Maria chorando
 

 

LANÇAI A REDE

(Jo 21, 6)

 

“Disse-lhes: ‘Lançai a rede à direita do barco e achareis’. Lançaram, então, e já não tinham força para puxá-la, por causa da quantidade de peixes”.

 

 

Jesus Cristo dá-lhes um CONSELHO de amigo: “Lançai a rede à direita do barco e achareis”. A convicção com que Cristo Jesus deu-lhes o CONSELHO; o ter visto naquele desconhecido algo santo e venerável; a mesma facilidade com que seguimos os conselhos que nos podem ser proveitosos, fez com que os Apóstolos seguissem a indicação de Jesus Cristo: “Lançaram, então, e já não tinham força para puxá-la, por causa da quantidade de peixes”. Pescaram mais de cem peixes no lago de Tiberíades, e que nesse caso foi pela onipotência de Jesus Cristo. É o símbolo da fecundidade do apostolado (cf. Lc 5, 10).

Jesus ressuscitado está na PRAIA, os Apóstolos no MAR. A PRAIA é a eternidade, o MAR é o século, o mundo. Jesus está bastante perto dos seus discípulos para vê-los e ouvi-los, mas não está com eles, como na primeira pesca milagrosa. A pesca dessa manhã é a imagem da Igreja no fim do mundo, como a precedente figurava a Igreja do tempo presente. Na primeira pesca, os Apóstolos apanharam peixes em número indeterminado, grandes, pequenos e maus, porque lançaram as redes a esmo, tanto para um como para outro lado. Assim agora na Igreja, os cristãos apanhados pela rede da palavra divina, são grandes e pequenos, bons e maus, justos e pecadores, vêm de todos os lados, por efeito da graça que os chama, e em grande número. Mas as redes se partem com a carga e alguns naturalmente se escapam. Na segunda pesca, os peixes são em número determinado, são cento e cinquenta e três grandes e bons peixes, apanhados à direita, de um lado só, e por serem tantos e tão grandes não se partem as redes. Assim, no fim do mundo, na Igreja triunfante, os eleitos serão recolhidos de um só lado, o lado direito, onde existe intenção reta e conformidade com o Direito que é a Justiça. Todos serão grandes e bons no reino de Deus, e em número determinado pela presciência divina. Finalmente, não se partirão as redes porque todos serão salvos por toda a eternidade. Para que lado nos dirige a nossa intenção? Para onde se encaminham as nossas obras? Se para a esquerda, tremamos pelo dia de amanhã, porque desse lado não estão os grandes e bons peixes, e seremos excluídos daquela barca que nos conduz às praias da eternidade feliz.

“Lançai a rede à direita”. À DIREITA: tem sentido de honra e predileção. Onde estão Jesus Cristo e os seus. Os PEIXES da DIREITA podem significar os ELEITOS de Deus e o lugar onde Cristo TRABALHA (atua, realiza, faz algo).

As redes foram lançadas e pegaram uma grande quantidade de peixes. Esta superabundância ou plenitude é algo notável que São João insiste em seu Evangelho: em Caná (2, 6), na “água viva” (4, 14; 7, 37ss); na primeira multiplicação dos pães (6, 11); na vida “abundante” que dá o Bom Pastor (10, 10).

“... achareis”. Indica grande segurança em quem manda (Jesus Cristo).

Jesus Cristo não ordenou duvidando como acontece entre os pescadores, mas ordenou com toda convicção... afirmando, como quem sabe o que vai acontecer: “‘Lançai a rede... e achareis”. Ordena que lance a rede para um lado, o lado direito, para que não pareça casualidade ter pescado naquela parte tantos peixes, segundo observam Teodoro de Mopsuestia e Eutímio. Esse é o sentido literal.

O sentido místico, tomado de São Gregório Magno, que é também de Ruperto, ainda que mais breve e claro diz: “Duas vezes se lê no Evangelho que o Senhor mandou seus discípulos lançarem a rede ao mar: UMA, antes de sua paixão; e, OUTRA, depois da sua ressurreição. Antes da paixão e ressurreição mandou que lançassem a rede para pescar (Lc 5, 4), porém, não determinou que fosse para a direita nem para a esquerda. Depois da ressurreição, aparecendo aos discípulos, mandou lançar a rede para a direita. Na primeira colheram tantos peixes que rompeu a rede. Nessa, apesar de que foram muitos, a rede  não se rompeu. Quem há que ignore que os bons são designados pela direita e os maus pela esquerda? Aquela pesca que não se manda a que parte do mar deve ser lançada a rede, designa a Igreja presente, que recolhe os bons e maus. Ao contrário, nesta outra pesca, depois da ressurreição do Senhor, lança somente para a direita do barco, como reunindo os eleitos para a glória; e o lado esquerdo é ignorado. Naquela pesca, a primeira, se rompia a rede pela quantidade de peixes, porque entram os eleitos com os réprobos na confissão da mesma fé; e a mesma rede, que é a Igreja. Porém, nesta outra pesca, depois da ressurreição de Jesus Cristo, pescam muitos e grandes peixes e a rede não se rompe, porque a Santa Igreja dos eleitos descansa na paz perpétua do seu Autor, sem ser rasgada pelas brigas e divisões”. O mesmo escreveu Santo Agostinho.

Eusébio Emiseno escreve: “Lançai a rede à direita do barco e achareis. Como se dissesse: ‘Eu desta vez não vos enviei, vocês vieram de noite, trabalharam pela parte esquerda e não pescaram nada. Agora, lançai a rede para a direita do barco; trabalhem obedecendo-me, pregai a minha doutrina... que não saiba a esquerda o que faz a vossa direita, e achareis”.

