TENTADO
PELO DIABO
(Mt 4, 1-11)
“1
Então Jesus foi levado pelo Espírito para o deserto, para
ser tentado pelo diabo.
2
Por quarenta dias e quarenta noites esteve jejuando. Depois
teve fome.
3
Então, aproximando-se o tentador, disse-lhe: ‘Se és filho de Deus,
manda que estas pedras se transformem em pães’.
4
Mas Jesus respondeu: ‘Está escrito: Não só de pão vive o
homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus’.
5
Então o diabo o levou à Cidade Santa e o colocou sobre o
pináculo do Templo
6
e disse-lhe. Se és Filho de Deus, atira-te para baixo,
porque está escrito: Ele dará ordem a seus anjos a teu
respeito, e eles te tomarão pelas mãos, para que não
tropeces em nenhuma pedra’.
7
Respondeu-lhe Jesus: ‘Também está escrito: Não tentarás ao
Senhor teu Deus’.
8
Tornou o diabo a levá-lo, agora para um monte muito alto. E
mostrou-lhe todos os reinos do mundo com o seu esplendor 9
e disse-lhe: ‘Tudo isto te darei, se, prostrado, me
adorares’.
10
Aí Jesus lhe disse: ‘Vai-te, Satanás, porque está escrito:
Ao Senhor teu Deus adorarás e só a ele prestarás culto’.
11
Com isso, o diabo o deixou. E os anjos de Deus se
aproximaram e puseram-se a servi-lo”.
Em Mt 4, 1
diz: “Então Jesus foi levado pelo
Espírito para o deserto, para ser tentado pelo diabo”.
Nosso
Salvador, imediatamente depois de ter sido batizado, foi
impelido, isto é, levado pelo Espírito Santo para o deserto,
como está em São Marcos 1,12: “E
logo o Espírito o levou para o deserto”. Este
deserto era um lugar muito árido, seco, na área do chamado
deserto da Judéia. Das margens do Rio Jordão, onde fora
batizado, caminhou Jesus Cristo uns oito quilômetros, até
esta área do deserto; ele ficou na região mais alta do
deserto, com muita probabilidade no que hoje se chama o
monte da Quarentena, de 323 metros de altura, a uns 4
quilômetros da moderna Jericó.
O deserto
para onde Jesus Cristo foi levado era muito seco, possuía
muitas pedras e era cheio de profundos regos.
Em São
Marcos 1,13 diz que Jesus “vivia entre as feras”,
indicando a sua extrema solidão. Estes animais viviam
naquele lugar desabitado e eram sobretudo chacais, isto é,
mamíferos ferozes; viviam também ali, raposas, águias e
outras aves de rapina.
São Mateus
especifica que Jesus foi ao deserto para ser tentado pelo
diabo. Está claro que Ele não foi ali para passar férias ou
descansar; São João Crisóstomo escreve:
“Como o Senhor fazia todas as coisas
para nos ensinar, quis também ser conduzido ao deserto e ali
travar combate com o demônio, a fim de que os batizados, se
depois do batismo sofrem maiores tentações, não se assustem
com isso, como se fossem algo inesperado”, e:
“Depois que Jesus foi batizado por
São João com água, foi levado pelo Espírito ao deserto, para
que ali fosse batizado com o fogo da tentação. Donde se diz
que Jesus foi levado ao deserto pelo Espírito. Foi então
quando o Pai clamou desde o céu: Este é meu filho muito
amado” (Pseudo-Crisóstomo,
Opus Imperfectum super Matthaeum, Hom. 5),
e também: “Alguns perguntam por
qual espírito foi levado Jesus ao deserto... o diabo o levou
à cidade santa. Porém, verdadeiramente e sem vacilo algum se
entende por todos e se acredita que foi levado pelo Espírito
Santo... onde o espírito maligno havia de tentá-lo”
(São Gregório Magno,
Homilia in Evangelia, 16, 1),
e ainda: “Foi levado, não
obrigado nem preso, mas pelo desejo de combater”
(São Jerônimo),
e: “O diabo se aproxima dos
homens para tentá-los, mas como o demônio não podia ir ao
encontro do Senhor, Este foi ao seu encontro. Por isso se
diz: foi para o deserto”
(Pseudo-Crisóstomo, Opus
Imperfectum super Matthaem, Hom. 5),
e também: “Quanto maior é a
solidão, mais tenta o diabo. Por isso tentou a primeira
mulher quando esteve só, sem seu marido. Donde se deu
ocasião ao demônio que tentasse. Por isso foi conduzido ao
deserto”
(São João Crisóstomo, Homilia in Matthaeum, Hom. 13, 1),
e ainda: “Este deserto está entre
Jerusalém e Jericó, onde habitavam os ladrões, cujo lugar se
chama Dammaín, isto é, do sangue, pelo derramamento de
sangue que com tanta freqüência ali acontecia por parte dos
ladrões. É aí onde aquele homem que vinha de Jerusalém a
Jericó, se diz que caiu em poder dos ladrões, representando
a Adão, que havia caído em poder dos demônios. Era
conveniente, pois, que Cristo vencesse ao demônio, no lugar
em que o demônio venceu ao primeiro homem, sob a figura da
serpente” (A Glosa).
