VASO CHEIO DE VINAGRE

(Jo 19, 29)

 

“Estava ali um vaso cheio de vinagre. Fixando, então, uma esponja embebida de vinagre num ramo de hissopo, levaram-na à sua boca”.

 

É preciso considerar a terrível falta de amor e também a crueldade do homem contra Deus, e a imensa bondade de Deus para com o homem; porque não pode ser maior liberalidade que derramar Deus todo o sangue de suas veias, sem deixar uma gota, para o bem do homem; nem pode ser maior rebeldia e indiferença do homem, que nesse momento não oferece um alívio para a sede de Deus.  Devemos ponderar o desamparo de Jesus Cristo nesta sua SEDE, sem ter quem compadecesse d’Ele e Lhe oferecesse água para matar a SEDE, senão vinagre, e ainda esse misturado com erva de hissopo, mortal e áspero. Nosso Senhor sofreu tudo isso com admirável paciência e silêncio, sem queixar-se nem dizer palavras de indignação... para dar-nos exemplo de sofrimento e para livrar-nos da sede eterna que por nossos pecados merecíamos no inferno. Quão digno de todo louvor e agradecimento é este Senhor que quis sujeitar-se a um desamparo, semelhante em algo ao dos condenados, para preservar dele seus inimigos! É preciso ponderar também a aflição de Jesus Cristo, nosso Senhor, na SEDE espiritual que ali padecia, quando naquela esponja, cheia de VINAGRE, sobre a cana, considerou a bebida que lhe haviam de dar muitos pecadores, dando-lhes seus corações cheios de VINAGRE ácido do pecado, postos sobre a cana da vaidade.

O seu pedido foi atendido imediatamente, se bem que de uma maneira assaz precária e humilhante. Ainda fosse um gole de água fresca ou de vinho reconfortante; mas não: ofereceram-Lhe uma esponja embebida em vinagre, e não sem adicionar zombarias indignas e ofensivas.

“Correndo um, e ensopando uma esponja em vinagre – relata São Marcos, - e atando-a numa cana, deu-lhe de beber, dizendo: ‘Deixai, vejamos se Elias vem livrá-lo” (Mc 15, 36). Foi este o refrigério único, que já nas vascas da agonia foi oferecido Àquele que aos homens deu e dá tudo e em abundância: água deliciosa, vinho saboroso e bebidas agradáveis! Nem um gole d’água as suas criaturas Lhe deram! A água ficou longe dos seus lábios, como longe ficou dos lábios do mau e amaldiçoado rico. Também a sua sede espiritual não teve tão desejada satisfação. Nem o mau ladrão mitigou o seu sofrimento com a dádiva de sua alma. Ele a negou, preferindo entregá-la a Satanás. Assim é até hoje. Todos passam pela cruz de Cristo e quantos não lhe negam a sua alma, preferindo lançá-la ao inferno. -la ao inferno!

Grande foi também a dor de Maria Santíssima e das santas mulheres, que assistiram bem de perto esta cena tristíssima e desoladora. Não lhes faltaria a coragem e a prontidão de, com perigo de vida, buscar um pouco           d’ água, como o fizeram os guerreiros de Davi (1 Cr 11, 18). Nada, porém, podiam fazer. Era-lhes vedada qualquer intervenção a favor do crucificado. Acompanhando-O na sua dor, lendo  nos seus olhos a luz da vida se apagar, vendo sua boca entreaberta e seus lábios mirrados de sede ardente, nenhum socorro Lhe podiam prestar, senão o da sua boa vontade, da sua alma e do seu amor.

O Pe. Juan Leal comenta: Misturado com água, a “posca”, bebida favorita dos soldados romanos e da gente pobre. Também deve ter sido um soldado que ofereceu essa bebida para Jesus Cristo (Lc 23, 36). Hissopo. São Mateus e São Marcos falam de uma cana. São João fala do hissopo colocado na cana.

Santo Afonso Maria de Ligório ensina: Afinal, sabendo Jesus que seu sacrifício já estava consumado, disse: Tenho sede. E aqueles carrascos lhe puseram nos lábios uma esponja toda embebida no vinagre e fel. Mas, Senhor, vós não vos queixais de tantas dores que vos roubam a vida e agora vos queixais de sede? Eu vos compreendo, meu Jesus, a vossa sede é sede de amor; porque vós nos amais, desejais ser amado por nós. Ajudai-me, pois, a expelir do meu coração todos os afetos que não são para vós: fazei que eu não ame outra coisa senão a vós e nada mais deseje senão cumprir a vossa vontade. Ó vontade de Deus, vós sois o meu amor.

O Pe. Luis de La Palma escreve: Imediatamente um deles tomou uma esponja, embebeu-a de vinagre e apresentou-lhe na ponta de uma vara para que bebesse. Os outros diziam: Deixa! Vejamos se Elias virá socorrê-lo. Apesar de todo sofrimento na cruz e toda zombaria, o Senhor cumpriu tudo o que estava estabelecido na Escritura, dizendo que tinha sede, confirmava o salmo: na minha sede deram-me vinagre para beber. Estava com uma sede que o atormentava, pois havia perdido muito sangue. Não pediu água, apenas disse que tinha sede. Havia ali um vaso cheio de vinagre (Jo 19, 29), que era uma bebida usada pelos romanos e deram-lhe para beber. Os soldados que guardavam, tinham que esperar até que os condenados estivessem mortos. Por isso, levavam com eles, para acalmar a sede, uma mistura de água com vinagre, chamada de posca. Traziam também para dar aos condena­dos, porque um dos maiores tormentos na cruz é a sede. Quando o Senhor disse que tinha sede, um dos soldados espetou uma esponja na ponta de sua lança, molhou-a na posca e deu de beber a Jesus.

 

ORAÇÃO: Ó meu Salvador! Quão diferente bebida me dais para matar a minha sede, daquela que lhe dou para matar a sua! Pela esponja cheia de vinagre sobre a cana de hissopo, me dais vossa santíssima carne, misturado com o vosso precioso sangue, exprimida nessa cana da cruz; e com ela me asperge como com um hissopo para limpar-me, e me embriagais com o vinho para encher-me do vosso amor. Que darei em troca, Senhor, por tão grande caridade? Amém!

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 14 de março de 2015

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Pe. Ramón Genover, Meditações Espirituais para todo o ano

Pe. Juan Leal, A Sagrada Escritura

Plauto, Miles gloriosus 836

Santo Afonso Maria de Ligório, A Paixão do Senhor

Pe. Luis de La Palma, A Paixão do Senhor

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Vaso cheio de vinagre”.

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