VOU MOSTRAR-TE A ESPOSA DO CORDEIRO (Ap 21, 9-27)
“9 Depois, um dos sete Anjos das sete taças cheias com as sete últimas pragas veio até mim e disse-me: ‘Vem! Vou mostrar-te a Esposa, a mulher do Cordeiro!’ 10 Ele então me arrebatou em espírito sobre um grande e alto monte, e mostrou-me a Cidade santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, 11 com a glória de Deus. Seu esplendor é como o de uma pedra preciosíssima, uma pedra de jaspe cristalino. 12 Ela está cercada por muralha grossa e alta, com doze portas. Sobre as portas há doze Anjos e nomes inscritos, os nomes das doze tribos de Israel: 13 três portas para o lado do oriente; três portas para o norte; três portas para o sul, e três portas para o ocidente. 14 A muralha da cidade tem doze alicerces, sobre os quais estão os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro. 15 Aquele que comigo falava tinha como medida uma cana de ouro, para medir a cidade, seus portões e sua muralha. 16 A cidade é quadrangular: seu comprimento é igual à largura. Mediu então a cidade com a cana: doze mil estádios. O comprimento, a largura e a altura são iguais. 17 Mediu também a muralha: cento e quarenta e quatro côvados. — O Anjo media com medida humana. - 18 O material de sua muralha é jaspe, e a cidade é de ouro puro, semelhante a um vidro límpido. 19 Os alicerces da muralha da cidade são recamados com todo tipo de pedras preciosas: o primeiro alicerce é de jaspe, o segundo de safira, o terceiro de calcedônia, o quarto de esmeralda, 20 o quinto de sardônica, o sexto de cornalina, o sétimo de Crisólito, o oitavo de berilo, o nono de topázio, o décimo de crisópraso, o décimo primeiro de jacinto, o décimo segundo de ametista. 21 As doze portas são doze pérolas: cada uma das portas era feita de uma só pérola. A praça da cidade é de ouro puro como um vidro transparente. 22 Não vi nenhum templo nela, pois o seu templo é o Senhor, o Deus todo poderoso, e o Cordeiro. 23 A cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminarem, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro. 24 As nações caminharão à sua luz, e os reis da terra trarão a ela sua glória; 25 suas portas nunca se fecharão de dia - pois ali já não haverá noite -, 26 e lhe trarão a glória e o tesouro das nações. 27 Nela jamais entrará algo de imundo, e nem os que praticam abominação e mentira. Entrarão somente os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro”.
Em Ap 21, 9-14 diz: “Depois, um dos sete Anjos das sete taças cheias com as sete últimas pragas veio até mim e disse-me: ‘Vem! Vou mostrar-te a Esposa, a mulher do Cordeiro!’ Ele então me arrebatou em espírito sobre um grande e alto monte, e mostrou-me a Cidade santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, com a glória de Deus. Seu esplendor é como o de uma pedra preciosíssima, uma pedra de jaspe cristalino. Ela está cercada por muralha grossa e alta, com doze portas. Sobre as portas há doze Anjos e nomes inscritos, os nomes das doze tribos de Israel: três portas para o lado do oriente; três portas para o norte; três portas para o sul, e três portas para o ocidente. A muralha da cidade tem doze alicerces, sobre os quais estão os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro”.