Jesus
Cristo foi tentado porque assim o quis, por amor a nós e
para a nossa instrução.
Jesus quis
ensinar-nos, ao permitir ser tentado, como devemos lutar e
vencer nas nossas tentações, isto é, confiando em Deus,
rezando, e com a fortaleza. Em Hebreus 2, 18 diz:
“Pois, tendo ele mesmo sofrido
pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados”.
Por outro
lado, estas tentações de Jesus no deserto, têm uma
significação muito profunda na História da salvação. Todos
os personagens mais importantes da História Sagrada foram
tentados e provados: Adão e Eva, Abraão, Moisés, o próprio
povo eleito; e assim também Jesus Cristo. Ele ao rejeitar
as tentações diabólicas, reparava as quedas dos homens antes
e depois d’Ele; preludia as futuras tentações de cada um de
nós e as lutas da Igreja Católica contra as tentações do
poder diabólico.
Em Mt 4, 2
diz: “Por quarenta dias e
quarenta noites esteve jejuando. Depois teve fome”.
Jesus
Cristo, depois de ter jejuado durante quarenta dias e
quarenta noites, teve fome, como qualquer homem nas mesmas
circunstâncias. Antes de começar a Sua obra messiânica e,
portanto, de promulgar a Nova Lei ou Novo Testamento, Jesus,
o Messias, prepara-se com a oração e o jejum no deserto,
está claro que não foi com bebedeira, glutonaria e com
barulho que Ele se preparou.
Moisés fez
o mesmo antes de promulgar, em nome de Deus, a antiga Lei do
Sinai. No livro do Êxodo 34, 28 diz:
“Moisés esteve ali com Deus
quarenta dias e quarenta noites, sem comer pão nem beber
água. Ele escreveu nas tábuas as palavras da aliança”.
Também Elias caminhou quarenta dias no deserto para
levar até o fim a sua missão de fazer renovar o cumprimento
da Lei; em 1 Reis 19, 8 diz: “Levantou-se,
comeu e bebeu e, depois, sustentado por aquela comida,
caminhou quarenta dias e quarenta noites até a montanha de
Deus, o Horeb”.
A Igreja
Católica segue as pegadas de Cristo Jesus ao estabelecer
anualmente o tempo do jejum quaresmal. Com este
espírito de piedade devemos viver cada ano o tempo da
Quaresma. Infelizmente, a maioria dos católicos vive a
quaresma como pagãos: com bailes, bebedeiras, carnaval
temporão, barulho, etc. O Papa João Paulo II escreve:
“Pode-se dizer que Cristo introduziu
a tradição do jejum de quarenta dias no ano litúrgico da
Igreja, porque ele mesmo ‘jejuou 40 dias e 40 noites’ antes
de começar a ensinar. Com este jejum quaresmal, a Igreja em
certo sentido, é chamada cada ano a seguir o seu Mestre e
Senhor se quer pregar eficazmente o Seu Evangelho”.
Será que os católicos estão seguindo o Mestre Jesus ou o
mundo inimigo das almas? Dê uma olhada à sua volta e verá.
