VAMOS, ATRAVESSEMOS (1 Sm 14, 1-14)
“1 Um dia, Jônatas, filho de Saul, disse ao seu escudeiro: ‘Vamos, atravessemos até o posto avançado dos filisteus que está do outro lado’, mas nada comunicou a seu pai. 2 Saul estava sentado no limite de Gaba, debaixo da romãzeira que fica perto da eira, e a tropa que estava com ele era de aproximadamente seiscentos homens. 3 Aías, filho de Aquitob, irmão de Icabod, filho de Finéias, filho de Eli, o sacerdote de Deus em Silo, levava o efod. Ninguém notou que Jônatas havia partido. 4 No desfiladeiro que Jônatas procurava atravessar para atingir o posto avançado filisteu, há um pico do rochedo de um lado, e outro pico do outro lado. Um chama-se Boses e outro Sene. 5 O primeiro pico acha-se ao norte e o outro ao sul, o primeiro olhando para Macmas, o segundo para Gaba. 6 Jônatas disse ao seu pajem: ‘Vamos, avançaremos até ao lugar onde estão aqueles incircuncisos. Talvez Deus faça alguma coisa por nós, porque nada impede que Deus nos dê a vitória, quer sejamos muitos ou poucos’. 7 Respondeu-lhe o pajem: ‘Segue a inclinação do teu coração. Eu estou contigo: o meu coração é como o teu coração’. 8 Jônatas então disse: ‘Eis o que faremos: iremos na direção deles, de peito descoberto. 9 Se nos disserem: ‘Não vos movais até que cheguemos perto’, ficaremos parados e não avançaremos sobre eles. 10 Mas se nos disserem: ‘Subi até nós’, então subiremos, porque Deus os entregará em nossas mãos. Este será o sinal’. 11 Aparecendo eles, pois, diante do posto avançado dos filisteus, comentaram os filisteus: ‘Eis que os hebreus saíram das cavernas em que se haviam escondido’. 12 Os que estavam no posto avançado dirigiram-se a Jônatas e a seu pajem, dizendo: ‘Subi até aqui, que vos ensinaremos uma coisa’. Então Jônatas disse ao seu pajem: ‘Conserva-te atrás de mim, porque Deus os entregou nas mãos de Israel’. 13 Jônatas subiu arrastando-se com os pés e as mãos no chão, e o seu pajem o seguiu. Eles caíam diante de Jônatas, e o seu pajem os matava. 14 Esta primeira matança que Jônatas e seu pajem realizaram foi de cerca de vinte homens...”
Em 1 Sm 14, 1 diz: “Um dia, Jônatas, filho de Saul, disse ao seu escudeiro: ‘Vamos, atravessemos até o posto avançado dos filisteus que está do outro lado’, mas nada comunicou a seu pai”.
O jovem Jônatas estava cansado da vida ociosa da tropa (soldados), então resolveu realizar uma façanha. Expôs o seu plano ao escudeiro (homem que, armado de lança e escudo, pertencia à guarda de proteção dos soberanos) que, como oficial, levava sempre consigo para que lhe protegesse em caso de ataque. O ofício de escudeiro é próprio dos tempos dos juízes (Jz 9, 54), de Saul e de Davi. Não podemos cruzar os braços nem vivermos na ociosidade diante dos inimigos da nossa alma; mas sim, devemos nos encher de coragem e enfrentá-los sem medo nem desânimo. Infeliz da pessoa que imita o péssimo exemplo dos ociosos; essa será derrotada antes de entrar no campo de batalha. Jônatas não quis ficar ocioso, mas partiu para a luta. Não estamos aqui nesse mundo para vivermos ociosos, mas para lutarmos contra os nossos inimigos: o MUNDO, o DEMÔNIO e a CARNE. Quem não LUTAR será derrotado. A hora do inimigo não é apenas a hora da noite, mas também a hora do ÓCIO. Há o sono que