A visão assemelha-se à do profeta Ezequiel quando contemplava a nova Jerusalém e o futuro Templo (Ezequiel, capítulos 40 até 42). Mas em São João põe-se em relevo que a cidade desce do céu, expressando assim que a instauração plena e tão desejada do reino messiânico se vai realizar pelo poder de Deus e conforme sua vontade. A descrição da Cidade Santa começa pelo exterior. É o primeiro que se contempla e o que a torna praça forte e inexpugnável. Assim se fala das muralhas, das portas e dos fundamentos. Os nomes entre o antigo Povo eleito e a Igreja de Jesus Cristo, e ao mesmo tempo indica-se a novidade da Igreja, que assenta sobre os Doze Apóstolos do Senhor (Ef 2, 20). A disposição das portas, de três em três e voltadas para os quatro pontos cardeais, indica a universalidade da Igreja, para a qual hão de concorrer todas as gentes para se salvarem. Neste sentido ensina Santo Agostinho que fora da Igreja Católica pode encontrar-se tudo, menos a salvação. O Pe. José Salguero comenta: O vidente de Patmos (São João Evangelista) passa agora a descrever o esplendor e a glória da nova Jerusalém. A visão presente é relacionada um tanto artificialmente com o setenário das taças de Ap 17, 1ss. Um anjo, provavelmente o mesmo que havia mostrado a São João a grande Prostituta e sua ruína, lhe mostra agora a Esposa do Cordeiro (versículo 9). Ambas as figuras se opõem totalmente. Por um lado está a Esposa do Cordeiro, pura e virgem; por outro está a grande Prostituta, cheia de corrupção e de podridão. A Roma pagã, isto é, a grande Prostituta, se viu de repente despojada de sua soberania e de sua glória humana e precipitada na ruína; a nova Jerusalém, ou seja, a Igreja foi levantada da humilhação causada pelas perseguições para a glória eterna. Está será a Noiva, a Esposa do Cordeiro que o anjo vai mostrar ao vidente. No Novo Testamento a Igreja é chamada a Esposa de Jesus Cristo (Ef 5, 21-24). Nesta visão, o simbolismo da esposa é usado de um modo um pouco diverso do que encontramos em Ap 21, 2-3. Enquanto que em Ap 21, 2-3 São João contempla a nova Jerusalém enfeitada como uma noiva que vai ao encontro do seu noivo, em Ap 21, 9-10 se diz que a Esposa do Cordeiro é a cidade santa de Jerusalém que desce do céu. E nos versículos seguintes descrevem a formosura desta cidade. Por conseguinte, nesta segunda visão se faz ênfase na personificação de Jerusalém sob a figura de uma mulher. Insiste na ideia da cidade cheia de formosura; em mudança, em Ap 21, 1-8, a nova Jerusalém é considerada mais como morada de felicidade para os que a habitam, porém sem insistir na ideia da cidade enquanto tal. Na realidade, ambas as visões se completam mutuamente. São João é transportado, como Ezequiel 40, 2, em espírito, para um monte grande e alto, e o anjo lhe mostrou a cidade santa de Jerusalém que descia do céu (versículo 10). A nova Jerusalém será edificada sobre esse monte elevado. A cidade santa será como a acrópolis do mundo novo, da terra nova, fundada para a eternidade, a qual atrairá para si a todas as gentes (Is 2, 2-3; Mq 4, 1-2; Ez 17, 22). A descrição desta cidade está inspirada na descrição que faz Ezequiel da Jerusalém ideal dos tempos messiânicos (Ez 40, 2-43). Toda esta seção de Ap 21, 9-22 contém numerosas alusões a Ezequiel (capítulos 40 até 48). O profeta Ezequiel é transportado também em espírito a Jerusalém, edificada sobre um monte altíssimo. E o anjo, com instrumentos para medir, lhe foi mostrando todas as partes do templo. Descreve suas portas gigantes (Ez 48, 30-35) e um manancial que saia do mesmo templo (Ez 47, 1-12). A diferença que existe entre Ezequiel e São João está em que o Apocalipse se detém principalmente na descrição da nova Jerusalém, enquanto que Ezequiel fica interessado mais no templo. A razão disso nos é dado pelo próprio São João ao dizer-nos que não viu templo na nova Jerusalém, porque o Senhor, como o Cordeiro, era seu templo (Ap 21, 22). São João Evangelista vê a nova Jerusalém descer do céu envolta em glória de Deus e brilhante como jaspe cristalino (versículo 11). Esta claridade da Jerusalém celeste é a claridade mesma de Deus, é o fulgor da sua presença (Is 60, 1-2. 