| 
                     
					Santa Missa 
					segundo o Rito Gregoriano
					(“Missa Tridentina”)
					  
					
					Pe. Franz Hörl 
					  
					TEOLOGIA DA 
					CELEBRAÇÃO LITÚRGICA
					  
					O Duplo Movimento 
					da Liturgia
					Glorificação de 
					Deus e Santificação dos Homens
					  
					
					A estrutura da celebração litúrgica evidencia
					a liturgia como o lugar privilegiado de encontro 
					entre Deus e o homem. Aqui na terra, o lugar de estar 
					mais próximo a Deus é na liturgia. Sob o véu de símbolos, 
					Deus desce (do Céu) ao homem e o homem sobe (da terra) a 
					Deus. 
					
					Portanto, na liturgia acontece um duplo 
					movimento: Os homens elevam-se a Deus para Lhe oferecer 
					adoração e louvor de agradecimento, e Deus inclina-se aos 
					homens para fazer descer sobre eles os Seus dons. 
					
					* É assim que diz a oração do <Supplices 
					te rogamus> do Cânon Romano, onde a Igreja suplica sejam 
					estas oblatas apresentadas no altar celeste, diante do trono 
					de Deus, e de lá desçam a nós, pela comunhão, a cumular-nos 
					de graças e bênçãos; 
					
					* como também na oração do <Suscipiat>:
					Receba o Senhor das tuas mãos este 
					sacrifício para louvor e glória do seu nome e para bem nosso 
					e de toda a sua santa Igreja. 
					
					* Ou como ainda na <Secreta> do 
					“Décimo Domingo depois de Pentecostes”: 
					Aceitai, Senhor, os sacrifícios que Vos são 
					consagrados e que Vós instituístes para servirem ao mesmo 
					tempo de remédio às nossas almas e de glória ao vosso nome. 
					  
					
					1.) A LITURGIA COMO GLORIFICAÇÃO DE DEUS
					  
					
					O movimento ascendente a Deus de adoração e 
					de ação de graças é tão dominante na liturgia, que exige do 
					fiel sempre de novo a conversão e a separação de todo o 
					terrestre, como diz Col 3,2: Pensai 
					nas coisas do alto, e não nas da terra! 
					
					A liturgia nos surpreende pela liberalidade 
					desinteressada que se doa, pelo ”ócio santo” que deixa 
					espaço à contemplação, justamente pela exclusividade com que 
					gira em redor de Deus. 
					
					Deste modo a liturgia é, para todos os que 
					têm a felicidade de assisti-la, uma escola singular 
					de servir a Deus e de se abrir para Ele. 
					  
					
					a) LOUVOR DE DEUS E AÇÃO DE GRAÇAS NA ORAÇÃO 
					LITÚRGICA...
					  
					
					O que Cristo nos revelou do seu Pai, e o 
					cumprimento que deu a todas as prefigurações 
					velho-testamentárias, confere à oração da Igreja, de um 
					lado, a continuidade da oração judaica, mas também, 
					pelo outro lado, a ruptura ou novidade: 
					  
					...COM AS PALAVRAS 
					DO ANTIGO TESTAMENTO
					  
					
					Aos salmos e cânticos do Antigo Testamento a 
					Igreja dá-lhes um lugar proeminente na sua liturgia. Mesmo 
					que não as use literalmente, servem de inspiração nas 
					orações do celebrante, nos cânticos do coro e da comunidade. 
					A Igreja extrai das orações bíblicas, sobretudo, as 
					ilustrações das perfeições divinas, a declarações da Sua 
					santidade, transcendência, eternidade e onipotência. 
					
					A oração judaica se eleva da contemplação das 
					perfeições de Deus à ação de graças pelas obras admiráveis 
					da criação e dos feitios de misericórdia para com o Seu 
					povo. 
					
					O judeu piedoso, reconhecendo a sua própria 
					condição pecaminosa e a sua miséria espiritual, tornou-se 
					mais sensível pelo Deus misericordioso e salvador. 
					
