MINHA MÃE, POR QUE SOFRESTES TANTO?
Entre os
quadros mais comoventes da vida humana, existe um que inunda
de dor os nossos corações, e faz brotar de nossos olhos
copiosas lágrimas de compaixão.
E qual
será este espetáculo tão comovedor e triste?
Muitos de
vós já o presenciastes. Muitos de vós já derramastes
lágrimas ao contemplar uma pobre mãe triste e desolada, os
olhos rasos de lágrimas, no momento de dar o último adeus ao
filho querido que levam ao cemitério.
Um coração
humano, ainda que empedernido e cruel, poderá ficar
indiferente e frio ante espetáculo tão comovedor?
Somente
quem conhece o afeto, o carinho que Deus colocou neste
relicário precioso: coração de mãe, poderá avaliar golpe tão
doloroso. Ei-la, a pobre vítima, desfeita em lágrimas, cheia
de angústias que ferem seu coração, soluçando, chorando o
filho querido que lhe foi arrebatado. Na verdade, triste é
para nós esta cena que se repete tantas vezes neste vale de
lágrimas. Tudo isto, porém, é um pálido esboço, um reflexo
sequer das tristezas e dores que padeceu a mais compassiva,
a mais dolorosa de todas as mães que existiram e ainda hão
de existir no mundo: a Mãe de Jesus, a Mãe das Dores.
Nem mãe,
nem filha, nem irmã, nem esposa, ninguém jamais sofreu tanto
como a Virgem Santíssima! E por quê? O motivo encontrareis
nesta verdade que todos vós conheceis e professais: Quanto
mais uma alma é perfeita e pura, tanto mais sensível e maior
é o seu amor.
Que
natureza foi mais delicada, mais pura e nobre do que a de
Maria Santíssima, ornada de todas as graças e perfeições
celestiais?!
Para
avaliar em toda sua extensão as dores de Nossa Senhora,
seria necessário conhecer a fundo o íntimo do coração de
Maria, aquele coração que mais amou a Jesus:
“Que havemos agora dizer a respeito
de Maria, Mãe de Jesus Cristo, que entre todas as criaturas
mais semelhança devia ter com o Seu Filho? Não nos devemos
de certo admirar se suas dores foram imensas, mas
considerá-las atentamente para nos compadecermos de tão
imensas tribulações. Queixou-se por vezes a mesma Senhora a
Santa Brígida que seus filhos tão pouco meditassem e se
compadecessem das suas dores. Entretanto, esta meditação
tanto agrada a Deus como se meditássemos, considerássemos a
Sua Sagrada Paixão. Contemplava um dia Santa Gertrudes as
dores de Maria Santíssima e não podendo reter as lágrimas,
soluçava grandemente, penetrada da mais viva compaixão,
apareceu-lhe Jesus recolhendo as lágrimas em uma taça de
ouro, as quais se tornaram logo como pedras preciosíssimas”
(Sacerdote da
Congregação da Missão).
Porventura, existe na terra união mais íntima e profunda do
que entre mãe e filho? Sangue do mesmo sangue, vida da mesma
vida, tudo entre estes seres privilegiados concorre para
estreitar os laços dessa união: os mesmos sentimentos, as
provas de amizade, o carinho ou sofrimento repartidos,
enfim, tudo... E estes laços de amizade sincera vão
crescendo, tornam-se mais sublimes e chegam a ser fonte de
doces lágrimas, se o filho se conserva bom e puro.
Que união
íntima não terá havido entre Jesus e Maria!
Descrever
o amor de Maria é enaltecer-lhe as dores !
Ah! O
coração humano torna-se impotente, a nossa linguagem não
pode traduzir em palavras o quanto a Virgem Maria amava a
Jesus, seu divino Filho, o quanto sofria vendo-O sofrer. Não
somente o amava! Ela O adorava, porque Ele era seu Deus! Que
foi o viver de Maria senão o renovar de contínuos atos de
amor?
A Virgem
Maria amava o seu divino Filho, quando ainda O trazia em seu
seio virginal. Ela O amava quando, naquela noite estrelada
do Natal, viu pela vez primeira as afeições delicadas do
filhinho, reclinado no presépio. Ela O amava, quando O
trazia nos braços, fugindo à fúria sanguinária de um rei
cruel. Ela O amava na humilde casa de Nazaré. Os seus olhos
contemplavam extasiados, aquele menino tão carinhoso e
obediente, trabalhando na pobre oficina de carpinteiro:
“Vós, Senhor, estais sempre com
Maria, e Maria sempre convosco, nem pode estar sem vós; de
outro modo, ela deixaria de ser o que é...”