19; Ap 21, 22), pois Deus habita nela e a ilumina (Is 58, 8). O resplendor das pedras mais preciosas vem desta divina presença; é uma participação da glória de Deus que nela mora. A formosura de todas suas partes é o reflexo da beleza espiritual de todos os que a habitam. A cidade tinha um muro grande e alto (versículo 12), como todas as cidades antigas. Não era possível imaginar naquele tempo uma cidade sem muralhas como proteção. Entretanto, nesse caso, o muro é puramente ornamental, pois não haverá perigo de ataques por parte de forças inimigas. O muro da cidade tinha doze portas que levavam por nome os das doze tribos de Israel, como sucedia também na Jerusalém da visão de Ezequiel (Ez 48, 30-35). Além disso, em cada porta havia um anjo que tinha por missão vigiar a entrada e defendê-la (Is 62, 6; Ez 48, 31). As portas estavam distribuídas três em cada um dos pontos cardeais, donde se deduz que a cidade era quadrada e que estava perfeitamente orientada (versículo 13). A muralha da cidade tem doze alicerces, sobre os quais estão os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro (versículo 14). A nova Jerusalém, que é a Igreja, está edificada, pois, sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, como dizia também São Paulo (Ef 2, 20). O esplendor da descrição da cidade está em harmonia com a descrição do trono de Deus e a corte celestial nos capítulos 4 e 5 do Apocalipse. São João se inspira em Ezequiel 48, 30-35. Porém, a descrição do Apocalipse é mais rica e mais colorida. As doze portas tem relação, sem dúvida, com as doze tribos místicas que formam o Israel de Deus (Ap 7, 4-8), o Israel espiritual, e expressam a ideia de catolicidade. Os nomes dos doze apóstolos nos doze alicerces dos muros significam a parte que os apóstolos receberam na fundação da Igreja e destacam a apostolicidade deles. O autor sagrado quis mostrar com estas alusões a união existente entre o Antigo e o Novo Testamento. Não são duas revelações, mas sim, uma só é única revelação. Além disso, quis por em relevo a universalidade e a catolicidade da Jerusalém celeste. O Pe. Miguel Nicolau explica: Um anjo mostrou para São João a ruína da Babilônia (Ap 17, 1ss). Agora outro anjo lhe ensinará a glória de Jerusalém. Os dois quadros se opõem. Roma pagã passou da glória do mundo para o nada; a Jerusalém cristã passou da humilhação para o resplendor eterno. Tal é a diferença de estar com Deus ou contra Deus. O anjo é um dos sete que lançaram as pragas divinas contra o Império Romano (Ap 15, 1), mas não sabemos qual deles.
Em Ap 21, 15-17 diz: “Aquele que comigo falava tinha como medida uma cana de ouro, para medir a cidade, seus portões e sua muralha. A cidade é quadrangular: seu comprimento é igual à largura. Mediu então a cidade com a cana: doze mil estádios. O comprimento, a largura e a altura são iguais. Mediu também a muralha: cento e quarenta e quatro côvados. — O Anjo media com medida humana”.
As medidas são meramente simbólicas e representam diversos aspectos da Cidade Santa. Assim, a base quadrada indica a sua solidez e estabilidade, o mesmo que a forma cúbica, resultante da idêntica longitude, largura e altura. O Sancta sanctorum do Templo, descrito em 1 Rs 6, 19ss., também tinha forma de cubo. Os números são igualmente simbólicos: os 12.000 estádios indicam o povo eleito com as suas doze tribos e, ao mesmo tempo, a grande multidão de nações que formam o novo povo. Os 144 côvados – também múltiplo de doze – que mede a muralha, são muito pouco em relação com a altura da Cidade celeste. Com isso se quer dizer que as muralhas eram antes ornamentação do que defesa. Os inimigos já foram derrotados e não há nada a temer. Esclarecer-se que as medidas são humanas, apesar