PREGANDO NO DESERTO (Mt 3, 1)
“Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto”.
1.º PONTO
SÃO JOÃO BATISTA PREPARA A PREGAÇÃO
Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto (Mt 3, 1). São João Batista foi escolhido por Deus para preparar o caminho e dispor o povo para a vinda do Messias, que viria em breve começar sua vida apostólica. Compreendendo sua alta missão, preparou-se para ela: 1.º Com uma vida inocente, qual convinha ao Precursor do Filho do Altíssimo, o Santo dos Santos: tal deve ser também a vida do apóstolo e pregador da divina palavra. Para isso foi viver no deserto, longe das ocasiões de pecados. 2.º Com a oração fervorosa e contínua para conservar-se na inocência e alcançar a conversão dos pecadores: pois é pela oração, mais que pelas palavras, que as almas se convertem. 3.º Com a penitência, praticando primeiro em si o que havia de pregar aos outros; penitências no comer, no vestir e no dormir: seu alimento era o mel silvestre, sua veste era uma pele de camelo e seu leito era a terra nua! Tal vida de inocência, oração e penitência deve ser a preparação de todos os missionários, se querem ver frutificar o trabalho. A frase “naqueles dias” é uma forma de exprimir-se que não pretende precisar o momento exato do que se narra. Usa-se às vezes simplesmente para marcar o começo de um novo episódio. De fato, neste caso pode calcular-se que tinham passado à volta de vinte e cinco anos, desde o regresso da Sagrada Família do Egito. Esta data é aproximada porque a história não pôde fixar o ano desse regresso. O termo “deserto” está tomado num sentido mais amplo que na atualidade. Não se trata do deserto arenoso ou pétreo, mas de zonas áridas nas quais se dá uma vegetação muito pobre. Sobre a frase “naqueles dias”, diz Remígio: “Por estas palavras, São Mateus designa não só o tempo e o lugar da pregação de João... mas também sua missão e o zelo em cumpri-la. Designa o tempo em termos gerais dizendo: ‘Naqueles dias’”.
2.º PONTO
ASSUNTO DA PREGAÇÃO DE SÃO JOÃO BATISTA
Ele dizia: Arrependei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo. A penitência era o assunto favorito de suas pregações, como necessário para receber o reino dos céus, isto é, o Messias. É com a penitência que devemos nos preparar para receber este mesmo Senhor, que veio ao mundo e ficou nele para alimentar nossas almas. São João Batista apela para as terríveis verdades do juízo final, do inferno e da morte, para mover seu auditório à verdadeira penitência. Como estas verdades são poderosas para esmorecer os corações! São as que, ressoando continuamente em nossos ouvidos, vão nos afastar do pecado e nos levar a fazer verdadeira penitência! Como as meditamos? 1.º Lembra-lhes o juízo final: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir à ira futura? Dizia ele aos fariseus e saduceus que o vinha escutar e receber o seu batismo. Contra estes ouvintes de má fé, que envenenaram tudo com o vírus de suas doutrinas e falsas interpretações, censurava este com veemência chamando-lhes raça de víboras, isto é, maus filhos de maus pais, em que a malícia e perversidade são hereditárias. Pecavam a sangue frio e como se estivessem seguros da impunidade. Lembra-lhes, interrogando-os retoricamente, que não escaparão à ira de Deus no juízo final. 2.º Lembra-lhes a sentença de Deus neste juízo: Ele traz a peneira na mão, e limpará a sua eira e recolherá o seu trigo no celeiro e queimará a palha com fogo inextinguível. O trigo atulhado nos celeiros simboliza os justos em sua Igreja; donde, se perseverarem, passarão à felicidade eterna. A palha simboliza todos os incrédulos que serão como palha queimada em um fogo que não tem fim! Dia terrível em que será feito esta distribuição de bens e males, de castigos e recompensas! Qual será a nossa sorte? Seremos palha ou trigo na eira do Senhor? 3.º Lembra-lhes o fogo do inferno: E queimará a palha com o fogo inextinguível. João Batista não receia apontar a esses pecadores para o lugar do fogo eterno, para induzi-los à penitência dos seus pecados. Se este último recurso falha, não há mais onde apelar para render os corações obstinados! A quem medita no fogo do inferno, que penitência pode parecer dura? Quando se trata da eternidade, seria nada a penitência de toda a vida! 4.