vossa alma. E quem era Jesus Cristo? Era a caridade, era a justiça, a mansidão, a prudência e a paciência... Era a beleza de Deus manifestando-se aos olhos humanos para que nele nos transformássemos. Tendes, pois, de trabalhar, trabalhar muito, até que sejais retratos perfeitos desse divino modelo...

Mas, santo Apóstolo, nossa carne é fraca, nosso coração é louco, nossa concupiscência é animal, nossas inclinações são perversas, as tentações são muitas, os demônios rodeiam-nos dia e noite, o mundo nos fascina...

Trabalhai! É preciso imitar a Jesus Cristo. Essa é a única e segura garantia de nossa eterna salvação. Se temos a sua graça, temos tudo...

Mas isso será trabalho de muitos anos.

Tendes razão: é trabalho de toda a vida. Mas para isso é que Deus nos pôs no mundo, para isso é a vida. Se não a entendeis assim, estais tristemente equivocados.

Trabalhai! Tendes diante de vós uma eternidade para descansar e se alegrar de vossas virtudes.

 

Enquanto estamos neste mundo devemos cuidar de duas vidas: da vida presente e terrestre e da vida futura e celeste.

Devemos cuidar da primeira sem nos apegarmos ao que passa... cuidar da vida passageira com os olhos fixos na  eterna: “Procuremos sofrer com paciência as aflições da vida presente, oferecendo-as a Deus, em união com as dores que Jesus Cristo sofreu por nosso amor e alentando-nos com a esperança da glória. Esses trabalhos, penas, angústias, perseguições e temores hão de acabar um dia e, se nos salvarmos, serão para nós motivos de gozo e alegria inefável no reino dos bem-aventurados” (Santo Afonso Maria de Ligório).

Se para sustentar esta vida é preciso trabalhar, quanto mais para conseguir aquela... a eterna! Entre ambas, pois, devemos repartir o tempo, as forças e o trabalho: “... operai a vossa salvação com temor e tremor” (Fl 2, 12). É preciso ocupar-se somente com aquilo que edifica... não perdendo tempo com o lixo do mundo: “... ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, virtuoso ou que de qualquer modo mereça louvor” (Fl 4, 8).

A vida futura consta de glória e felicidade; e para conquistá-la é preciso nos desapegar das coisas da terra e perseverar no bem: “O Céu é a posse de Deus. No Céu contempla-se a Deus, adora-se e ama-se a Ele. Mas para chegar ao Céu é preciso desprender-se da terra” (Santa Teresa dos Andes), e: “Para se salvar não basta estar no caminho do céu, mas é necessário perseverar nele... o céu é para os que pelejam por alcançá-lo” (Pe. Alexandrino Monteiro), e também: “Que enorme estultícia é amontoar de onde se há de partir, e não enviar para onde se há de ir! Põe as tuas riquezas onde tens a tua pátria” (São João Crisóstomo).

Quando Deus nos houver de admitir à sua presença para ser a nossa felicidade eterna, há de contar todos os passos que por seu amor demos neste mundo, ponderar todos os atos da nossa vida, enumerar todos os sacrifícios que praticamos em O servir... para por tudo medir o grau de glória e felicidade que nos há de dar: “Vós dais a cada um segundo as suas obras” (Sl 61, 13), e: “O Juízo versará também sobre o modo como se correspondeu às graças recebidas de Deus, e como se utilizaram os seus dons para amar o Senhor e fazer bem ao próximo... A nós, também nos serão pedidas contas do que tivermos feito com os dons divinos” (Monge Edouard Clerc).

De nada nos hão de valer, então, as canseiras do corpo que não foram toleradas com os olhos em Deus: “Tudo o que não se faz para Deus transforma-se em sofrimento” (Santo Afonso Maria de Ligório).