Do mesmo
modo o retiro de Jesus no deserto convida-nos a
prepararmo-nos com a oração e a penitência, antes de
empreendermos qualquer atividade ou decisão importante na
nossa vida. Antes de tomarmos uma decisão, precisamos rezar
e fazer penitência. Seria agradável a Deus e um bem imenso
para a alma, se jejuássemos ao menos uma vez por mês a pão e
água; quem for generoso, faça mais de uma vez por mês e não
se arrependerá no dia do Juízo.
Quarenta
dias e quarenta noites passou Jesus no deserto, sem tomar
alimento algum. Em São Lucas 4, 2 diz:
“Nada comeu nesses dias...”,
neste longo período, Jesus viveu unido a Seu Pai, ao Pai
Eterno.
Jesus
jejuou quarenta dias e quarenta noites. Hoje existem milhões
de católicos que não são capazes de renunciar, sequer, um
pouco de alimento por amor a Deus e pelo bem de sua alma.
Muitos sentem nojo só em ouvir falar em renúncia e
penitência.
Para
milhões de católicos, a quaresma só existe no calendário,
porque na prática é zero.
São João
Maria Vianney escreve: “... (Jesus) diz-nos que se não fizermos penitência todos pereceremos. Tudo
se compreende facilmente. Desde que o homem pecou, todos os
seus sentidos se rebelaram contra a razão; por conseguinte,
se quisermos que a carne esteja submetida ao espírito e à
razão, é necessário mortificá-la; se quisermos que o corpo
não faça guerra à alma, é preciso castigá-lo e a todos os
seus sentidos; se quisermos ir a Deus, é necessário
mortificar a alma com todas as suas potências”.
Em Mt 4,
3-4 diz: “Então, aproximando-se o
tentador, disse-lhe: “Se és o Filho de Deus, manda que
estas pedras se transformem em pães”. Mas Jesus respondeu:
“Está escrito: Não só de pão vive o homem, mas de toda
palavra que sai da boca de Deus”.
Depois destes
quarenta dias e quarenta noites de jejum, em que a natureza
humana de Jesus se encontra debilitada, isto é,
enfraquecida; aproximou-se o Tentador, isto é, o atrevido
diabo, para lhe armar a primeira armadilha. O evangelho
mostra-nos o príncipe dos demônios aproximando-se de Nosso
Senhor de modo insidioso, falso, provavelmente com forma
humana. Ele diz a Nosso Senhor:
“Se és o Filho de Deus manda que estas pedras se transformem
em pães” (Mt
4, 3).
É lógico
que Jesus estava com muita fome. Embora pudesse fazer esse
milagre, transformar pedras em pães, prefere continuar a
confiar no Pai e não realizá-lo, porque não entra no seu
plano de salvação.
A proposta
do demônio nesta tentação, não tinha razão de ser dentro do
plano de redenção, já que iria em benefício exclusivo de
Jesus Cristo, que era matar a sua fome. Com a sua intenção,
o diabo parece querer certificar-se sobre se Jesus Cristo é
verdadeiramente “Filho de Deus”, pois, embora seja
verdade que se mostra informado acerca da voz do céu no
batismo, o diabo vê um contra-senso, um absurdo, um
disparate, em que Jesus seja Filho de Deus, e por outro
lado, sinta fome.
Com a Sua
posição perante a tentação, Jesus Cristo vem ensinar-nos que
as nossas petições a Deus não devem ser em primeiro lugar
acerca das coisas que se podem conseguir com o esforço
pessoal, nem que vão exclusivamente em benefício próprio;
mas antes, acerca das que vão encaminhados para a santidade.
O diabo
disse a Jesus Cristo: “...manda
que estas pedras se transformem em pães”.
O pão!
Alimento do corpo; a vida sensual em todas as suas
manifestações, eis onde o demônio tenta afogar a alma.
Lance um
olhar sobre o mundo! Quanta gente corre, agita, sua,
sofre... Somente atrás de interesses materiais: pelo pão,
para ganhar dinheiro, para conseguir bens, para gozar dos
prazeres, etc. Até parece que o corpo é o imortal, e não a
alma. Quanta loucura! Quanta cegueira!
Milhões de católicos profanam os domingos e os dias Santos de
guarda: pelo pão, exatamente, pelo pão. Trabalham aos
domingos e dias santos de guarda, somente atrás do pão,
somente com a intenção de
saciar o corpo, e não se preocupam com a própria alma.