(São Luís
Maria Grignion de Montfort).
Ela O
amava quando O via entre as multidões, ensinando-lhes a
verdade, curando os enfermos, consolando os aflitos e
fazendo o bem a todos. Ela O amava quando O encontrou na Via
Dolorosa, e tanto era o amor entre estes dois corações, que
somente souberam dizer: “Minha Mãe!” “Meu pobre Filho!”
E este amor intenso chegou ao máximo do apogeu ao contemplar
o Filho querido de seu coração, pregado numa cruz e que ali
morreu por causa de nossos pecados, para salvar nossas
almas. Pessoas existem, frias e indiferentes, que não
demonstram, amor e carinho senão quando vêem o próximo, o
irmão em grandes aflições. Se Maria amava o Filho nas horas
de alegria, este amor aumentou de intensidade, transpôs os
últimos limites, no momento em que Jesus agonizava, pendente
de um madeiro. Como o espelho recebe e reflete os objetos
que se colocam diante dele, assim a Virgem Santíssima
recebia com amor todos aqueles tormentos e sofria com Jesus
Cristo. No coração de Maria repercutiam dolorosamente os
ecos das bofetadas, dos golpes, das marteladas e dos cravos
que ensangüentaram o Corpo Santíssimo de Jesus Cristo.
E que dor
imensa não sofreu o coração amante da Virgem Dolorosa ao
contemplar o Filho pregado numa dura cruz, entre o céu e a
terra, os braços abertos, como se quisesse abraçá-la e a
todos os homens, pelos quais morreu. E tão intensas e
grandes foram suas dores, que o Evangelista, confuso e
atônito, ante este quadro doloroso não encontrou outra
palavra senão: “Stabat juxta crucem Jesu Mater ejus!”
“Estava de pé junto à cruz de Jesus, a sua Mãe!”
“Estava de pé, estava diante da
cruz, não vencida pela dor, caída no chão, mas, intrépida,
corajosa, em porte digno”
(Santo Ambrósio).
E Maria ali se conservou de pé, amando e sofrendo, sofrendo
e amando! “Se as dores de Maria
fossem divididas entre todos os mortais, não poderiam
agüentar tanto peso, e todos morreriam debaixo dele
oprimidos” (São Bernardo de Claraval),
e: “Por grande que fosse a
crueldade exercitada contra os mártires, tudo era leve em
comparação do martírio de Maria”
(Santo Anselmo),
e também: “Assim, entre todos os
tormentos que inventou a barbaridade humana pelo espaço de
três séculos, a fim de atormentar tantos mártires que
derramaram o sangue pela fé no meio das maiores crueldades,
nenhum houve que se possa comparar com o martírio desta
Senhora; nem sequer toda esta multidão de mártires reunidos
pode se igualar com Maria, porque a todos excedeu nas suas
dores, sendo por isso com justa razão aclamada: Rainha de
todos os Mártires”
(Sacerdote da Congregação da Missão).
Não são
mais fortes as chamas abrasadoras do amor, quando o objeto
amado, o centro de nossas afeições não está mais em nossa
presença? Até o momento em que Maria Santíssima pôde
contemplar o seu divino Filho, o amor de seu coração
materno, encontrou alívio e consolo nas aflições. Mas chegou
também para a mais carinhosa de todas as mães, a derradeira
vez de estreitar ao peito o Coração de Jesus, a quem tanto
amava e adorava! O corpo santíssimo do Salvador, ungido com
preciosos aromas e envolto em alvos lençóis, deve ser tirado
dos braços de Maria e levado ao sepulcro.
Quem
poderá avaliar a intensidade do golpe desferido contra o
coração de Maria! Pobre Mãe! Já não lhe será dado contemplar
os desfigurados membros do Filho, que tanto amava!
“Voltemos ao Calvário e observemos
atentamente a aflita Mãe, que ainda tem abraçado Seu Jesus
morto e se consome de dor ao beijar-lhe as chagas”
(Santo Afonso Maria de
Ligório, Meditações).
Ei-Lo,
colocado por mãos carinhosas em um sepulcro. Contempla-O
ainda...pela derradeira vez, até que alguém procura
afastá-la daquele lugar. Maria, a Mater Dolorosa, não tem
forças suficientes para separar-se do único anelo de seu
coração. Cobre de lágrimas, beija sem cessar a campa tão
fria, e aperta contra ela o coração, como se quisesse
abraçar ainda uma vez o coração do Filho querido.