					Apropriando-se de todas essas orações, a 
					Igreja dá-lhes um sentido mais amplo, porque as obras 
					admiráveis de Deus na Nova Aliança superam as da Antiga 
					Aliança, as continuam e rematam. 
					  
					...NA ORDEM DE 
					SALVAÇÃO DO NOVO TESTAMENTO
					  
					
					Foi Jesus Cristo que nos revelou os mistérios 
					da vida trinitária. Por isso, na liturgia, se encontram 
					numerosas doxologias da Trindade Santa, muitas das 
					vezes tiradas dos escritos de São Paulo. As orações que o 
					celebrante dirige ao Pai, se apóiam todas em Jesus, Filho de 
					Deus, como mediador, mencionando o Espírito Santo. 
					
					No culto de adoração de Jesus Cristo, a 
					Igreja Lhe atribui o título de “KYRIOS” que a 
					tradução grega do Velho Testamento usa exclusivamente para 
					Deus. 
					
					No livro de Apocalipse, o canto da comunidade 
					celeste é ação de graças. São Paulo fala dela em 
					forma de uma obrigação permanente do cristão. É 
					agradecimento a Cristo que nos purificou no Seu sangue, é 
					adoração do plano de salvação de Deus que nos chamou e nos 
					amou primeiro. Na reunião litúrgica acontece de certa forma 
					uma “epifania”, ou aparição, da salvação em Cristo. 
					  
					
					b) O SACRIFÍCIO DE LOUVOR
					  
					
					A liturgia alcança o seu ápice na celebração 
					eucarística que é um sacrifício de adoração e ação de 
					graças, portanto, como diz o Cânon Romano, um "sacrifício 
					de louvor" pelo fato de ser uma atualização eficaz do 
					ato redentor de Cristo. 
					
					A partir de que Cristo se imolou, na cruz, de 
					modo singular, todos os ritos de adoração e de louvor da 
					Antiga Aliança foram superados (confira: Hebr 10,5-7). 
					
					A distinção fundamental entre o culto cristão 
					e o culto velho-testamentário é justamente isso: A realidade 
					faz desaparecer as prefigurações. Em reconhecimento 
					da soberania absoluta de Deus, a Igreja não oferece mais 
					sacrifícios de “primícias” e “holocaustos”, mas o próprio 
					Cristo. O Seu sacrifício é louvor perfeito: 
					“oferta 
					e sacrifício de odor suave” (Ef 5,2); 
					é a única expiação adequada e é o rogo d'Aquele que
					“vive para sempre para 
					interceder por nos” (Hebr 7, 25). 
					  
					
					c) O CULTO NATURAL E O CULTO CRISTÃO
					  
					
					O culto bem como a virtude da religião 
					são indispensáveis para todos os seres humanos (Rom 
					1,19-21): 
					“O que se pode conhecer de Deus é 
					manifesto também entre os pagãos. A realidade invisível de 
					Deus, o seu poder eterno e a sua divindade, tornaram-se 
					inteligível através das criaturas de sorte que não têm 
					desculpas”. 
					
					O culto em si é a totalidade de todos os atos 
					pelos quais o homem procura dar expressão das suas 
					obrigações em relação a Deus. “Culto” é expressão de 
					religião, manifestando as duas atitudes de honrar a Deus 
					em reconhecimento da sua soberania, e de submissão. 
					  
					
					Diante da transcendência divina infinitamente 
					superior, o homem sente admiração, temor e 
					submissão. Isso já é um primeiro sentimento espontâneo 
					de adoração. Refletindo depois sobre essa experiência, o 
					homem concorda livremente que por justiça e necessidade deve 
					como obrigação, a mais elementar e indispensável, a de 
					reconhecer a sua independência daquele que é o início e o 
					fim, criador e senhor de todos os seres. 
					
					O homem, passando além dessas impressões 
					elementares da religião, procura conhecer a Deus e louvá-lo. 
					A glorificação de Deus - "clara noticia com laude" 
					(conhecimento claro com louvor) - é a finalidade do culto. 
					  