Muitos, por causa do dinheiro, atropelam e pisam na justiça,
ficam cegos e desorientados; outros brigam com ódio
pelos bens materiais. Quantas guerras nas famílias por causa
de uma herança... Cometem até assassinatos. Outros
transgridem qualquer lei para gozar dos prazeres, até
parecem cavalos selvagens. Quanta loucura!
Hoje,
infelizmente, milhões de pessoas consentem nesta tentação,
esquecem da salvação da própria alma para correrem
desesperadamente atrás dos bens materiais; não reservam
nenhum horário para a leitura espiritual, porque estão
preocupadas somente em satisfazer todos os prazeres do
corpo; eis onde milhões colocam os seus desejos. Santo
Ambrósio escreve: “Não era esta a
fome que atormentava Jesus; era sim a fome das almas”.
Por isso,
Jesus Cristo respondeu ao demônio:
“Está escrito: Não só de Pão vive o
homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”
(Mt 4, 4).
A resposta
de Jesus é um ato de confiança na providência de Deus. Quem
o levou para o deserto, como preparação da sua obra
messiânica, ocupar-Se-á de que Jesus não desfaleça. A
resposta fica sublinhada, pelo fato da resposta de Jesus ser
uma evocação de Dt 8, 3, onde se recorda aos filhos de
Israel, como Deus os alimentou miraculosamente com o maná
do deserto. Assim, pois, Jesus, em contraste com o antigo
Israel, que se impacientou perante a fome no deserto,
entrega confiadamente o Seu cuidado à providência do Pai.
As palavras de Dt 8, 3 que Jesus pronuncia, associam as
imagens de pão e palavra como saídas ambas da boca de Deus:
Deus fala e faz surgir o alimento do maná.
Lembre-se
de que não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que
sai da boca de Deus. Está claro que possuímos uma alma
imortal, e é preciso trabalhar fervorosamente para salvá-la,
como escreve São Pedro Julião Eymard:
“Preciso salvar a minha alma, isto
é, ganhar o céu, evitar a eternidade do inferno. Não há
meio-termo. Salvar a minha alma é o fim da minha vida”.
Infelizmente, milhões de pessoas andam esquecidas da
salvação da própria alma, como escreve Santo Afonso Maria de
Ligório: “O negócio da eterna
salvação é, sem dúvida, o mais importante, e, contudo, é
aquele de que os cristãos mais se esquecem”.
Você se
preocupa com a salvação de sua alma ou você é um toco?
Pare com
tanta correria atrás do material! Pense mais na
salvação de sua alma imortal, como fala Nosso Senhor Jesus
Cristo: “Com efeito, que
aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro e arruinar a sua
vida?” (Mc 8,
36).
Em Mt 4,
5-7 diz: “Então o diabo o levou à
Cidade Santa e o colocou sobre o pináculo do Templo e
disse-lhe! ‘Se és o Filho de Deus, atira-te para baixo,
porque está escrito: Ele dará ordem aos seus anjos a teu
respeito, e eles te tomarão pelas mãos, para que não
tropeces em nenhuma pedra’. Respondeu-lhe Jesus: ‘Também
está escrito: Não tentarás ao Senhor teu Deus”.
Rábano escreve: “Se chama santa a cidade de Jerusalém, porque se encontrava nela o
templo, o Sancta Sanctorum e o culto do verdadeiro Deus,
estabelecido por Moisés”,
e:
“Para que se
conheça que o diabo tenta os homens ainda que em lugares
mais santos”
(Remígio),
e também:
“O diabo sempre
eleva às alturas por meio da jactância, para se precipitar
melhor”
(A Glosa),
e ainda:
“Mas, como podia conhecer nesta ocasião se era Filho de Deus ou não?
