LEMBRA-TE DE MIM

(Lc 23, 42)

 

“Jesus, lembra-te de mim, quando vieres com teu reino”.

 

O bom ladrão, depois de ter exercitado a humildade e a caridade, confessando seu pecado e defendendo a Jesus Cristo, tomou ânimo e confiança, e voltando para o Senhor disse-Lhe: “Jesus, lembra-te de mim, quando vieres com teu reino”. Chama Jesus Cristo primeiro de SENHOR, com grande reverência, respeitando aquele que era desprezado por todos e tido por verme. Por fim, pede para o Senhor lembrar-se dele quando entrar no seu reino, como se dissesse: Não te peço que me salves aqui, lembrando-me da morte, como pede meu companheiro, mas que me salves depois que morrer na cruz. Tampouco te peço que me leves ao teu reino e me dês nele um trono; porque um ladrão como eu não poder se atrever em pedir coisa tão grande; só te peço que se lembre de mim, porque se o Senhor fizer assim, terei boa morte, e o Senhor me colocará no lugar que quiser na tua glória.

Pondera logo as causas de onde procedeu a conversão do bom ladrão, pressupõe a graça de Deus. Os meios de que se valeu o Senhor para converter-lhe não foram milagres, porque, não viu nenhum; não foram também as pregações, porque o bom ladrão não tinha ouvido nenhuma. O que moveu o bom ladrão foi a heróica paciência e mansidão de Jesus Cristo no meio de tantas injúrias, e a rara caridade que demonstrou rezando por seus inimigos. Estas virtudes, junto com a ilustração do céu, o convenceram de que aquele Senhor era Santíssimo; e, pois, Ele dizia que era Rei, Messias e Filho de Deus, assim seria sem dúvida. Como é importante, para converter um pecador, ser paciente, manso, caridoso e exemplar!

Santo Afonso Maria de Ligório comenta: E voltando-se para Jesus disse-lhe: Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu reino. Com estas palavras reconhecia-o por seu verdadeiro Senhor e como rei do céu. Jesus promete-lhe então o paraíso para o mesmo dia: Em verdade eu te digo que hoje estarás comigo no paraíso. Escreve um douto autor que com essa palavra o Senhor nesse mesmo dia, imediatamente depois de sua morte, se lhe mostrou sem véu, fazendo-o imensamente feliz, embora não lhe conferisse todas as delícias do céu antes de entrar nele. Arnoldo Carnotense, no seu Tratado das sete palavras, considera todas as virtudes que o bom ladrão, São Dimas, praticou na sua morte: Ele crê, se arrepende, confessa, prega, ama, confia e reza. Praticou a fé, dizendo: Quando chegares no teu reino, crendo que Jesus Cristo depois de sua morte havia de entrar vitorioso no reino de sua glória. Teve por certo que havia de reinar quem ele via morrer, diz São Gregório. Exerceu a penitência, confessando seus pecados: Nós padecemos justamente, pois recebemos o que merecemos. Diz Santo Agostinho: Não ousou dizer: lembra-te de mim, senão depois da confissão de sua iniquidade e de depor o fardo de suas iniquidades. E Santo Atanásio: Ó bem-aventurado ladrão que roubaste o céu com essa confissão. Outras belas virtudes praticou, então, esse santo penitente: a pregação, anunciando a inocência de Jesus: Este, porém, nenhum mal praticou. Exerceu o amor para com Deus, aceitando a morte com resignação em castigo de seus pecados: Recebemos o que merecemos. São Cipriano, São Jerônimo e Santo Agostinho não duvidam, por isso, de chamá-lo mártir, porque os algozes, ao quebrarem-lhe as pernas, o fizeram com maior atrocidade, por ter louvado a inocência de Jesus, aceitando esse sofrimento por amor de seu Senhor.

O Pe. Luis de La Palma explica: Estando o Senhor na cruz iluminou com a verdade um de seus companheiros de suplício. O outro que foi repreendido, talvez, agora pudesse abrir-se para a salvação.

Este venturoso ladrão, depois de ter reconhecido os seus próprios pecados e aceitar o castigo, mostrou a seu companheiro onde estava a verdade. Então virou o rosto e disse: Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres entrado no teu Reino!

Com toda Simplicidade, reconheceu-o como Rei; de uma maneira maravilhosa acreditou na ressurreição. Chamando-lhe pelo nome, não pedia mais nada para esta vida, somente o perdão e a vida eterna; sentindo-se indigno, disse: Lembra-te de mim.