sana e restaura as forças perdidas; e há outra espécie de sono que debilita e arruína a alma e o corpo: o ÓCIO. Nenhuma hora é tão própria do Demônio quanto a hora do ÓCIO. As imaginações más assaltam-nos nos momentos do ÓCIO: “... a ociosidade traz a pobreza e a penúria, porque a mãe da indigência é a ociosidade” (Tb 4, 13). Jônatas não quis ficar OCIOSO, mas preferiu lutar contra os inimigos. Quem luta vence! Quem vive na ociosidade será derrotado! Esse jovem aguerrido não foi sozinho, antes expôs o seu plano ao ESCUDEIRO e pediu a sua companhia: “Vamos, atravessemos...” Quando partirmos para o campo de batalha contra os inimigos da nossa alma, peçamos também a companhia de um ESCUDEIRO... não de carne e osso; mas sim, de um ESCUDEIRO muito mais forte, valente e fiel: o nosso Santo Anjo da Guarda. Devemos passar para esse nosso amigo fiel todas as nossas façanhas e perigos: “Desde o início até a morte, a vida humana é cercada por sua proteção e por sua intercessão. Cada fiel é ladeado por um anjo como protetor e pastor para conduzi-lo à vida. Ainda aqui na terra, a vida cristã participa na fé da sociedade bem-aventurada dos anjos e dos homens unidos a Deus” (Catecismo da Igreja Católica). O Catecismo Romano comenta: “Porque assim como os pais, quando os filhos necessitam de viajar por caminhos maus e perigosos, procuram alguém que os possa acompanhar para defendê-los dos perigos e cuidar deles, de igual modo o nosso Pai dos Céus, nesta viagem que empreendemos para a pátria celeste, nos dá anjos a cada um de nós para que, fortificados pelo seu poder e auxílio, nos livremos das ciladas furtivamente preparadas pelos nossos inimigos e afastemos os terríveis ataques que eles nos dirigem; e para que, com tais guias, sigamos pelo caminho reto, sem que erro algum interposto pelo inimigo seja capaz de separar-nos da senda que conduz ao Céu”, e: “É missão dos Anjos da Guarda auxiliar o homem contra todas as tentações e perigos e suscitar no seu coração boas inspirações. Eles são nossos intercessores, nossos protetores, e prestam-nos a sua ajuda quando os invocamos... O Anjo da Guarda pode prestar-nos também ajudas materiais, se forem convenientes para o nosso fim sobrenatural ou para o dos outros. Não tenhamos receio de pedir-lhes o seu favor nas pequenas coisas materiais de que necessitamos diariamente: encontrar uma vaga para estacionar o carro, não perder o ônibus, sair bem de uma prova para qual estudamos, etc. Podem ainda colaborar conosco no apostolado, e especialmente na oração e na luta contra as tentações e contra o demônio” (Pe. Francisco Fernández Carvajal). Jônatas disse ao seu ESCUDEIRO: “Vamos, atravessemos...” Com a proteção do nosso Santo Anjo da Guarda também atravessaremos todos os obstáculos, porque ele não nos abandonará nas horas difíceis: “Enviarei um anjo adiante de ti para que te proteja no caminho e te conduza ao lugar que te preparei” (Ex 23, 20).
Em 1 Sm 14, 2-3 diz: “Saul estava sentado no limite de Gaba, debaixo da romãzeira que fica perto da eira, e a tropa que estava com ele era de aproximadamente seiscentos homens. Aías, filho de Aquitob, irmão de Icabod, filho de Finéias, filho de Eli, o sacerdote de Deus em Silo, levava o efod. Ninguém notou que Jônatas havia partido”.