Sim, é
preciso que ela deixe o centro de seu amor; porém, algo fica
ali sepultado com Jesus: o seu coração de Mãe!
Santa
Brígida, ao receber uma revelação da Santíssima Virgem, esta
lhe afirmou que ficara sepultada com seu Divino Filho.
A Mãe das
Dores, trêmula, quase desfalecida, volta silenciosa pelo
mesmo caminho até chegar ao Cenáculo, donde partira em busca
de Jesus...
Ali,
derrama copiosas lágrimas e, em busca de consolo, seus
lábios proferem estas palavras: “Filho de meu coração,
onde estás? Por que me tiraram o único objeto de meu amor?
Meu filho, já não estás comigo! Não entrarás mais neste lar,
cansado de fazer o bem aos homens que te maltrataram e
crucificaram! Oh! Bendita seja a santíssima vontade de
Deus!”
E mais e
mais, a espada de dor penetrava no coração de Nossa Senhora,
que sofria, é verdade, mas também beijava reverente a mão
carinhosa de Deus, que a feria por amor!
Ó Virgem,
Filha de Sião, exclamarei com o Profeta: que imagens, que
semelhança encontrarei para representar uma sombra sequer de
vossas angústias? Direi, porventura, que Maria sofreu todos
os suplícios com que os pagãos atormentaram os mártires?
Isto seria pouco, porque Santo Anselmo nos diz que
“... todos aqueles bárbaros
tormentos não podem ser comparados com as dores de Nossa
Senhora”.
Maria
Santíssima terá sofrido todos os males que as criaturas
suportaram nas horas de infortúnio? Não, isto não basta,
desde que São Bernardino afirma que as
“... dores de Nossa Senhora foram
tão cruéis, que se as repartíssemos entre todas as
criaturas, estas morreriam de dor”.
E quantas
lágrimas não chorou Nossa Senhora! Tantas foram, que, no
dizer de São Germano, “... lhe
saíram dos olhos inumeráveis lágrimas de sangue!”
Qual,
pois, será a comparação para a vossa dor, dor tão grande
como o mar?
Há
episódios e fatos da vida humana, que nenhum mortal pode
jamais pintar ao vivo, com as verdadeiras cores.
Quando o
nosso olhar repousa, extasiado, sobre o oceano imenso, o que
vemos? Um enorme volume de água, rodeado de todas as partes
por um horizonte esbranquiçado. Aquela grande extensão
coberta de água, não nos diz nada sobre as inumeráveis
espécies de vida que se lhe encerram no interior. Nem dos
belíssimos jardins que lhe brotam debaixo das ondas,
salpicados de plantas de cores variegadas, nem dos bancos de
coral, nem das grutas abertas em rochas fantásticas... Assim
sucede com o oceano de dores que se oculta debaixo do
Coração imaculado da Mãe de Deus.
O que
conseguimos ver nos deixa maravilhado e, apesar disso, nada
é comparado com a grandeza do que se nos esconde... Quando o
nosso olhar encontra uma pessoa que sofre, temos compaixão
daquela pobre alma.
Deixamos
então escapar de nossos lábios esta pergunta: — Por que
sofres? — Após contemplar, ainda que em pálido esboço, o mar
de dores e angústias que inundou o Coração de Nossa Senhora,
aproximemo-nos, reverentes e contritos da imagem da Mãe das
Dores e perguntemos-lhe: — Minha Mãe, por que sofrestes
tanto? Vós que fostes a mais pura, a mais sensível de todas
as criaturas. Vós que amastes tanto a Deus, não somente nas
horas de alegrias, mas principalmente nas horas de aflições?
Vós que nunca ofendestes a Nosso Senhor, nem com a mais leve
culpa, nem com um pensamento sequer! Dizei-me, ó Mater
Dolorosa, dizei-me por que sofrestes tantas dores e não vos
queixastes?
E Maria
Santíssima, sempre compassiva para com as almas dedicadas
que recorrem a Ela nas dores e tentações, tomando-nos pela
mão, conduz-nos a um lugar bem alto, onde nossa vista
alcança a amplidão do espaço. Cenas pungentes para o coração
humano desenrolam-se diante dos nossos olhos estupefatos.
Eis em uma cama um pobre doente, ardendo em febre, cheio de
dores, cena esta que comove àqueles que dele se acercam. É
verdade, ele sofre muito, mas dos lábios jamais se lhe
escapa uma palavra de queixa, uma imprecação. Ele sofre tudo
com paciência heróica, e oferece as dores para pagar os
pecados, para salvar almas... O olhar lânguido só encontra
consolo num quadro de Nossa Senhora das Dores aos pés da
cruz. Pelas mãos deslizam-lhe as contas do Rosário, unindo o
seu padecer com o de Jesus e Maria! Que quadro edificante de
cristã resignação! Mas, como compreender tanta paciência no
meio de tormentos atrozes?