de que é o Anjo quem as utiliza. De todas as formas são medidas cuja magnitude indica, mediante a hipérbole, a grandeza e magnificência da Jerusalém celestial. O Pe. José Salguero comenta: Continuando, São João Evangelista descreve as dimensões da Jerusalém celeste. A medição tem por finalidade destacar a perfeição do plano de Deus e admirar sua formosura. Ezequiel nos deixou descritos os planos da cidade de Jerusalém dos tempos messiânicos e de toda a Terra Santa (Ezequiel, capítulos 40-48). São João começa dizendo que o anjo que lhe falava tinha nas mãos uma cana de ouro para medir a cidade (versículo 15). Tinha uma cana de ouro porque na Jerusalém celeste não cabe outra coisa de menos valor. Tanto o profeta Ezequiel (Ez 40, 3-5) como o profeta Zacarias (Zc 2, 1-5) nos apresentam anjos com canas de medir em suas mãos para medir a Jerusalém messiânica. O plano da Jerusalém celeste era quadrangular, o que é um sinal de perfeição. A medida de seu comprimento como de sua largura, realizada pelo anjo, resultou ser de 12.000 estádios, ou seja, de uns 2. 200 quilômetros (versículo 16). O estádio era uma medida de comprimento de uns 185 metros, que multiplicando por 12.000 estádios, dá a cifra de 2.200 quilômetros já indicados. Essas dimensões de grandes proporções não devem nos estranhar se tivermos presente que aqui se mede a Jerusalém celeste, onde hão de morar com o Senhor todos os anjos e santos, que são milhões e milhões. A cifra de 12.000 estádios é evidentemente simbólica, e corresponde ao número das tribos de Israel – a Igreja é o novo Israel -, multiplicado por mil em sinal de multidão. O autor sagrado, dando-nos estas proporções gigantescas, quer destacar a grandeza da nova Jerusalém. O mais curioso desta descrição é que a altura, a largura e o cumprimento desta cidade são iguais. Seria difícil imaginar uma cidade que tivesse a mesma largura, a mesma altura e o mesmo cumprimento. Teria a forma de um cubo perfeito, com 555 quilômetros, isso não é imaginável para uma cidade. Porém, se uma cidade em forma de cubo perfeito não é concebível para nós, resulta uma imagem muito apta para expressar o conceito de estabilidade e de perfeição. Tanto mais quanto que o santo dos santos do templo de Jerusalém formava um cubo perfeito (1 Rs 6, 19ss.). Com o qual parece querer indicar-nos o hagiógrafo que a Jerusalém celeste será o templo de Deus. Também poderia conceber sua forma como a dos famosos zigurates babilônicos, isto é, em forma de pirâmide. De todas as maneiras é conveniente ter presente que também a literatura rabínica exagera as proporções da Jerusalém dos tempos messiânicos: se elevaria sobre o Sinai e chegaria até o céu, pedindo a Deus lugar lá em cima, porque não cabia na terra (comenta M. J. Lagrange). A altura do muro era de 144 côvados, que vem a dar uns 72 metros, o que resultaria demasiado desproporcional com a elevação da cidade (versículo 17). A cifra 144 côvados corresponde também ao número das doze tribos de Israel elevado ao quadrado (12X12). A medida com que media o anjo era medida humana, isto é, medida ordinária, comum entre os homens quando escrevia São João (comenta M. del Alamo). Por conseguinte, ainda que as medidas fossem tomadas por um anjo, não obstante estão computadas segundo os cálculos ordinários dos homens (Ap 13, 18).
Em Ap 21, 18-21 diz: “O material de sua muralha é jaspe, e a cidade é de ouro puro, semelhante a um vidro límpido. Os alicerces da muralha da cidade são recamados com todo tipo de pedras preciosas: o primeiro alicerce é de jaspe, o segundo de safira, o terceiro de calcedônia, o quarto de esmeralda, o quinto de sardônica, o sexto de cornalina, o sétimo de Crisólito, o oitavo de berilo, o nono de topázio, o décimo de crisópraso, o décimo primeiro de jacinto, o décimo segundo de ametista. As doze portas são doze pérolas: cada uma das portas era feita de uma só pérola. A praça da cidade é de ouro puro como um vidro transparente”.
