NÃO AMEMOS DA BOCA PARA FORA (1 Jo 3, 18)
“Filhinhos, não amemos com palavras nem com a língua, mas com ações e em verdade”.
Devemos fazer uso agradável a Deus dos bens terrestres se os possuímos; do contrário, eles nos arrastam para o caminho da perdição. Pode haver uso mais agradável a Deus que o emprego da riqueza pela esmola?
I. Existe um preceito da esmola.
Dar esmola não é um mero conselho, mas um grave preceito: “Não vos iludais: a esmola não é um simples conselho, mas um preceito positivo, como o de santificar os dias de festa e de honrar pai e mãe” (Pe. João Colombo). O mandamento grave que nos obriga a amar o próximo impõe-nos igualmente como obrigação dar esmola. Quem ama ao próximo não se contenta com a simples benevolência, mas procura fazer-lhe bem: “Filhinhos, não amemos com palavras nem com a língua, mas com ações e em verdade” (1 Jo 3, 18). São Francisco de Sales escreve: “Reserva frequentemente uma parte de teus bens para empregá-la em favor dos pobres… É verdade que Deus te recompensará nesta e na outra vida; pois nada faz prosperar tanto os bens temporais como a esmola cristã”, e: “Dentre esses gestos de misericórdia, a esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos da caridade fraterna. É também uma prática de justiça que agrada a Deus” (Catecismo da Igreja Católica), e também: “Com efeito, aquele que alimenta o Cristo presente no pobre, constrói seu tesouro no céu” (São Leão Magno). Jesus Cristo confirmou com sua palavra o que o preceito natural prescreve: “Dai ao pobre da vossa abundância” (Lc 11, 41). No juízo final muitos serão condenados porque se negaram a dar esmola (Mt 25, 31-46). Àqueles que amam a perfeição e que aspiram a um lugar de destaque no Céu, Jesus Cristo indica como caminho mais curto para chegar a este sublime intento o da caridade, e aconselha dar não só o que lhes é supérfluo, mas vender tudo que possuem e dá-lo aos pobres: “Se queres ser perfeito, vai e vende tudo que tens e dá aos pobres” (Mt 19, 21). Santo Tomás de Aquino escreve: “Os bens terrenos que o céu confiou ao homem são do homem quanto à sua propriedade; mas, quanto ao uso devem ser não daquele que os possui como também dos outros que com o supérfluo podiam-se sustentar”, e: “Se reconheces que teus bens te foram dados por Deus, porventura Deus tem sido injusto em ter distribuído as coisas tão desigualmente? Por que tu vives na abundância enquanto que o outro deve mendigar? É do esfomeado o pão que tu tens de sobra; é do esfarrapado a túnica que escondes no guarda-roupa; é do descalço o calçado que deixas estragar em tua casa; é do pobre o dinheiro que guardas fechado no cofre. Por que fazes injustiça a tantos, quando poderias fazer tanto bem?” (São Basílio Magno), e também: “Dá para comer a quem tem fome; se assim não fizeres és réu de homicídio” (Santo Ambrósio). Dado o direito da propriedade, a esmola é exigida não só pela caridade, como também pela justiça.