					
					Sob esse ponto de vista, o homem toma 
					consciência do seu próprio nada, da sua miséria, do seu 
					pecado. O sentido verdadeiro por Deus encontra-se sempre 
					acompanhado pela humildade. Tais sentimentos se 
					manifestam na oração, nos gestos de adoração e no 
					sacrifício. Assim os atos exteriores do culto são 
					emanações de atitudes interiores da alma. 
					
					O culto, porém, sem o auxílio da Revelação 
					está sempre ameaçado de desfigurações. O homem fica exposto 
					à tentação de: 
					
					* buscar a experiência religiosa por si só, 
					em vez de buscar a Deus; 
					
					* parar num estado subjetivo e irracional do 
					sentimento religioso; 
					
					* fugir de um esforço intelectual necessário 
					de conhecer a Deus; 
					
					* evitar a exigência conseqüente de 
					santidade; 
					
					* e, sobretudo, de perder o senso pela 
					transcendência de Deus. 
					  
					
					O culto natural não alcança o nível do culto 
					cristão. A Revelação divina não somente purificou e corrigiu 
					o culto que o ser humano naturalmente deve ao ser divino, 
					mas abriu um horizonte para um mundo de culto todo novo: 
					
					A novidade fundamental consiste no fato de 
					que Deus falou em língua humana. O incognoscível se 
					deu a conhecer, mostrou a sua glória a Abraão e a Moises, 
					falou pelos profetas, agiu na história do seu povo escolhido 
					de tal modo que já o AT declarou: (“A Sabedoria) apareceu 
					sobre a terra e no meio dos homens viveu” (Bar. 3, 38). 
					Depois dos profetas, Deus falou por seu Filho (1Jo 1, 18):
					“Ninguém jamais viu a Deus: o 
					Filho único, que está voltado para o seio do Pai, este o deu 
					a conhecer”. Ou também como reza o prefácio 
					de Natal: 
					“...pelo mistério do Verbo Encarnado, aos olhos da nossa 
					mente brilhou nova luz do vosso esplendor, a fim de que, 
					conhecendo a Deus de modo visível, por Ele sejamos 
					arrebatados ao amor das coisas invisíveis”. 
					
					Isso muda completamente o conceito de 
					“culto”, que Jesus precisou à mulher Samaritana, explicando:
					“... nós adoramos o que 
					conhecemos. Mas vem a hora - e é agora - em que os 
					verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade”
					(Jo 4, 22s). Cristo revelou aos homens 
					o amor de Deus e os convidou à amizade e intimidade 
					com Ele, apesar de que o cristão deve estar sempre 
					consciente da sua própria indignidade e condição 
					pecaminosa, e que deve aproximar-se de Deus imenso e 
					terrível sempre com reverência, humildade e respeito. 
					  
					
					O culto e a virtude de adoração do cristão 
					estão inseparavelmente ligados à fé e à caridade. E mais: O 
					culto cristão contem, essencialmente, o diálogo entre 
					Deus e o seu povo. Isso faz com que o culto cristão com 
					a posição significativa e única da Palavra de Deus na 
					liturgia é diferente de todos os outros tipos de culto. 
					  
					
					Mas existe uma diferença ainda mais profunda: 
					A paixão de Cristo superou os cultos do AT e os das outras 
					antigas religiões, porque a Sua paixão foi um sacrifício, 
					portanto um ato de culto. Deus aceita esse sacrifício 
					por si mesmo; é um sacrifício único e “renovado” 
					sacramentalmente. A sua eficácia está independente da fé 
					e da piedade das pessoas que lhe estão ligadas. 
					
					É designado para a salvação dos homens e 
					contem a graça espiritual de fazer os homens participar do 
					culto que ele possibilita. O sacrifício de Cristo é o 
					fundamento de uma nova comunidade de culto – que é a 
					Igreja – com a finalidade de continuar o sacerdócio de 
					Cristo. 
					
					A Igreja é muito mais uma comunidade, 
					essencialmente, de culto, fundada por um ato de culto que é 
					o sacrifício de Cristo: 
					
					* pelo seu culto que gera novos membros; 
					
					*é no culto que se manifestam os diversos 
					graus da sua hierarquia; 
					
					*no culto ela se torna consciente da sua 
					essência mais profunda e da presença e eficiência da sua 
					cabeça que é o Cristo Jesus; 
					
					*é no culto que ela avista o fim da sua 
					peregrinação terrestre. 
					  