As descrições recordam as de Ezequiel, mas superam-nas na beleza e colorido. Cada uma das pedras preciosas manifesta o valor da Cidade Santa, e o mesmo as grandes pérolas das suas portas. Alguns Padres da Igreja viram nestas descrições a multiplicidade e valor dos dons divinos, presentes de alguma forma na alma em graça. Como é habitual no livro, estão subjacentes referências ao Antigo testamento: Tb 13, 17 fala da reconstrução de Jerusalém com pedras preciosas como a safira e a esmeralda, que recordam também a ornamentação do peitoral que levava o Sumo Sacerdote (Ex 28, 17-20) e as vestes do rei de Tiro (Ez 28, 13). Assim, pois, as pedras preciosas aludem aos traços sacerdotais e reais da cidade. O Pe. José Salguero comenta: A nova Jerusalém estava construída com materiais riquíssimos que servem para dar-nos uma ideia da sua formosura e esplendor. A cidade era de ouro puro, transparente como o vidro puro (versículo 18). Era, portanto, como um bloco de ouro resplandecente. Os fundamentos do muro da cidade estavam adornados de toda classe de pedras preciosas (versículos 19-20). A ideia de uma construção com pedras preciosas pode ter vinda do profeta Isaías, o qual nos descreve a glória da Jerusalém messiânica nestes termos: Ó aflita, batida de tempestades, desconsolada, certamente vou revestir de carbúnculo as tuas pedras, vou estabelecer os teus alicerces sobre a safira. Farei de rubi as tuas ameias e de berilo as tuas portas, de pedras preciosas todas as tuas muralhas (Is 54, 11-12). Cada uma das pedras preciosas do nosso texto do Apocalipse pode ter na mente de São João um sentido simbólico que hoje não se pode determinar com certeza. Os nomes das pedras correspondem, em parte, às que o sumo sacerdote judeu levava no peitoral (Ex 28, 17-21) e às que adornavam as vestes do rei de Tiro segundo a descrição do livro de Ezequiel (Ez 28, 13). O jaspe deve ser o jaspe verde (Ap 4, 3; Is 54, 12). A safira era uma pedra preciosa de cor celeste. Pela descrição de Plínio, o Velho, e de outros autores antigos, parece deduzir-se que respondia ao atual lápis-lazúli. A calcedônia é uma pedra verde e furta-cor como o pescoço dos pombos. A esmeralda é uma joia de cor verde. A sardônica é uma variedade de ônix onde o branco se mistura com o vermelho. A cornalina é uma pedra preciosa de cor vermelho carne. O crisólito é uma pedra de cor de ouro. O berilo é uma espécie de esmeralda de cor ligeiramente verde-amarelo. O topázio é de cor verde dourado. O crisópraso é uma espécie de ágata de cor verde. O jacinto é uma pedra preciosa de cor violeta ou vermelho-amarelo. A ametista é uma joia de cor violeta (comentam A. Lentini e L. Thorndike). Em toda essa variedade de pedras preciosas e de cores, produzidos pela claridade que difundia a glória de Deus, os Santos Padres viram a diversidade dos dons da graça e a multiplicidade das virtudes dos bem-aventurados. A alma de todo cristão que está na graça de Deus, e principalmente a dos bem-aventurados, por usa perfeição, reflete e manifesta a perfeição da glória divina (2 Cor 3, 18). O muro da cidade estava fortificado por doze portas, três de cada lado. Cada uma das portas era feita de uma só pérola (versículo 21). Essas portas não se fechavam nem de dia nem de noite, porque ali não havia perigo de inimigos. Só podiam entrar e sair por elas os que estavam escritos no livro da vida que tinha o Cordeiro (Is 52, 1; Ap 13, 8). A praça que devia estar no meio da cidade era de ouro puro, brilhante como o cristal. Sobre esta maravilhosa e refulgente pavimentação da praça se levantava o trono de Deus. No tabernáculo construído por Moisés e no templo de Salomão entravam apenas materiais preciosos. Porém, todavia, será muito mais na cidade celeste, construída para manifestar a magnificência divina para com os eleitos.
Em Ap 21, 22-27 diz: “Não vi nenhum templo nela, pois o seu templo é o Senhor, o Deus todo poderoso, e o Cordeiro. A cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminarem, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro. As nações caminharão à sua luz, e os reis da terra trarão a ela sua glória; suas portas nunca se fecharão de dia - pois ali já não haverá noite -, e lhe trarão a glória e o tesouro das nações. Nela jamais entrará algo de imundo, e nem os que praticam abominação e mentira. Entrarão somente os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro”.