Voar pelos ares não é propriamente obra de Deus, porque a
nada conduz”
(Pseudo-Crisóstomo,
Opus Imperfectum super Matthaeum, Hom. 5),
e: “Perturbando os esforços do
diabo, Jesus se manifesta como Deus e como homem”
(Santo Hilário, in Matthaeum, 3), e também: “Não lhe disse: ‘Não me tentarás, pois sou
teu Deus e teu Senhor’, mas sim: ‘Não tentarás ao Senhor teu
Deus’, o mesmo que poderá dizer todo homem de Deus tentado
pelo demônio, porque o que tenta o homem de Deus, tenta ao
mesmo Deus”
(Pseudo-Crisóstomo,
Opus Imperfectum super Matthaeum, Hom. 5),
e ainda:
“A sã doutrina ensina que quando o
homem tenha algo que fazer, não deve tentar ao Senhor seu
Deus”
(Santo
Agostinho, contra Faustum, 22, 36), e: “Tenta a
Deus quem faz algo pondo-se em perigo sem motivo”
(Teodoto).
Na
primeira tentação, Jesus Cristo mostrou um total abandono em
Deus. Agora, o demônio quer induzi-Lo a uma confiança
presunçosa, cheia de vaidade. No versículo 5 diz que o diabo
leva Jesus consigo à Cidade Santa. Não quer dizer que o
diabo o obrigasse a segui-lo com violência, nem que Cristo o
acompanhasse amigavelmente. Orígenes escreve:
“Jesus seguia o diabo como um atleta
que voluntariamente caminha para a luta”, e o Pe.
Francisco Fernandes Carvajal também escreve:
“É mais provável que seja somente
uma representação de tipo imaginativo, sem que Jesus o
acompanhasse ‘fisicamente”, e São Gregório Magno
diz ainda: “...quem considere
como permitiu Nosso Senhor ser tratado na Sua Paixão, não
estranhará que permitisse também ao demônio comportar-se com
Ele dessa maneira”.
A Cidade
Santa era Jerusalém, centro judaico. O pináculo parece
referir-se a algum dos ângulos dos pórticos do Templo que se
levantavam sobre a torrente Cedron, a 180 metros de altura
sobre o fundo da torrente. De uma destas alturas, segundo a
tradição, foi precipitado São Tiago, o Menor.
No
versículo 6, o diabo diz a Jesus Cristo:
“Se és o Filho de Deus, atira-te
para baixo, porque está escrito: Ele dará ordem a seus anjos
a teu respeito, e eles te tomarão pelas mãos, para que não
tropeces em nenhuma pedra”.
Santo
Agostinho escreve: “As heresias
nasceram por se entenderem mal as escrituras, que são boas”.
O católico deve estar alerta perante falsas argumentações
que pretendem basear-se na Sagrada Escritura. Como estamos
vendo neste trecho do Evangelho, o demônio apresenta-se
algumas vezes como “exegeta” da Bíblia,
interpretando-a como lhe convém. Ele é realmente um exegeta
ridículo e enganador. Por isso, qualquer interpretação que
não esteja de acordo com a doutrina contida na Tradição da
Igreja deve ser rejeitada. Normalmente o erro da heresia
consiste em fixar-se nuns passos da Escritura com exclusão
de outros, interpretando-os a seu bel-prazer, perdendo de
vista a unidade da Escritura e a totalidade da fé.
Lembre-se
de que o demônio é atrevido, a ponto de citar a Sagrada
Escritura.
Essa
tentação era aparentemente capciosa, astuciosa: se Jesus
recusasse pular da altura, demonstraria que não confiava em
Deus plenamente; se aceitasse pular, obrigaria Deus a enviar
em proveito pessoal os seus anjos para salvá-lo.
Jesus
Cristo nega-se a fazer milagres inúteis por vaidade ou por
vanglória, Ele não é exibicionista, como muitos de hoje, que
fingem fazer curas, mas que tudo não passa de falsidade,
porque os hospitais continuam cheios de enfermos.
Devemos
estar atentos para saber rejeitar tentações semelhantes,
como por exemplo: o desejo de montar em benefício próprio
falsas argumentações que pretendem fundar-se na Sagrada
Escritura e a atitude de quem pede (e até exige) provas ou
sinais extraordinários para crer. Essas pessoas se esquecem
de que Deus nos dá no meio da nossa vida cotidiana, graças e
testemunhas suficientes, para iluminarem o caminho da fé.