Pescar, pois, à direita é pregar a verdadeira e católica doutrina com sincero afeto e puro coração. Os pescadores são os apóstolos, pregadores e doutores; as redes são o Evangelho e toda palavra divina; os peixes são claramente todos os fiéis; tais peixes nadam nas fontes batismais. Tais são pescados nas redes do Evangelho e no amor da fé.

O lado direito do barco é a intenção boa de ânimo. Lançamos a rede à direita sempre que fazemos algo para Deus, ou, o que aprendemos também do mistério da pesca milagrosa, é que pescamos de noite quando realizamos algo sem Jesus Cristo, sem a luz divina, sem o divino auxílio. Lançamos a rede à direita quando o Senhor está à nossa direita e não tememos o que nos façam os homens. Isto é, quando realizamos algo apoiados no auxílio de Deus, Ele nos sustenta.

“... e já não tinham força para puxá-la”. A mesma forma, intimamente relacionada com a ordem de Jesus Cristo, destaca a eficácia das palavras do Senhor.

Chama a atenção que os apóstolos ouvindo as palavras de um desconhecido lançaram a rede depois de trabalhar toda a noite sem fruto. Ouviram a voz de um homem venerável e sagrado, e cheios de  esperança lançaram a rede desejosos de pescar muitos peixes e de fazer também a vontade dele.

Eutímio disse: “Ou pensaram que talvez ele conhecesse alguma região do mar onde os peixes eram abundantes”. Também, alguns autores comentam que é muito fácil seguir os conselhos que achamos verdadeiros.

Vamos ver se existe algum mistério nessa pesca milagrosa.  Santo Agostinho comenta: “Não teria permitido Deus semelhante coisa se não quisesse que tal fato significasse algo e que para nós não fosse de proveito. Que importava a Cristo que pescassem muitos peixes ou não? Aquela pesca era figura da nossa pesca”.

Pelas palavras de São Gregório Magno que foram citadas acima (o sentido místico), entenderemos o significado que dão a este milagre Santo Agostinho, São Beda, e Ruperto. Eusébio Emiseno diz: “Podemos entender pela primeira e noturna pesca aquela pregação dos apóstolos entre os judeus, quando, não querendo crer, disse-lhes Paulo: ‘Era preciso que a vós primeiro fosse dirigida a palavra de Deus. Uma vez, porém, que a rejeitais e julgais a vós mesmos indignos da vida eterna, nós nos voltamos para os gentios’ (At 13, 46). Pois, que é este voltarmos para os gentios, senão o que aqui se diz: Lançai a rede à direita do barco? Já que os peixes do judaico rio não quiseram entrar na rede dos apóstolos, os apóstolos voltaram aos rios dos gentios. Pescam, pois, os doutores de noite quando os ouvintes, cegos em seu interior, não entendem a verdade. Lançaram a rede para a direita do barco... e não podiam arrastá-la por causa da quantidade de peixes”.

Observação moral: Jesus Cristo enviaria pouco depois os seus discípulos por todo mundo, como se os MERGULHASSEM em alto mar, para pescarem homens. Poderiam eles desculpar-se por ignorância e fraqueza, falta de estudo, isto é, incapacidade de pescar; que, sendo poucos e destituídos de forças humanas, como poderiam “pescar” tão grandes peixes... tantos pregadores, tantos filósofos... e fazê-los mudar de vida? Quis Jesus Cristo, com um exemplo tomado do seu próprio ofício (pescar), fazer-lhes ver que não poderiam conquistar esses homens com suas forças; e isso ensinou aquele trabalhar toda a noite sem colher nada absolutamente. Porém, com a ajuda e auxílio do mesmo Senhor, facilmente “pescariam” muito homens, tantos que não poderiam arrastar a rede. Isto é: Espalhada a Igreja por toda a terra e cheia de pessoas, poderiam, então, governá-la sossegadamente.

O que significa com esse milagre (pesca)... terem lançado a rede à direita do barco, obedecendo a Jesus Cristo,  e pescado muitos e grandes peixes que não conseguiram arrastá-la?  Eis o significado: foram com bom ânimo para o lugar onde Cristo havia indicado e colocaram suas forças no divino auxílio; não duvidaram do sucesso feliz daquele trabalhoso negócio... olharam sempre à direita não à esquerda, isto é, para o auxílio de Deus que nunca lhes havia de faltar, e não confiaram em suas forças limitadas. Assim também explica Teodoro de Heraclea.

Foi singular prudência de Jesus Cristo, que do mesmo modo que chamou a São Pedro (Lc 5, 4), pescando uma grande quantidade de peixes, para ensinar-lhes que, todavia, seria mais feliz a pesca espiritual, feita por obediência ao Salvador, que aquela temporal que acabavam de realizar; assim confirmou o chamado e enviou-lhe depois à pesca espiritual cheio de esperança num bom trabalho frutuoso.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 09 de maio de 2014

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Pe. Manuel de Tuya, Bíblia comentada

Dom Duarte Leopoldo, Concordância dos Santos Evangelhos

Dom Isidro Gomá y Tomás, O Evangelho explicado

São Gregório Magno, Escritos

Santo Agostinho, Escritos

São Beda, Escritos

Ruperto, Escritos

Teodoro de Heraclea, Escritos

Eusébio Emiseno, Escritos

Pe. Juan de Maldonado, Comentário do Evangelho de São João

Eutímio, Escritos

Pe. Juan Leal, A Sagrada Escritura (texto e comentário)

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “Lançai a rede”

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