DIGO A TODOS: VIGIAI!

(Mc 13, 33-37)

 

33 Atenção, e vigiai, pois não sabeis quando será o momento. 34 Será como um homem que partiu de viagem: deixou sua casa, deu autoridade a seus servos, distribuiu a cada um sua responsabilidade e ao porteiro ordenou que vigiasse. 35 Vigiai, portanto, porque não sabeis quando o senhor da casa voltará: à tarde, à meia-noite, ao canto do galo, ou de manhã, 36 para que, vindo de repente, não vos encontre dormindo. 37 E o que vos digo, digo a todos: vigiai!”

 

 

 

Pseudo-Jerônimo escreve: “Porque é necessário que vigie o espírito antes da morte do corpo”, e: “Nos ordena duas coisas: vigiar e orar. Porque muitos vigiam, sim, toda a noite, porém, para consagrá-la à maldade. E apresentando um exemplo em confirmação disso, disse: ‘À maneira de um homem que, saindo para uma longa viagem” (Teofilacto), e também: “O homem que saindo para uma longa viagem deixando sua casa é Cristo, quem, subindo triunfante a seu Pai depois da ressurreição, deixou corporalmente a Igreja, sem privá-la, por isso, da proteção da presença divina” (São Beda, In Marcum 4, 42), e ainda: “Portanto, e para que os últimos aprendam dos anteriores este preceito comum a todos, conclui dizendo: ‘O que digo a vocês, digo a todos” (Pseudo-Jerônimo), e: “Não falou somente para os que então o ouviam, mas também para os sucessores daqueles, os anteriores a nós, para nós mesmos e os que seguem depois de nós até sua última vinda” (Santo Agostinho, Ad Hesych., Epíst. 80).

 

Edições Theologica comenta Mc 13, 33-37.

 

Vigiai”: Visto que não sabemos quando há de vir o Senhor, temos de estar preparados. Vigiar é, sobretudo, amar. Quem ama cumpre os mandamentos e espera com ansiedade, com urgência, que Cristo volte; porque esta vida é de espera, é caminho ao encontro de Cristo Senhor. Os primeiros cristãos repetiam com freqüência e com amor a jaculatória: “Vem, Senhor Jesus” (1 Cor 16, 22; Ap 22, 20). E, ao exercitar deste modo a fé e a caridade, aqueles cristãos encontravam a força interior e o otimismo necessário para o cumprimento dos deveres familiares e sociais, e desprendiam-se interiormente dos bens terrenos, com o senhorio que dá a esperança da vida eterna.

Católico, Dom Duarte Leopoldo comenta sobre esse trecho da Palavra de Deus: “A morte chega sempre de improviso e quando menos a esperamos. E, pois, estamos no mundo como de passagem para a eternidade; vigiemos e oremos para que não nos surpreenda a morte em estado de pecado. Vigiar e orar, eis os dois conselhos de Jesus para alcançarmos o céu: a vigilância tem os olhos abertos para observar tudo em torno de si, vê os perigos do caminho, pressente os do inimigo, conhece os recursos de que dispõe, desconfia de si e previne-se, põe-se de guarda; a oração tem os olhos levantados para o céu, donde nos pode vir o socorro indispensável. Servos de Deus, temos todos a nossa missão, uma tarefa a cumprir. É preciso que, quando vier o dono da casa, de dia ou de noite, na mocidade ou na velhice, nos encontre ocupados em nosso trabalho”.

Infeliz do católico que vive como se Deus não existisse e como se nunca fosse morrer e comparecer diante do Tribunal de Deus.

Milhões de católicos vivem como se não existisse eternidade após essa vida passageira. É preciso acordá-los e dizer-lhes: “Atenção, e vigiai, pois não sabeis quando será o momento” (Mc 13, 33).

 

Santo Afonso Maria de Ligório comenta.

 

É certíssimo que todos devemos morrer, mas não sabemos quando.

Nada há mais certo que a morte. — diz Idiota — porém nada mais incerto que a hora da morte. Meu irmão, estão fixados ano, mês, dia, hora e momento em que terás que deixar este mundo e entrar na eternidade; porém nós o ignoramos. Nosso Senhor Jesus Cristo, a fim de estarmos sempre bem preparados, nos disse que a morte virá como um ladrão, oculto e de noite (1Ts 5, 2). Outras vezes nos exorta a que estejamos vigilantes, porque, quando menos o esperamos, virá Ele a julgar-nos (Lc 12, 40). Disse São Gregório que Deus nos oculta, para nosso bem, a hora da morte, a fim de que estejamos sempre preparados para morrer. Visto que a morte em todo tempo e em qualquer lugar pode arrebatar-nos, é mister – disse São Bernardo – que se quisermos morrer bem e salvar-nos, a estejamos esperando em todo lugar e em todo tempo.