O demônio
disse a Jesus: “Lança-te daqui
para baixo!” O maligno, isto é, Satanás, repete a
todo homem que peca as mesmas palavras: Tu estás no alto, ó
homem, sobre os méritos, sobre a graça, próximo de Deus...
lança-te daqui abaixo, no inferno onde eu estou a
atormentar-me, assim diz Satanás. E infelizmente, milhares
de pessoas aceitam o convite dessa serpente infernal e se
perdem eternamente; mergulham no mar de fogo do inferno,
onde serão atormentadas para sempre.
No
versículo 7, Jesus Cristo responde a Satanás:
“Também está escrito: Não tentarás
ao Senhor teu Deus”.
A resposta
de Jesus perante esta segunda tentação é de novo uma
rejeição radical, porque aceitá-la seria tentar a Deus. Para
isso, Nosso Senhor emprega uma frase do livro do
Deuteronômio 6, 16: “Não tentarás
o Senhor teu Deus”, referindo com ela o que está
em Êxodo 17, 2, em que os Israelitas, ao faltar-lhes a água,
exigem a Moisés um milagre e ele lhes responde:
“Por que tentais a Deus?”
Tentar a
Deus é completamente diverso de confiar n’Ele; é expor-se
vaidosamente a um perigo desnecessário, contando sem motivo
com uma ajuda extraordinária de Deus. Tentar a Deus, é
também pedir-lhe provas por causa da incredulidade e
arrogância humanas.
O primeiro
ensinamento desta cena evangélica é que, se alguma vez
ocorresse ao homem pedir ou quase exigir de Deus provas ou
sinais extraordinários, isso seria uma clara tentação a
Deus.
Você tem o
costume de tentar a Deus? De se expor a perigos, e
pedir que Deus o proteja? Deixe de estupidez, seja uma
pessoa normal; Deus não é obrigado ajudar uma pessoa
caprichosa.
Em Mt 4,
8-10 diz: “Tornou o diabo a
levá-lo, agora para um monte muito alto. E mostrou-lhe todos
os reinos do mundo com o seu esplendor e disse-lhe: ‘Tudo
isto te darei, se, prostrado, me adorares’. Aí Jesus lhe
disse: ‘Vai-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor teu
Deus adorarás e só a ele prestarás culto”.
Nesta
última tentação, o demônio oferece a Jesus toda a glória e
poder terreno que um homem pode ambicionar e cobiçar.
O demônio
promete sempre mais do que pode dar, ele é enganador, a
felicidade está muito longe das suas mãos. Toda a tentação é
sempre um logro, um engano miserável. Mas, para nos
experimentar, o demônio conta com a nossa ambição. E a pior
ambição é desejar a todo o custo a glória pessoal: a ânsia
de nos procurarmos a nós mesmos nas coisas que fazemos e
projetamos. Muitas vezes, o pior dos ídolos é o nosso
próprio eu. Temos que vigiar, em luta constante, porque
dentro de nós permanece a tendência de desejar a glória
humana, apesar de termos dito ao Senhor Jesus repetidamente
que não queremos outra glória que não a d’Ele.
Antes de
cometer o pecado, a pessoa vê no fruto proibido a verdadeira
felicidade; mas é tudo um engano. E a ingênua alma do homem,
por detrás da lisonja de ser rainha, é feita escrava de
Satanás: “Adora-me,
comete esse pecado”, diz o demônio,
“... e serás um rei”.
Puro engano! Puro engano! Infeliz daquele que escorrega na
saliva de Satanás; esse viverá na mais fria ilusão.
No versículo 10
Jesus diz ao demônio:
“Vai-te, Satanás,
por que está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás e só a ele
prestarás culto”.
Num
segundo, Jesus enxotou o demônio; porém quarenta dias, na
solidão, Jesus gastou em mortificar a sua carne. Grande
ensinamento! Quando se sabe dominar os próprios instintos, o
demônio não passa de um covarde que foge à primeira
jaculatória ou de um pouco de água benta, como escreve Santa
Teresa de Jesus: “De nenhuma
coisa fogem tanto os demônios para não voltar, como da água
benta”.
Jesus
respondeu energicamente a Satanás:
“Vai-te, Satanás”. Faça
você também o mesmo, não dialogue com a serpente infernal,
porque acabará caindo. Faça o sinal da cruz, chame por Jesus
e grite com o coração: “Eu
adoro a Deus! Só n’Ele e na sua vontade está a minha paz.