					
					2.) LITURGIA COMO SANTIFICAÇÃO DOS HOMENS
					  
					
					A finalidade da liturgia é também a de 
					presentear aos homens a graça divina. Sinais e atos 
					externos da liturgia são sacramentos e sacramentais com a 
					finalidade de santificar os homens. A missa e os sacramentos 
					são o essencial da liturgia de tal forma que a 
					santificação é condição da realização do culto divino em 
					louvor, adoração e ação de graças. 
					  
					
					a) A SANTIFICAÇÃO DOS HOMENS É UM FIM 
					ESSENCIAL DA LITURGIA
					  
					
					Na liturgia, o dom de Deus aos homens 
					é essencial. Nela a Palavra de Deus, proferida com devida 
					disposição, contem uma luz e uma força que transcende o 
					valor de palavras puramente humanas, mesmo as dos maiores 
					pregadores, e lhes confere uma autoridade e eficiência 
					particular e toda singular: Hebr 4,12: 
					”Pois a Palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante do 
					que qualquer espada de dois gumes; penetra até dividir alma 
					e espírito... Ela julga as disposições e as intenções do 
					coração”. 
					  
					
					O papel primordial dos sacramentos consiste 
					em conferir aos homens a graça de Deus, em 
					aplicar-lhes a redenção e conduzi-los à salvação. 
					Eles são "propter homines", a favor dos homens, e a 
					sua eficácia se produz através de ritos, gestos e 
					palavras; são, portanto, direta a essencialmente 
					litúrgicos. O plano inteiro de 
					salvação sacramental está ligado à liturgia. 
					
					De um lado, os sacramentos recebem a sua real 
					eficiência da paixão de Cristo, do sacrifício da Nova 
					Aliança, e pelo outro lado, eles dão à liturgia 
					participantes e ministros: Batismo, Crisma e Ordem conferem 
					à alma um caráter que dão ao cristão a tarefa de ter parte 
					no culto divino e confere uma participação no sacerdócio de 
					Cristo. 
					  
					
					b) A CELEBRAÇÃO EUCARÍSTICA – DOM DE DEUS AOS 
					HOMENS
					  
					
					O duplo movimento da liturgia é realizado de 
					modo mais perfeito na Eucaristia. Ela é sacrifício, o ato 
					mais escolhido de adoração de Deus, e também é o dom mais 
					sublime de Deus aos homens. A oferta do sacrifício que 
					oferecemos ao Pai, antes temos recebido dEle pela 
					transubstanciação (cf. Cânon Romano: "de tuis donis ac 
					datis"). E tendo-a oferecido a Deus, dEle a recebemos de 
					volta para nosso alimento. Embora a comunhão não seja 
					essencial ao sacrifício, ela o completa (pelo menos na 
					comunhão do celebrante). Assim o culto mais desinteressado e 
					mais teocêntrico (=que tem Deus como centro), o “sacrifício 
					de louvor” torna-se, ao mesmo tempo, para nos o ato pelo 
					qual recebemos de Deus a fonte de todas as graças. 
					  
					
					c)  SANTIFICAÇÃO  OBJETIVA  E  SUBJETIVA
					  
					
					A santificação que a liturgia nos oferece é 
					uma realidade objetiva, na sua origem, independente 
					de quem a recebe, pois adquirida pelo próprio Cristo e dado 
					como presente "ex opere operato". Nos ensinamentos de 
					Pio XII lemos: "Nas celebrações 
					litúrgicas e, sobretudo, no sacrossanto Sacrifício do Altar, 
					perpetua-se a nossa redenção e aplica-se a nos os seus 
					frutos. Cristo opera a nossa redenção, dia por dia, nos 
					sacramentos e no seu sacrifício; através deles fica 
					continuamente atuando, expiando a humanidade e consagrando-a 
					a Deus" (Mediator Dei, 29). 
					