Quando Deus nos houver de dar o prêmio de nossos trabalhos, não reparará se foram honrosos para nós e de grande admiração para o mundo; mas olhará para a intenção com que foram feitos, e se esta foi reta e santa receberá o prêmio conveniente. De pouco valerão ali grandes diplomas adquiridos com o fim de nos engrandecermos entre os homens: “E tudo o que fizerdes de palavra ou ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, por ele dando graças a Deus, o Pai” (Cl 3, 17), e: “Em tudo o que fizerdes ponde a vossa alma, como para o Senhor e não para homens, sabendo que o Senhor vos recompensará como a seus herdeiros” (Cl 3, 23- 24), e também: “Nada no mundo poderia apagar o que se faz para a glória do Senhor” (Venerável Beatriz da Encarnação), e ainda: “A vida dos mundanos que tudo fazem por motivos humanos é inútil aos olhos do Altíssimo; porém, meritória é a vida dos fiéis que em tudo se propõem sempre o contentamento divino” (Pe. Luís Bronchain).

Nem os títulos da nobreza, nem os feitos militares, nem as insígnias de reis ou imperadores hão de mover Deus a dar um prêmio maior do que o merecido: “Retribuirá a cada um segundo suas obras” (Rm 2, 6).

Ricos e pobres, sábios e ignorantes, filhos de reis e filhos de lavradores... todos são iguais diante de Deus.

Dirá Deus – Queres entrar no céu e viver e se alegrar com os Anjos e Santos? “Pois bem, mostra os direitos que tens a ele, apresenta a tua folha de serviços e terás entrada franca. Onde estão as obras de amor para comigo e para com o teu próximo? Onde estão as virtudes alcançadas em tantos anos que te dei de vida sobre a terra? Onde estão as vitórias alcançadas nessa prolongada guerra em que andaste lutando contra o mundo, o demônio e a carne? Onde estão os vícios corrigidos com virtudes e as paixões dominadas com penitências? Onde está a abnegação da própria  vontade e a mortificação dos sentidos, negando-lhes os que não lhes era lícito ambicionar?” (Pe. Alexandrino Monteiro).

Queres entrar no céu? Não sabes que não se abre a sua porta aos indolentes e tíbios que se deixam adormecer na moleza e nos vícios?

Queres entrar no céu? E nunca leste o que Eu disse àquele jovem que me pediu um conselho para conseguir a sua salvação: Se queres entrar na vida, guarda os mandamentos? (Mt 19, 17).

Se queres ir ao céu tens de trabalhar... e trabalhar muito! Tens que  cortar tuas afeições desordenadas; tens muito que plantar em virtudes... muito que aperfeiçoar na sua vida: “Se vai ao céu pela oração... em desprezar as vaidades terrenas... vencendo os perigos e trabalhando por amor a Deus.  Não vamos à conquista de uma cidade viciosa e decaída, mas à conquista de uma cidade eterna e divina. Que dificuldade, que perigo, que tentação pode deter-nos?” (Pe. João Colombo).

Sem trabalho não produzem os campos e sem poda não frutificam as árvores. Para ter boa colheita no outono precisa o agricultor trabalhar quase o ano inteiro.

A nossa alma é um campo. Para que ele dê o fruto desejado, precisamos trabalhá-lo não só um ano, mas a vida inteira. Deus semeou nele a semente da graça; nós devemos trabalhar para a conservação dela e fazer que chegue a ser árvore onde colheremos muitos frutos para a vida eterna. Também devemos fazer uma sementeira em nossa alma se queremos ter boa colheita de glória no céu. Quem mais semeia, mais há de colher. O maior trabalho será coroado com maior prêmio. Quem melhores obras semeou pelo campo da vida, mais merecimentos recolherá; e quanto mais merecimentos, mais glória: “O que é o céu? É um monte, diz figuradamente Davi: Quem subirá ao monte do Senhor? (Sl 23, 3). Para lá chegar é preciso subir. Quem fica sentado nas colinas, contemplando as flores das planícies, admirando a amenidade dos vales, gozando o frescor das fontes... com certeza não chegará ao cume” (Pe. Alexandrino Monteiro).