II. As vantagens da esmola.
Em Mt 10, 42 diz: “Todo o que der de beber a um desses pequeninos um copo de água fria só pela razão de ser meu discípulo, na verdade vos digo que não perderá sua recompensa”; porque, “com a esmola constitui a Deus como devedor” (São João Crisóstomo). Em Pr 19, 17 diz: “A Deus empresta quem dá ao pobre, e Deus mesmo lhe dará a recompensa”, e: “Quantas vezes fizeste qualquer coisa a um destes meus irmãos pequeninos a mim o fizeste” (Mt 25, 40), e também: “Deus se dá como penhor pelos pobres e restituirá tudo com medida abundante” (São Leão Magno). Em Tb 4, 11 diz: “Pela esmola Deus nos perdoa os pecados”. Foi este o conselho que Deus pela boca do profeta Daniel deu a Nabucodonosor: “Resgata com esmolas teus pecados, resgata com obras de misericórdia aos pobrezinhos tua iniquidade” (Dn 4, 24). E eis aqui uma promessa que nos faz Jesus Cristo: “Antes, dai o que tendes em esmola e tudo ficará puro para vós!” (Lc 11, 41), e: “… a esmola, que alivia a miséria material dos deserdados, remedeia a miséria moral dos ricos ou de quem dá esmola. A caridade, a benevolência e a generosidade para com os pobres alcançam de Deus o perdão dos pecados e enriquece para a vida eterna” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena), e também: “Que sejam misericordiosos com os pobres aqueles que querem para si o perdão de Cristo. Que estejam prontos para alimentar os pobres, aqueles que desejam chegar à sociedade dos bem-aventurados… As esmolas purificam, apagam os pecados e despedem a morte” (São Leão Magno). Pela esmola Deus atende as nossas preces: “Dai e dar-se-vos-á” (Lc 6, 38), e: “Divide teu pão com o faminto, recebe em tua casa os pobres peregrinos; quando vês um nu, veste-o e não desprezes a tua carne. Então romperá a tua luz como a aurora e a tua saúde mais depressa nascerá, e a tua justiça irá diante da tua face e a glória do Senhor te recolherá. Então invocarás tu o Senhor, e ele atenderá; tu clamarás a ele, e ele te dirá: ‘Eis-me aqui…” (Is 58, 7-9), e também: “Não vires tua face para nenhum pobre, assim não acontecerá que Deus vire sua face para ti” (Tb 4, 7), e ainda: “Nós todos somos mendigos de Deus; mas para que Deus reconheça seus mendigos, é preciso que primeiro conheçamos os nossos” (Santo Agostinho). Pela esmola Deus nos concederá uma boa morte: “Não me lembro de um caso sequer, que tenha tido má morte quem fez obras de caridade; porque há muitos intercessores e impossível é que a oração de muitos não seja ouvida” (São Jerônimo), e: “Só a misericórdia conduz os homens a Deus e aproxima Deus dos homens; nunca se viu um homem caridoso terminar desastrosamente” (Santo Agostinho). Pela esmola o eterno Juiz nos dirá aquelas palavras consoladoras: “Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do reino que vos foi preparado desde a criação do mundo; pois tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era hóspede e me recolhestes; estava nu e me cobristes; enfermo e me visitastes. Estava no cárcere e viestes ver-me” (Mt 25, 34-36).
III. Como devemos dar esmolas?
Devemos fazê-la de acordo com as nossas forças: “Dai aos pobres segundo vossas forças” (Eclo 14, 13), e: “Se tiveres muito, dá muito” (Tb 4, 8), e também: “De todas as artes a mais lucrativa é a de dar esmola” (São João Crisóstomo), e ainda: “Um patrimônio está bem no seguro quando é confiado a Deus” (São Cipriano). Em Tb 4, 8 diz: “Se tens pouco dá de boa vontade”, e: “Deus não põe na balança a dádiva, mas o coração” (São Gregório Magno), e também: “Quando temos pouco, pois bem, damos; e quando não possuímos, damos emprestado, se o possuímos. Aquele que não pode atender às necessidades dos doentes, então pode visitá-los, dizer-lhes alguma palavra de consolo, rezar por eles, a fim de que façam bom uso da sua doença. Sim, tudo é grande e precioso aos olhos de Deus, quando agimos por um motivo de religião e de caridade, porque Jesus Cristo nos diz que um copo de água não permanece sem recompensa. Vede, portanto, que podemos facilmente dar esmola, embora sejamos bastante pobres” (São João Maria Vianney). Jesus Cristo elogiou grandemente a pobre viúva que deu o que tinha; quando os ricos davam da sua abundância, muitas vezes nem a centésima parte do que podiam e deviam dar: “Se realmente nada podemos dar, mostremo-nos, pelo menos, afáveis para com os pobres. Deus premia o coração quando não há algo para dar. Ninguém diga: ‘Não tenho nada; a caridade não é só pão” (Santo Agostinho), e: “Vede, pois, que a esmola não consiste somente em dar de comer a quem tem fome e em vestir o que está nu; mas são todos os favores que se