Ninguém ignora que deve morrer; mas o mal está em que muitos vêem a morte a tamanha distância que a perdem de vista. Mesmo os anciãos mais decrépitos e as pessoas mais enfermas não deixam de alimentar a ilusão de que hão de viver mais três ou quatro anos. Eu, porém, digo o contrário: Devemos considerar quantas mortes repentinas vemos em nossos dias. Uns morrem caminhando, outros sentados, outros dormindo em seu leito. É certo que nenhum deles julgava morrer tão subitamente no dia em que morreu. Afirmo, ademais, que de quantos no decorrer deste ano morreram em sua própria cama, e não de repente, nenhum deles imaginava que devia acabar sua vida neste ano. São poucas as mortes que não chegam inesperadas.

Assim, pois, cristão, quando o demônio te provoca a pecar, pretextando que amanhã confessarás, dize-lhe: Quem sabe se não será hoje o último dia da minha vida? Se esta hora, se este momento, em que me apartasse de Deus, fosse o último para mim, de modo que já não restasse tempo para reparar a falta, que seria de mim na eternidade? Quantos pobres pecadores tiveram a infelicidade de ser surpreendidos pela morte ao recrearem-se com manjares intoxicados e foram precipitados no inferno? Assim como os peixes caem no anzol, assim são colhidos os homens pela morte num momento ruim (Ecl 9,12). O momento ruim é exatamente aquele em que o pecador ofende a Deus.

Diz o demônio que tal desgraça não nos há de suceder; mas é preciso responder-lhe: E se suceder, que será de mim por toda a eternidade?

O Senhor não nos quer ver perdidos. Por isso, com ameaça de castigo, não cessa de advertir-nos que mudemos de vida. Se não vos converterdes, vibrará sua espada (Sl 7,13). Vede — disse em outra parte — quantos são os desgraçados que não quiseram emendar-se, e a morte repentina os surpreendeu quando não esperavam, quando viviam despreocupados, julgando terem ainda muitos anos de vida (1Ts 5, 3). Disse-nos também: Se não fizerdes penitência, todos haveis de perecer. Por que tantos avisos do castigo antes de infligi-lo, senão porque quer que nos corrijamos e evitemos morte funesta. Quem dá aviso para que nos acautelemos, não tem a intenção de matar-nos — disse Santo Agostinho.

É mister, pois, que preparemos nossas contas antes que chegue o dia do vencimento. Se durante a noite de hoje devesses morrer, e ficasse decidida assim a tua salvação eterna, estarias bem preparado? Quanto não darias, talvez, para obter de Deus a trégua de mais um ano, um mês, um dia sequer! Por que agora, já que Deus te concede tempo, não pões em ordem tua consciência? Acaso não pode ser este teu último dia de vida? Não tardes em te converter ao Senhor, e não o adies, porque sua ira poderá irromper de súbito e no tempo da vingança te perderás (Eclo 5, 8-9). Para salvar-te, meu irmão, deves abandonar o pecado.

E se algum dia hás de abandoná-lo, por que o não deixas desde já? Esperas, talvez, que chegue a morte? Mas esse instante não é para os obstinados o tempo do perdão, senão da vingança. No tempo da vingança, te perderás.

Se alguém te deve soma considerável, tratas de assegurar o pagamento por meio de obrigação escrita, firmada pelo devedor; dizes: Quem sabe o que pode suceder? Por que, então, deixas de usar da mesma precaução, tratando-se da alma, que vale muito mais que o dinheiro? Por que não dizes também: quem sabe o que pode ocorrer? Se perderes aquela soma, não estará ainda tudo perdido e ainda que com ela perdesses todo o patrimônio, ficaria a esperança de o poder recuperar. Mas se, ao morrer, perdesses a alma, então, sim, tudo estaria irremediavelmente perdido, sem esperança de recobrar coisa alguma.

Cuidas em arrolar todos os bens de que és possuidor, com receio de que se percam quando sobrevier morte repentina. E se esta morte imprevista te achasse na inimizade para com Deus? Que seria de tua alma na eternidade?