E a Mater
Dolorosa nos dirá carinhosamente: — “Filho de minha alma,
eu sofri tanto, resignada, para ser um modelo aos que
padecem”.
Contemplemos outro episódio...
Vemos um
jovem, na flor da mocidade, onde tudo devia ser risos e
flores. Mas, como está abatido aquele rosto! As faces
pálidas, os olhos fundos e tristonhos! O que se lhe passa no
interior do coração? Doença? Cansaço?
Ah! Aquela
jovem alma está mergulhada num mar de tristezas. São as
tentações, são as ondas impetuosas das paixões, são as
ciladas do demônio, que faz tudo para perder aquela alma
imortal!
Apesar de
toda resistência, novamente surgem tremendas tempestades.
Onde buscar alívio e consolo? No mundo? Nos divertimentos e
nas criaturas? Não, tudo isto não o pode consolar, mas
somente Jesus e Maria, que jamais desamparam os que recorrem
a Eles. E, esta pobre alma, levada pela graça, não se
desespera, não deixa de rezar as orações diárias, não se
afasta da Confissão e Comunhão. Pelo contrário, redobra o
seu fervor, aumenta-lhe a confiança em Deus e na Santíssima
Virgem, e ali, aos pés da Mater Dolorosa, o seu coração
encontra lenitivo e paz.
Santa
Catarina de Sena achava-se certa vez em grandes tentações
contra a castidade, mas resistia heroicamente. Por fim
aparece-lhe Nosso Senhor, trazendo-lhe a paz e a resignação.
A Santa
perguntou-lhe: — “Onde estáveis, quando estas coisas se
passaram comigo?”
Respondeu-lhe Jesus: — “Filha, estava dentro do teu
coração”. — “Jovem, exclama também a Mater Dolorosa;
Jesus e eu jamais desamparamos aos que nos invocam nas
tentações. Damos-lhes coragem e paciência para lutarem e
vencerem. É para ser o amparo e o modelo dos atribulados que
eu sofri tanto”.
Continuemos a percorrer o mundo e eis que presenciamos outra
cena dolorosa. A morte, implacável e cega, ceifou a vida de
um ente querido, encanto e alegria do lar! Oh! Que momentos
dolorosos não se passam no seio da pobre família, que chora
o tesouro perdido, mas, não com lágrimas de desespero, com
gritos alucinantes, como se fossem pessoas loucas. Não se
ouvem imprecações e blasfêmias contra Deus, injuriando a
Nosso Senhor, dizendo que Ele foi cruel, que foi um tirano.
Não, todos choram, mas, resignados. Choram, adorando os
desígnios de Deus, que tudo dirige com mão carinhosa de Pai
bondoso. Estas almas privilegiadas, educadas na escola da
Virgem Dolorosa, sabem muito bem que o sofrimento é sinal de
que Deus as quer elevar a um mais alto grau de santidade.
Ah! Um coração sem tribulações é como um céu sem revelação
que vê a Deus somente à luz fraca e tênue do crepúsculo.
Certos estão de que o ente querido não se afastou para
sempre de junto dos seus. Não, ele somente foi levado para
gozar de Deus, lá no belo Céu!
“Minha Mãe, agora
compreendemos os motivos de vossas dores cruciantes. Sim,
vós amastes a Jesus como ninguém neste mundo, e, apesar
disso, que sofrimentos atrozes não padecestes! Vós sofrestes
tanto para nos ensinar que devemos levar a cruz, contritos e
resignados, e não nos revoltando contra Deus e as criaturas,
ficando impacientes e nervosos. Na verdade, este mundo é um
vale de lágrimas, e não um mar de rosas! Felizes os que
sofrem resignados!”
(Pe. Newton
Pimenta).
Pe. Divino
Antônio Lopes FP.
Anápolis,
15 de fevereiro de 2008
Bibliografia
Bíblia Sagrada
Santo Afonso
Maria de Ligório, Meditações
Pe. João Batista
Lehmann, Euntes... Praedicate!
São Luís Maria
Grignion de Montfort, Tratado da Verdadeira Devoção à
Santíssima Virgem
Sacerdote da
Congregação da Missão, Sagrada Paixão de Nosso Senhor
Jesus Cristo e Dores de Maria Santíssima
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