Saul, pai de Jônatas, estava sentado à sombra de uma romãzeira... e, tudo indica, os seiscentos soldados também estavam ociosos, pois: “Ninguém notou que Jônatas havia partido”. Saul estava sentado debaixo da romãzeira que fica perto da eira, de sorte que não via o que Jonatas fazia. A atitude de Saul e de seus seiscentos homens não é nada imitável, principalmente quando se sabe que o inimigo está tão próximo. Jônatas saiu sendo que ninguém percebesse. Será que eles perceberiam a chegada dos inimigos? Não podemos cochilar nem nos distrair diante do perigo... precisamos estar alertas: “Para quem está em país hostil, em tempo de guerra, toda a vigilância é pouca. Não pode haver segurança plena depois de uma vitória ganha. O inimigo ficou derrotado, mas não sem vida. A terra é para nós todos um campo de combate, e a vida é a duração desse combate. Se saíste vencedor de algum recontro com os inimigos de tua salvação, não deponhas logo as armas, nem digas: – ‘Agora já posso descansar; o inimigo está derrotado’. Olha que não estás ainda defendido pelos muros da pátria, andas ainda peregrinando por terra de inimigos. Puseste em fuga, mas não lhe cortaste a cabeça! Se o céu da tua alma se desanuviou das nuvens negras da tentação e voltou ao seu azul diáfano e sereno, pensa que nem sempre estará assim meigo o seu caris. Os inimigos topam-se a cada passo, mas nem sempre nos aparecem como tais. Uns são já de nós conhecidos, outros acercam-se de nós embuçados em capas de amigos. O demônio é negro e feio, mas sabe trajar de anjo. Não espera que nós o provoquemos; está sempre em pé de guerra, disposto a dar o assalto, quando as circunstâncias forem mais propícias” (Pe. Alexandrino Monteiro). Saul estava SENTADO à SOMBRA de uma romãzeira. É essa a postura correta do chefe de um exército diante dos inimigos? Os soldados vendo a sua ociosidade, tudo indica, fizeram o mesmo. Estavam despreocupados e sossegados diante do perigo! Longe de nós imitarmos o péssimo exemplo de Saul e do seu exército. Não devemos nos ACOMODAR nem buscar REFRIGÉRIO enquanto estivermos aqui na terra; mas sim, devemos estar ATENTOS para nos defender dos ataques do MUNDO, do DEMÔNIO e da CARNE: “Sede sóbrios e vigilantes! Eis que o vosso adversário, o diabo, vos rodeia como um leão a rugir, procurando a quem devorar. Resisti-lhe, firmes na fé” (1 Pd 5, 8-9), e: “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mt 26, 41). Jônatas estava ATENTO, enquanto que uma multidão estava OCIOSA. Quantidade sem qualidade não tem valor: Vale mais um santo do que cem medíocres.
Em 1 Sm 14, 4-5 diz: “No desfiladeiro que Jonatas procurava atravessar para atingir o posto avançado filisteu, há um pico do rochedo de um lado, e outro pico do outro lado. Um chama-se Boses e outro Sene. O primeiro pico acha-se ao norte e o outro ao sul, o primeiro olhando para Macmas, o segundo para Gaba”.
Jônatas não tinha uma planície pela frente nem uma estrada de fácil acesso; mas sim, um DESFILADEIRO (passagem apertada entre os contrafortes de uma serra ou cadeia de montanhas; garganta, estreito, passo). Jonatas PROCURAVA (tentava conseguir) atravessar. Ele tinha pela frente um DESFILADEIRO e uma CADEIA de MONTANHAS. Jônatas deve ter sofrido muito ao passar pelo DESFILADEIRO: quedas, cansaço, escorregões, esfolamentos, arranhões... Para vencermos os inimigos da nossa alma, para atingi-los antes que nos atinjam, devemos passar por um “DESFILADEIRO”. Que “DESFILADEIRO” é esse? É o da LUTA, ESFORÇO, OUSADIA e VIGILÂNCIA. Por esse “DESFILADEIRO” atingiremos o inimigo antes de sermos atingidos por ele: “Sede sóbrios e vigilantes!” (1 Pd 5, 8), e: “Vigiemos, pois no caminho da vida devemos ser, não uns tontos, mas uns prudentes” (São Jerônimo), e também: “A vida do cristão não é compatível com o aburguesamento, o comodismo e a tibieza” (Pe. Francisco Fernández Carvajal), e ainda: “O cristão nasceu para a luta, e quanto mais encarniçada se apresenta, tanto mais segura há de ser a vitória com o auxílio de Deus” (Leão XIII), e: “O Reino dos Céus não pertence aos que dormem e vivem dando-se todos os gostos, mas aos que lutam contra si mesmos” (Clemente de Alexandria), e também: “Marcar metas não