Estais preparados — O Senhor não disse que nos preparemos ao aproximar-se a morte, mas que estejamos preparados. No transe da morte, nesse momento cheio de perturbação, é quase impossível pôr em ordem uma consciência embaraçada. Isto nos diz a razão. Nesse sentido Deus também advertiu-nos, dizendo que não virá então perdoar, mas vingar o desprezo que fizéssemos da sua graça (Rm 12, 19).

Justo castigo — disse Santo Agostinho — para aquele que não quis salvar-se quando pôde; agora, quando quer, não o pode. Dirá, todavia, alguém: Quem sabe? Talvez nesse momento me converta e me salve.

Mas quem é tão néscio e se lança num poço dizendo: Quem sabe? Atirando-me, talvez fique com vida e não morra? Ó meu Deus, que é isto? Quanto o pecado cega o espírito e faz perder até a razão! Quando se trata do corpo, os homens falam como sábios, e como loucos, quando se trata da alma.

Meu irmão, quem sabe se esta reflexão que lês será o último aviso que Deus te envia? Preparemo-nos sem demora para a morte, a fim de que não nos encontre de improviso. Santo Agostinho disse que o Senhor nos oculta a última hora da vida com o fim de que todos os dias estejamos preparados para morrer (Hom. XIII). São Paulo nos previne que devemos procurar a salvação não só temendo mas tremendo (Fl 2, 12). Conta Santo Antonino que certo rei da Sicília, para manifestar a um particular o grande medo com que se sentava no trono, o fez sentar à mesa com uma espada suspensa sobre sua cabeça por um fio delgado, de sorte que o convidado, vendo-se nessa terrível situação, mal podia levar à boca uma migalha de alimento. Todos estamos em semelhante perigo, já que dum instante para outro pode cair sobre nós a espada da morte, resolvendo o negócio da eterna salvação.

Trata-se da eternidade. Se a árvore cair para o norte ou para o meio-dia, em qualquer lugar onde cair aí ficará (Ecl 11, 3). Se na morte nos acharmos na graça de Deus, qual não será a alegria da alma vendo que tudo está seguro, que já não pode perder a Deus e que, para sempre, será feliz? Mas, se a morte surpreende a alma em estado de pecado, que desespero se apoderará do pecador ao dizer: Então erramos (Sb 5, 6), e para minha desgraça, já não há remédio em toda a eternidade! Foi este receio que fez exclamar o Beato P. M. Ávila, apóstolo da Espanha, quando lhe anunciaram a aproximação da morte: Oh! Se tivesse um pouco mais de tempo para me preparar para a morte! Foi por isso que o abade Agatão, ainda que morresse depois de haver exercido a penitência durante muitos anos, dizia: Que será de mim? Quem conhece os juízos de Deus? Também Santo Arsênio tremia à vista da morte e, perguntando-lhe os seus discípulos a causa, respondeu: Meus filhos, já não é novo em mim esse temor: tive-o sempre, em toda a minha vida. Mais que ninguém tremia o Santo Jó, dizendo: Que será de mim quando Deus se levantar para me julgar, e que lhe direi se me interrogar?

 

Católico, não cochile durante a sua vida aqui na terra; lembre-se de que a morte não tarda... não manda recado... Esteja, portanto, preparado.

 

O Pe. Paulo Ségneri comenta Mc 13, 33: “Estai de sobreaviso, vigiai e orai, porque não sabeis quando será o tempo”.

I - Nestes três itens encontra-se tudo quanto deves realizar para que estejas sempre preparado para morrer: estar de sobreaviso, vigiar e orar. A primeira coisa que te é pedida é, pois, de que estejas de sobreaviso: isto quer dizer que não te deves deixar alucinar pelo pecado mortal, como costumam fazer tantos miseráveis, a respeito dos quais acha-se escrito: “A sua malícia os cegou” (Sb 2, 21). Esta sim que é uma cegueira lutuosa! E o é por três motivos:

a) Porque a cegueira corporal pode, pelo menos, produzir muitos bens à tua alma, não te deixando ver tantas coisas perigosas que poderiam com certa facilidade induzir-te ao mal, como seja, a formosura feminina, o brilho do ouro, o faiscar da púrpura, a presença do adversário que te possa enervar. A cegueira do intelecto, porém, ocasiona infinitos males à tua alma e teu corpo: “Obscureçam os seus olhos para que não vejam”: e o que acontece? “E faze que os seus rins vacilem sempre” (Sl 68, 24). Quando o demônio consegue cegar-te, então ele far-te-á curvar a seu bel-prazer.