					As celebrações litúrgicas possuem em si 
					mesmas uma força (objetiva) que faz as nossas almas ter 
					parte na realidade da vida divina de Jesus Cristo. 
					Portanto, não por força nossa, mas por força divina, a 
					liturgia contem aquela eficácia que une a ação piedosa dos 
					membros com a da cabeça, e a torna a ser a ação de toda a 
					comunidade. 
					  
					
					Porém, não há de se esquecer que o fiel, 
					recebendo essa graça, precisa de se preparar para isso, 
					se deve colocar na disposição necessária, e depois 
					também corresponder a ela. Pois liturgia não é magia! 
					
					A esse esforço interior e pessoal a própria 
					liturgia também ajuda, despertando, iluminando e 
					aumentando a fé; a oração litúrgica expressa o amor a 
					Deus; a liturgia enquanto convivência comunitária torna-se
					escola da caridade fraterna, colocando, 
					incessantemente, diante dos olhos dos fieis os mistérios 
					de Cristo e o exemplo dos santos. 
					  
					
					Os dois movimentos que distinguimos na 
					liturgia – o dos homens a Deus e o de Deus aos homens – 
					estão, pela sua própria essência, intimamente interligados. 
					São Tomas de Aquino atribuiu a todo ato religioso este fim 
					duplo, o teocêntrico e o santificante. O fim de 
					santificação, porém, encontra-se subordinado ao fim primário 
					teocêntrico da liturgia: A santificação dos homens está 
					orientada para a liturgia. A redenção por Cristo, o fruto do 
					seu devotamento ao Pai, possui o seu fim último na liturgia 
					celeste em que “Deus é tudo em 
					todos” (1Cor. 15,28). O 
					sacerdócio de Cristo, exercido na liturgia, une esses dois 
					movimentos e, no fim, dirige todos os ritos para a adoração 
					e glorificação de Deus. 
					  
					A LITURGIA DA NOVA 
					ALIANÇA NO ESPÍRITO
					  
					
					A liturgia cumpre a tarefa de prestar a Deus 
					o devido culto de adoração e também a de tornar o seu 
					mistério de salvação presente e eficiente no meio dos 
					homens. A Igreja ó o novo Israel do fim dos tempos, 
					anunciado pelos profetas e realizado numa aliança nova e 
					definitiva com a característica de um culto espiritual. 
					  
					
					* A liturgia como expressão da aliança entre 
					Deus e o seu povo é completamente inspirada pela Palavra 
					de Deus que chama esse povo, lhe comunica os seus 
					mandamentos e lhe revela os planos de Deus referente ao seu 
					futuro. Portanto, a liturgia cristã é essencialmente fundada 
					na Revelação divina, nas Sagradas Escrituras, é 
					essencialmente bíblica. 
					  
					
					** A liturgia cristã como expressão da Nova 
					Aliança possui um caráter escatológico pelo Reino de 
					Deus, no fim dos tempos. Sob o véu de sinais sacramentais 
					que realizam o que significam, a liturgia possui já o 
					penhor da união entre Deus e os homens da realidade 
					última no Céu. A estrutura sacramental da liturgia 
					cristã tem a sua raiz na realidade antecipada dos fins dos 
					tempos. 
					  
					
					*** Essa aliança definitiva é caracterizada 
					pela efusão do Espírito Santo e constitui a 
					liturgia cristã como culto espiritual, não, porém, 
					porque recusaria a usar coisas materiais, mas porque as 
					submete inteiramente à liderança do Espírito Santo e ao Seu 
					serviço. Assim as realidades materiais – língua, gestos e 
					todos os objetos que podem ser usados na liturgia – mesmo 
					que não deixem de ter o seu sentido próprio, alcançam um 
					significado mais elevado o qual os torna sinais 
					eficazes da graça; graça que o Espírito Santo 
					comunica aos fieis para santificá-los e produzir nos 
					seus corações a oração dos filhos de Deus. 
					  