prestam ao próximo, seja para o corpo, seja para a alma, quando fazemos com espírito de caridade” (São João Maria Vianney). Além das obras de misericórdia corporais há as espirituais, e estas devem ser praticadas por todos, em todo o tempo e em todo o lugar. Não há ninguém que não possa sofrer com paciência as provações vindas de pessoas perversas… ninguém que não possa rezar pelos vivos e defuntos. A esmola deve ser feita na proporção da necessidade do próximo. Entre os próximos são os parentes que ocupam o primeiro lugar. Diz o Apóstolo: “Se alguém não cuida dos seus, e, sobretudo, dos de sua própria casa, renegou a fé e é pior do que um incrédulo” (1 Tm 5, 8). É claro que na aplicação da esmola deve haver critério, segundo os diferentes graus do parentesco, da santidade e utilidade: “É muito mais útil dar esmola a uma pessoa santa e que maior indigência sofre, ou socorrer uma necessidade pública do que favorecer a uma pessoa só, que outro merecimento não apresenta a não ser um parentesco próximo” (Santo Tomás de Aquino), e: “Toma em consideração também a idade e a fraqueza; a pobreza envergonhada e aqueles que de nobre origem e de uma alta posição social, sem culpa, caíram na miséria” (Santo Ambrósio). A esmola deve ser feita prontamente e de boa vontade: “Não demores em socorrer a quem sofre!” (Eclo 4, 3), e: “Não digas a teu amigo: ‘Vá e volta amanhã, quando poderias dar-lhe alguma coisa hoje” (Pr 3, 28). Quem sabe se amanhã tua esmola viria já tarde? Se dermos esmola, deve ser de boa vontade: “Cada um dê como propôs seu coração, não com tristeza nem forçado; porque Deus ama a quem dá com alegria” (2 Cor 9, 7), e: “Quem dá o pão com o rosto contrariado, perde o pão e o merecimento da esmola ao mesmo tempo” (Santo Agostinho). O pobre, por sua vez, sendo por nós beneficiado, sente um duplo benefício: o benefício material do socorro e o benefício espiritual dum trato fraternal que o anima e lhe dá alento. A esmola deve ser dada por amor a Deus. É esta a nota essencial da caridade cristã. Esmola dada não por amor a Deus é uma esmola meramente material e filantrópica, mas não caridade. E se não é dada por caridade, de nada serve a esmola: “De nada me serve ter distribuído entre os pobres toda a minha fortuna, se não tiver a caridade” (1 Cor 13, 3), e: “De nada serve a caridade feita só por amor dos homens, só para ser vista e elogiada” (Pe. João Batista Lehmann). Jesus Cristo disse: “Guardai-vos de praticar a vossa justiça diante dos homens para serdes vistos por eles. Do contrário, não recebereis recompensa junto ao vosso Pai que está nos céus. Por isso, quando deres esmola, não te ponhas a trombetear em público, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, com o propósito de serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua esmola fique em segredo; e o teu Pai, que vê no segredo, te recompensará” (Mt 6, 1-4). E se bem que a esmola, como qualquer outra boa obra feita em estado de pecado mortal possa obter da bondade de Deus a graça da conversão para o pecador, seria, todavia, uma estulta e ímpia presunção esperar tal favor de Deus, permanecendo obstinado na culpa: “Não pensem os pecadores, que a justiça divina se deixa comprar, achando que podem pecar impunemente, só porque pretendem resgatar com dinheiro sua culpa. A alma é mais que o alimento, e o corpo é mais que a indumentária” (São Gregório Magno). Pode dizer que deu verdadeiramente esmola, aquele que se acha na graça de Deus, e outra coisa não procura, senão agradar a Deus: “Como poderás ser misericordioso para com os outros, se és cruel contra ti mesmo? Tem pena de tua alma, se procuras agradar a Deus. A penitência é uma esmola que o homem faz a si próprio. A caridade bem ordenada começa com a própria pessoa. Quem se arrepende dos seus pecados faz uma excelente esmola à sua alma” (Santo Agostinho).
Pe. Divino Antônio Lopes FP. Anápolis, 21 de outubro de 2011
Bibliografia
Bertetti, Escritos Catecismo da Igreja Católica, n.º 2447 Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena, Intimidade Divina, 230 - Ano B Pe. João Batista Lehmann, Euntes… Praedicate! Pe. João Colombo, Pensamento sobre os Evangelhos e sobre as festas do Senhor e dos santos Sagrada Escritura Santo Agostinho, Escritos Santo Ambrósio, Escritos Santo Tomás de Aquino, Escritos São Basílio Magno, Escritos São Cipriano, Escritos São Francisco de Sales, Filotéia, Parte III, XV São Gregório Magno, Escritos São Jerônimo, Escritos São João Crisóstomo, Escritos São João Maria Vianney, Textos escolhidos São Leão Magno, Escritos
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