º Lembra-lhes a morte: Já o machado está posto à raiz das árvores. A enfermidade e a velhice anunciam morte próxima; porém a saúde e a mocidade, nem por isso, asseguram longa vida. Todos somos árvores com o machado posto na raiz! Grande motivo para nos darmos à penitência antes que o machado dê o último corte e a árvore de nossa vida caia ao chão. 5.º Mais uma vez lembra a seus ouvintes o fogo do inferno: portanto, toda árvore que não der fruto bom será lançada ao fogo. Nunca é demais sentirmos perto as chamas deste fogo, para, ao calor dele, sacudirmos o torpor que nos inibe de praticar boas obras! 6º Por fim, tira-os da presunção que os impede de fazer penitência: Não vos digais a vós mesmos: Temos por pai a Abraão; em consideração a seu servo, Deus nos salvará; pois eu vos declaro que Deus pode fazer nascer destas pedras filhos de Abraão. Quer dizer: Deus que formou Adão do limo da terra pode aniquilar-vos a todos, e mandar às pedras que vedes neste deserto, converter-se em novos homens, que pela obediência e pela fé serão com maior título que vós, chamados filhos de Abraão. Nas pedras estão também representados os gentios, que, sendo repudiados os judeus, serão chamados a fazer parte do reino messiânico. O Pe. João Batista Lehmann ensina: “João Batista, sem temores e sem fraquezas, prega a verdade a todos, e a todos admoesta, enfrentando as iras dos poderosos; cai vítima do seu zelo e de sua coragem. Belo exemplo para os fiéis de todos os tempos”. É grande covardia esconder a verdade dos fiéis. São João Batista foi sincero em suas pregações: “Para ser autêntica, a palavra deve ser transmitida ‘sem duplicidade e sem falsificação, mas manifestando com franqueza a verdade diante de Deus’ (2 Cor 4, 2). O presbítero, com uma maturidade responsável, evitará DISFARÇAR, REDUZIR, DISTORCER ou DILUIR o conteúdo da mensagem divina. Com efeito, a sua missão ‘não é de ensinar uma sabedoria própria, mas sim, de ensinar a PALAVRA de DEUS e de convidar insistentemente a todos à conversão e à santidade” (Diretório para o ministério e a vida do presbítero, 45).
3.º PONTO
QUALIDADE DA PREGAÇÃO DE SÃO JOÃO BATISTA
Prega com zelo da glória de Deus, pois queria ter preparado todo aquele povo para receber com fruto o Messias e seguir sua doutrina. Prega com fortaleza e constância contra os vícios dos fariseus; e já é terrível com os soberbos, como Elias; já misericordioso com os humildes, como Moisés. Prega sem milagre, pois tanta força de persuadir tinha a vida santa que levava, que não precisava fazer milagres para autorizar sua doutrina. Prega principalmente com o exemplo de uma vida austera e penitente. Ora, João, conta o evangelho, se vestia com pele de camelo e um cinturão de couro em volta dos rins; seu alimento era gafanhotos e mel silvestre. Este exemplo nunca lido de nenhum outro profeta é que despovoava Jerusalém e toda a Judeia e todo o país vizinho do Jordão, vindo a ele os pecadores para ser batizados e confessar os seus pecados. Força maravilhosa do exemplo! Como queres convencer os ouvintes a fazer penitência, se vives vida regalada? Como queres induzir o auditório a uma vida santa, se a tua é pecaminosa? Como queres infundir o amor de Deus nos corações dos fiéis, se o teu transborda em amor terreno e mundano? O Pe. João Batista Lehmann escreve: “João Batista, santificado no seio materno, quando da visita de Maria Santíssima a Santa Isabel, tonou-se um grande penitente. Vivia no deserto; alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre, e talvez de resinas; vestia-se com uma pele de camelo. Praticava austeridades espantosas; evitava tudo que pudesse dar conforto material ou mesmo moral. Foi perfeito imitador de Jesus, e deve ser nosso modelo...” São João Batista nos ensina a pregar para agradar a Deus e não aos homens: “Adulterar a palavra de Deus é ou sentir nela algo distinto do que na realidade é, ou buscar por ela não os frutos espirituais, mas os fetos adulterinos do louvor humano. Pregar com sinceridade é buscar a glória do autor e criador” (São Gregório Magno), e: “... em suas pregações procure apenas agradar a Deus” (São João Crisóstomo).
Pe. Divino Antônio Lopes FP (C) Anápolis, 10 de outubro de 2018
Bibliografia
Sagrada Escritura Edições Theologica Remígio, Escritos Pe. Alexandrino Monteiro, Reflexões Evangélicas Pe. João Batista Lehmann, Euntes... Praedicate! Diretório para o ministério e a vida do presbítero, 45 São Gregório Magno, Escritos São João Crisóstomo, Escritos
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