Através dos muros e portas, o autor introduziu-nos no interior da Cidade até à praça, também de uma riqueza impressionante. Mas, surpreendentemente, ali não há Templo. Contrasta com a Jerusalém descrita por Ezequiel, cujo centro era o Templo (Ezequiel, capítulos 40-42). O Templo em Jerusalém, ou a Tenda do Tabernáculo no deserto, representavam a morada de Deus, o sinal visível da presença divina – chamada shekináh pelos hebreus -, que se manifestava na descida da nuvem da glória de Deus. Na Jerusalém celestial já não há necessidade dessa morada divina, pois o próprio Deus Pai e o Cordeiro estão sempre presentes. A divindade não há de recordar-se mediante o Templo, sinal da sua presença invisível, pois os bem-aventurados verão sempre a Deus face a face. Não há língua que possa explicar a bem-aventurança que goza, nem o proveito de que é senhora a alma que voltou à sua própria nobreza e que pode, doravante, contemplar o seu Senhor (São João Crisóstomo). Nas teofanias de Deus, uma luz esplendente manifestava a glória divina. Por isso, a presença de Deus encherá de claridade a Jerusalém celestial, sem que haja necessidade nem de sol nem de lua. Junto a Deus Pai, com a mesma categoria e dignidade, está o Cordeiro, cuja glória também reluz com força, revelando-se, uma vez mais, a condição divina de Jesus Cristo. Essa luz iluminará todos os homens que prestarão homenagem ao Senhor, cumprindo-se assim as profecias messiânicas de Isaías (Is 60, 3. 5. 11; capítulos 65-66). As portas da Cidade Santa estarão abertas durante o dia, ou seja, sempre, porque ali não haverá nunca mais noite, como tão pouco haverá nada impuro: só entrarão os santos. O Pe. José Salguero comenta: Nesta maravilhosa cidade São João Evangelista não viu templo algum, porque o Deus todo poderoso, com o Cordeiro, era seu templo (versículo 22). Surpreende um pouco esta constatação do vidente de Patmos, já que antes nos falou de um templo e de um altar no céu, onde seus servos, os eleitos, lhe dão culto dia e noite (Ap 5, 12; 7, 15; 8, 3). São João usou essa imagem tradicional para simbolizar diversas realidades. Porém, quando quer expressar a grande realidade da vida gloriosa no céu, esta imagem já não lhe parece apropriada. O templo era o sinal da presença invisível de Deus no meio de seu povo (Ap 7, 15-17). Mas na nova Jerusalém, Deus e o Cordeiro estarão presentes visivelmente e os bem-aventurados verão a Deus face a face (Ap 22, 4). Por conseguinte, não é necessário um templo, porque todo o céu é um templo. A glória de Deus e do Cordeiro o enche todo. A Jerusalém celeste está inundada da presença imediata de Deus e do Cordeiro, que constituem seu verdadeiro templo (comenta M. Garcia Cordero). O autor sagrado tem possivelmente no pensamento esse texto de Isaías: Não terás mais o sol como luz do dia, nem o clarão da lua te iluminará, porque Deus será a tua luz para sempre, e o teu Deus será o teu esplendor. O teu sol não voltará a pôr-se, e a tua lua não minguará, porque Deus te servirá de luz eterna e os dias do teu luto cessarão (Is 60, 19-20). Deus e o Cordeiro são colocados nessa passagem iguais como em outros lugares do Apocalipse (Ap 7, 9-12; 14, 4; 22, 1-3). Donde se deduz claramente que o Cordeiro é considerado por São João como uma pessoa divina semelhante ao Pai. Os cidadãos da nova Jerusalém estão iluminados pelo resplendor luminoso de Deus e do Cordeiro. Por isso, a cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminarem, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro (versículo 23). Todas essas expressões devem ser tomadas no sentido espiritual. Deus é o sol que ilumina toda a vida interior