basta. É preciso lutar. É forte não aquele que não experimenta fraquezas – todos nós a sentimos –, mas aquele que luta por superá-las; é corajoso não aquele que não sente medo – ninguém é um super-homem –, mas aquele que luta por ultrapassar a covardia... A meta está no fim da vida. A luta dura a existência inteira. E para esse longo combate não bastam gestos enérgicos intermitentes, mas é necessária uma atitude habitual de fortaleza que nos faça ganhar, com o último tiro, a última batalha” (Dom Rafael Llano Cifuentes), e ainda: “O nosso amor a Deus consistirá em retomarmos muitas vezes o esforço diário por não nos deixarmos vencer pelo comodismo e pela preguiça, que estão sempre à nossa espreita” (Pe. Francisco Fernández Carvajal), e: “O diabo não dorme, e a carne também ainda não morreu; por isso não cesses de preparar-te para a batalha. À direita e à esquerda estão os inimigos que nunca descansam” (Tomás de kempis). É pura ilusão querer vencer os inimigos da alma vivendo na “planície” do comodismo, da sombra, da “poltronice”, da vida fácil e do relaxamento. É preciso ENTRAR PELA PORTA ESTREITA E PELO CAMINHO APERTADO (Mt 7, 13-14), isto é, pelo “DESFILADEIRO”. Não podemos desanimar diante das quedas, “arranhões”, “esfolamentos”... pelo contrário, com os olhos fixos em Jesus Cristo e no prêmio eterno, devemos perseverar: “Quem retrocede condena-se voluntariamente a jamais atingir a meta: é um fraco, um vil, um desertor; enquanto deve o cristão ser forte, intrépido e perseverante” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena). O trecho ainda diz: “No desfiladeiro que Jônatas procurava atravessar para atingir o posto avançado filisteu, há um pico do rochedo de um lado, e outro pico do outro lado”. Esses dois picos apontavam para o alto, para o céu... sem dúvida. Para passar pelo “DESFILADEIRO” e atingir os nossos inimigos antes que nos atinjam, precisamos nos fortalecer fixando os olhos em dois “picos”: a FÉ e a ESPERANÇA. Apoiados nessas duas virtudes passaremos pelo “DESFILADEIRO” e obteremos vitória segura contra os inimigos. O “pico” da FÉ dá-nos, efetivamente, convicções profundas que fortificam singularmente a nossa vontade; põe-nos incessantemente diante dos olhos a eterna recompensa que será o fruto dos sofrimentos... também nos recorda que, sendo o próprio Deus a nossa força e apoio, nada temos que temer, ainda quando o mundo e o Demônio se coliguem contra nós... é também uma fonte de consolação. O “pico” da ESPERANÇA nos faz desejar a Deus como nosso bem supremo, e aguardar com firme confiança, por causa da bondade e do poder divino, a bem-aventurança eterna e os meios de alcançá-la. Produz, com efeito, santos desejos, em particular o desejo do céu, o desejo de possuir a Deus. O desejo imprime à alma o impulso, o movimento, o ardor necessário para alcançar o bem suspirado, e sustenta-nos os esforços, até podermos chegar ao fim desejado.
Em 1 Sm 14, 6-7 diz: “Jônatas disse ao seu pajem: ‘Vamos, avançaremos até ao lugar onde estão aqueles incircuncisos. Talvez Deus faça alguma coisa por nós, porque nada impede que Deus nos dê a vitória, quer sejamos muitos ou poucos’. Respondeu-lhe o pajem: ‘Segue a inclinação do teu coração. Eu estou contigo: o meu coração é como o teu coração’”.
Jônatas disse ao seu pajem: “Vamos, avançaremos até ao lugar onde estão aqueles incircuncisos”. Ele estava determinado (bem resolvido, decidido) de chegar até o local onde estavam os filisteus (incircuncisos). Não estava com medo, meia-vontade, indeciso, nem vacilante; mas estava decidido: “Vamos, avançaremos...” Para vencermos os inimigos da nossa alma não podemos vacilar, recuar, retroceder, ficarmos indecisos nem sentir medo; mas devemos AVANÇAR sobre eles com determinação, coragem e força: “O Senhor repele todos os ataques e ciladas de meu inimigo. De ninguém terei medo” (Santo Agostinho), e: “O Senhor é nossa luz, Ele é o sol de justiça que irradia sobre a Igreja Católica estendida por toda parte...O Senhor é minha luz e minha salvação: a quem temerei? O homem interior, assim iluminado, não vacila, segue reto seu caminho e tudo suporta” (São João de Nápoles). Jônatas não disse: vamos tentar chegar; mas sim, “avançaremos