Retira-te, Satanás!”
São
Josemaria Escrivá diz:
“Aprendamos desta atitude de Jesus: durante a Sua vida na
Terra, não quis sequer a glória que Lhe pertencia, pois
tendo direito a ser tratado como Deus, assumiu a forma de
servo, de escravo. O cristão sabe, portanto, que toda a
glória é para Deus e que não pode servir-se da sublimidade e
grandeza do Evangelho como instrumento de interesses e de
ambições humanas”. Você enxota a Satanás ou gosta
de conversar com ele? Cuidado! Ele te seduzirá com as suas
falsas promessas e a ruína será total.
Em Mt 4,
11 diz: “Com isso, o diabo o
deixou. E os anjos de Deus se aproximaram e puseram-se a
servi-lo”.
Também nós
somos ajudados pelos anjos, que
são mensageiros de Deus. No livro do Ex 23, 20 diz:
“Eu mandarei um anjo diante de ti
para que te defenda no caminho e te faça chegar ao lugar que
te dispus”. Isto torna-se realidade na vida de
cada homem.
A missão
dos anjos é auxiliar os homens contra as tentações e
perigos, e trazer ao coração dos mesmos boas inspirações.
São os anjos nossos intercessores, os nossos custódios, e
prestam-nos o seu auxílio quando os invocamos. Também pode
prestar-nos ajudas materiais, se são convenientes para o
nosso fim sobrenatural ou para o dos outros. Especialmente
podem colaborar conosco no apostolado, na luta contra as
tentações e contra o demônio e na oração. São João da Cruz
escreve: “Além de levarem a Deus
as nossas notícias, trazem os auxílios de Deus às nossas
almas e apresentam-nos como bons pastores, com comunicações
doces e inspirações divinas. Os anjos defendem-nos dos
lobos, que são os demônios e amparam-nos” Você
confia no seu anjo da guarda? Você pede que ele o proteja?
Ou você nem sabe que possui um anjo que te protege?
A vitória
é conseqüência da perseverança na luta. Ninguém é coroado
sem ter vencido. Em Ap 2,10 diz:
“Sê fiel até à morte e dar-te-ei da coroa da vida”.
Os anjos que servem a Jesus depois de ter resistido às
sucessivas tentações, mostram-nos a alegria interior que
Deus dá ao que se opõe com esforço à tentação diabólica.
Nunca estamos sós na tentação ou na dificuldade, o nosso
anjo nos ajuda; estará ao nosso lado até o momento em que
abandonamos este mundo, e depois acompanhar-nos-á no juízo.
O Cônego
Duarte Leopoldo escreve: “Esta
refeição de Jesus é a imagem do festim que Deus serve à alma
vitoriosa. O momento que se segue à vitória é o mais
delicioso de todos os momentos”.
Rezemos
com atenção, devoção e respeito, essa oração composta
por Santo Afonso Maria de Ligório:
“Ò meu amabilíssimo Jesus, vejo que
no passado caí e recaí tão miseravelmente, porque me
descuidei de imitar os vossos diversos exemplos.
Arrependo-me de todo o coração; peço-Vos perdão e prometo
que para o futuro serei mais cuidadoso. Mas fortalecei a
minha fraqueza. Eu vo-lo peço pela mortificação que
praticastes, abstendo-vos por quarenta dias de toda a
alimentação, e pela humildade que mostrastes, permitindo ao
demônio que Vos tentasse como a qualquer outro filho de
Adão”.
Pe. Divino Antônio Lopes FP.
Anápolis, 06 de fevereiro de 2008
Bibliografia
Bíblia
Sagrada
Catena
Aurea
Adolfo
Tanquerey, Compêndio de Teologia Ascética e Mística
Dom Duarte
Leopoldo, Concordância dos Santos Evangelhos
Pe. João
Colombo, Pensamentos sobre os Evangelhos
Pe.
Francisco Fernándes-Carvajal, Falar com Deus
Pe.
Gabriel de Santa Maria Madalena, Intimidade Divina
Santo
Afonso Maria de Ligório, Meditações
Vide também:
Tentado por Satanás
Esteve no deserto
quarenta dias
Os anjos o serviam
|