do cristão e será a luz indefectível, a verdadeira bem-aventurança dos predestinados. Os versículos 24 até 27 são tomados de Isaías, os quais nos descrevem a glória da Jerusalém messiânica com estas palavras: As nações caminharão na tua luz, e os reis, no clarão do teu sol nascente. Ergue os olhos em torno e vê: todos eles se reúnem e vêm a ti. Os teus filhos vêm de longe, as tuas filhas são carregadas sobre as ancas. Então verás e ficarás radiante; o teu coração estremecerá e se dilatará, porque as riquezas do mar afluirão a ti, a ti virão os tesouros das nações. Uma horda de camelos te inundará, os camelinhos de Madiã e Efa; todos virão de Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando os louvores de Deus. Todas as ovelhas de Cedar se reunirão em ti, os carneiros de Nabaiot estarão a teu serviço, subirão ao meu altar em sacrifício agradável, e cobrirei de esplendor a minha casa. Quem são estes que vêm deslizando como nuvens, como pombas de volta aos seus pombais? Em mim esperam as ilhas, os navios de Társis vêm à frente, trazendo os seus filhos de longe, com a sua prata e o seu ouro, por causa do nome do Senhor teu Deus, por causa do Santo de Israel, pois ele te glorificou. Estrangeiros reedificarão os teus muros e os seus reis te servirão, pois que, se na minha cólera te feri, agora, na minha graça, me compadeci de ti. As tuas portas estarão sempre abertas, não se fecharão nem de dia nem de noite, a fim de que se traga a ti a riqueza das nações e os seus reis sejam conduzidos a ti. Com efeito, a nação e o reino que não te servirem perecerão, sim, essas nações serão reduzidas a uma ruína (Is 60, 3-12). O autor do Apocalipse, inspirando-se nestas imagens de Isaías, nos descreve a riqueza e o esplendor da nova Jerusalém, isto é, da Igreja; e a representa como uma cidade que recebe o tributo de todos os povos. A Igreja está composta de homens de toda as nações (Ap 7, 9) que se converteram ou se converterão à fé cristã. A iluminação das nações e a homenagem dos reis da terra (versículo 24) são imagens de Isaías (Isaías, capítulos 65 e 66) que significam a vocação e a salvação dos gentios e a parte que haviam de tomar na vida gloriosa da nova Jerusalém. Suas portas estão abertas continuamente, como convite a todos os povos para que venham a ela, pois ninguém será excluído desta santa cidade, a não ser os impuros, os mentirosos e os que cometem abominações (versículos 25 até 27). Os verdadeiros cidadãos da Jerusalém celeste serão os que estão inscritos no livro da vida e do Cordeiro (Ap 20, 12-15), isto é, os eleitos. A ela levarão a glória e a honra das nações, ou seja, todas as riquezas espirituais e todas as obras boas dos que se salvam. Com estas imagens, o autor sagrado quer mostrar-nos a universalidade ou catolicidade da Jerusalém celeste e, ao mesmo tempo, sua santidade, pois nada impuro e nada profano poderá entrar nela (Is 52, 1; At 10, 14. 28).
Pe. Divino Antônio Lopes FP (C) Anápolis, 26 de junho de 2015
Bibliografia
Sagrada Escritura Edições Theologica Santo Agostinho, Sermo ad Cassar., 6 São João Crisóstomo, Ad Theodorum lapsum, I, 13 M. J. Lagrange, Le Messianisme chez les juifs p. 199 M. del Alamo, Las medidas de la Jerusalén celeste (Ap 21, 16) A. Vanhoye, L’ utilisation du livre d’Ezéchiel dans l’Apocalypse Plínio, o Velho, Hist. Nat. 37 A. Lentini, Il ritmo “Civis caelestis patriae” e il “De duodecin lapidibus” de Amato: Benedictina 12 (1958) 15-26 L. Thorndike, De lapidibus: Ambix 8 (1960) 6-26 M. Garcia Cordero, o. c. p. 221 Pe. José Salguero, Bíblia Comentada Pe. Miguel Nicolau, A Sagrada Escritura
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