b) Quem está sujeito à cegueira corporal busca ajuda, apoio, como fazia aquele certo Elimas, que tendo sido cegado por São Paulo, logo “andando à roda buscava quem lhe desse a mão” (At 13, 11). Mas quem está cego intelectualmente, desdenha orgulhosamente qualquer ajuda, não quer nenhum guia, não quer ninguém que o governe, acha que enxerga mais do que os outros e acaba na perdição: “Ai de vós, os que sois sábios a vossos olhos, e, segundo vós mesmos, prudentes!” (Is 5, 21).

c) Quando muito, a cegueira corporal poderá fazer com que caias em algum fosso, de onde muitas vezes poderás sair; a cegueira intelectual, porém, far-te-á precipitar no inferno, de onde, se vieres a cair, não sairás nunca mais: “O justo cairá sete vezes, e tornar-se-á a levantar; porém os ímpios serão precipitados no mal” (Pr 24, 16).

É preciso que faças o maior esforço possível, para não incorrer em tal cegueira. E se por infelicidade já te encontras nela, podes estar certo que o melhor remédio para sarar da mesma é aquele usado por Jesus Cristo com o cego de nascença: “Unge os teus olhos com um colírio, para que vejas” (Ap 3, 18). Pensa que és de barro, que és de cinza, pensa que por isso podes morrer de uma hora para outra; e depois vai, sem tardança, recorrer ao banho da confissão sacramental. “Vai à piscina de Siloé” (Jo 9, 11) e aí, desatando-te completamente em pranto, lava-te bem: esse pranto far-te-á reconquistar a vista perdida. “Estai de sobreaviso porque não sabeis quando será o tempo”.

II — Reflete agora sobre a segunda coisa que te é pedida: “Vigiar”. Quer dizer não adormecer nos pecados veniais: “Vigiai justos e não pequeis” (1 Cor 15, 34): é o sono referido pelo Apóstolo nesta passagem. É, portanto, um sono muito comum aos justos: porém, não deve ser descurado: ele é muito mais prejudicial do que possas imaginar: por três motivos:

a) Verdade é que não te perverte o intelecto como o faz o pecado mortal que é cegueira: cobre-o, porém, de sombra, embaça-o, atordoa-o, de tal modo que nas coisas que te são verdadeiro proveito, não te encontres disposto como acontece com quem se encontra vigilante: ao invés, encaminha-te para sonhos e vaidades. Quem são os “dorminhocos?” Di-lo Isaías: aqueles que “amam os sonhos” (Is 56, 10).

b) Constrange-te a uma penosa pobreza: “Não queiras ser amigo do sono, para que a pobreza não te oprima” (Pr 20, 13). Qual será o teu lucro se não tiveres cuidado com os pecados veniais, as vanglórias, as impaciências e as contínuas transgressões na vida espiritual? O que te torna rico é a vigilância: “Abre os teus olhos e terás pão em abundância” (Idem.).

c) Dormindo, perdes o controle sobre ti mesmo, e assim ficas exposto aos insultos dos inimigos, como aconteceu com Sansão, com Sísara, com Holofernes e com muitos outros, motivo pelo qual clamava Isaías: “Levantai-vos, príncipes, tomai o escudo” (Is 21, 5). Não vês como os demônios são hábeis em subjugar-te, porque sabem que desprezas os pecados leves? Pouco a pouco sugerem os grandes, e assim, enquanto te achas dormindo, matam-te, quando menos o esperas: “Chegaram a Lais, a um povo tranqüilo e seguro, e passaram-no ao fio da espada” (Jz 18, 27).

Que te resta a fazer? Desperta; escuta a voz do teu Senhor que há tanto tempo te está convocando para uma vida perfeita. E depois, para não cair outra vez em sono, pensa também na aproximação do último dia. Depressa, depressa: não vês que não há tempo a perder? Neste mundo seria necessário vigiar sempre, tão breve é a nossa vida. Que digo eu? Seria desejável que não se cometesse nunca pecados veniais, porém, isso não é possível. É preciso, portanto, agir como os santos que usavam de mil expedientes para dormir o menos possível: jejuavam, estudavam e salmodiavam. Fazes tu, algo semelhante? Sobretudo, tem cuidado com o ócio, ao qual muitas vezes não dás muita atenção: e, todavia, é precisamente ele quem produz em ti tanto sono: “A preguiça dá de si sono” (Pr 19, 15).