até ao lugar onde estão aqueles incircuncisos”. Sem perseverança e sem vontade firme é impossível obter vitória. Só chega ao local desejado quem caminha com passos firmes e decididos: “No fundo de toda deserção há sempre uma falta de fé na graça e no auxílio de Deus. É impossível que Deus abandone a quem quer ser-lhe fiel a todo custo e, portanto, luta sem tréguas para superar as tentações do egoísmo e as atrações do mundo” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena). Jônatas disse também: “Talvez Deus faça alguma coisa por nós, porque nada impede que Deus nos dê a vitória, quer sejamos muitos ou poucos’. Respondeu-lhe o pajem: ‘Segue a inclinação do teu coração. Eu estou contigo: o meu coração é como o teu coração’”. Os inimigos filisteus se apoiavam nas armas e na força do seu exército; enquanto que Jônatas depositava a sua confiança em Deus. O jovem Jônatas não se apoiou na multidão dos seiscentos soldados, nas armas... nem nas próprias forças, mas somente na FORÇA e no PODER de Deus: “Junto convosco eu enfrento os inimigos, com vossa ajuda eu transponho altas muralhas” (Sl 17, 30), e: “Revesti-vos da armadura de Deus, para poderdes resistir às insídias do diabo” (Ef 6, 11), e também: “Uma vez que este inimigo pode mais que nós, devemos aproveitar-nos do ‘escudo da fé’, que é coisa sobrenatural, ouvindo uma palavra de Deus, ou recebendo os Sacramentos, ou meditando a doutrina da Igreja. E crendo firme com o entendimento que Deus pode tudo” (São João de Ávila). Não basta CONFIAR em Deus... é preciso CONFIAR n’Ele e AVANÇAR... Deus exige a nossa colaboração: “Deus nunca nos pede o impossível; pede, sim, que façamos o possível para que depois Ele nos ajude a conseguir o que parece impossível” (Dom Rafael Llano Cifuentes). Infeliz da pessoa que confia nas próprias FORÇAS na LUTA contra os inimigos da alma. É preciso se esforçar apoiando no Deus que tudo pode: “Tudo posso naquele que me fortalece” (Fl 4, 13), e: “Lançai sobre ele toda a vossa preocupação, porque é ele que cuida de vós” (1 Pd 5, 7), e também: “Eu me deito e logo adormeço. Desperto, pois é Deus quem me sustenta” (Sl 3, 6), e ainda: “Pois tu salvas o povo pobre e rebaixas os olhos altivos” (Sl 18, 28), e: “Porque os maus vão ser extirpados e quem espera em Deus possuirá a terra” (Sl 37, 9). É grande loucura desprezar a força do alto para mendigar o apoio das criaturas: “Maldito o homem que confia no homem, que faz da carne a sua força…” (Jr 17, 5), e: “É um abismo o coração de cada homem!” (Sl 64, 7), e também: “O amor da criatura é enganoso e mutável, o amor de Jesus é fiel e constante. O que se prende à criatura cairá com ela, o que se abraça com Jesus estará firme para sempre” (Tomás de Kempis). Deus dá a vitória para a pessoa que LUTA confiando no seu PODER e FORÇA. O pajem (empregado que acompanha alguém em viagem) de Jônatas disse: “Segue a inclinação do teu coração. Eu estou contigo: o meu coração é como o teu coração”. Era um amigo fiel! É muito difícil encontrar um conselheiro e amigo fiel: “Um amigo fiel é um poderoso refúgio, quem o descobriu, descobriu um tesouro. Um amigo fiel não tem preço, é imponderável o seu valor. Um amigo fiel é um bálsamo vital e os que temem o Senhor o encontrarão” (Eclo 6, 14-16). Jônatas estava passando por dificuldades e o seu pajem não se afastava dele... prometia-lhe fidelidade e ajuda: “Eu estou contigo: o meu coração é como o teu coração”. É nas horas de dificuldades que conhecemos os verdadeiros amigos: “Porque há amigo de ocasião: ele não será fiel no dia da tribulação... Há amigo que é companheiro de mesa, mas que não será fiel no dia de sua tribulação” (Eclo 6, 8. 10). Ele tinha a proteção do ALTO (Deus) e também aqui da TERRA (pajem): “Quem andar com o amigo virtuoso, será também virtuoso. Estando com os bons, eu garanto que alcançará o Paraíso” (São João Bosco).
Em 1 Sm 14, 8-10 diz: “Jônatas então disse: ‘Eis o que faremos: iremos na direção deles, de peito descoberto. Se nos disserem: ‘Não vos movais até que cheguemos perto’, ficaremos parados e não avançaremos sobre eles. Mas se nos disserem: ‘Subi até nós’, então subiremos, porque Deus os entregará em nossas mãos. Este será o sinal”.