					
					**** É uma aliança messiânica, na qual 
					e através da qual a presença de Deus é realizada no 
					meio do seu povo. É por isso que a liturgia cristã é 
					cristocêntrica, orientada em todos os sentidos para 
					Cristo. Jesus Cristo é o único e definitivo Sumo 
					Pontífice da Nova Aliança que se imolou a si mesmo como
					“única oferenda e levou à 
					perfeição para sempre os que Ele santifica” 
					(Hebr 10,14). 
					
					A liturgia da Igreja permite à comunidade dos 
					fieis uma participação no culto que Cristo incessantemente 
					oferece ao Seu Pai, nesta Igreja que é o Seu Corpo. 
					
					“Mediator Dei” 20: A liturgia é 
					“o culto público que 
					nosso Redentor, a Cabeça da Igreja, presta ao Pai Celestial 
					e que a comunidade dos fieis oferece ao seu fundador, e 
					através dEle ao Eterno Pai. ...é o culto público do Corpo 
					Místico de Jesus Cristo, da sua cabeça,e dos seus membros”. 
					  
					LITURGIA E 
					PASTORAL
					  
					
					O fim primordial da liturgia é a glorificação 
					de Deus, e depois, ao mesmo tempo, a santificação dos 
					homens. A honra de Deus em si nós não a podemos aumentar; 
					somente podemos dar a Deus o que nós mesmos possuímos. O 
					que glorifica Deus é a nossa santidade. Disse santo 
					Irineo: “A glorificação de Deus é o homem vivo”. 
					
					A liturgia é a obra sacerdotal de Cristo, 
					continuada pela Igreja, com o duplo fim de glorificar o Pai 
					celestial, oferecendo-Lhe a ação de graças e as preces dos 
					homens, e de redimir os homens, distribuindo-lhes os dons de 
					Deus. 
					
					Este fim duplo do sacerdócio determina também 
					o sacrifício eucarístico que é 
					
					*ação de graças a Deus, 
					
					*expiação pelos pecados e 
					
					*comunhão dos homens com Cristo no Sacramento 
					do Altar. 
					  
					
					Também a celebração dos sacramentos – sinais 
					eficazes da graça –possuem esta dupla finalidade. O 
					Ofício Divino (“Breviário”) é oração de louvor como 
					preparação e continuação da eucaristia; de um coração 
					purificado e consciente, a oração eleva-se do homem a Deus. 
					
					Sendo os sacramentos sinais da fé, cuja 
					validade depende somente da celebração correta e da intenção 
					certa - <ex opere operato> - fica claro, porém, que
					produzem tanto mais fruto quanto melhor a disposição do 
					celebrante e do recipiente. 
					
					Por isso se exige do sacerdote e dos fieis um
					esforço espiritual, porque uma celebração digna e 
					frutuosa tem como condição a santidade (cf. Encíclica 
					“Mediator Dei”). 
					
					“A liturgia é a 
					primeira e indispensável fonte do autêntico espírito 
					cristão” (São Pio X), 
					e, portanto, é a fonte de toda a 
					vida verdadeiramente espiritual. 
					
					A própria celebração, nela e através dela, há 
					de santificar a comunidade dos fieis que assiste à 
					liturgia consciente e piedosamente. É como diz o 
					Concílio de Trento: ”A celebração 
					litúrgica, ela mesma, santifica, educa para a virtude da 
					religião e contem rica instrução para o povo cristão”. 
					
					A pastoral litúrgica nasce da sacralidade da 
					liturgia para 
					
					*dirigir o povo fiel, 
					
					*instruí-lo e 
					
					*santificá-lo. 
					
					Assistindo com conhecimento e atenção 
					ao culto, os fieis podem, na sua fonte, beber o autêntico 
					espírito cristão. 
					
					A pastoral litúrgica não visa os infiéis ou 
					pagãos (os sem religião ou não-cristãos), aos quais é 
					necessário, antes, introduzi-los ao mundo da fé; mas quer 
					condicionar aos fieis batizados e praticantes uma 
					assistência mais profunda da celebração dos mistérios da 
					fé. 
					