A vida é breve: por conseguinte procura ficar ocupadíssimo e assim estarás agindo como os santos que não cediam diante do sono a não ser sob pressão. “Estai de sobreaviso, porque não sabeis quando será o tempo”.

III — Eis a terceira coisa que te é pedida: a oração: “Orai”. Quer dizer não deixar de recomendar-se nunca ao Senhor: “Orai sem cessar” (1 Ts 5, 17). Como será possível praticar isto? É mais do que sabido que orar não significa outra coisa que revelar a Deus o desejo que se tem de seu auxílio, o desejo de adquirir a humildade, a obediência e de conseguir os demais bens para a alma: isto é, aquilo que aqui estamos tratando. O Senhor conhece muito bem o teu desejo: mas afinal para poder atender plenamente o teu desejo, Ele quer que tu o manifestes. Posto isto, se quiseres orar sem cessar, deves, antes de tudo, ter momentos determinados nos quais, em cada dia, possas apresentar tais desejos ao Senhor. Se tais momentos tiverem que ser breves, que sejam pelo menos freqüentes, para que tenham valor: “A oração fervorosa do justo pode muito” (Tg 5, 16). Quando, porém, tens que interromper tua oração direta, devido ao cansaço, ou estudo, ou por causa de outras justas ocupações, deves, pelo menos, conservar um vivo desejo no coração: assim, sempre e de algum modo continuarás rezando: se não rezas em ato, rezarás pelo menos, virtualmente. Infeliz de ti, quando perdes tal desejo: é aí então que as tuas coisas vão mal!

Até que existe a disposição constante para rezar, poderás, talvez, cair de quando em quando em algum defeito inconsiderado, mas conseguirás levantar-te com facilidade, porque voltas sempre a implorar a Deus o seu santo auxílio. E mesmo que certamente Ele mais te ouça quanto mais for atual a tua oração, todavia ouve-te também mesmo quando por vezes rezas apenas virtualmente: “Ouviste, Senhor, o desejo dos infelizes” (Sl 10, 17).

Agora, por conseguinte, é mister que orientes os teus esforços para orar. E isso não apenas no desejo, mas, enquanto for possível, em ato: porque esta era a oração entendida pelo Senhor, quando afirmava: “Estai de sobreaviso, vigiai e orai”. Queres tu, cumprir direitinho este dever? Pensa com freqüência na morte: pensa que já foi determinada, que está na iminência, talvez daqui a instantes: e não duvides. Então, como saberás recomendar-te ardentemente a Deus! Não haverá de passar quase nenhum momento do dia em que deixes de te recomendar a Deus: porque o verdadeiro temor é essa disposição que por sua mesma natureza muito mais incita à oração do que mesmo o próprio desejo: “E Josafá, cheio de medo, aplicou-se inteiramente a rogar ao Senhor” (II Cr 20, 3). Assim deverás fazer também.

Tu, porém, imaginas a morte sempre muito distante e por isso não te recomendas a Deus: “Orai, porque não sabeis quando será o tempo”.

IV — Reflete com atenção: não sabes quando deverá chegar a tua hora; não te podes garantir nem sequer um momento de vida: e o que há, por outro lado, que não seja capaz de tirar-te em qualquer momento? A morte sabe colher em todas as maneiras: sabe colher por assalto e por emboscada. Não seria possível que ela já te tivesse alcançado e tu nem sequer te apercebeste? Observa aquele peixe que já se encontra dentro da rede, enquanto esta ainda se encontra dentro da água: nada sabe: goza, esguicha, tripudia como os outros peixes que ficaram fora da rede; entrementes já se acha condenado. Assim poderia facilmente acontecer contigo. Talvez a rede já foi lançada e não há necessidade senão de um puxãozinho para arrastá-la para a terra. E não refletes nisso? Que tristeza! “Eu te enredei, ó Babilônia, e tu foste tomada sem o saberes” (Jr 50, 24).