Pelo contrário, quem não trabalha na cultura da sua alma, longe de colher merecimentos para o céu, colherá merecimentos para o inferno. A alma sem cultura torna-se em breve tempo semelhante a um campo estéril, onde durante anos não entrou o arado, e que, portanto, precisará de que se empregue mais trabalho e mais tempo para expulsar as feras, rasgar o terreno duro e arrancar as ervas daninhas: “Se uma casa não for habitada pelo dono, ficará sepultada na escuridão, desonra  e desprezo, repleta de toda espécie de imundícia. Também a alma, sem a presença de seu Deus e dos anjos que nela jubilavam, cobre-se com as trevas do pecado, de sentimentos vergonhosos e de completa ignomínia. Ai da estrada por onde ninguém passa nem se ouve voz de homem! Será morada de animais. Ai da alma se nela não passeia Deus e com sua voz afugenta as feras espirituais da maldade!” (São Macário).

Trabalhe, pois, em tua alma, e trabalhe muito e sempre, porque o céu não é prêmio da ociosidade: “Aquele que luta tem o que esperar. Onde há luta, há coroa” (Santo Ambrósio), e: “Quando será que a nossa vida deixará de ser, como até hoje foi, um serviço reservado e exaustivo ao mundo, em vez de pertencer a Deus? Quando começaremos a interessar-nos tanto pelo céu, como nos interessamos pela terra? Quando começaremos a ser servidores da virtude, como temos sido até agora servidores do pecado e do vício?” (Pe. João Batista Lehmann).

Milhões de católicos se consomem pelas coisas caducas e passageiras desse mundo... derramam “cachoeiras” de suor para conquistar o que passa... perdem noites de sono correndo atrás do que perece... passam por cima de todos os obstáculos para serem aplaudidos pelos homens: “De fato, que aproveitará ao homem se ganhar o mundo inteiro, mas arruinar a sua vida?” (Mt 16, 26).

Isto pelo que passa... pela terra! E pelo céu? Que se faz por ele? Nisto não se pensa! Disto não se trata... nem se quer ouvir falar! Quanto muito se reserva um pequeno espaço para se tratar desse importantíssimo negócio para o último instante da vida... para a véspera da morte!

Que desviados andam estes tais do que Jesus Cristo diz no Evangelho: “Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas” (Mt 6, 33).

Segundo essa doutrina, devemos por mais cuidado em procurar o céu do que qualquer outro bem terreno. Todo o cuidado dos bens temporais se deve subordinar aos dos eternos, isto é, aos interesses da alma e ao serviço de Deus.

Para conseguir, pois, o céu, devemos reunir todas as nossas forças e pôr em atividade todo o nosso ser: corpo, alma, sentidos e potências; pois o céu é mais importante do que qualquer outro bem; e, ele ganho, tudo está salvo.

O Pe. Alexandrino Monteiro escreve: “Com o corpo trabalharemos para o céu, sujeitando-o à observância da Lei de Deus e da Igreja; com a alma, exercitando-a nas virtudes; com os sentidos, negando-lhes o que não lhes é permitido desejar; com a vontade, resistindo aos ímpetos da concupiscência; com o entendimento, submetendo-o às verdades da fé; com a memória, recordando os inumeráveis benefícios de Deus”.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 10 de julho de 2011

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Pe. Francisco Alves, Tesouro de exemplos

Clemente de Alexandria, Quis dives salvetur, 21

São Josemaría Escrivá, Cristo que passa, 82

Santa Teresa dos Andes, Diário

Pe. Alexandrino Monteiro, Raios de luz

Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a morte; A prática do amor a Jesus Cristo

São João Crisóstomo, Escritos

Monge Edouard Clerc, Que há para além da morte?

Venerável Beatriz da Encarnação, Escritos

Pe. Luís Bronchain, Meditações para todos os dias do ano

Pe. João Colombo, Pensamentos sobre os Evangelhos e sobre as festas do Senhor e dos Santos

São Macário, Escritos

Santo Ambrósio, Escritos

Pe. João Batista Lehmann, Luz perpétua, Volume I

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Queres entrar no céu?”

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