Jônatas, confiando na FORÇA e no PODER de Deus, disse ao pajem: “... iremos na direção deles”. Quem CONFIA em Deus não foge nem muda de direção, nas caminha com FÉ e FIRMEZA em direção aos inimigos. Caminha com o propósito de vencer a batalha. Para VENCERMOS os inimigos da nossa alma: o mundo, o Demônio e a carne, não podemos nos INTIMIDAR, TREMER nem RECUAR; mas sim, com os olhos fixos na proteção do alto, devemos AVANÇAR sobre eles para vencê-los... sem MUDARMOS de direção: “Recuar diante do inimigo... é próprio de homem covarde ou de quem vacila no fundamento de sua crença” (Leão XIII). O jovem Jônatas disse também: “... de peito descoberto”. Está claro que Jônatas depositou a sua CONFIANÇA somente em Deus... totalmente no Deus que tudo pode: “Em Deus tenho posto a minha confiança; não temerei o que me possa fazer o homem” (Sl 59,11). Caminhou com o peito DESCOBERTO... EXPOSTO... em direção aos inimigos, não quis se proteger, porque confiava completamente na PROTEÇÃO divina. Na luta contra os inimigos da nossa alma, a primeira arma deve ser a CONFIANÇA em Deus... esse Senhor nos FORTALECE na batalha:: “Os que confiam no Senhor são como o Monte de Sião, que não se abala, mas permanece firme para sempre” (Sl 125, 1). Com a CONFIANÇA em Deus caminharemos com o peito DESCOBERTO e EXPOSTO, porque nos protegerá e nos encorajará na batalha contra os inimigos: “Ainda que um exército me cercasse, o meu coração não temeria” (Sl 27, 3). Jônatas disse ainda ao pajem: “Se nos disserem: ‘Não vos movais até que cheguemos perto’, ficaremos parados e não avançaremos sobre eles. Mas se nos disserem: ‘Subi até nós’, então subiremos, porque Deus os entregará em nossas mãos. Este será o sinal”. O Pontifício Instituto Bíblico de Roma diz: “Se nos disserem”, é SINAL que Deus quer entregá-los em nossas mãos. EUNSA comenta: Jônatas propõe um SINAL para conhecer o que Deus vai fazer (versículos 8-10). No Antigo Testamento é frequente perceber a presença e intervenção divina interpretando os SINAIS da natureza e os acontecimentos por pequenos que sejam. Assim Moisés compreende o sentido de sarça ardente (Ex 3, 12-14), ou um “homem de Deus” interpreta a morte dos filhos de Eli (1 Sm 2, 34). No Novo Testamento Jesus Cristo é o SINAL supremo da intervenção divina “nisto se manifestou entre nós o amor de Deus: em que Deus enviou seu Filho Unigênito ao mundo para que recebêssemos por ele a vida” (1 Jo 4, 9). Deus segue manifestando-se mediante SINAIS ordinários, como são os sacramentos da Igreja; porém também pode manifestar-se mediante SINAIS extraordinários que chamamos milagres. Pedir uma intervenção extraordinária de Deus, por exemplo, a cura de um enfermo sem esperança, não só é legítimo senão que, como toda ocasião de pedido, é uma mostra de confiança em Deus, cuja vontade suprema aceitamos de antemão.
Em 1 Sm 14, 11 diz: “Aparecendo eles, pois, diante do posto avançado dos filisteus, comentaram os filisteus: ‘Eis que os hebreus saíram das cavernas em que se haviam escondido’”.