Não esperes nada mais para refletir nos teus casos. Conserva-te preparado; fica atento e faz quanto antes uma confissão precisamente igual àquela que desejarias fazer então na hora em que tivesses que morrer, porque verdadeiramente ignoras “quando será o teu tempo”; podes recorrer à perícia dos astrólogos quanto quiseres, mas realmente “não sabes”: gostaria de ver se com tais atitudes ou artes conseguirás fazer passar a Cristo por mentiroso. Ele diz que tu “não sabes”. Basta-te isso: não dês crédito às lisonjas de ninguém. Não confies em tua jovem idade, não confies em tua saúde, não confies na tua aparência exterior, na tua musculatura, ou em qualquer outro vigor da mente, porque quando Cristo disse: “Estai de sobreaviso, vigiai e orai, porque não sabeis quando será o tempo” o que pretendia? Referir-se apenas aos Apóstolos? Afirmo-te que não: queria dirigir-se a todos. E assim concluiu: “O que eu, pois, digo a vós, o digo a todos: vigiai!” (Mc 13, 37).

Vamos, pois, vem para frente com as tuas sandices, e se fores capaz tenta excluir-te do número daqueles a quem Cristo se referiu. Quem quer que sejas, com a saúde ou doente, jovem ou velho, grande ou desprezível, rico ou mendigo; torno a repetir-te, “não sabes quando será o tempo”; não existe nenhuma circunstância na qual tua última hora não possa estar iminente.

 

Católico, não prenda o seu coração nas coisas passageiras, mas trabalhe fervorosamente para conquistar a Vida Eterna, lembrando de que a morte não tarda: “Vigiai, portanto, porque não sabeis quando o senhor da casa voltará: à tarde, à meia-noite, ao canto do galo, ou de manhã,  para que, vindo de repente, não vos encontre dormindo. E o que vos digo, digo a todos: vigiai!”

Católico, não cochile, não durma... mas permaneça acordado, entesourando tesouros no céu; então não será pego de surpresa.

 

O Pe. Francisco Fernández-Carvajal comenta esse trecho da Palavra de Deus.

 

Para manter este estado de vigília, é necessário lutar, porque a tendência de todo o homem é viver de olhos cravados nas coisas da terra. Especialmente neste tempo do Advento, não deixemos que os nossos corações fiquem ofuscados pela glutonaria, pela embriaguez e pelos negócios desta vida, perdendo assim de vista a dimensão sobrenatural que devem ter todos os nossos atos.

Estaremos alerta se cuidarmos com esmero da oração pessoal, que evita a tibieza e, com ela, a morte dos desejos de santidade; estaremos vigilantes se não descurarmos os pequenos sacrifícios, que nos mantêm despertos para as coisas de Deus. Estaremos atentos mediante um exame de consciência delicado, que nos faça ver os pontos em que nos estamos separando, quase sem o percebermos, do nosso caminho.

 

São Bernardo de Claraval escreve: “Irmãos, a vós, como às crianças, Deus revela o que ocultou aos sábios e entendidos: os autênticos caminhos da salvação. Meditai neles com suma atenção. Aprofundai no sentido deste Advento. E, sobretudo, observai quem é Aquele que vem, de onde vem e para onde vem; para quê, quando e por onde vem. É uma curiosidade boa. A Igreja universal não celebraria com tanta devoção este Advento, se não contivesse algum grande mistério”, e: “Da parte do homem, deve ser, a fidelidade, a indicada pelo evangelho (Mc 13, 33-37): generoso serviço no cumprimento  do próprio dever, sem ceder ao cansaço e à preguiça. Assim age o servo diligente que não dorme durante a ausência do patrão, mas cumpre fielmente os encargos que lhe foram confiados, de modo que, ao voltar o Senhor, ‘à tarde ou à meia-noite, ou ao canto do galo ou de manhã’ (Mc 13, 35), encontra-lo-á sempre em seu lugar, ocupado em seu trabalho; não assustado, com medo de ser surpreendido em falta, mas alegre de revê-lo. E porque, para o cristão, Deus não é apenas patrão, mas Pai, o encontro será repleto de alegria” (Pe. Gabriel de Santa Maria Madalena).

Católico, ESTEJA SEMPRE ACORDADO, isto é, trabalhando para SALVAR sua ALMA IMORTAL: “Salvar a minha alma, tornar-me santo, eis o principal negócio de minha vida. Ser rico, honrado, prezado, servido, isto não tem valor algum e será antes um perigo, uma grande desgraça se der ocasião a que peque ou me leve a descuidar-me de minha salvação – pois na morte acaba tudo” (São Pedro Julião Eymard, A Divina Eucaristia, Vol. 3).

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 26 de novembro de 2008

 

 

 

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Depois de autorizado, é preciso citar:

Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Digo a todos: vigiai!”

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