					(Portanto, querer produzir novas formas 
					litúrgicas para pagãos ou pessoas afastadas, não 
					introduziria na liturgia, mas dela afastaria. No início da 
					história do Cristianismo, a conversão dos pagãos não 
					aconteceu pelo culto cristão, mas começou com questões 
					quanto à pureza da vida, à caridade dos cristãos, às quais 
					uma introdução ao Evangelho dava respostas. Somente após um 
					longo tempo de catequese e preparação, os catecúmenos foram 
					admitidos à celebração dos mistérios, na qual participaram 
					plenamente só após serem batizados.) 
					
					A pastoral e catequese litúrgicas querem 
					formar comunidades unidas e espiritualmente elevadas, 
					conscientes e – sem presunção - orgulhosos da sua fé, cujos 
					membros façam atrativa a religião católica também a pessoas 
					afastadas ou sem fé. 
					  
					
					A pastoral litúrgica quer educar os filhos 
					de Deus, como um pai educa os seus filhos, para fazer 
					deles personalidades desenvolvidas e para 
					habilitá-los a corresponder à sua vocação. As 
					características de toda educação, portanto, são próprias 
					também da pastoral litúrgica: 
					  
					
					* A pastoral litúrgica é paternal, com 
					autoridade, mas sem autoritarismo e sem arbitrariedade. 
					Não exige um comportamento puramente externo, mas quer 
					implantar bons costumes e atitudes corretas, explicando 
					as razões e esforçando-se por criar as disposições internas. 
					  
					
					** A pastoral litúrgica è doutrinária, 
					porque quer criar convicções e não 
					somente impor comportamentos. 
					  
					
					*** A pastoral litúrgica quer formar: 
					não quer só ensinar e informar, mas despertar ainda mais: 
					
					- o sentido do sagrado, 
					
					- o sentido por Deus, 
					
					- o sentido do espírito de Cristo, 
					
					- o sentido da alegria da vocação interior e 
					da contemplação, 
					
					- o sentido pela Igreja e da alegria da 
					oração em comunidade. 
					  
					
					**** A pastoral litúrgica é progressiva: 
					formação e educação têm seu ponto de partida do estado 
					real do homem para conduzi-lo para o alto e elevá-lo acima 
					de si mesmo. Não é certo de se contentar em falar com os 
					fieis numa linguagem que compreendem, sem ter a vontade de 
					conduzi-los, aos poucos, a uma compreensão mais profunda 
					do mistério propriamente cristão. 
					  
					
					A pastoral litúrgica quer integrar os 
					fieis na tradição da Igreja; não pretende alcançar 
					sucessos visíveis, nem se adaptar a necessidades do momento 
					do povo cristão, nem a particularidades sociais ou 
					geográficas. Pelo contrário, a pastoral litúrgica pretende
					introduzir os fieis na liturgia da Igreja, ensiná-los a 
					respeitar e amar tudo quanto é herança de pensamento cristão; 
					quer integrá-los à grande Igreja de todas as nações e de 
					todos os tempos. Improvisações e experiências 
					arbitrárias não têm espaço numa liturgia autenticamente 
					cristã. 
					  
					PALAVRA FINAL
					  
					
					A força viva consegue a renovação pela 
					tradição, não sem ela, e muito menos contra ela. À atual 
					decadência do cristianismo devemos opor a beleza e o 
					esplendor duradouro do nosso catolicismo, a “paisagem de 
					alma” da liturgia e da cultura clássicas da Igreja católica 
					apostólica romana. Precisamos levar a sério as ricas e mais 
					diversificadas heranças e tesouros do Catolicismo, na sua 
					vivência durante vinte séculos da sua história,inspirada e 
					guiada pelo Espírito Santo. Precisamos combater o 
					desinteresse na tradição da história da Fé e a 
					marginalização da consciência cristã, e, pelo contrário, 
					fortalecer o orgulho da nossa própria tradição. 
					
					Para coisas para as quais o nosso tempo 
					perdeu as palavras e a forma de expressão, temos os tesouros 
					de formulação do passado, ritos, cerimônias, orações, 
					melodias... 
					  
					    
					
					   |