Como foi comentado no início (1 Sm 14, 1), Jônatas cansou da ociosidade dos soldados e decidiu enfrentar os filisteus. Se Jônatas estava ESCONDIDO, tudo indica não era por MEDO; e se tinha algum MEDO no coração, se libertou dele tomando a decisão de partir para a guerra sem AVISAR o pai Saul e os soldados. Quem CONFIA em Deus e conta com a sua AJUDA não pode ficar TREMENDO e INTIMIDADO dentro das “cavernas” do MEDO, da OCIOSIDADE e da PREGUIÇA; a atitude MEDROSA deixaria os inimigos FORTALECIDOS, OUSADOS, PREPOTENTES e até ARROGANTES: “Nós, os cristãos, não somos amigos das sombras e dos cantos escuros, mas da luz, da claridade na vida e na palavra. Vivemos uns tempos em que é mais necessário proclamar a verdade sem ambiguidades, porque a mentira e a confusão imperam por toda a parte. A sã doutrina, as normas morais, a retidão de consciência no exercício da profissão ou a hora de se viverem as exigências do matrimônio, o simples senso comum... gozam algumas vezes de menos prestígio, por absurdo que pareça, do que uma doutrina chocante e errada, que se qualifica de ‘valente’ ou a que se dá um colorido de progresso” (Pe. Francisco Fernández Carvajal), e: “Recuar diante do inimigo, ou calar-se, quando de toda parte se ergue tanto alarido contra a verdade, é próprio de homem covarde ou de quem vacila no fundamento de sua crença. Qualquer destas coisas é vergonhosa em si; é injuriosa a Deus; é incompatível com a salvação tanto dos indivíduos como da sociedade e só é vantajosa aos inimigos da fé” (Leão XIII), e também: “Fugir é próprio do covarde. A cruz não acolhida torna-se duplamente pesada... Duas ou três vezes na vida poderemos, porventura, demonstrar que somos valentes, mas todos os dias podemos demonstrar que não somos covardes. Enfrentemos o medo. O medo é mais covarde do que nós. Desaparece, escapa, quando o encaramos. Decidamo-nos a não ter medo de nada...” (Dom Rafael Llano Cifuentes). Os inimigos AVANÇAM sobre os MEDROSOS, e a derrota é total.
Em 1 Sm 14, 12-14 diz: “Os que estavam no posto avançado dirigiram-se a Jônatas e a seu pajem, dizendo: ‘Subi até aqui, que vos ensinaremos uma coisa’. Então Jônatas disse ao seu pajem: ‘Conserva-te atrás de mim, porque Deus os entregou nas mãos de Israel’. Jônatas subiu arrastando-se com os pés e as mãos no chão, e o seu pajem o seguiu. Eles caíam diante de Jônatas, e o seu pajem os matava. Esta primeira matança que Jônatas e seu pajem realizaram foi de cerca de vinte homens...”
O Pontifício Instituto Bíblico de Roma diz: “Subi até aqui, que vos ensinaremos uma coisa”. É uma IRONIA atrevida e PROVOCADORA. Jônatas não se INTIMIDOU diante desse convite irônico e provocador; mas sim, saiu ao encontro dos inimigos arrogantes. Não devemos nos DESANIMAR nem TREMER diante do “barulho” dos inimigos; mas sim, confiando em Deus devemos caminhar com FIRMEZA ao encontro deles e derrotá-los: “Abandonemos este mundo cego... grite ele quanto quiser, como uma coruja para inquietar os passarinhos do dia. Sejamos firmes em nossos propósitos, invariáveis em nossas resoluções e a constância mostrará que a nossa devoção é séria e sincera” (São Francisco de Sales), e: “De nenhuma coisa fogem tanto os demônios, para não voltar, como da água benta” (Santa Teresa de Jesus). Quem TREME de MEDO diante das ironias e provocações dos inimigos será vencido antes de entrar no campo de batalha. O caminho para chegar ao local onde estavam os filisteus não era fácil, mas Jônatas não DESANIMOU, não RETROCEDEU, não RECUOU nem DESANIMOU: “Então Jônatas disse ao seu pajem: ‘Conserva-te atrás de mim, porque Deus os entregou nas mãos de Israel’. Jônatas subiu arrastando-se com os pés e as mãos no chão, e o seu pajem o seguiu”. Para vencer os inimigos da nossa alma, não podemos percorreu o caminho FÁCIL e CÔMODO; mas sim, o CAMINHO ESTREITO: “Entrai pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que levam à perdição, e muitos são os que entram por esse caminho. Porque estreita é a porta e difícil o caminho que conduzem à vida, poucos encontram esse caminho!” (Mt 7, 13-14). Quem se ASSUSTA com a aspereza do caminho jamais vencerá os inimigos da alma... jamais perseverará: “Retirar-se do bem começado, do caminho da fé e do seguimento de Cristo, quer dizer pôr em perigo a própria salvação... Quem retrocede condena-se voluntariamente e jamais atingirá a meta: é um fraco, um vil, um desertor; enquanto deve o cristão ser forte, intrépido e perseverante... Não há dúvida: quem quiser ganhar sua alma para a vida eterna deve perseverar no bem, sem se assustar com a aspereza das provações...” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena). Jônatas disse ao pajem: “Conserva-te atrás de mim, porque Deus os entregou nas mãos de Israel”. O jovem Jônatas mandou que o pajem (escudeiro) ficasse atrás dele, porque a sua CONFIANÇA em Deus dispensava as lanças (armas dos homens). Deus os entregou... e não as armas do pajem (escudeiro). Para vencer os nossos inimigos devemos nos APOIAR em Deus que tudo pode, e não confiar na força dos homens... se Deus CAMINHA CONOSCO, deixemos para trás a proteção das criaturas... Deus deve ir à nossa frente, e não as criaturas: “Cristo comigo, a quem temerei? Mesmo que as ondas se agitem contra mim, mesmo os mares, mesmo o furor dos príncipes: tudo isto me é mais desprezível que uma aranha” (São João Crisóstomo), e: “Ainda que atravesse as sombras da morte’. Ainda que atravesse esta vida que é a sombra mortal. ‘Não temerei mal algum. Estás comigo’. Não temerei males, porque habitas em meu coração pela fé; e agora estás comigo, de sorte que, após as sombras da morte, também eu esteja contigo” (Santo Agostinho). Esse trecho ainda diz: “Eles caíam diante de Jônatas, e o seu pajem os matava”. Os filisteus (inimigos) caíam diante de Jônatas “porque Deus os entregou nas mãos de Israel”. Primeiro Deus os entregou; depois o pajem os matou. Está claro que Deus quis também a colaboração do pajem: “... e o seu pajem os matava”. Quando CONFIAMOS no PODER e na FORÇA de Deus os inimigos da nossa alma “caem por terra”, mas eles não morrem como aconteceu com os filisteus. Então, devemos usar as “espadas” da oração, mortificação, penitência, fuga das ocasiões, recepção dos sacramentos da Confissão e da Comunhão... para vencê-los. Com a ajuda de Deus é possível vencer todos os inimigos: “Levanta-se Deus: eis que se dispersam seus inimigos” (Sl 67, 2). O trecho diz também: “Esta primeira matança que Jônatas e seu pajem realizaram foi de cerca de vinte homens...” O Pe. Luis Arnaldich diz que os filisteus não contavam com tal OUSADIA por parte desses dois bons e valentes jovens que deixaram fora de combate não menos de vinte homens. Está claro que uma pessoa VALENTE e FIEL a Deus pode vencer todos os tipos de inimigos. Aqui não se trata de quantidade; mas sim, de santidade, fervor e amor a Deus. Apoiados em Nosso Senhor podemos realizar uma “grande matança” contra os inimigos que lutam continuamente para nos destruir. Um santo consegue realizar uma grande “carnificina”, porque está alicerçado em Deus que o protege na luta. Os pecadores, mesmo sendo milhares, caem diante dos inimigos porque se apoiam na lama do mundo. A quantidade longe de Deus não tem sentido... é pura ilusão.
Pe. Divino Antônio Lopes FP (C) Anápolis, 27 de agosto de 2015
Bibliografia
Sagrada Escritura Pe. Luis Arnaldich, Bíblia Comentada Fernández, Problemas de topografia palestinense EUNSA São Francisco de Sales, Filotéia São João Bosco, O cristão bem formado São João de Ávila, Escritos São João Crisóstomo, Escritos São João de Nápoles, Sermão 7 Pontifício Instituto Bíblico de Roma Pe. João Colombo, Pensamentos sobre os Evangelhos e sobre as festas do Senhor e dos Santos Santa Teresa de Jesus, Obras Completas Catecismo da Igreja Católica, 336; 2633 Catecismo Romano, IX, n. 4 Pe. Francisco Fernández Carvajal, Falar com Deus Pe. Alexandrino Monteiro, Raios de Luz Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena, Intimidade Divina Leão XIII, Encíclica Sapientiae christianae, 18 e 19 Clemente de Alexandria, Quis dives salvetur, 21 Dom Rafael Llano Cifuentes, Escritos Tomás de kempis, Imitação de Cristo, II, 9, 8 Adolfo Tanquerey, Compêndio de Teologia Ascética e Mística Santo Agostinho, Escritos
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