Vendo-o padecer ao seu lado, escutando todas as acusações que os sacerdotes lançavam; tudo levava a pensar que Jesus tinha crimes iguais aos seus, ou até piores. Mas a força da graça e a luz do céu foram abundantes, pois mesmo nestas circunstâncias acreditou em Jesus. Ninguém falava bem do Senhor; o sol ainda não tinha escurecido; a terra também não havia tremido. Não foram estes acontecimentos que o moveram a crer, mas a força da cruz.

Viu Jesus padecer na cruz e acreditou nele como o Senhor do universo; acreditou no reino celestial e pediu-lhe o céu.

Emocionado, o Senhor escutou no meio de tanta zombaria e insultos, aquela voz que o reconhecia como Deus. Vinha de um ladrão que mesmo estando Deus tão oculto, soube confessar em alta voz. Declarando essa verdade ao outro ladrão, podemos dizer que este foi o primeiro apostolado de fato. Como reconhecia a divindade e defendia-O, dizendo que era santo e inocente; o Senhor concedeu-lhe muito mais do que pedia.

Um sacerdote da Missão escreve: Ó prodígio da graça! Ó valor da intercessão de Maria! Um ladrão que há pouco blasfemava se concentra em si: considera os imensos sofrimentos de Jesus Cristo todo esfolado e coroado de espinhos; e, sobretudo, essa paciência heróica em suportar as injúrias, em não responder aos insultos; essa mansidão e bondade incomparável que o leva até a pedir por seus inimigos. Este malfeitor não pôde mais reter o ímpeto do seu coração arrependido, reconhece que Jesus cristo é Deus, e aproveita ocasião tão oportuna para se recomendar a Ele: “Jesus, lembra-te de mim, quando vieres com teu reino”.

O Pe. Manuel de Tuya escreve: Seguramente o bom ladrão havia ouvido falar de Jesus Cristo: de sua vida de milagres e do seu messianismo. E agora, diante de sua majestade e exemplo na cruz, se confirmava nele. Aquela conduta era sobre humana. E, voltando-se para Jesus Cristo, pediu que se lembrasse dele. Pede que se lembre dele quando vier o seu reino, no momento escatológico, na hora da ressurreição dos corpos.

O Pe. Juan de Maldonado comenta: Jesus, lembra-te de mim, quando vieres com teu reino. Não é no sentido quando vieres a reinar, mas quando vieres já reinando. Quando vieres não a conquistar o reino, mas com o reino já conquistado, como virá no dia do juízo. Breve sentença, porém cheia de sentido. Em poucas palavras confessa a Jesus Cristo como rei e como Deus: como rei, ao dizer quando vieres com teu reino; como Deus, quando O chama de Senhor. E O considera rei de tal natureza, que pode perdoar pecados. Lembra-te de mim; logo acredita na sua ressurreição; do contrário, não O imploraria quando estava para entregar a alma. Acreditava, pois, que Jesus havia de ressuscitar e reinar depois da ressurreição. Confissão que, sendo admirável em si mesma, o é muito mais naquelas circunstâncias de tempo, lugar e pessoa, como anotam São João Crisóstomo e León. León explica: Que exortação lhe deu tanta fé e que doutrina o instruiu? Que pregador ouviu?Não havia visto milagres!

Lembra-te de mim. Modesto pedido. Não pede que lhe faça participante de seu reino ou que lhe dê o lugar mais honrado; que o coloque na sua direita ou na sua esquerda, como a mulher de Zebedeu havia pedido para seus filhos; só diz: Lembra-te de mim. Isto é, não me excluas nem leve em conta os meus pecados, mas por tua misericórdia e bondade, admite-me no último lugar. Com razão Santo Agostinho deduziu deste texto o purgatório. O ladrão sabia que estava perto de morrer, e, então, rogou a Jesus Cristo que, quando Ele morresse, recordasse dele, perdoando os seus pecados. Acreditava, pois, conforme a religião dos judeus, que depois da morte podiam perdoar os pecados, coisa possível somente no purgatório.

 

ORAÇÃO: Ó doce Jesus! Vós que, pregado na cruz, com vossa milagrosa paciência e maravilhoso exemplo de caridade, converteu o bom ladrão; ajude-me, para que, à sua imitação, faça também esses milagres, isto é, dando muitos exemplos para edificar ao meu próximo... refreie os maus exemplos e acenda no coração do próximo grande desejo de perfeição e santidade. Amém!

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 03 de março de 2015

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Pe. Ramón Genover, Meditações Espirituais para todo o ano

Santo Agostinho, Sermão 130

Santo Afonso Maria de Ligório, A Paixão do Senhor

Pe. Luis de La Palma, A Paixão do Senhor

Sacerdote da Missão, A Sagrada Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo

Pe. Manuel de Tuya, Bíblia Comentada

Pe. Juan de Maldonado, Comentário de São Mateus

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Lembra-te de mim”.

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